1848/04/00
Compra ao régulo de Goli da ponta das Duas Palmeiras a que
se pôs o nome de S. Belchior, e sua fortificação (tudo feito por CAETANO JOSÉ
NOZOLINI).
«É verdade que Nosolini tem outros gatos mais caros e mais perigosos para espantar:
a
29 de Novembro de 1847, a tripulação de um brigue britânico arrebatou sete criados (ler: escravos)
a sua esposa, a Nhánha Aurélia Correia, em Bolama, para os «libertam
em
Serra
Leoa. Em Lisboa, o Ministério desconfia desde hã muito tempo de Nosolini,
quanto
ao qual já não há ilusões mas, à falta de pessoal mais idóneo, deixam-no ao leme de Bissau. Como homem
dos mais subtis, sempre ele sabe, aliás, tomar medidas quando a sua situação parece um tanto cambaleante.
A 4 de Abril de 1848, tal como muitos dos seus antecessores, comprou uma
ponta de seis léguas por três ao régulo de Gole
(Goli, Golli ou Golles), na margem direita do rio Geba. Fortifica-a (três peças de artilharia), baptiza-a «São Belchior» (14) e pretende que ela impedirá os Biafadas de interromper
o trânsito pelo
Geba. Parece tratar-se ali do
resultado mais tangível da presença da sua goleta armada enviada, no começo de 1847, para o
rio Geba. 20 soldados são, pois,
colocados em terra em São Belchior, para vigiar a navegação
que
tem de se efectuar com um salvo-conduto. É o velho mare clausum português aplicado ao rio. Na margem esquerda, em Xime,
obtém igualmente (8 de Abril de 1848) uma cessão de território à Coroa. De facto, somos levados a crer que
Caetano José Nosolini procura, acima de tudo, fazer do rio Geba e do Corubal, os «seus» rios pois que, recordêmo-lo, ele é já governador interino de Bissau, senhor da «comporta» governamental de São Belchior e propõe um dos seus devotados oficiais
para o posto de comandante de Geba. A seu crédito, se estabelecerá, contudo, o facto de
que, quando transmitir os poderes, em Bissau, ao seu sucessor, no início de Janeiro de 1849, deixará um aquartelamento de pedra
para 150 homens. Que as obras, confiadas
a
um dos seus compadres, continuam por pagar, pela metrópole, não é assunto seu. Assunto seu é o
comércio e o arrecadar dos direitos de alfândega e dos impostos da Guiné. Ele o recuperará, portanto, e
o conservará até à sua morte, que vai ser muito próxima (11 de Julho de 1850, em Cabo Verde) (15).
(14) De notar que, no mapa de 1923,
a localização de Gole é a 15 km a sudoeste de São Belchior, estando a
região de Xi me na outra margem, à entrada do estrangulamento do rio
Geba.
(15) Curiosamente, a carreira de Nosolini recebe um tratamento relativamente pormenorizado num livro onde não se esperava vê-la figurar com
tanta importància. Rosemary E. Galli & Jocelyn Jones: Guinea-Bissau. Politics,
Economics and Society. Londres, 1987, pp. 22-24. Este texto, que é uma vibrante defesa do camponês guineense face aos
aparelhos e às opressões citadinas, contém igualmente um pequeno estudo
da sociedade crioula até aos anos de 1920.
René Pélissier, História da Guiné Portugueses e Africanos
na Senegâmbia 1841-1936, Volume I, EDITORIAL ESTAMPA, 1997, p.p. 110-111
1848/05/13
«João Fontes Pereira de Melo - nomeado
pela segunda vez em 13 de Maio de 1848, tomou conta do cargo em 26 de J unho. Por carta de lei de 6
de Julho de 1849, foi declarada livr'e a apanha da urzela, ficando apenas sujeita
aos .direitos da exportação 1$400 réis por
quintal para os portos estrangeiros e de metade, para o território
nacional. Já nesse tempo a urzela deixara de ter procura e preço nos mercados europeus. Por seu lado a população de Cabo
Verde dedicava-se à cultura da purgueira
e
café.» João Barreto
1848/08/08
O Governador de Cacheu tendo recebido do comandante
militar de Ziguinchor informações sobre as
ameaças do residente francês do Selho,
declarou que de modo algum se
abandonaria a ocupação de Jagubel, ponto cedido espontaneamente aos
portugueses pelos gentios, e que era objecto de disputa por ser ali muito importante o comércio de sal.
1848/08/09
O governador geral Noronha não occultava a pouca sympalia que tinha a Honorio Barreto,
que era muito considerado pelos ministros e antigos governadores.
Em officio de 16 de junho de 1848 para o
ministerio estranhara aquelle que este se correspondesse directamente com o ministro, sem llle enviar cópia d'essa correspondencia, como estava determinado, e o accusava de ter
mandado fuzilar um cabo da bateria de Cacheu.
Este cabo tentou assassinar Honorio, quando este governava interinamente Cacheu e por isso, sem formulas de processo, condemnou-o á morte, sendo a sentença logo executada.
O governador geral, em 9 de agosto de 1848, deu conta ao
ministro de um officio que recebeu do governador interino de Bissau, Caetano José Nozolini , de 14 de abril, sobre os acontecimentos que ali, nesse mes, tinha havido, e dos serviços tambem por elle prestados, chamando os grumetes de Geba á obediencia, estabelecendo para isso no territorio do Golles, no sitio das Duas Palmeiras, a nossa auctoridade, ponto importante que conseguiu have-lo do regulo mediante um presente; mandou
ali fazer uma fortificação e lançou os alicerces para
quartel do destacamento e casa para o commandante do mesmo. Deu Nozolini o nome de S. Belchior a esse forte, o que foi approvado pelo governador geral.
Dizia o governador de Bissau: que tinha partido a 2 de abril para o rio de Geba afim de escolher o local mais proprio para levantar um
forte, para assim chamar á obedieucia o povo de Geba e evitar, do futuro, que os Beafares fechassem o rio ou prohibissem a communicação com Geba.
Cedido á corôa o sitio das Duas Palmeiras, mandou
limpar o matto e colocou sobre uma eminenciá tres peças de artilharia para defesa do rio e do referido local ; para este serviço levou para ali um destacamento, que começou a
fazer o seu quartel. Contava, em breve, mandar para ali pedreiros e utensílios para aperfeiçoar o forte, embora o local escolhido fosse já, pela sua situacão, uma fortaleza.
O gentio nunca resolve as suas contendas senão depois de um prévio
ajuntamento do Grandes e do povo, que decreta o que se deve fazer: o qual dão o nome tle Palavra; esta era frequentemente usada em Geba, entre os gentio de Badora (Beafares) quando julgavam necessario fechar o rio, e para o abrirem era preciso grandes dadivas dos cofres de Fazenda que importavam em mai de 2:000$000 réis.
Com taes medidas adaptadas entregou este gentio parle dos roubos que fizera em
Ganjarra, promettendo entregar o resto.
Em S. Belchior deixou ao commandante 20 praças de pret e duas canôas tripuladas para, em caso de necessidade, tomarem qualquer embarcação que pretendesse passar no rio sem pas aporte e sem receber o passe.
De S. Belchior seguiu Nozolini para o sitio do Chime, onde se demorou dois dias, para tratar com a fidalga governante d'aquelle ponto, que se apresentou a bordo, para ceder á corôa uma parte d'esse territorio afim de ali se estabelecerem alguns negociantes; concordou-se n'isso recebendo ella um pequeno presente.
…
Em 6 de novembro de 1848 sollicitou o governador geral, a pedido do governador
interino da· Guiné, Nozolini, a promoção, ao posto de capitão, do tenente Victor Jorge,
que no rio de Geba e a bordo da escuna mercante Rosa,
durante 11 meses, estacionou no porto
de Chime, onde prestou bons serviços contra os gentios
Beafares e outros; e tendo sollicitado Nozolini que esse official fosse
nomeado governador de Geba e do
forte de S. Belchior, não concordou o governador
geral, com essa proposta, por
isso que entendia que os officiaes que governavam taes presídios deviam ser nomeados
pelo governador de Bissau e escolhidos entre os que mais confiança lhe merecesse.
A informação da competente repartição do ministerio ao ministro
deixava vêr que Nozolini não estava bem cotado no reino. Do governador Noronha
recebia elle, constantemente, provas da maior
consideração e ilimitada confiança. Embora fosse com a mira no
interesse, é inegavel que Caetano Nozolini prestou na Guiné
bons serviços ao país; no ministerio,
porém, havia informações que lhe eram
desfavoraveis, especialmente porque o acusaram de traficar em escravos.
A ínformação referida dizia:
«Funda-se a proposta na informação dada pelo governador
interino
de Bissau, Caetano José Nozolini, o qual não só o lembra para ser promovido
a capitão, mas tambem o propõe para
governador de Geba e do forte de S. Belchior.
Allega o governador de Bissau os grandes serviços feitos
por este oflicial, destacado onze meses a bordo de uma escuna estacionada no interior , do Rio de
Geba.
Se o governador de Bissau fosse outro, e de confiança,
mereceria muita consideração o serviço mencionado;
mas sendo quem fez a recomendação
Caetano José Nozolini, pode quasi ter-se a certeza de que o grande serviço tem sido feito ao mesmo Nozolini na qualidade de negociante, e parece talvez pouco
prudente fazer uma nomeação sobre
recommendação de Nozolini, quando ainda não ha informações
circumstanciadas respectivamente ao estado de Geba, que
vulgarmente se diz achar-se em
estado de insurreição ou desobediencia por culpa
da auctoridade de Bissau». Apesar disso foi promovido a capitão o tenente Victor Jorge.
A Junta da Fazenda, em 11 de janeiro de 1849. remettendo para o
ministério a correspondencia que o governador interino de Bissau, Caetano José Nozolini, lhe dirigiu em 25 de novembro de
1848: dando-lhe conta de se terem concluído as obras do quartel militar d'aquella Praça, conforme o contrato ceJebrado em 15 de fevereiro de 1.847 com
Macedo & c.a, solicitou do ministro da marinha o respectivo pagamento
dos saques sobre a pagadoria de marinha, por
não ter a Provincia meios para fazer face ás
suas despesas; quando mais não fosse ao menos dos saques
destinados a satisfazer obrigações contrahidas porcontractos.
O governador referido, de Bissau, informou
que o quartel estava prompto e já occupado pela tropa; que ficou o melhor
possível, todo feito de pedra e cal,
com bons vigamentos. de madeira, coberto de
asphalto, ladrilhado com lagedo que havia na Praça ; tinha tarimbas
de casqninba, uma boa e grande arrecadação e quarto
para o sargento; o quartel podia accommodar 150 praças á vontade.
Faltava fazer a cozinha e rebocar o quartel por fora,
A casa Macedo & C. ª estava desembolsada das
sommas que despendeu para edificar
aquelle quartel; a Junt.a de Fazenda da Província adiantou 1:000$000 réis em uma letra
sobre
a
Contadoria
de
Marinha, a qual foi protestada e por isso a firma Macedo & C. ª
suspendeu os trabalhos, que continuaram sob a responsabilidade do governador
interino
Nozolini, que sa embolsaria no caso do governo pôr
duvidas ou retardasse o pagamento.
A Repartição Central do Ministerio da Marinha informou como devia ao
titular da respectiva pasta e por forma tal que não seria para estranhar-se, alem
da indispensavel Qensura, fossem obrigado a pagar taes despesas quem a ellas deu causa. Dizia a
informação;
. «A Junta da Fazenda de Cabo Verde deu conta de que tendo
contratado
(em 15 de fevereiro de 1847) com Macedo & C.ª (de Bissau) a construção
de
um quartel para a tropa, naquella
praça, se obrigara a pagar-lhe em letras sobre a
pagadoria da marinha. Que· tendo-lhe dado a primeira, e como
esta não fosse paga, aquella casa recusara tomar outras em pagamento: e nesta circunstancia
pediu para que o governo não deixasse de pagar as letras que ella sacasse em virtude
de contratos. Invoca-o credito publico, e não sei que mais,
que não vem ao caso» .
Subsidios para a História de Cabo Verde e Guiné, por Christiano José de
Senna Barcellos, parte V,
pgs. 124-127, Lisboa, 1911
1849
☻ JOSE BENTO GOMES aparece como urn
notavel de Ziguinchor em 1849.
☻ Mas
em 1849, o novo almany Oumar,
desejoso de vingar a incursão de Manda, proclamou
a guerra santa e mobilizou um exército de seis mil homens, incluindo uma
numerosa cavalaria de mais de três mil cavalos. A batalha de Bérékolon concluiu-se ao fim de cinco dias com a vitória
peul, mas estes, consideravelmente enfraquecidos, retornaram ao Fouta com
menos de metade dos efectivos.
☻ A segunda filha de CAETANO NOZOLINI e Mãe Aurélia, Leopoldina, casou com Adolphe Demay, um comerciante franco-africano de Gorée que
se estabelecera em Bissau nos finais dos
anos 40. A residência de Demay em Bissau reflectia os tempos de mudança.
Protegido por barcos de
guerra franceses, os comerciantes franceses,
franco-africanos e senegaleses fizeram incursões cada vez maiores no comércio
luso-africano e caboverdiano no rio Casamansa e no sul ao lonogo da Costa Alta
da Guiné. A intimidação e a violência como meio de eliminar comerciantes
rivais já não eram posssíveis
após o assassínio de Dumaigne em 1835, de modo que Mãe Aurélia, Nozolini e Leopoldina devem ter decidido que os interesses da
família seriam melhor servidos pela tradicional estratégia proprietario
africano-estrangelro de co-optarem por um comerciante estrangeiro hábil através
de uma aliança matrimonial.
Apesar
do casamento de Leopoldina com Demay ter sido por conveniência, o comércio de Demay prosperou, e pode-se supor que os
de Leopoldina também foram bem servidos. Dos bens de Leopoldina não era de desprezar a herança que recebera de seu pai, o estabelecimento
comercial e os privilégios comerciais exclusivos no rio Corubal (Nozolini
obteve estes
últimos em 1843 do régulo biafada). Além do comércio em Bissau e no rio
Corubal, Demay tinha uma feitoria
denominada «Monte Napoleão» no rio Grande, também
parte da esfera comercial de Mãe
Aurélia e Nozolini. Demay
desempenhou urn papel importante para os interesses
comerclals
franceses e senegaleses nos anos 50 e 60, facultando relatóros sobre o
comércio e outros assuntos aos oficiais da marinha francesa e aos funcionários
coloniais do Senegal, e por varios anos na decada de 50 actuou como agente comercial para o cônsul americano na Praia,
nas ilhas de Cabo Verde
1849/01/24
Tomou posse do governo de Bissau o major Carlos Maximiliano de Sousa em 24 de janeiro de 1849.
Deu-Ihe posse o
governador interino Caetano José Nozolini, que foi
elogiado pelo seu successor pelos bons serviços que prestou á Praça, entre os quaes o donativo que fez
de todos os objectos necessarios
para vestir o destacamento, que se achava em miseravel estado, por falta
de pagamento de massas, havia dois annos, e por concluir o quartel militar, feito
com muita solidez e em condições de poder receber o dobro
da guarnição.
1849/06/16
No anno de
1849 deram-se varios conflictos entre o Governador de Cacheu José Xavier Crato e autoridades
francesas do
Senegal por causa do rio Casamansa os quaes ficariam ignorados se a Cacheu não tivesse passado a
Commisão para inspeccionar essa Praça.
O tenente-coronel commandante
militar de Zeguichor, Francisco de Carvalho Alvarenga em officio de 16 de junho para o governador de Cacheu
alude á representação que lhe foi dirigida pelo patrão de
uma embarcação portuguesa que foi a Sejo para vender ai e que ali fora obrigado a pagar um imposto, (taxa) por um
mouro (mandinga) e que esse imposto havia sido mandado cobrar por um francês ali colocado
como capitão commandante do estabelecimento francês de Casamansa, V. Doyer, a titulo de ser antigo costume dos habitantes de Sejo; e uma vez que elle tinha feito aos portugueses abandonar aquelle ponto e, posto lá outros habitadores qne precisavam reconstruir
suas casas, era forçoso que se renovasse aquelle imposto.
Em 8 de junho o commandante
de
Zeguichor deu conhecimento d'este
facto ao governador de Cacheu que, em 11 mandou uma nota ao commandanle francês lastimando
tal procedimento exercido em terrilorio que pertence a Portugal.
Em
17
de junho respondeu V. Doyer: «Deverá saber que o Governo não
pode responder por um acto que por elle não foi commettido
e por franceses, e de que a
autoridade não possue conhecimento».
Tambem outra nota
foi
dirigida
ao Governador da Goré no referido dia 11, tendo o de Cacheu recommendado
muito ao commandante de Zeguichor que expedisse
um
expresso para que as respostas não demorassem.
Bem interessante foi
o que depois se seguiu, e que foi relatado ao Governador de Cacheu pelo commandante dé Zeguichor em officio de 16 de junho. Que no dia 10 do
referido mez de junho fundeou uma embarcação no porto de Zeguichor,
trazendo a bordo o commandante do Sejo; que este a elle se dirigiu, pedindo-lhe para o informar por que razão
havia mandado retirar uma chalupa franceza que tinha ido a Jagubel comprar sal. Respondeu-lhe que em cumprimento
das ordens do
Governador de Cacheu ou de um tratado que
tínhamos com aquelle feito em 1844 por Honorio Pereira Barreto. Mostrando-lhe o tratado disse: que não era
aquillo mais do que uma convenção feita com aquelles gentios e que Portugal não
tinha o direito exclusivo d'aquelle ponto para fazer retirar qualquer embarcação estrangeira, que não era tratado approvado pelo Governo Supremo com reconhecimento das nações estrangeiras e por isso não reconhecia aquelle ponto como português; que, então toda a vez que
alli
fosse qualquer embarcação francesa e que a mandassem
retirar, que elle viria a Zeguichor,
com um navio de guerra para a abandonar e tomar o Presidio. Interrogou-o
Carvalho Alvarenga se tinha sido elle quem autorizára os mandingas a cobrar ás canôas portuguesas um imposto quando fossem a Sejo commerciar e como respondesse
affirmativamente perguntou-lhe sobre quaes princípios se fundava para que
tal imposto se cobrasse, respondendo com evasivas.
O certo é que o
commaudante de Zeguicbor, Alvarenga, acompanhou o seu protesto para o Governador de Cacbeu em 27 de junho, com declarações de José Bento Gomes, Pedro Dave e Gregorio José Domingues, como testemunhas presenciaes das brutaes ameaças de V. Doyer.
O Governador de Cacheu protestou contra taes ameaças para· o Governàdor do Senegal e commandante de Goré.
O commandante do Sejo, em 30 de julho, em nome do Governador de Senegal e Dependencias, respondendo á nota ou protesto, preveniu o comandante
de Zeguichor, que elle seria forçado a retirar a
bandeira e soldados do rio de Jagubel se impedisse o commercio de sal aos navios franceses. Terminava a nota com a seguinte ameaça; Tenho ordem formal de ir ali pessoalmente tirar a sua bandeira e seus soldados; rogo-lhe me evie este desgosto.
Em 31 de julho, o capitão de fragata, commandante particular da ilha de Goré, respondia á nota do Governador de Cacheu de 11i de junho, abordando os dois pontos : tributo
lançado em Sejo (Sedhiou) ás embarcações portuguesas que ali iam commerciar e prohibição de negociar á francesas. em Jagubel.
Quanto ao primeiro ponto diz que nenhuma responsabilidade
cabe ao official
francês, commandanle do forte de Sedhiou, da canoas serem prohibidas pelos mandigas, das vizinhanças d'aquelle forte, commerciarem sem pagamento de um tributo, que era de costume antigo, e ainda do tempo de uma parte dos soniqueses
terem sido d'alli expulsos pelo referido efficial.
Quanto ao segundo communicava-lhe ter recebido uma reclamação contra a prohibição das embarcações francesas irem a Jagubel
a
commerciar em sal; que esta prohibição inacceitavel pelo Governador do Senegal e Dependencias a manter-se pelo commandante de Zeguichor, levaria aquelle governador a exigir do de Cabo Yerde uma
reparação completa por um tal acto de brutalidade.
O commandante militar de Zeguichor officiou ao Governador
de Cacheu em 4 de agosto sobre as ameaças do residente em Sejo; enviou-lhe
a nota original d'este residente e pediu-lhe instrucções do modo como devia proceder .
Em 8 de agosto accusando a recepção dessa correspondencia disse-lhe: de maneira alguma podemos ou devemos abandonar aquelle ponto que é nosso e que nos foi cedido expontaneamente pelos Gentios, donos d ri e
terreuo Pelo officio junto V. S.ª verá qual é a minha resolução; e ent- J depois de os lêr os fechará, e remetterá a seu destino. Será bom que Y. .ª previna os Gentios d'aquellas paragens sobre o brutal
procedimento que intentam praticar os franceses, instigados sem duvida por esse miseraveis qae se intitulam
commerciantes do Sejo, e que tão bom acolhimento recebem nesse Presidio.
Deus Guarde a Y. .ª
(a)
José Xavier Crato – Governador
Em 19 d'agosto communicou o commandante de Zeguichor ao Governador de Cacheu ter unido os gentios de Jagubel e
Assinhame protestando estes a sua fidelidade a Portugal e que a bandeira portuguesa ·não seria arriada pelos franceses.
O Governador de Cacbeu, Crato, respondeu ao otlicial frances residente no Sejo á nota que dirigiu ao commandante de Zeguichor.
Ill.mo Sr.
Tenho á vista o officio que Y. .ª com data de 30 de julho ultimo, em que communica ao
commandante de Zeguichor a ordem que V. S.ª recebeu do Governador de Senegal, ordem que eu não quero classificar; a nossa bandeira fluctua no rio de Jagubel e A ·iohame em virtude de um tratado livremente feito com o gentio dono d"aquelle
rio
e terreno, e com approvação do Governo de Sua Majestade, e portanto não hei-de remover aquella bandeira só para agradar a V. S.ª ou ao Governador de Senegal. Rogo a V. S.ª
por sua dignidade pessoal e ainda mais pela dignidade da Nação a que pertence que se não abaixe a fazer ameaças brutaes ao ponto de Zeguichor porque eu desprezo soberanamente taes
ameaças pelas quaes desde já protesto perante meu Governo, que não deixará de reclamar ao Governo
Francês, qne é justa a satisfação das injurias que V. S. ª tem feito ao Presidio de Zeguichor; ainda que eu conheça que V. S.ª leima, não concebe, nem pode conceber razões de justiça, comtudo remetto junto as copias ~os tratados que temos com os gentios de Assinham.e e Jagubel, e V. S.ª verá que temos direito fundado
naquele rio e terreno e não como V. S. ª pensa, ou lhe informaram os estúpidos commerciantes que
habitam esse ponto. Dirijo ao Governador do Senegal um officio e protesto a este respeito.
8 d'agoslo de 1849
Deus Guarde a V. Ex.ª
José Xavier Crato
Na mesma data enviou a seguinte nota ao Governador de Senegal.
m.mo e Ex.mo r.
Não posso deixar de leYar á presenç.a de Y. Ex.a. . e!xas, as mais amargas, contra a brutalidade do official fran' • res~"'t:nt.:'> em Sejo, o qual tem insultado o Presidio de Zeguichor porque conhece
exactamente sua fraqueza ; a generosidade bem conhecida da :\ação Portugue a não permitte que seus cidadãos, despresando a justiça, só attendam ao
direito da força. Ultimamente o dito otlicial dirigiu uma ordem ao cornmandante de Zeguicbor para abandonar um ponto que nós comprámos
aos gentios por um tratado pelo menos tão valido como os que os franceses tem feito com diversos gentios e d'onde
lhes vem o direito de repellirem de taes pontos, os Ingleses; cobriram-se com o nome de Y. Ex.ª para dar ordem, mas eu não posso crer que Y. Ex.ª seja tão
ignorante que assinasse ordem para ser executada pelo mmandante de Zeguichor que embora feita a uma nação pequena, porem que e independente, o dito
official de sorte informa mal a V. Ex.ª sobre a po · ~e du· portugueses no rio e no terreno de ssinhame e Jagubel;
para abreYiar toda a questões remetto a Y. Ex.'1 copias antenticas dos tratados que existem
entre nós e os gentios. Porém como é de rnppôr que o official fra ncti~ em ejo. pela sua crassa ignorancia, não entenda o direito das Gentes e que 11
·eira fazer um insulto á nossa bandei ra naquellas paragens, i nsulto~ · 'evi o...., á nossa fraqueza, desde já protesto perante V. Ex.ª e perante o
mur:.1 elo mais brutal e mais injusto insullo que se tem feito a ação alguma: e espero que a Republica Francesa conhecerá a razão e a justiça do meu G
'\"erno.
8 de agosto de 1849 Deus Guarde
a Y. Ex.ª
Jru · J:arier Crato.
O Gornrnador do Senegal em datas de 20 e ~ de
setembro accusou ao Governador de Cacheu as copias dos !ralados feitos com o ~ genlios do Jagubel e Assinhame e a reclamação contra o commandante militar de Sedhiou (Sejo).
Não considerou taes tratados como documento -.1ne g-aranti ·em os direitos de Portu gal naquelles pontos de C asaman~a; increpou o commandante militar de Zegu ichor que quis prender e maltratar o palrãí' Ia embarcação francesa, que eslava coberto pela bandeira d'esta nação: e admirou- e do governador Crato accusar tão violentamente o official commandante
de Sedhiou que era duma patente superior á sua e provavelmente mais instruido, não só sobre o direi lo das Gentes mas ainda sobre outras cvnsas; protestou contra o íacto de não ter sido permittido o livre commercio em Jagubel) onde sempre o foi, e contra o inqualificavel insulto feit1
ao c.:omm;indante do Casaman a a quem a bandeira francesa não pôde proteger da brutalidade do residente de Zegnichor e ainda contra a conduta do Governador Crato que approvou·lhe os os seuE acto .
Em 20 de novembro de 1844 terminou et;la triste contenda provocaua pelas autoridade france::as que já dominavam a margem direita do Casamansa e procuraHm annular o nosso commercio indispondo o gentio contra nós.
Naquela data o governador omc1on ao do Senegal accusando·ll1e os seus officio de 20 e 28 nos seguintes termos : Pondo de parte tudo quanto v. Ex.ª se abaL\ou a dizer contra mim e contra o commandante íle Zeguichor, tratarei só de respond er ao qne diz respeito ao serviço, deixando a V. Ex.ª a gloria de me ter insultado gratuitamente em correspondencia official. Logo que recebi este officio de V. Ex,ª enviei um expresso ao
commandanle de Zeguichor para me informar sobre a accusação grave que V. Ex.ª fundado, nas informações
que
lhe deu o capitão do navio Casamansa do mesmQ comandante de Zegnicbor, recebi a resposta que incluso p'or copia .
Julgo que V. Ex.ª não dmidarã da honra e lealdade d'aquelle commandante, pois é bem conhecido pelos differentes negociantes franceses que habitam Goré e Senegal, e então conhecerá que o capitão do
Casamansa faltou á verdade nas declarações que fez ao Governo. Vê-se pela sua participação, que mandou o Delegâdo fiscal, acompanhado
de um unico soldado, com ordem de fazer retirar a embarcação que se achava em lagubel; e este empregado encontrou
o patrão Mamadi ter acabado de fazer o seu negocio1 devendo-se retil'ar para Sejo onde era seu destino.
Infallivelmente devia passar por Zeguicbor
e não foi a isso obrigado como elle disse, e foi então nesta ocasião que o commandante de Zeguichor lhe declarou qne então tornasse a ir a Jagubel, sob pena de ser sua embarcaç.ão
tomada. Não o ameaçou; nem o podia ameaçar com
açoites porque e r ca tigo é prohibido entre nós pela Carta Constitucional da Monarchia Portuguesa. São egualmente fal sas as informa ções que
V. Ex.ª teve sobre as embarcações estrangeiras irem sempre negociar ao porto
de Jagubel. Pode Y. ~.ª perguntar a todos os patrões das embarcações
d.o seu Governo, se já entraram naqnelle porto. A cha!upa Casamansa foi a primeira e a unica embarcação que ali entrou. E então que prejuízo poderiam os tratados causar a nel:locio francê ~ ? O tratados feitos com os gentios de Jagubel e As inhame Ii1lr um
patrii tiro e não caprichoso negociante, foram por este
offerecid ~ ao Governo de aa
)1agestade que se dignou acceitá-los em Portaria de 5 d·ago to de 184.5, e P.ortanto os terrenos e direitos ahi declarados
pertencem hoje á Nação Portuguesa e não a um partirular. Creio ter mostrado que a ollensa que V. Ex.ª diz feita á bandeira francesa não existe. O commandante de Zeguichor pede no seu officio que se tire uma informação sobre se~ procedimento; então bem desejava eu que V. Ex.ª se dignasse exigir do
patrão Mamadi uma nota das pessoas qne ouvissem da ·boca do mesmo commandante o ameaço de açoites. Pois á vista da negação do referido commandante não posso dar credito á informação verdadeiramente caprichosa do
patrão Mamadi. Pois que credito pode merecer um patrão, que havendo carregado seu navio em Jagubel, ponto este abaixo de Zeguichor, se queixou de o haverem arrastado até aquelle estabelecimento por onde devia
infallivelmente passar para Sejo ? O commandante de Zegnichor é um bomem sisudo, prudente e honrado, e jamais seria capaz de negar o qne ti'resse dito ou obrado ainda que
fosse contra a Lei e direito das Gentes; nem eu negaria dar uma satisfação se o facto fosse verdade, mas não pos o e nem devo reprehender um empregado honrado, pela
simples declaração de seu patrão, que já conheço que deixou de fallar a
verdade, asseveverando que o levaram á força até Zeguichor quando elle depois de carregado se destinava a .:iejo. Rogo a V. Ex.ª
que
livre de toda a prevenção e a sangue frio me ajnde· a conhecer a verdade, exigindo, como disse, do patrão
Mamadi a nota das pessoas, que assistiram ao ameaço que diz, lhe fez o
comandante de Zeguichor. Permitia-me V. Ex.ª que note uma contradicção entre seus dois officios. No officio de 20 de setembro diz V. Ex.ª
que vae submetter ao Chefe do seu Governo este n~gocio; em seu officio de 28 de rntembro
diz que seu Governo tem mais a fazer do que pensar nos fortins do Sejo, Zeguichor e Cacheu ;. e outro tanto não direi eu do meu Governo que se presta de boa vontade, movido só por justiça, a dar uma satisfa ção ainda mesmo nos obj ectos mais insignificantes. Apesar do que
V. Ex.ª diz, estou certo que o Governo Francf>s, visto a sua lealdade e cavalheirismo, não se negará a
dar aquella satisfação que a justiça exigir. Deixo de responder a tudo
quanto diz respeito ao official francés qne reside no Sejo.
Cacheu, 20 de novembro de 1844.
Deus Guarde a V. Ex.ª
(a) José Xavier Crato.
Subsidios para a História
de Cabo Verde e Guiné, por Christiano José de Senna
Barcellos, parte V, pgs. 168-174, Lisboa, 1911
1849/10/31
Por
portaria régia de 31 d'oulubro 1849 foi encarregado da direcção de todos os trabalhos publicos de Cacheu, Farim e Zeguichor, Honorio Pereira Barreto, quando não fosse,
determinadamente, incumbido ao official engenheiro da Província.
Em 13 de junho de 1850
remetteu Honorio Barreto ao ministro as contas do corte de madeiras em Cacheu; sacou
contra o pagador da marinha o pagamento de 2: 127$927 réis de despesas com aquelle corte.
«Em
tempo de D. Pedro foi creada a companhia
de Cacheu e Cabo Verde; e esta cuidou logo do trafico de escravos, mandando
arrematar no concelho das índias, em Castella, o contrato de escravos na Nova
Hespanha «obrigando-se a introduzir alli
dez «mil toneladas de negros,—reputada a tonelada «em três peças —no decurso de
seis annos e oito «mezes». Eram muitos os favores e privilégios concedidos
a esla companhia; mas os seus vícios de origem, e a natureza das suas
transacções, tornaram a sua influencia funesta para a Guiné.»
ESTUDOS
SOBRE AS PROVÍNCIAS ULTRAMARINAS POR JOÃO DE ANDRADE CORVO Volume I LISBOA POR
ORDEM E NA TYPOGRAPHIA DA ACADEMIA REAL DAS SCIENCIAS 1883, p. 91
☻ A introducção da mancarra nas ilhas de Cabo
Verde é um
beneficio que seus habitantes têem a agradecer ao sr. JOÃO GOMES BARBOSA, da ilha do Fogo, que em 1850 mandou buscar a
Bissau, na Guiné, uns poucos de alqueires, que distribuiu a algumas pessoas, e
semeou nas suas fazendas, recommendando a sua cultura e dando o exemplo,
fazendo ver as vantagens que se poderiam obter; e apesar da repugnancia que
quasi sempre encontram todas as novas culturas, cooseo;
☻ AS FORTALEZAS DE NISSAU, por N. Valdez dos Santos, Mj. Inf.
A primeira fortaleza de Bissau teve,
como origem, um acto de pirataria de três navios franceses cuja tripulação pretendeu construir,
num local da embocadura do rio Geba já então regularmente frequentado por
comerciantes portugueses· um forte que lhes protegesse a feitoria e porto que
ali queriam edificar.
Através de ofertas ao régulo papel da
região, de nome Bacampolco, conseguiram os nossos negociantes que fosse negada
aos estrangeiros a pretendida edificação, sendo aqueles obrigados, pelos
indígenas, a embarcar os materiais de construção que já tinham colocado em terra.
Certamente que este acontecimento foi
comunicado ao Rei de Portugal, porque D. Pedro II se apressou, por intermédio
do governador de Cabo Verde, a enviar ao régulo Bacampolco régios presentes,
que foram agradecidos por uma carta, datada de 4 de Abril de 1687, na qual
também se comunicava que os portugueses poderiam, à vontade, construir no porto de Bissau uma fortaleza.
Ante esta concessão, o primeiro
capitão-mor de Cacheu, António de Barros Bezerra, logo enviou Manuel Teles, com alguns soldados e duas peças, para garantir a
autoridade portuguesa naquele local e iniciar a construção de um posto militar,
que seria o núcleo de uma futura fortaleza.
Para a construção do «forte e outras despesas» foram enviados, de Lisboa,
6.000$000 réls, mas, ao que parece, esta
quantia foi absorvida noutros gastos da Província de Cabo Verde e Guiné.
Em Lisboa, no dia 21 de Dezembro de 1695, publicou-se um decreto
autorizando o Conselho
Ultramarino a encarregar a Companhia de
Cacheu e Cabo Verde, recém formada, da «administração da fábrica da fortaleza de
N.a S.a da Conceicão de Bissau» (CHRISTIANO JOSE
DE SENNA BARCELOS, Subsidlos paras história de Cabo Verde e Guiné. II. p. 114.).
Meses depois, a 7 de Março de 1696, o Rei confirmou
este decreto e, a 17 do mesmomês, o Conde de Alvor, como presidente do Conselho
Ultramarino, e Gaspar de Andrade,como
administrador-geral da Companhia, assinaram (ibid.p. 123. ). o respectivo
contrato paraa construção da fortaleza.
Jâ, em 23 de
Fevereiro de 1696, o engenheiro das
fortificacões do Alentejo. João Coutinho, com a função de Capitão de
Engenharia de Cabo Verde e Guiné, ganhando25$000 réis por mês, tinha sido nomeado para dirigir a
construção de um forte em Bissau.Após uma curta paragem pela ilha de
Santiago, este engenheiro chegou ao seudestino, onde, Imediatamente, traçou um
grandioso projecto para a fortaleza que pretendiaconstruir.
Este plano não mereceu a aprovação do Capitão José
Pinheiro e do Bispo D.Vitoriano que
pretendiam - certamente guiados pela experiência e conhecimento daGuiné - uma
fortificação multo mais simples e modesta.
Em 26 de Agosto
desse ano, uns escassos dois meses após a sua chegada, morreuo engenheiro João
Coutinho e, ao que parece, com uma certa satisfacão do CapitãoJosé
Pinheiro, pois este, num dos seus
escritos, comentou que aquela morte «tinhasido uma providência, porque João
Coutinho daria cabo de todos os cabedals, por querermeia Bissau por fortaleza.
O Capitão José Pinheiro desenhou, então, o projecto de
um forte que se limitava a umsimples quadrado abaluartado, rodeado de uma cava.
Conforme Lopes de Lima(Ensaios sobre aestatístlca das Possessóes
Portuguezas, Livro I. Parte II, p. 104),
«desde 1690 a Companhia de Cacheu e Cabo Verde começou a fazer muito caso do
porto de Bissau aonde em 1696 por mandado d'El·Reí D. Pedro IIse estabelleceu
uma Feitoria Portugueza fortificada, e nesse mesmo tempo allí foi, levado pelo
seu zelo apostolíco, o venerando Bispo D. Fr. Victoriano do Porto, o qual fez
construir de pedra a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Candelarila e o Hospicio
dos Capuchos, de que já há muito nem vestígios existem».
No dia 16 de Outubro de 1696, com arande solenidade e na presença do bispo D.
Vitoriano da Costa, lançou-se a primeira
pedra da futura fortaleza que, como a pequenina capela construída por Fr. José de Beque, ficava sob a proiecçao de
N.a S.a da Conceição.Trabalhou-se, naquelas obras, com o mesmo afinco e
titânico esforço que levou os portugueses de 1500 a espalharem pelo mundo os
marcos lndestrutlvels da sua presença - as Fortalezas de Portugal. Assim, dos
terrenos lateriticos das proximidades de Bissau.
Ao fim de
suatro meses. as obras indispensáveis da fortaleza estavam prontas e, meioano depois do lançamento da primeira pedra - em Março
de 1697 - El-Rei D. Pedro lI foiInformado pelo Capitão JOSÉ PINHEIRO DA CÂMARAque «a fortaleza era Importante
paraaquella terra, com os seus 140 pés de cada comprimento; que faz em
redondeza 560 pés,com 4 baluartes com suas pontas de diamante, dois para a
banda do mar e dois para aterra; cada um deles pode levar 8 peças de artilharia,
fora uma cortina para o mar entre osdois baluartes, que pode levar 12 peças».
Numa carta escrita
um mês depois, a 17 de Abril, José
Pinheiro dava a seguinte einteressante
noticia (SENNA BARCELOS.Subsidios
para a hlstôrla de Cabo Verde e Gulnê. U. p. 135.); "···
a fortaleza de Sua Magestade fica em bom terreno, porque estas águas ficam já
da banda de dentro, que lhe ffirmo a V. S.a que em Africa não tem Sua Magestade
outro como ella porque todas teem falta d'agua e se valem de cisternas; e vendo
eu que este gentio não tinha com que nos fazer mal que em tolher-nos a agua, me
resolvi abrir um poço muito largo, que quiz a minha fortuna que com quatro
braças e meia achei agua com abundancia e a melhor que tem hoje Bissau para
beber, Isto dentro da fortaleza, que os mesmos gentios, vendo que abri agua, me
pozeram de feiticeiro e ficaram com grande magoa.»
Muitos anos mais
tarde, quase meio século depois, em
ofício de 12 de Março de 1752, FRANCISCO ROQUE DE SOTTO MAYOR, capitão-mor de
Cacheu, referiu-se a esta fortificação do seguinte modo: «Era a dila
fortaleza eregida em hú pequeno tezo junto ao principal porto d'aquella ilha,
regularmente feita, e nella montadas 18 ou 20 pessas de artilharia; seguia-se a
fortificação de marinha, com sete ou outo baluartes, e em cada hü 4 ou 5 pessas
(BEANARDINO ANTÓNIO ÂLVARES OE ANDRADE.
Planta da Praça de Bissau e suas adjacentes, p. 73.)
Voltando à
construção da fortaleza, as obras arrastaram-se por mais alguns anos,
possivelmente em acabamentos e construções Internas para habitação das
guarnições, além dos melhoramentos que a prática aconselharia.
Ao fim de
suatro meses, as obras indispensáveis da fortaleza estavam prontas e, meio ano depois do lançamenlo da primeira pedra - em Março
de 1697 - EI-Rei O. Pedro II foi Informado pelo Capitão JOSÉ PINHEIRO DA CÂMARA que «a fortaleza era Importante
para aquella terra, com os seus 140 pés de cada comprimento; que faz em
redondeza 560 pés, com 4 baluartes com suas pontas de diamante, dois para a
banda do mar e dois para a terra; cada um deles pode levar 8 peças de
artilharia, fora uma cortina para o mar entre os dois baluartes, que pode levar
12 peças».
Em Dezembro de 1697, dois patachos ingleses fundearam
nas águas lodosas do Geba e pretenderam desembarcar vários produtos para transacções
comerciais. O Capitão José Pinheiro
não consentiu e intimou-os a abandonarem o porto, o que foi cumprido.
No entanto,
este acto legítimo do Comandante da Praça de Bissau levou à primeira revolta dos
indígenas da região, que, sob a chefla de um novo régulo, chamado lncinhate,
cercaram a povoação, impedindo o reabastecimento de viveres.
O Capitão José
Pinheiro viu-se na necessidade de pedir
socorro aos moradores dasargens do Geba
e ao capitão-mor de Cacheu VIDIGA! CASTANHO, que, prontamente,acorreu a
Bissau com 92 soldados transportados em três lanchas.
Contactado o
régulo rebelde, segundo o relatório de Vldlgal Castanho, datado de 21 de Março
de 1698, este provou a sua amizade a Portugal e o seu consentimento para a permanência do forte. No entanto. queria,
em troca. a substituição do Capitão-mor JOSÉ PINHEIRO DA CÂMARA e que lhe fosse pago o terreno onde se
construíra a fortaleza, além de lhe ser
garantido o livre comércio com a navegação estrangeira.
É de salientar a
informação do Capitão Vidigal Castanho,
referindo que «a fortaleza é de pequena capacidade, feita de pedra e terra;
dizem os que entendem que promete pouca defesa».
Ainda nesse
relatório, Vidigal Castanho
Informava o Rei de Portugal que a
maioria dos soldados da guarnição de Bissau linha desertado, pelo que
deviam ser substituídos com urgencia.
De acordo com o
orçamento económico referente ao ano de 1696-1697, a guarnição da Praça de Bissau seria constituída pelo
Capitão-mor, um alferes ou tenente, um ajudante,um sargento, três cabos
de esquadra, quarenta soldados, um tambor, um condestável e dois artilheiros,
além de vários Indivíduos civis com funções burocráticas.
Em Janeiro de
1698, sendo presentes., além do Capltão-mor
JOSÉ PINHEIRO e do capitão-tenente JOÃO DE ALMEIDA COIMBRA, os escrivães
FRANCISCO LOURENÇO e JOSÉ CORREIA DE SÁ e o régulo lncinhate, seus acólitos e intérprete, foi lavrado, no
Livro de Registo daAlfândega de Bissau, o auto da compra do terreno onde
fora construída a fortaleza, adquorodo pela Importância de 300 barafulas, ou
seja. 60$000 réis.
Precisamente um mês depois desta cerimónia, um novo
episódio, relacionado com o comércio livre, provocou outra rebelião dos
indígenas.
O comandante de
uma nau holandesa, armada com 26 peças, sob o pretexto de comerciar com os nativos
da região mas com a finalidade de formar, em território sob a nossa soberania,
uma feitoria, fundeou nas águas do Geba. O comandante da fortaleza intimou o
navio estrangeiro a levantar ferro e, como não fosse obedecido, atacou-o a tiro
de canhão, obrigando-o a retirar-se.
No dia seguinte a fortaleza estava cercada e um
emissário dos rebeldes Informou o Capitão-mor que «se continuasse na sua
teimosia (o régulo), derrubaria as muralhas, cortando a cabeça aos moradores».
A paz só se conseguiu através de várias concessões,
entre as quais a autorização de livre comércio e a substituição do Capltão-mor
JOSÉ PINHEIRO DA CÃMARA pelo Capitão RODRIGUES DE OLIVEIRA FONSECA.
O régulo
lncinhate, logo que viu satisfeitas as suas pretensões, escreveu a EI-Rei, em23
de Maio de 1698, agradecendo e pedindo novas concessões, que, em parte,
foramatendidas.
Ao Iniciar-se o
século XVIII, o Capltão-mor OLIVEIRA
FONSECAteve um conflito com o gerente de uma firma francesa, estabelecida em
Bissau.Esta desavença foi logo exploradapelos franceses, que, alegando
razões sem fundamento, pretenderam construir nasmargens do Geba uma feitoria e
um forte com vistas a aniquilarem o comércio e poderioportuguês em Bissau.
Assim, em 13 de Março de 1700, surgiu no porto de
Bissau um navio de guerra francês, o Anna, ameaçando o seu comandante
que desembarcaria 200 homens para garantir a manutenção dos direitos da firma
da sua nacionalidade e salvaguarda dos seus concidadãos.
A semelhante
arbitrariedade retorquiuOliveira Fonseca que impediria qualquerdesembarque e,
acto continuo, mandou que os canhões da fortaleza fossem assestadossobre o
navio estrangeiro. Como um dos princípios da guerra naval daquela êpoca era quepoderia bastar um só tiro de uma fortaleza
para afundar um navioenquanto que nem cemtiros de um barco destruiriam
uma fortificação, o comandante francês, ante a ameaça doscanhões portugueses,
mudou de ideias. Assim, vendo que não poderia demover o CapitãoOliveira
Fonseca, procurou aliciar os indigenas para que atacassem a fortaleza.
Não contou, porém,
com a lealdade do régulo lncinhate, que, categoricamente, serecusou a trair a
confiança que o Rei de Portugal depunha nele e nos seus súbditos.
Foi este o último
episódio da fortaleza de N.aS.ada Conceição de Bissau.
Em 1707, o Capitão-mor de Cacheu, PAULO GOMES DE ABREU
E LIMA, num relatóriosobre a Guiné
e que hoje nos parece um tanto ou quanto mcompreensível. Afirmava queBissau
era «terra muito ambicionada pelos franceses, que nessa ocasião empregavam
osmaiores esforços para ali levantarem uma fortaleza e se tal conseguissem
tornar-se-lamsenhores de toda a Guiné».No
entanto. apesar destas sensatas afirmações. acabava por preconizar que a fortaleza de Bissau fosse
arrasada.
D. João V,
embebido com o sonho· das minas preciosas do Brasil, pura esimplesmente, em 5 de Dezembro de 1707, mandou demolir a
fortaleza de N.aS.a da Conceição de Bissau, o que se realizou em 1708.
O Capitão-mor de
Cacheu, FRANCISCO DE SOTTO-MAYOR,
mais tarde, em 1752 (Ofício de 12 de Março. Vide ÁLVARES DE ANDRADE op. cil. p. 74.),explicava a
decisão de D. João V da seguinte maneira:
«A causa de demolirce foram certas dífferenças que
SANTOS VIDIGAL CASTANHO teve com o capitâo-mor da dita ilha RODRIGO DE OLIVEIRA
DA FONSECA, sobre materia de mais ou
menos interesses nos seus negócios».
Em breves dias foi
demolida a fortaleza de N.aS,a da Conceição de Bissau, que representava não só
20 anos de soberania como também o sacrifício de muitas vidas deportugueses. A
sua artilharia foi enviada para Cacheu, ficando abandonadas 6 peças quese
consideraram Incapazes (Oficio de
12 de Março'. Vide ÁLVARES OE ANDRADE op. cit . p. 74.).
Assim, desapareceu
a primeira fortaleza de Bissau, com grande descontentamento detodos os
residentes da região, incluindo os próprios indígenas.Estes, através do seu
régulo, recusaram sempre aos franceses as necessáriasautorizações para
construirem, nas margens do Geba, uma feitoria e forte, alegando que«haviam
dado aquele terreno ao Rei de Portugal e que não faltariam à sua palavra».
Apesar da insistência
francesa e da lealdade dos papéis, os membros do Conselho Ultramarino, falando
em nome do Rei, afirmavam em 1718, perante um pedido para a construçao de uma
nova fortaleza, que: «Portugal não tinha meios para conservar e sustentar o
presídio, e também pela inconstância dos negros e reis de Bissau, motivos por
que linha EI-Rei mandado demoli-lo.»Em
1723, só devido ao naufrágio de um navio que transportava os materiais de
construção, é que a França não viu realizadas as suas aspirações de ter a sua bandeira a flutuar aos ventos de Bissau, onde
pretendia construir um forte à vivaforça,
se necessário fosse.Talvez essa a razão de o Conselho Ultramarino, pouco tempo depois, ter emitido o parecer de«mandar-se
reedifícar em Bissau a fortaleza que nella houve», mas o Procurador da Fazenda contrariou a ideia,
alegando «não saberqual seja a utilidade que possamos tirar desta Ilha• (ct.
ALVARES DE ANDRADE. ob. clr., p. 11.). Emais uma vez foi posta de
parte a construção de uma nova fortificação.
No mês de Abril de
1739 dois navios franceses fundearam nas águas do Geba e asua tripulação
procurou, por todos os meios, captar as boas graças dos nativos parapoderem
construir a tão almejada feitoria e forte.No entanto, não foram felizes e, antes de se fazerem ao mar, ameaçaram
que voltariam no ano seguinte e então, com a força dos seus canhões e das armas
dosseus soldados, a bem ou a mal, construiriam uma fortaleza.
Numa carta escrita
ao Capitâo-mor de Cacheu, e que posteriormente chegou ao conhecimento de D.
João V, o régulo de Bissau declarava que «enquanto ele fosse vivo,jamais a
França teria um forte nas suas terras». Mas também, ao que parece, enquanto
D.João V existisse não haveria em Bissau qualquer fortaleza de Portugal.
Após a morte do
régulo lncinhate, em 18 de Setembro de 1746, os franceses foram,autorizados,
pelos nativos, a construir, no ilhéu do Reí. uma feitoria fortificada,mas,apesar
disso, EI-Rei D. João V manteve a sua vontade, baseado no parecer do
Procuradorda Fazenda, de que «não se devia levantar de novo a fortaleza»e
apoiado na informação doConselho Ultramarino de que, para a sua construção,
seria preciso mandar umengenheiro com patente de capltão-mor e promessa de que
findos os trabalhos se lhedaria o governo de Cabo Verde, o que levava a excluir
a ideia de uma nova fortaleza emBissau.
Após a morte de D. João V, o seu sucessor, D. José I, certamentecomo consequêncla do oficio de 12 de Março de 1752 do
Capitão-mor FRANCISCO ROQUE SOTTOMAYORmandou, em Janeiro de 1753, uma pequena esauadra de quatronavios N.aS.adaGula
e Santo António, Santa Margarida e Ventura de Amigo sob pavilhão do Capitão
demar e guerra Guilherme Kinray, embarcado na nau de guerra Nossa Senhora da
Estrela,com a missão de se construir em Bissau uma fortaleza (Ct. ALVARES de ANDRADE, ob. cit.p,
77.).
Esta seria
planeada pelo Capitão-engenheiro
FRANCISCO XAVIER PAIS DE MENEZES,tendo-lhe sido Indicado pelo Ministro da
Marinha e Ultramar que: «verá V. Mercê a dita Ilha,tirará um plano della e fará
o desenho da fortificação que n'ella se pode fazer, comdefensa, e sem muitas
obras exteriores, e só assim aquellas precisas e necessárias para opoder pôr em
execução quando o dito capitam-mor lhe disser que se pode executar».
Quando o régulo
lncinhate mostrava o rmaior Interesse pela presença portuguesa noseu chão, o
Rei D. João V opunha-se a essa ideia. Apôs a morte destes dois personagens,os
papéis inverteram-se: o novo Rei de Portugal queria mandar edificar uma
fortaleza emBissau e o novo Régulo papel de nome Palanca não queria, ou,pelo menos. não semostrava
Interessado.
Embora contra a má
vontade dos indígenas, em 17 de Fevereiro de 1753, .o réguloPalanca acabou por
assinar "um auto de fidelidade a Portugal e de consentimento daconstrução
de uma fortaleza”, cuja primeira pedra foi lançada, com grande solenidade,nesse
mesmo dia.
Durante cerca de
dois meses, muitas centenas de homens trabalharam afincadamentena construção da
nova fortificação, lutando contra o mau clima da região e contra asconstantes intrigas
com os nativos e, ao gue consta, nessas escaramuças morreram 9europeus
e, vitimas do clima, cerca de 500 Indígenas e operários.
A22 de Março de 1753 as principais
e indispensáveis obras de defesa estavam prontas, mas, oito anos depois, ainda
se trabalhava na construção da fortaleza,desaparecendo, durante este espaço de
tempo, as «pyramides com as armas reaes»enviadas de Lisboa a bordo da nau
«Nossa Senhora da Estrela» e que tinham sidodesembarcadas em Bissau.
Talvez que a
lentidão destes lrabalhos fosse motivada pela grande mortandadedos obreiros,
vitimados pelo escorbuto, paludismo e febre-amarela - a que chamavamo «Vómito
negro». As mortes chegaram a ultrapassar
as dezenas por dia e, entre elas, contou-se a do Capilão-engenheiro Pais de
Menezes, que planeou e deu Inicio à fortificação.
Em 16 de Novembro
de 1753 foi atrlbuída a primeira guarnição à fortaleza, que ficousob o comando
do Capltão-mor NICOLAU PINHEIRO DE
ARAÚJOsubordinado à capitania-mor de Cacheu. O armamento atribuido nessa
ocasião foi de 34 peças de artilharia – conformeSolto Mayor tinha solicitado em
1752 - que foram expedidas de Lisboa em Dezembro de1753. No entanto, em 22
de Março de 1776, o tenente ANTÓNIO ALYARES DE ANDRADE aosolicitar os «reparos para a
artilharia que se acha descavalgada na dita praca de Bissau»faz pressupor que
as peças existentes eram as seguintes: 12 de calibre 18, 12 de calibre12, 12 de
calibre 6 (todas de ferro) e 6 peças colombrinas de bronze, das quais 3 de
calibre3 e as outras de calibre 6 (Ct.
ÁLVARES DE ANDRADE. ob. Clt., pp.
79 e 125).
Em Janeiro de 1754
a guarnição de Bissau recebeu uma leva de 50 soldados degredados de Cabo
Verde, mas, passados quatro anos, estes estavam reduzidos a
20 – a maioria ttnha morrido e os
outros desertaram.
Nessa ocasião, as
obras concluídas em 1753 já ameaçavam ruína. Na falta de umtécnico responsável
não só pela reconstrução como também pela
conclusão da fortaleza,foi nomeado FREI MANUEL VINHAIS SARMENTO, que se
limitou a mandar lazer algumas obras,provisórias e imperfeitas (CRISTIANO BARCELOS, III. ob. cit. P. 28, indica que “Frei Manuel V. Sarmento deu começo à
reconstrução da fortaleza segundo um plano seu”).Em 19 de Julho de 1755, o
ConselhoUltramarino, baseando-se numa carta do Capitão-mor de Bissau, NICOLAU DE PINA ARAÚJO,pronunciou-se que
«para povoar e fortalecer aquela Ilha, era necessario hum engenheiro para
delinear a fortificação e com elle olficiaes para executarem e gente para a
guarnição».
Com a data de 15
de Junho de 1757, Frei Manuel Vinhais Sarmento escreveu(Transcrito no Boletim Cultural da Guiné Portuguesa. VI (1951) 979)a seguinte carta:"q. está isto em
hü total dezamparo: as artelharias q. he a que só existe nestapraça estão
arruinadas, mas não encravadas. som.te depois da morte do deflunto temos negros
com gr.de ouzadia desmontado quasi todas quebrando carretas. e tlrandolheas
ferrages chamando lhe suas, o que tinhão principiado antes que morresse o cap.m
móroutras estavam em terra desde q. sahirão p' terra”.
A 13 de Maio de
1758, o Capltão-mor de Cacheu (Cf.
ÁLVARES DE ANDRADE. ob. clt .. p.
82.)indicava para a corte de
Lissboa que a direcção das obras da fortaleza devia ser entregue aoCapitão Anastácio Domlngos Pontes, pois
era «sujeito em quem concorre o predicado deter bastante noticia da sciencia de
fortificação e ser pratico d' estes países».
A situação da
Fortaleza, caminhando rapidamente para uma ruína total, foi exposta aoRei D.
José I, tendo, em 6 de Agosto de 1765, os moradores de Bissau solicitado a
autorização para construírem uma nova fortifiicação a erigir «na ilha de Bissau
ou no ilhéo que fica defronte».
E tão confiantes
estavam na anuência realque encarregaram o Capitão·mor da ilha do Fogo,MANUEL GERMANO DA MATA- que se dizia
engenheiro - de a planear, o que este fez,mas «tão irregularque, examinada por
pessoas práticas do paiz,que foram sobre ella ouvidas, se assentou que não se
devia mandar executar» ibid . p . 83.).
D. José I tomou
medidas imediatas para que se abandonassem as obras em curso e,por sua
resolução de 12 de Agosto de 1765, foi determinado que se construisse uma
novafortaleza em Bissau.
Para isso, em fins
desse ano, chegou aoporto de Santiago a corvetaNossa Senhorada Esperançacom ordem de arrebanhar, por todo o Cabo
Verde e Guiné, os vadios e condenados por crimes
comuns e levá-los para Bissau. Aqui,
em regime de liberdade,trabalhariam nas obras da nova fortificação, recebendo
um salário diário de 180 réis, alémda comida e uma ração de aguardente,na
altura considerada essencial e indispensável naluta contra as febres palustres.
Muitos anos mais tarde, em 13 de Abril de 1790, JoãoGomes Pereira apresentou ao
Conselho Ultramarino a seguinte informação (cf.
ALVARES DE ANDRADE, ob. Cit.p. 147.): «... (que) em 11 de Dezembro do dito ano
(1765) remeti para Bissau na fragata NossaSenhora da Penha de França, e nas embarcações da Companhia que a
acompanhavão com 720 criminosos com as suas espadas largas e zapaias multo
luzentes.» Outros escritores reterem que o efectivo era formado por 270 vadios e criminosos, juntamente com 450
soldados retirados das 30 companhias que então existiam pela Província,
além de 1 cirurgião, 25 cabos, 10pedreiros e 20 carpinteiros, sem contar o chefe da construção e o seu adjunto,
respectivamente JOÃO DA COSTA ATAIDE TEIVE e Tenente degranadeiros BERNARDINO
ÁLVARES DE ALMADA.
Este pessoal teria
desembarcado em Bissau no dia 26 de Dezembro, tendo sidotransportado numa esquadra de cinco navios, sob o comando
de Frei Luis Caetano de Castro com o cargo de capitão de mar e guerra,
constituída pela fragata Nossa Senhora daPenha de França; nau Nossa Senhora do
Cabo; galera São Sebastião, corveta NossaSenhora das Necessidades e a escuna
(ou corveta) Nossa Senhora da Esperança, além de um bergantim (Ct. ALVARES DE ANDRADE. ob. Clt .. p, 87.).
Com a ajuda de um
milhar de indígenas, o entãosarqento-mor
MANUEL GERMANO DA MATA, a 30 de Dezembro de 1765, deu «principio a cortar
as árvores e mato e a limpar oplano para se lançarem as primeiras
linhas»(lbld •. p. 97.) de uma fortaleza de que ele era oautor do
projecto.
Pouco tempo
depois, a Companhia do Grão-Pará - entidade concessionária daexploração da
Província de Cabo Verde e Guiné e cujas despesas da construção da fortaleza
corriam a seu risco - expressou por escrito o seu contentamento pelo
«bomsucesso do principio da fundação da fortaleza», levantada junto às margens
lodosas doGeba, «a cousa de 100 passos das suas águas».
Em 11 de Abril de
1766, GERMANO DA MATA teria pretendido
modificar o traçado,avisando a Companhia do Grão-Pará da «mudança que
fez na planta do risco que dafortaleza
levou desta corte». Imediatamente os Directores daquela Companhiaescreveram-lhe,
não concordando com essa alteração, pois «verdade he q. o discursonatural
nos quer persuadir q. um quadrado não pôde defender bem os lados sem
quatroBaluartes nos anglos; os dous Baluartes q. estão á frente do mar bem
defendem essaparte; porem o baluarte, q. está só no meio do lado na frente do
gentio, de q.m devemosrecear continuos assaltos, não duvidamos possão defender
os dous flancos lateraes: porem sempre nos parece q. os lados lateraes a esses
flancos ficam com fraqueza se porahl forem atacados».
Calcula-se que a
primeira fase das obras de construção tivesse importado em 50contos de réls,
mas em vidas humanas, o custo foi elevadíssimo. Mais de 1000 operárlos
eobreiros - incluindo o clrurgião, o botlcárlo, capatazes etc - ficaram para
sempresepultados no cemitério que existia perto da fortaleza Devido a essa
mortandade -atribuída ao paludismo e ao • vómito negro» -e ainda ao lacto de a
Companhia do Grão-Para,que pagava os salários e custeava as despesas, ter
esgotado os seus recursos, asobras diminuiram conslderavelmente de ritmo,
aumentando, em contrapartida, a
indisciplina de operérlos e tropa, a ponto do ter que desembarcar uma torça de
marinha, sob o comando do Capitão-Tenente JOÃO DA COSTA ALAÍDE TELVE, para
«disciplinar a tropa e organizar a gente de trabalho»(Cf. ÁLVARES DE
ANDRADE,ob. clt. p. 94).
Segundo o tenente-coronel GERMANO DA MATA, quatro
meses após o início dostrabalhos já se levantavam «oquadrado fortificado com 67
bracas de lado e 4 baluartes,que foram designados pelos nomes de Bandeira,
Poana, Onça e Balança.
Com a retirada de ATAÍDE TEIVE, o autor do projecto,
GERMANO DA MATAassumiu a direccão da obra, sendo ajudado pelo Capitão-mor de
CacheuSEBASTIÃO DA CUNHA SOTTO MAYORvisto que o tenente de granadeiros ÁLVARES
DE ANDRADE fora chefiar a botica.
Alémdisso, ajudava também nas obras o Capitão-cabo
da Praça de Ziguinchor, CARLOS DE CARVALHO ALVARENGA.
Em Agosto de 1766,
Germano da Mata comunicou para Lisboa que tinha prontas a serinauguradas as
principais obras defensivas e, meses depois, a 17 de Fevereiro do anoseguinte,
informou que «a obra da fortaleza se yay continyando na abertura do fosso».
Ao que parece, a
abertura deste fosso deu origem a grandes problemas,porquanto, mais tarde, numa
reclamação apresentada pelo Capitão de engenheirosCarlos Andrels, afirmava-se o
segulnte(cf. Á'LVARES DE ANDRADE. ob. clt., p. 106.):
« ... que por baxo
de dois e tres dedos: de terra se encontra huma pisarra e roxa,que seria
percizo, par fazer só o foço determinado, de sessenta palmos de largo e
duasbraços e meia de fundo, ao menos dous annos atendendo que no tempo das
agoas senão pode trabalhar.•
Mas, precisamente
um ano após a informação de Germano da Mata, em 14 deFevereiro de 1768, o Capitão de mar e guerra JOÃO DA SILVA
indicava que «os baluartesdonde se acha a artilharia montada tem dezabado multa
parte dellas com as agoaspassadas, e como se não repararão, na occaslão
presente pode facilmente dlsmontara artilharia, caindo por terra, pois os ditos
baluartes não tem resistencia á calamidade do tempo».
No entanto,
Germano da Mata continuava a mandar para Lisboa optimistasinformações sobre o
andamento dos trabalhos, referindo-se à conclusão da «casa dogoverno a padrasto
sobre a porta de armas, os quartéis dos oficiaes e da guarnição,as instalações
hospitalares», além de uma pequena capela que passava a ter comoorago S. José.
A consulta dos
documentos da época mostra-nos, porém, uma situação muito diferente
daquela descrita por Germano da Mata.
Este, ao que
parece, era um individuo sem qualquer capacidade de trabalho,incompetente e
quezilento - a ponto de um marinheiro euro, peu lhe ter dado com umapicareta
na cabeça, que o ia matando, e,de outra vez, ter sido agredido pelosoperários. No entanto, alardeava
profundos conhecimentos e prática, atributos essesde que era destituído.
O seu Imediato,
capitão com exercicl:o de engenheiro ANTÓNIO
CARLOS ANDREIS,era, de facto,multo competente mas, em contrapartida, um
alcoolico crónico, deespírito tempestuoso.
Entre Germano da
Mata e Carlos Andreis havia uma rivalidade enorme e, sóquando era de todo
impossfvel, o que um fazia o outro não desfazia ou dizia mal.
Esta situação
ter-se-la mantido ao longo de alguns anos, até que Germano da Mata,em 1769, foi
obrigado a ir a Lisboa justlflcar-se dos seus trabalhos, tendo
conseguido,graças a um enorme favoritismo e protecção, juntamente com a Imensa
propaganda quefazia de si próprio, obter uma alta recompensa pelos seus
trabalhos na edificação dafortaleza de São José de Bissau.
Como consequência, o Capitão Carlos Andreis obteve,
por decreto de 6 de Novembro de 1766, o desterro para a Ilha de Santiago, donde
saiu trinta anos depois,sendo
restituídoà liberdade, ao seu soldo e às honras do seu posto por despacho régio
de 27 de Outubrode 1799, isto é, quando já estava às portas da morte.
Assim laureou-se
um incompetente e desprezou-se um técnico de certo valor, numaaltura em que a
Guiné tanto precisava de homens válidos. O
Governador Sotto Mayor, num oficio datado de 3 de Junho de 1769, dirigido ao
Ministro da Marinha e Ultramar critica abertamente a acção de Germano da Mata,referindo
que a fortaleza «se achava irregularno que respeita aos terraplenos dos
baluartes e cortinas, porque achando-se os ditosdoies baluartes fronteyros à
campanha em altura tão proporcionada, que ficam os tiros daspessas de
artilharia orizontaes à campanha, e em algumas partes ainda ficão mais baixos
do que a mesma campanha ... e n’esta forma se achão os ditos doies baluartes do
mar comos de campanha, é trez cortinas a ellas contíguas, que qualquer
embarcação do meyo doporto as domina, como lambem os ditos baluartes»,
concluindo por responsabilizar o autordo
projecto e director das obras de edificação«deste tão arande descuido
achar-se agoraesta fortaleza
por todos os lados arruinada. dezabando por húa e outra parte»(cf. BERNARDINO ÁLVARES DE ANDRADE. Planta da Praça de Bi:ss.au e Suas Adjacentes. Pp. 107 e seguintes.).
Aliás a planta da
fortaleza de Bissau também não foi multo do agrado do Marquês dePombal, que,
entre várias coisas, estranhou a falta de canhoneiras, pois Germano da
Mataentendera ser «mais fácil laborar com artilharia por cima dos parapeitos
para todas aspartes».
O primeiro
documento que alude à conclusão da fortaleza de São José de Bissau édatado de
30 de Novembro de 1773. No entanto, jáem
10 de Maio do mesmo ano a Junta de Administração da Companhia Geral de
Grão-·Pará e Maranhão tinha providenciado para o despedimento dos operários e
demais obreiros, além de ter proposto a respectiva guarnição. Esta foi
nomeada por decreto real de 28 de Novembro de 1774, que era doseguinte teor:
«Relação dos officiaes que Sua Magestade he
servido nomear para guarnição da Praça de Bíssao.
Para sargento mor
da dita Praça o capitão della LUIZ DA
SILVA CARDOZO.
Para ajudante da
mesma, o cadette do regimento de SETUVAL
ANTONIO DE BRAUN.
Para capitão da
Primeira Companhia de Infantaria da guarnição da dita Praça ocadete do regimento de SETUVAL JOSÉ LUIZ DE
BRAUN.
Para tenente da
mesma companhia BERNARDINO ANTONIO
ALVARES DA ANDRADE.
Para alferes da
mesma o sargento JOSÉ JOAQUIM PEREIRA.
Para capitão da
segunda companhia de infantaria da guarnição da dita Praça LUIZ DA VEIGA BARROS.
Para tenente da
dita companhia DOMINGOS DA VEIGA.»
Assim nasceu a fortaleza
de São José de Bissau, cujo custo de construção atingiu omontante de 147690$763
réis. No entanto, para que se mantivesse de pé durante os seusdois séculos de
uma história mais ou menos agitada,foi necessário,quase de 50 em 50anos, reconstrui-la de novo.
A guarnição da
fortaleza era da ordem dos 250 homens, dlstrlbuldos por duascompanhias de
Infantaria e uma de Artilharia a 80 homens cada. No entanto, os efectivos andavam à volta de 200 homens,
sendo estes, na maioria, desterrados ou mesmo criminosos, e, no dizer de Lopes
de Lima(Ensaio sobre a statistica das Possessões Portuguezas, livro I. cap. VI, p. 126), «mal vestidos, mal nutridos, mal
disciplinados, enervados pelo vicio, e pelas doenças lnseparavels delle, que
alli ha longos annos vegetam languidamente, antes para envergonhar, que para
defender a Bandeira Portugueza».
Antes de embarcar
para a Guiné, a 22 de Março de 1776, o Tenente
ALVARES DE ANDRADEdeu ao Conselho Ultramarino um parecer sobre a situação
da fortaleza de Bissau(ÁLVARES DE ANDRADE.
ob. cit.. pp. 79 e 125), ao qual lhe juntou uma
«Relação de que he maisnecessario para a praça de S. José de Bissau pello que
pertence á artilharia e muniçõespara a infantarian».
Desta relação
constava que eram necessárias as seguintes peças de artilharia erespectivos
«prettences»:
«16 Pessas de
artelharia, de 24 ou 36, comlombrlnas
8 ditas de dezoito
do mesmo gênero
16 ditas de nove
4 Pessas píquenas
para sahirem ao campo. Bailas de 3. 6. 9. 12. 18. 24 ou 36
Dítlas meudas para
ce empinharem»
De um relatório de
Dezembro de 1777constava que «… estava completamenteacabada ... porém os
reparos estão arruinados». No ano seguinte, em 2 de Novembro, oCapltão-mor de Cacheu, ANTÓNIO VAZ DE
ARAUJO, escrevia que «a fortaleza de Bissau he de pedra e cal, tem quatro baluartes, toda mal fabricada, e de pouca
duração, e só hum pedaço que fez o engenheiro
ANTÓNIO FÉLIX DE AMARALestá bom; o mais é qualquer parede»...São raras as descrições sobre a velha fortaleza de São
José de Bissau onde nãoconstem alusões que a mesma está em ruínas, e são vários
os relatórios que aludem aimportantes obras de restauro e sem os quais as suas
muralhas e outras edificações terse-lam desmoronado.
A vida da fortaleza, quase se pode dlzer que até aos
nossos dias, decorreu entre amotinações da sua guarnição e obras de restauro. A primeira
insubordinação deu-se em 1783, tendo o Comandante da Praça Capitão JOSÉ ANTÓNIO
PINTO fugido para algures do Geba, conseguindo assim salvar a vida.
O seus ubstituto
foi o Capitão JOÃO DAS NEVES LEÃO,
que tomou posse em 1799, mas pouco tempo depois abandonava aquele cargo, seguindo-se-lhe o Capitão ANTÓNIO CARDOSO
FARIA que em 1803 foi envenenado pela soldadesca. Em prlnclplos de 1805 foi
nomeado para comandante da capitania de Bissau e da Praça MANUEL PINTO GOUVEIA,que
trouxe uma nova guarnição, constituída por 150 criminosos retirados da cadeia
do Llmoeiro, em Lisboa, e 80 vadios
e condenados por crimes comuns trazidos de Cabo Verde os quais, conformeescreveu Cristiano Barcelos (Ob. cit. III. P. 326),juntamente com os «30 soldados
indisciplinados em Bissau formavam um Batalhão de 450 desordeiros».
Esta escolha fora motivada pela razão de não haver soldados que, voluntariamente ou por
obrigação, não quisessem ir prestar serviço na Guiné, nomeadamente em Bissau.O facto de, desde 1807, os soldos serem pagos em
fazendas, e mesmo assim commuito atraso,originava constantes protestos das guarniçõesmilitares.
AIegando
essa razão, em 14 de Abril de 1811, a tropa da fortaleza sublevou-se contra o seu
comandante, Capitão ANTÓNIO CARDOSO FIGUEIREDO, exigindo-lhe o pagamento dos
seus soldos «poistinham fome e andavam rotos e descalços».O Governador de Cacheu teve que arranjar um
empréstimo, feito a titulo particular,pois não o conseguiu em nome do Governo,
para pagar aos sublevados, alguns dos quaisjá não recebiam há quatro anos,
aliás como sucedia ao próprio Governador.Ao
que parece, esta intentona fora fomentada pelo comerciante TOMÁS DA COSTA
RIBEIRO, que, em 12 de Julho desse ano, conseguiu originar nova revolta.
Cristiano Barcelos (lbid, p. 173. Consulte-se também a IV parte,
p. 72, onde o mesmo autor escreveu o segulnte: «Caetano José Nozolini reuniu
60 manjacos e com estes cahlu sobre os soldados indisciplinados, prendendo-os e
reastituindo a liberdade ao Governador e oficiaes,e assim se restabeleceu o
sossego em Bissau». ) fez oseguinte
descrição da fortaleza de Bissau, referente ao ano de 1821:
«... tinha os
muros mui damnlflcados; em mau estado e telhado do quartel dosoffícíaes e em
ruínas o dos soldados, vivendo estes em
improvisadas barracas que construíram de paus e esteiras, estando os muros
da fortaleza cheios de furos querecebiam os paus; n'estas habitações viviam os soldados com suas mulheres gentias
contando alguns seis mulheres; não havia hospital, nem médico; a egreja,
que outrora foracoberta de telha, estava coberta com palha e as paredes
ameaçando ruínas; a artilhariaconstava de cincoenta peças, estando onze
desmontadas, de calibre 9, 12 e 18; cavalgadasem reparos novos dez, e as restantes
vinte e nove, de vários calibres, montadas emreparos velhos; os soldados no
effeclivo de cento e setenta e sete homens formavam trêscompanhias de
infantaria ...»
Dez anos depois,
em 16 de Junho de 1831, na Ilha da Boa Vista, Manuel AntónioMartins, na sua Memória (Transcrita no Boletim
Cultural da Guiné Porruguesa. XIII
(1958) 206.),faz aseguinte descrição da fortaleza de São José de
Bissau:
«Tem huma cappela
dentro da fortaleza, aonde hum padre, com o nome de vigário, vaicelebrar o
Santo Sacrifício da Missa aos domingos e dias santos, a que assiste a
poucatropa da praça, e todos os que da povoação querem entrar nesses dias, ou
para a ouvir, oucom esse pretexto, prática esta bem estranha, e que há-de
resultar em grande prejuízo.
O vigário he mandado de Cabo Verde para allí, e
geralmente escolhido entre os mãos... como espécie de castigo.
Tem a praça de
Bissau 64 peças em número, famoza artilharia, muita parte della decalibre 18,
reforçadas em 24, algumas de 12, e poucas de 6: e em o numero de 64 entram 6comlumbrlnas
de bronze de calibre 9, e duas de campanha de 6.
De toda esta
artilharia, não se acha huma só peça capazmente montada para dar fogohuma hora
succesiva, e assim mesmo a maior parte por terra desmontada ou cahlda para
abanda com parte da carreia, excepto todas as de bronze, que nem signal de
carretas tem.
Enquanto ao
armamento de tropa, entra em questão de duvida haver doze armasperfeitas, ou
capazes de cada huma dar dous tiros...»
Devido ao estado
em que se encontrava a fortaleza, não é para admirar que, nosprincípios de
1822, se tivesse dado, em pleno porto de Bissau, um ultraje à
soberaniaportuguesa, e que Senna Barcelos (Ob.
Cit . III. p . 278)descreve
da seguinte maneira:«Em 25 de fevereiro de 1822 communicaram os membros da
Junta da Praçade S.José aos da
Praiao ataque que um batelão e dois escaleres, com tripulantes armadose com peças de artilharia, deram no pono da
mesma Praça a escuna portugueza Conde de Villa Flor, alli fundeada, na noite de
21 d'aquelle mes...
... Estavam todos
já a bordo e a escuna devia deixar esse porto em que foiatacada por aquellas
embarcações, que ficaram atracadas ao costado da referidaescuna, ao abrigo
dos tiros da Praça; cortaram-lhe a amarra e fizeram-se de vela,sendo
conduzida para o canal do Geba, onde
estava fundeada uma fragata inglesa com quarenta e oito peças.Da Praça, de
que era capitão-mor JOÃO HYGINO CURVO
SEMEDO, não foi possível socorre-la por falta de embarcações e pela
impossibilidadede se fazerem tiros, que poderiam metter no fundo a escuna,
morrendo não só osinglezes, mas os portuguezes...
Parece que esta fragata fora a mesma que na manhã de 4
de Março de 1823 mandara cinco lanchões bem armados atacar a escuna franceza
denominada africana,tentando
picar-lhe a amarra. Da Praça acudiram a tempo, fugindo os lanchões debaixode um
nutrido fogo mandado fazer pelo capitão-mor
interino MARCELINO PINTO DA FONSECA. A fragata acima referida era a L'Owen
Genndower.»
Em 7 de Abril de
1823 foi nomeado como sarqento-mor da
fortaleza o Capitão MARCELINO PINTO DA FONSECAe, na ocasião, a guarnição
foi reforçada com 45 soldados e6
degredados da Ilha de Santiago.
A falta de pagamento de vencimentos e a má qualidade
de rancho originaram, em Maio de 1826, nova revolta, que só foi dominada quando
fundeou no porto de Bissauuma fragata inglesa e surgiu um destacamento vindo de
Geba com 50 soldados. Os rebeldes, perante as imposições da força da ordem
libertaram o capltão-mor e alguns deles entregaram-se, mas a maioria fugiu para
o mato. No rescaldo da revoluçao,
ficaram presos 5 oficiais e 38 soldados, os quais, mais tarde, foram julgados
em tribunal militar e condenados.
Em 1 de Maio de 1835, registou-se mais uma
insubordinação militar. Os soldados sublevaram-se, prenderam os seus superiores
e promoveram-se a oficiais. Um deles, ANTÓNIO PICADAS, foi nomeado Governador,
e um outro foi promovido a general!
Foi o então capltao Caetano Nozolíni que conseguiu persuadir os revoltosos a
restituírem â liberdade os seus oliclals e a desistirem dos seus propósitos.
Assim, «em 7 de Maio, para que o sossego se conseguisse na Praça, houve uma
convenção entre o governador e os amotinados, fazendo-se um juramento, pelo
qual reciprocamente se obrigaram a esquecer o passado, sendo este gracioso
juramento deferido pelo capelão» (CRISTIANO
BARCELOS, ob. Cit., III, p. 349).
No decorrer dos
anos, a fortaleza foi-se arruinando e, em Dezembro de 1837, oseu poder
defensivo era muito reduzido.Ante a
ameaça de um ataque dos papéis, o Governador
JOAQUIM ANTÓNIO DA MATA,após ter ouvido em conselho todas as entidades da
terra - civis, militares eeclesiásticas - e com o apoio unânime, mandou ao comandante de uma corveta
francesa, surta no Geba, um patetico oficio ·em que pedia protecçao.
O oficialfrancês limitou-se a devolver o offcio e nem seauer lhe
deu resposta.
O almejado auxílio
foi então solicitado ao governo da Gâmbia, que, segundoparece, também não ligou
importância ao pedido.
Coincidência
curiosa. Nessa ocasião, o Governador de
Cabo Verde e Guiné, coronel JOAQUIM PEREIRA MARINHO, sem que tivesse tido
conhecimento do que se passava em Bissau, escrevia para Lisboa (lbid. IVp.158) aludindo que as
tropas da Guinê «eram indisciplinadas e barbaras... caindo aqueles
estabelecimentos na anarguia mais deshonrosa e de maior miséria...»o que,
no caso da fortaleza de Bissau,era absolutamente verdadeiro. Aliás, este
governador, tendo estado desterrado,voluntariamente, em Bissau no ano de 1836,
escreveu que encontrara «a Praça emestado miserável, e que a história dos últimos governadores de Bissau e Cacheu é a mais
deshonrosa. Alli tudo tem sido roubado, até pedras das plataformas; o
revestimento de contra-escarpa também fora arrancado para construções de casas
dos vizinhos; ... a artilharia desmontada e os ouvidos das peças alegradas pelo
pessimo tratamento que tem tido ... »
Em 1840 a
fortaleza contava 70 soldados (pouco disciplinados) e estava armadacom 22 peças
de artilharia capazes de laz:er logo (CRISTIANO
BARCELOS. em ob. cit., IV, p.
271. lndlea que nove peças estavam
montadas em reparos do ferro.).Mais ou menos nessa ocasião, Lopes de Lima (em ob. cit.,Livro I,
Parte II, p . 103) fez a seguinte descrição:
«Praça de guerra
de S. José de Bissau-Reduto quadrado de boa cantaria, flanqueadopor quatro
Baluartes, tendo cem passos de comprido cada uma das faces, cercado todo deboa
cava (que está servindo para hortas) guarnecido com quarenta e tres Peças de
ferro enove de bronze, de diversos calibres (quase metade dellas desmontadas
por falta dereparos em paiz aonde ha tão excelentes madeiras de graça).
Dentro da Praça
tem Quartel para o Governador - bons Quarteis para duzentossoldados, e para os
oficiaes correspondentes; -Igreja- Alfandega;- e Grandes Armazens;tudoem pedra,
coberto de telha; mas carecendo de grandes concertos até as muralhasque tem
quarenta pés de altura (apesar de apparecer todos os annos no Orçamento
umaverba de concertos, que não se vêem); acha-se lambem dentro no recinto um
poço seccodesde tempo immemorial, sendo aliás de pri meira necessidade, que
dentro na Fortalezahaja um poço, ou cisterna de agoa potavel para a guarnição;
... A fortaleza dista uns cempassos da borda da praia, tendo em frente da porta
principal dois grandes Poílões, queservem de marca aos navios, que vão dar
fundo.»
Segundo o mesmo
autor, a guarnição de Bissau, em 31 de Dezembro de 1843, era deum oficial
superior, comandante da Praça, dois tenentes e dois alferes, um
primeirosargento, quatro segundos sargentos, dois tambores, cinco cabos, três
anspeçadas(praças para impedimentos pessoais), cinquenta e seis soldados, num
total de setenta ecinco homens de força arregimentada de 1ªlinha.
Quando, em Novembro de 1840, se procedia á
reconstrução dos baluartes, queestavam
em vias de desmoronamento, registou-se em Bissau, num armazém civil deaguardente
e pólvora, uma violenta explosão que
provocou a queda da «Casa do governo•, da capela e de mais um ou outro edlficio
da fortaleza(CRISTIANO BARCELOS,ob. clt IV. p . 273.).
Em Novembro de 1842, tendo aldo
determinado aos lndlgenas de Bissau que «não
se concertassem nem se levantassem mais casas junto das muralhas da fortaleza»,
estes negaram-se a cumprir essa ordem, e, segundo o relatório do governador A. JOSÉ TORRES, datado de 7
de Junho de 1843(ibid pp. 314-311 ), «emboscados pelas casas fizeram os grumetes
fogo para a Praça, que rompeu com o da artilharia, obrigando-os a retirar. Até
aodia 4 de Janeiro atacavam todos osdlas a Praça, sendo repellldos. No dia 5
mandaramcomo parlamentarlos, dois homens grandes da Povoação, para tratarem da
paz ...»
Em 4 de Janeiro de
1844 desembarcou em Bissau um Conselho de Investigação(Era constftuido pelo comandante do Brigue«Vouga», FRANCLSCO ASSIS DA SILVA, Chefe do Estado-maior daProvíncla tenente ROSADO DE FARIA e pelo escrivão da
Junta de Fazenda de Cabo Verde, EVARISTO
DE ALMEIDA)para apreciar os casos de Indisciplina de guamlção. Segundo
o relatório que esteConselho elaborou, no tocante a instalações, «os
aquartelamentos estavam emruínas, e que os
soldados haviam construido na esplanada mais de 40 palhotas, ondeviviam com as
suas mulheres, ou exerciam a profissão de comerciantes. Além disso,os muros
da fortaleza estavam sem reboco e o fosso entupido e muitas palhotas da população avançavam até junto das muralhas,
impedindo o emprego da artilharia».
Pretendeu-se então
pôr em vigor varias medidas tendentes a não só impedir aconstrução de mais
palhotas no interior da fortificação, como também a desafrontar assuas
muralhas. Mas, precisamente cem anos depois, a situação ainda se
mantinha!Aliás, já em Abril de 1842 tinham sido recebidas em Bissau instruções
do governador-geralpara que se «abrisse o fosso e a ponte levadiça na parte que
dá acesso à Praça;que (se) evitasse a construção de novas casas junto à mesma
Praça que pudesseprejudicar a sua defesa»
(CRISTIANO BARCELOS, ob. cit ..
IV. p. 280. Na ocasião foidada ordem ao governador
de Blssau que diligenciasse juntar materiais para so construir no llhéu do Rei
o forteque semostra naplanta levantada pelo tenente de engenheiros ANTÓNIO
MARIA FONTES PEREIRA DE MELO». Cf. C. BARCELOS. ob. cit .. IV, p.
280).
Foi a revolta dos papéis e grumetes de 1844 -e que
durou poucos meses: de 11 de Setembro a 9 de Dezembro-que originou a construção de uma «palissada,protegida
interiormente por uma parede de taipa .. , cercando parte de Bissau, ou seja,ligando
a fortaleza ao pequeno forte do Pigiguiti, também em construção e formadopor um
semibaluarte, onde se montaram velhas peças de artilharia.
Ao que parece,
duas destas peças foram, já em nossos dias, levadas para juntodo Museu de
Bissau, ficando a ladear a porta principal do edifício; uma outra tevediferente
serventia: foi enterrada na avenida marginal, junto ao cais do
Plgiguitl,ficando só com o cascavel, a faixa e parte da culatra de fora, para
servir de cabeço deamarração. É possível que as restantes tivessem fim ainda
mais Inglório.
Foi tal o
interesse dos habitantes de Bissau na construção da «muralha», que selevantou
junto à pallssada, que, segundo Cristiano Barcelos, «até as senhorasrivalizavam
com os homens, transportando ellas também pedra e barro para essaconstrução da
muralha».
Para os papéis a revolta terminou três meses depois da
sua eclosão, numacerimónia realizada
na esplanada da fortaleza e que se caracterizou pela sua orlglnalldade (Consulte-se, para maior desenvolvimento sobre esta rebelião dos
indigenas, C. BARCELOS. ob. cit .. IV, pp. 25 o 38.).
Num misto de
religiosidade e de paganismo, um sacerdote cristão e umasacerdotisa (??)
indígena, chamada Balobeira, benzeram uma bacia feita da casca deuma enorme
cabaça, onde tinham sido postos aguardente, balas, pólvora e outrosamuletos
nativos.
Seguidamente, os assistentes a semelhante cerimónia
beberam aquela mixórdia e, segundo as crenças indlgenas - pelos vistos também
perfilhadas pelos europeus – a paz ficaria feita e manter-se-ia por muitos e
muitos anos.
Mas, ao que
parece, ou à mistura faltavam alguns ingredientes ou nem todos osassistentes
cumpriram na íntegra todo o ritual, e o resultado foi que, passados unsquatro
meses, a paz já tinha desaparecido da região de Bissau.
Em Maio de 1845, a guerra estava generalizada a toda a
Ilha, e os lndlgenas içavam a bandeira francesa salvando-a com tiros de peças
(roubadas nos nossos fortes).
Ogentiopretendeu
na ocasião destruir a recente palissada de Bissauesó perante a ameaça dos
canhões da fortaleza e do brigue Vouga é que desistiram dassuas
intenções.
No ano seguinte
celebrou-se um tratado de paz com os papéis e grumetes –quenão duraria muito
tempo, como era habitual - e adquiriu-se o porto de Bandim. Alémdisso,
registou-se, ainda em 1846, a conclusão do pequeno forte do
Pigiguiti,constituído por um simples reduto quadrado: feito a pedra e cal, em
que cada ladolinha cerca de 15 metros, sendo o do lado de terra rasgado num
amplo acesso. Em 7de Abril de 1846 o tenente-coronel Nozolini enviou ao
governador-geral de Cabo Verdee Guiné o seguinte ofício:
«Participo a V.
Ex.ªque o forte que offereci fazer no sitio de Piglgultl se achaquasi prompto,
tudo de pedra e cal com casa para a guarda e arrecadação dasmunições de guerra:
no dia 1 de Maio pretendo arvorar alli a bandeira nacional e levarpara ali duas
peças de artilharia. V. Ex.• ordenará o nome que quer se ponha ao ditoforte»(Em
CRISTIANO BARCELOS, ob. clt.,
p. 73.) .
Este forte
devia-se aos esforços do tenente-coronel Caetano Nozollnl (Este oficial nasceu em 1801 na Ilha do Fogo e morreu em 22 de Julho
de 1850 na Vila da Praia. Assentou praça em 1 de Maio de 1816, tendo sido
promovido: a alferes em 1816; tenenl/e em
1823; capitão em 1825; major em 1837; graduado em tenente~coronel em 1842 e promovido a este posto em
1843. Possuía os h'bitos da Aviz e da Conceiçio.), quehá muito
estava radicado em Bissau como importante homem de negócios, tendoprestado
relevantes serviços à Guiné, razão por que foi proposta para esta fortificação
onome deste oficial, o que não foi aceite pela corte de Lisboa, por motivos
políticos.No dia 7 de Abril de 1845 o capitão
de artilharia TAVARES DE ALMEIDA, com «14 artistasentre carpinteiros de
banco e de machado, pedreiros e canteiros», iniciou o trabalho para aconstrução
de um forte no Ilhéu do Rei. Depois de ter sido aberto um fosso e construídauma
face dos redutos, as obras foram, a 16 de Maio, interrompidas e nunca maiscontinuaram.
No inicio de 1847,
começou-se a construir, dentro da fortaleza, um novo quartel,substituindo as
antigas edificações, que estavam completamente em rulnas. A falta deverbas,
porém, fez interromper as obras, que só foram concluídas mais tarde, em
1851,graças a dádivas do Governador Major Lobo de Ávila, de Nicolau Monteiro
Macedo e de seuirmão João Monteiro Macedo. além de mais alguns comerciantes.
A 5 de Julho de 1853, a guarnição da fortaleza, por um
motivo fútil, revoltou-se. O Governador Interino, Major MARIA MORAIS, na
impossibilidade da dominar a rebelião, pediu socorro a um brigue francês de
nome Pellimure, sob o comando do
Capitão Augusto Bosse.
Uma força de marinheiros franceses desembarcou e após
ter levado os revoltosos a submeterem-se
ocupou, por um escasso mês, a fortaleza de S. José, enquanto se aguardava
a chegada do vapor Mindelo, trazendo de Lisboa um contingente de tropas
Durante a estadia dos franceses em Bissau, o Comandante Bosse mandou içar a sua
bandeira na secular fortaleza, mas, ante a oposição de todos os portugueses,
militares e civis, teve que desistir da sua ideia
Como
consequência da revolta da guarnição da fortaleza, faleceu, no recontro com os
revoltosos, o tenente da Marinha lmperlal da França Glllardale. O seu corpo ficou sepultado à entrada da capela da
Praça de S. José de Bissau e, mais tarde, a viúva daquele oficial solicitou a
anuência do Governo Português para que fosse colocada uma pedra, simples mas
durável, sobre a campa do seu marido. Ao que parece, este tão justo e humano
pedido nunca se concretizou, pois não encontramos, nem consta da tradição popular,
qualquer alusão à existência de alguma lage sepulcral na velha fortaleza, e não
há, em todo o recinto da sua esplanada, a mais pequena memória que assinale
aquela sepultura.
No dia 26 de Abril
de 1859 morreu na fortaleza de Bissau o grande português eguineense Honório
Barreto, na ocasião governador da Guiné, por decreto de 30 deNovembro de 1858 (Cf. JAIME WALTER, Honório Pereira
Barreto, memôria n.º5 do Centro
de Esrudos da Gulné Portuguesa, Blssau, 1947.).
Hoje, nem uma
singela placa assinala tão infausto acontecimento e recorda a memóriade um dos
mais Ilustres governadores desta Província que tanto pugilou por tudo
quantodizia respeito à Guiné e sua soberania portuguesa e que teve um especial
interesse pelafortaleza de São José de Bissau, mandando restaurar as suas
velhas muralhas e melhorar asua artilharia, além de lhe ter dedicado, ao longo
da sua vida politica, várias referências edescrições, uma das quais na Memória(HONÓRIO BARRETO. Memória
sobre o estado actual da Senegâmbia Portuguesa, escrita em Cacheu em 1842 e publicada em Lisboa em
1843.) que publicou em Lisboae que, segundo um seu biógrafo (JAIME WALTER. ob. clt., p. 29.), é um «livro modelo de verdade epatriotismo, e
ainda de actualidade flagrante.
Da referida
memória transcrevem-se as seguintes palavras:
«Bissau é uma
praça situada na Ilha deste nome,e construída segundo o systema deVauban; mas
não foi acabada. Não tem obras algumas exteriores, a excepção dosfossos ja
quasi entulhados, e aonde se planta algodão, milho, e indigo. Teve contraescarpa
mas parece que ella e as !ages das plataformas foram arrancadas para sefazerem
algumas casas dos Particulares. • Dentro ha os edificios seguintes: • OQuartel
da tropa, que esta quasi a cair, e por isso a maior parte dos soldados moramem
palhoças; o indecente quartel dos Officiais, aonde chove como na rua; o
arruinado armazem do Governo; • e a pequena, e destelhada Capella com invocação
de S.José, que é o Orago da Praça. O Governador mora no quarlel dos Officíais
com unsquartos pequenos, e rldlculos. Deixou-se arruinar o quartel do Governo,
que não era lamulto boa cousa, e que uma explosão de pólvora apenas destelhou,
e lhe abaloualgumas paredes podia então ser composto com pouca despeza.
Até 1912, segundo
Senna Barcelos, estas nove peças· cujos reparos tinham sidoadquiridos por
Honório Barreto, em 1837, ao governador da Gâmbia - eram as únicasda fortaleza
de S. José de Bissau que podiam fazer fogo.
Pouco depois da
morte de Honório Barreto • que foi sentida em toda a Guiné • acidade de Bissau
foi visitada por um diplomata e escritor, Francisco Travassos Valdez,que fez a
seguinte descrição da fortaleza de S. José (ln Atrlcs
Occldenlst. p
. 313.):
«A praça de S.
José de Bissau, com os seus poílões (erio exdendron anfractorum),árvores
gigantescas que se erguem com magestade nos quatro baluartes, e que osabrigam
com a sua sombra, sendo de taes dimensões que uma d'ellas tem 18 metrosde
perímetro na maior grossura, está situada na foz do rio Geba, e foi construída
noanno de 1766, reinando et-rel O. José I.
Do seu princípio
teve alojamento para o governador, bons quarteis para 200homens e officíaes
correspondentes, Igreja da Invocação de S. Josê, alfandega,grandes armazéns, e
um poço com água potável. Mas depois de tudo Isto feito comgrossos capltaes,
pela nec,essidade que houve de conduzir de Lisboa muitos operáriose grande
parte dos materíaes, bem como os vasos de guerra contra o gentio papel
ebalanta, e ara proteger a edificação
da praça, que referem escríptores antigos custou a vida a mais de 2.000
portugueses, chegou este estabelecimento a uma decadênciatal que ainda
ha bem pouco tempo só lhe restava um casarão construido de pedra ebarro, aonde
o governador e ofticlaes estavam pessimamente alojados e nas peiorescondições
hlglenlcas, um quartel para soldados quasl em ruínas e em grande
partedescoberto, uma mesquinha capella, algumas mlseravels barracas cobertas de
palha,destinadas ás mulheres dos soldados, e um poço cheio de entulho!
Ultimamente porém,
além de se estabelecer uma nova tarifa para os soldos dosofficiaes da provincia
de Cabo Verde, destacados na Guiné portugueza, dando-se-lhesde augmento o
equivalente á metade dos seus vencimentos, têm lido certo incrementoas obras
militares.
O governador geral
Fortunato José Barreiros ordenou que se procedesse areparação da forte do
Plglguitl, da tabanca. e da pallssada, e auctorizou a construçãode uma parede
(guarda fogo) no paiol da pólvora.
Sob a direcção do
activo e lntelllgente governador de
Guiné, ANTONIO CÂNDÍDO ZAGALLO, reconstruiu-se o quartel militar.,
comprehendendo alojamentos para ossoldados e officiaes inferiores, arrecadação
e cozinha, e começaram-se também asobras para a reconstrução da casa de
residencia dos governadores, cujo madeiramentofoi offerecido gratuitamente
pello fallecido commendador Honorio PereiraBarreto.
Considerada em si,
aquella praça, formada por quatro frentes abaluartadas,traçadas sobre um
quadrado de 100 metros aproximadamente de lado, com muralhasde 10 a 12 palmos
de elevação sobre o fosso que a circunda, não passa de umapequena povoação mal
alinhada, com algumas casas palhoças, outras de barro, e bempoucas de solida
construção. Tem por limites nas duas extremidades de ENO e SSO,na primeira, uma
palissada, na segunda uma tabanca, que ambas fecham a fortificaçãoque a defende,
e lhe fica superior pelo lado do N; ao NO, serve-lhe de limite o rio deBissau.»
Quase no final do século XIX, em Fevereiro de 1890, os
papéis e qrumetes de Bissaurebelaram-se e, a 22 desse mês, atacaram a povoaçio,
tendo sido repelidos. A luta prosseguiu até Março de 1892, tendo custado a
Portugal a vida de muitos dos seus militares, dos quais doia capltlas, um
tenente e um alferes.
Em Dezembro de 1893 os papéis recomeçaram a guerra,
mas no espaço de algunsmeses foram subjugados, em parta devido aos vários disparos
doa canhões da fortaleza, em parta devido ao revés que sofreram quando, a 7 de
Dezembro, atacaram Bissau e foram repelidos.
Em 28 de Novembro de 1893 o gentio de Blssau
assassinou, não multo longe dosmuros da fortaleza, um civil, natural de Cabo Verde,
fornecedor de pão e de géneros para o exército.
Seguidamente os papéis a grumetes da Ilha de Blssau
sublevaram-se. Sendo, porportaria n.º127 de 1 de Dezembro, declarado o estado
de guerra e autorizado «o bombardeamento do interior da praça apara fora da
mesma contra os seus habitantes»(Em
Revista Militar, ano de 1817,p. 518.).
Da fortaleza foram efectuadosmuitosdisparosdirigidos –paraasdiferentes partes da ilha, tanto com as peças de
artilharia como com as espingardas Snyder, parecendo então que a rebelião tinha
sidosufocada. No entanto,. os nativos, dias depois, atacaram com violência a
cidade de Bissau, sendo a acção descrita (Alferes
MANUEL ANTÓNIO PIMENTEL, A guerra de Bissau em 1894, in Revista Militar, ano de
1817).por um Oficial que tomou parte activa
na defesa, da seguinte maneira:
«No dia 7 de Dezembro, seriam cinco horas da manhã,
quando a fortaleza foi surprehendída pelo inimigo em numero provavel de 3 000
homens (papeis e grumetes), que durante a noite anterior, por um qualquer
descuido da parte da guarnição da praça e fortaleza, se haviam aproximado das
muralhas encobertos com os tarafes (matto), a uma distancia de 50 metros, pouco
mais ou menos e entre o Pyjlguity e o baluarte da Onça; travou-se então um
renhidissimo combate entre os revoltosos e a guarnição da praça, fazendo eu
nessa ocasião parte da força postada no denominado baluarte da Onça, junto com
o meu lllustrado camarada tenente GRAÇA FALCÃO, o qual então se entretinha com
algumas peças Krupp de 7° m/1882 com que escangalhou ainda parte das paredes
dos muros do cemiterio e creio que as cabeças de alguns papéis, enquanto eu me
entrelinha com a minha espingarda Snyder ...
Foi tal o elleito produzido por tão renhido ataque de
7 de Dezembro, causado pelo demasiado estrondo das bocas de logo e fuzilaria,
que aterrorizou extraordinariamente todo o pessoal estranho áquelle serviço e
que então se achava no interior da praça. E multo especialmente o pertencente
ao sexo feminino ...
Como felizmente a
boa estrela favoreceu sempre as nossas forças, viram-se então osrebeldes na
dura necessidade de retirar em d ebandada deixando a praça e ainda o
campolivre, do que elles nada gostaram ...
Depois do referido
ataque deram-se mais alguns pequenos combates de mais oumenos importância, mas
não tão Importantes como aquelle, nos mezes de janeiro eFevereiro, e
alternadamente até á saida da col:umna para fora da praça ...
... Pelas Ires
horas da tarde do mesmo dia (27 de Abril) ... surgiram os rebeldes nas
alturas
fazendo fogo vivo. A este ataque responderam os auxiliares que se
portaramrazoavelmente bem, sendo o Inimigo repellldo pelos tiros da fortaleza e
do fortim doPyjiguity.»
A
guerra de Bissau do ano de 1894, que foi pelo autor anteriormente citado,
referidacomo «uma das mais Importantes que nas possessões ultramarinas
portuguezes se têemeallzedo nos ultlmos anncs•, terminou com a completa derrota
dos gentios em Basslm nodia 10 de Maio, sendo a paz assinada em 22 do mesmo
mês, numa cerimónia realizada noInterior da fortaleza de S. José de Bissau na presença
do Governador de muitos militarese povo.
Data
sensivelmente do final do século passado a seguinte descrição do capitãoBARAHONA E COSTA, feita na Revista
de Engenharia Militar de 1901:
«A
fortaleza de S. José de Bissau, quando ali cheguei, também inspirava
poucaconfiança aos seus defensores. Basta dizer qjue o parapeito estava quase
destruído, acima
do
terraplano de circulação. D'este modo os pretos rebeldes podiam bem alvejar
asreduzidas tropas da guarnição que fomos encontrar exaustas por sucessivos
alarmes.
A
densa vegetação que circundava a praça permitia que o inimigo se pudesseaproximar
sem ser visto.O artilhamento da praça era simplesmente mesquinho, para não
dizer outra coisa.Basta citar o facto de termos ido encontrar ali peças de
artilharia assestadas noparapeito sobre reparos constituídos por grossas lages
postas de cutelo!
Tanto
o fortim de Pigiguiti como o forte de S. José foram convenientementereparados
durante o tempo que estive na Guiné e o arlilhamento foi muito melhorado,o que
não obstou a que poucos annos depois já ali se vissem as peças de
artilhariaamarradas com cordas aos respectivos reparos!
Os capitães de
artilharia JOAQUIM DE FREITAS RAMOS, JACINTO I.SANTOS ESILVA e VIRIATO FONSECAenvidaram patrióticos esforços para organizar de
vez o materialde guerra da Guiné em condições favoráveis á defensa. Como se vê,
porém, ali tudomuda rapidamente ...
Tendo
citado aqueltes três oflíciaes, não quero deixar no olvido o nome dovalente
capitão Lage, que em 1891 comandava a fortaleza de Bissau.
Quando
em 1891 fui servir na Guiné, encontrei a fortaleza de S. José de Bissauquase
completamente arruinada ...
Durante
a minha estada na Guiné (1891-1892) procedi a importantes trabalhos nafortaleza
de S. José de Bissau, que restaurei em grande parte, pondo-a em condiçõesde
resistir ás sortidas do gentio irrequieto que a rodêa.
O
forte de S. José de Bissau tem 4 faces abaluartadas, dispostas segundo os lados
de
um
quadrado ...As muralhas teem 12 metros de elevação sobre o fosso que a
circunda. Este fossotinha a escarpa revestida, mas quando ali cheguei achava-se
quase entulhado com osescombros da muralha e os revestimentos do fosso tinham
desaparecido.
Honório
Barreto, que foi governador da Guiné, assevera, n'uma memória que escreveu
sobre
a Guiné, que as pedras que guarneciam a contra escarpa, e as lages das
plataformas
de
artilharia foram roubadas para se fazerem algumas casas particulares ...
...
em cada um dos baluartes, ao centro, havia gigantesco pollão (erio
exdendronanfractorum) que lhes dava farta sombra .
...
o tronco de um desses gigantes mede na base cerca de vinte metros de perímetro
.
...
a povoação de Bissau fica apertada entre o forte e uma cortina que liga o
baluarte daOnça ao fortim do Pigiquiti, nome pelo qual em 1891 era conhecido o
antigo forte Nozolfni,do qual, aliaz, só existia a lace que olha para a
campanha ...
Durante
alguns anos uma paz relativa reinou em Bissau e a fortaleza de S. José deBissau
pouca acção teve no desenrolar das campanhas de 1908 - se bem que
tivessealojado no seu interior grande número de militares que tomaram parte na
Campanha deBissau, que foi, para todas as nossas tropas que até então tinham
actuado na Guiné,aquela que mais baixas causou.
Em
1913 houve grande alvoroço entre os moradores de Bissau, porquanto a paliçada
que
ligava a fortaleza ao forte de Piguitii fora mandada demolir. Esta medida
foiconsiderada altamente prejudicial à cidade pois, segundo se escreveu ao
Ministro doUltramar, «a defesa desta ficaria só apoiada pela velha fortaleza de
S. José».
Nos
acontecimentos politicos provenientes da mudança de regime em Portugal, em1910,
e durante as guerras mundiais de 1914-1918 e 1939·1945, a acção da velha
fortaleza
foi
de pequeno relevo e, desde então, praticamente só serviu de aquartelamento e
depósito
de
tropas.
Fotografias
existentes nos arquivos do· Quartel-General de Bissau, datando de hâpouco mais
de um quarto de século, mostram a fortaleza de S. José com as sua.s muralhas desmoronadas, as edificações em ruínas,
aparecendo, entre os destroços, ou quase cobertas pelo capim, uma ou
outra peça.
Para
se celebrarem as comemorações do quinto centenário da descoberta daGuiné, a
fortaleza foi parcialmente reparada, dado que algumas das principaiscerimónias
desenrolar-se-iam no interior da.s suas seculares muralhas.
No
dia 1 de Janeiro de 1946 começaram essas comemorações, que abrangeramtoda a
Guiné e às quais Portugal inteiro, desde o Minho a Timor, se associou.
A
primeira cerimónia teve lugar às oito horas desse dia com o içar, pelo
comandante da Guarnição Mllltar, Major Pedro Pinto Cardoso, da Bandeira das Descobertas (esta bandeira oncontra-se
emoldurada na Biblioteca do Ouartel General do Comando Territorial lndependenle
da Guiné.). Ao acto prestaram honras militares forças da Armada, do Exército e
do Corpo da Policia de Segurança Pública.
Finda
a salva de 21 tiros, Sua Excelência o Governador, Comandante SarmentoRodrigues, proferiu a sua célebre «Mensagem
do Baluarte» (Em Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, 1
(1946) 349-352.). que começa com as seguintes palavras: •do alto deste
baluarte, onde a bandeira portuguesa sempre com honra se ergueu ... Seguidamente as forças em
parada desfilaram e Inaugurou-se, na esplanada da fortaleza de S. José de
Bissau, um pequeno monumento dedicado «aos heróis da ocupação e pacificação da Guinén, iniciand)o-se, assim, as cerimónias
comemorativas do quinto centenário da Província.
Em
1947 desmoronaram-se alguns lanços das muralhas da fortaleza e, no ano
seguinte, deu-se a derrocada das edificações do Pavilhão dos oficiais e
arrecadações do material de guerra.
Dois
anos foram necessários para se reconstruírem as muralhas e se demolirem as
ruínas das edificações. Depois, em 1951, começou a construção de duas moradias,
que substituíram o velho • Quartel de officiaes• que há cem anos, pouco antes
da sua morte, o governador Honôrlo
Barreto mandou reconstruir.
Durante
anos e anos os quartéis da fortaleza serviram para alojar unidadesmilitares,
quer da guarnição de Bissau, quer em trânsito para o interior da
Província,sendo a última unidade que se abrigou no Interior das velhas muralhas
o Batalhão deIntendência da Guiné.
Na
luta que hoje se trava contra um Inimigo alentado e bem remunlclado por países
estrangeiros, têmsido capturadas muitas toneladas de armamento. O
GabineteMilitar do Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné promoveu uma
exposiçãopública do material capturado e escolheu como local mais
representativo para aapresentação desses troféus de guerra • que testemunham
bem o Inegável apoio domundo comunista aos terroristas da Guiné • o interior da
velha fortaleza de S. José deBissau, espalhando pelo seu recinto, misturadas
com seculares canhões, as maismodernas armas de fogo.
Após
esta exposição, em 1969, a fortaleza· vulgarmente chamada da Amura, ou seja, o
nome
em crioulo de muralha • passou a servir de sede ao Comando-Chefe das
ForçasArmadas da Guiné e, praticamente, a vida política e militar da Província
voltou aIrradiar, para todos os pontos guineenses. da antiga «Casa do
governo»da fortaleza de S.José de Bissau.
Hoje,
uma ponte de caracteristicas mod!ernas e simples, atravessa o único troço
defosso, existente junto à face poente, dando acesso à porta de armas, que está
ladeada pordois belos exemplares de canhões belgas, fundidos em 1757 por L.
Lefache, e por duas guaritas de cimento armado, estas sem qualquer Interesse
artistico.
Um
portão de ferro, tão modesto e sim pies que talvez fosse rejeitado em
qualquerquinta um pouco mais abastada, substitui a porta que a fortaleza
certamente devia terpossuído e que a riqueza de madeiras da região impunha.
O
túnel de passagem é baixo e curto, com uma curvatura de tecto pouco
pronunciada. Nas suas paredes laterais existem duas lápides, modernas e de
discutível bom gosto. A dadireita tem o
escudo da Guiné, mas com a tradicional «negrinha» (D. Afonso Vcomo slmbolo da posse da Guinéfazia uso de um busto de
marfimrematado por uma cabeça de negra. Este bastão era conhecido pelo nome do
negrinha, efoi, mais tarde, adoptado como emblema heráldico da província da
Guiné,. sendo mantido pela portaria mlnlstetlat de 5 de Maio de 1935) muito
se assemelhando a um canhão • erro normalmente seguido e que dá origem a
outra interpretação deste simbolo tendo gravadas as seguintes palavras:
FORTALEZA
DE S. JOSÉ DE
BISSAU
PRIMEIRAMENTE
CONSTRUIDA EM
1696
PELO CAPITAO-MOR JOSE PINHEIRO.
FOI
INICIADA A SUA RECONSTRUÇAO
EM
1753 SEGUNDO OS PLANOS DE FREI
MANUEL
DE VINHAIS SARMENTO E CONTI
NUADA
EM 1766 COM A TRAÇA DO COR MANUEL
GERMANO
DA MATA
RECONSTRUIDA
PARCIALMENTE EM 1916
Ao
ler-se esta lápide quase se pode afirmar que, em cada linha, há um erro.
A
primeira fortaleza que existíu em Bissau tinha o nome de Nossa Senhora
daConceição, a padroeira de Portugal e orago da capela da fortificação que foi
mandadademolir, completamente, por D. João V em 1707, e põe-se em dúvida se,
melo séculodepois, teria sido reconstruida.
Deve-se
a traça da segunda fortaleza de Bissau ao Capitão-engenheiro
PAIS DE MENESES(Cf.
o ofício do Ministro da Marinha e do Ultramar, transcrito por ÁLVARES DE
ANDRADEob. Cit.., p. 77
eindicadana pag. 489 deste trabalho)e foi só após a morte deste que FREI VINHAIS SARMENTO, e por algum
tempo, foi nomeado para a direcção das obras da fortaleza. Mas, como se
indicou, tudo quanto construido sob a sua direcção foi provisório e ficou
imperfeito. Da leitura de vários documentos verifica-se que a segunda fortaleza
de Bissau estava de pé quando a Companhia do Grão-Pará expressou por escrito o
seu contentamento pelo «bom sucesso do principio da fundação da fortaleza»( GERMANO DA MATA • categórico ao afirmar que, em 30 do Setembro do 1765 deu
«princípio a cortar árvores e matos ea limpar o plano para se lançarem as
primeiras linhas». Cf. CUNHA SARAIVA. A
Fortaleza de Bissau e a Companhia
de Grão-Paráe Maranhão. p.
167: ÁLVARES ANDRADE. Plantas ds Praça
de Bissau e suas adjacentes. p.
57.). Portanto, esta foi
construída em local diferente das anteriores, contrariamente ao que se
depreende da lápide.
Por
último, duvida-se da reconstrução da fortaleza em 1946, porquanto reconstruir é restaurar segundo a traça primitiva,
e, nesta reconstrução, só houve a preocupação de tornar a fortaleza
funcional para determinado IIm, não se atendendo ao seu passado histórico.
Assim, a pequenina capelinha de evocação a S. José desapareceu para dar origem
a uma singela casa quadrada, tipo colonial, e também desapareceram os
majestosos poilões que existiam em cada um dos baluartes (No arquivo do Quartel-General existe uma
fotografia destes poilões.) , além de hoje se verem nas arestas dasmuralhas
inestéticas guaritas de cimento, pintadas de branco, em nltido contraste coma
cor enegrecida das pedras lateriticas.
Na
parede do lado esquerdo do túnel de acesso ã esplanada hã uma pequenaplaca de
bronze Indicando que a fortaleza foi
VISITADA
PELO CHEFE
DO
ESTADO, GENERAL
FRANCISCO
HIGINO
CRAVEIRO
LOPES EM
3
DE MAIO DE 1955
Na
esplanada, mas descentrado, ergue-se, desde 1946, um pequeno monumentodedicado
aos «heróis da ocupação e pacificação da Guiné». Está rodeado de 4 canhões
deferro, de calibre 36, montados em reparos do mesmo metal.
Dois
destes canhões, os que estão voltados para a porta de serviço, são
holandeses,um tem uma coroa que parece a sueca e o outro, provàvelmente, é de
fundição inglesa.Junto à porta de serviço - que se vê ter sido rasgada na
muralha, em ampliação daoriginal há um
montículo de terra, ajardinado, onde se encontram uma caronada, umancorote
e uma hélice de avião, querendo si mbolizar a união dos três ramos das
ForçasArmadas. Para realização deste fim, julga-se que a caronada - canhão
tipico da marinha -devia ser substituida por uma peça.
No
lado exterior da porta de serviço estão dois canhões de ferro, de calibre
24,montados nos respectivos reparos, tendo um as armas holandesas e o outro
aspecto deser de origem inglesa. Espalhados pelos parapeitos das muralhas encontram-se
24 canhões de ferro (Em todas as descriçõessobre a fortaleza de
S. José de Bissau verifica-se que o número de canhões vem diminuindo. Conquanto
em 1847 houvesse sido dada ordem, de Lisboa,para inexplicável medida do desartllhamento geral(RovistaMlitarano do 1864. p. 128), nos constou que, quer nessa
ocasião quer em 1854 e1877,ou datas posteriores, tivessem recolhido ao Arsenal
do Exêrclto canhões de ferro ou de bronze
provenientes da Guiné. Assim o desaparecimento dos canhões que existiram na
fortaleza de Bissau só se explica, para os mais pesados, pelo abandono e
consequente enterramento natural; para os mais pequenos, em especial os de
bronze, pelo roubo. Além das 35 peças do artilharla que seencontram na
tortaleza de S. José,conhecem-seem Bissaumais novo bocas defogo antigas, cujas
caracteristlcas e locais onde se encontram resumidamente se indlcam: • No Batalhãode Intendência de Angola:· Mortelro de ferro,
possivelmente de fins do século XVIII - 1. No munhão esquerdo tem a marcaS
BOWLING e no fogão os números de referência 7 ·I· 12. Estámontado em reparo de
ferro, próprio, e tem um diâmetro de boca de 230mm.· No Museu deBlssau: • canhão acolumbrinado,
deferro, do Inicio do século XVII - 1; . Canhão deferro do final do século
XVIII- 1: . Peça de tiro de sinal, de ferro, do principio do séc. XVIII- 1; N.
B. A peça de tiro do sinal, uma dasmultas que os indígenas nos roubaram, 101,
hâ pouco mais de cem anos, ullllzada pelos mandlngas nas suas lutas contra
osfulas. Cf. Boletim Cultural da Guiné
Portuguesa, II(1947) 449 . • Canhão de bronze com a cifra de D. Maria I -1. Os
doiscanhões de ferro parecemser do origem inglesa.Ocanhão de bronze tem
um corte triangularem bisel, invertido, junto ao«ouvido»,
que teria sido feito paraembutir um «grão», o que sucedia quando as peças
tinham feito multo fogo. • NoCemitério Municipal de Bissau: Canhão de bronze, com o comprimento total de
96 cm e diâmetro de 10 cm. Alma com 6estrias, slnlstrorso. Na faixa da culatra
tem a legenda: RUELLEAN 1863, e nos munhões, esquerdo e
direito,respectivamente, «N.º100»e «p 101 K» • Canhão de bronze idêntico ao anterior, com a data de 1870, tendo no
munhãoesquerdo a indlcação: «N.º16» • Canhão do bronze, com ocomprimento total
de 96 cm eo diâmetro de boca de 11,5cm.Tem a alma lisae a câmara estrangulada.
No munhão esquerdo tem a indicação «N.º232»e no direito «P 98 K». Temmarca de
mira na bolada e na faixa da culatra, lado esquerdo superior, uns furos de
adaplaçâo de um aparelho,possivelmente de pontaria. Uma peça idêntica foi roubada
em 1959,ignorando-se o seu paradeiro. • Junto
ao cais doPlglguitl, na Avenida
Marglnal:Canhão de ferro, provavelmenle de calibre 36,enterrado pela
boca, estando de tora ocascavel, culatra e parte do primeiro reforço. Esta
peça,bem como os dois canhões de ferro que se encontram no Museude
Bissau,guarneciam o antigo forte do Plglguiti. Por uma fellz delermlnação do
Ex.• Secretárlo-Geral da Provinda vãorecolher ao Museu de Bissau Iodas as peças
antigas de artilharia que se encontram espalhadas pela Guiné, mesmoaquelas que
estão a ser utilizadas como cabeças de amarração), dos quais só um ostenta
as armasportuguesas- embora não tivesse sido feito em Portugal. Os restantes
são holandeses,um possivelmente é sueco, outro deve-se às fundições belgas de
Lefache, e ha aindaum que tem, nos seus munhões, a característica «flôr de
liz», francesa.
No
Interior da esplanada, em parte sombreada por mangueiras, encontram-se,além dos
quatro canhões já aludidos que rodeiam o monumento e da carona da pertoda porta
de serviço, mais duas peças des·te tipo, uma das quais encravada com umpelouro
de maior calibre. No chão, junto a cada uma destas bocas de fogo, existemuns
quatro ou cinco pelouros de diversos tamanhos.
Na
varanda da «casa do governador», voltados para o mar, encontram-se
quatropequenos canhões de 47 mm, que há meio sêculo faziam parte do armamento
dealgum navio de guerra.
Exceptuando
estas quatro peças, um total de 35 velhos canhões fazem imaginar, aquem os
contempla - melhor que estes simples e breves apontamentos - o que foi
ahistória da fortaleza de S. José de Bissau, através dos seus dois séculos de
existência.
Uma
história atribulada, de sucessos e insucessos, de esperanças e desânimos,
indelevelmenteligados pela nossa constante vontade de permanecer na Guiné.
BIBLIOGRAFIA
ANTÓNIO
AFONSO MENDES COUTINHO- Apontamentos sobre a Praça de S. Josê deBissau,
Lisboa, 1853.
BERNARDINO
ANTÓNIO ALVES DE ANDRADE· Planta da Praça de Bissau e suas Adjacentes.
lntrodução e notas doDr. Damião Peres. Edlção da Academia Portuguesa de
História. 1952.
Boletim
Cultural da Guiné Portuguesa, Bissau.
CHRISTIANO
JOSÉ DE SENNA BARCELOS • Subsídios para a hlstôrlade Cabo
Verde e Guiné, Tipografia
daAcademia Real das Sciencias de Lisboa, 1899 a 1912.
FRANCISCO
TRAVASSOS VALDEZ, Afrcia Occidenfal. Edição de Francisco Artur da Silva.
Lisboa. 1864.
Cap.
Eng. HENRIQUE C. S. BARAHONA, Cartelra de um Afrlcanlsta. Algumas palavras
sobre as fortalezas da Gulnêe da Africa Oriental,ln Revista de
Engenharia Militar, ano de 1909.
JOÃO
BARRETO - História da Guiné. Edição do Autor. Lisboa. 1938.
JOSÉ
JOAQUIM LOPES DE LIMA - Ensaios sobre a statlstlca das Possessões
Portuguezas, livro I. ImprensaNacional, Lisboa. 1841.
JOSÉ
MENDES DA CUNHA SARAIVA - A Fortaleza de Bissau e a Companhia do
Grão-Paráe Maranhão, lnConqressoComemorativo do Quinto Centenárlo do
Descobrimento da Guiné, vol. I,pp. 157 ss.
Idem.
I Congresso da História da Expensà·o Pottuguesa no Mundo. pp.
167-170. doe. n.º2. nota F.
MANUEL
ANTÓNIO MARTINS - Memória demonstrativa do Estado Actual das Praças de
Bissau, Cacheu e suas Dependências emÁfrlca, in Boletim Cultural
da Gulnê Portuguesa. XIII {19S8) 203-216.
Alf.
MIGUEL ANTÓNIO PIMENT'EL · A Guerra de Bissau em 1894. ln Revista Militar, ano
de 1897, pp. 616 ss.
TITO
AUGUSTO DE CARVALHO- As Campanhas Portuguesas de Colonização, Memória
apresentada â Sociedadede Geogralia de Lisboa, Lisboa, 1902.
☻
Aqui os filhos nao herdam dos paes, e
sim os sobrinhos,filhos das irmans, uterinas, porque essestem elles a certezade
que são de seu mesmo sangue, o .que não acontece o respeitode seus filhos,
attenta o geral licenciosidadedos costumes.
Quando
morre alguém,não sendo velho, sempre altribuemo acontecimento amaleficio, e
enchendo-se de lamavão para a casa mortuaria fazer grande alarido dechoro,
cantando os louvores do defunto,a que chamam fazer guiza;mas se o morto
jáé velho, levnantamgrandes cantorias e formam bailados ao som de
tambores,aquechamambombolons,e em ambos os casos passam nisto diversos
diascomendo ebebendo à custa da familia do falecido quede ordinario
nãodeixam, em quanto sentem que havaccas para comer, e aguaardente paro beber.
Portugal
tem o direito de protectorado sõbreéstaIlhapor offertaespontanea do rei della,
que a collocou debaixoda sua protecção, pedindo-lhe umae muitas vezesque
mandassealli construir uma fortaleza para proteger os seus vassalos, e
evitar que fossem estrangeiros fazer-lhes vexame apretexto de negociarem,como
costumavam fazer os ingrezes,francezes, e flamengos: e foi
por esse protectorado que EIReipor Alvaráde 7 de Março de 1696 ordenou que ajurisdiçãodo Capitão Mor de Bissau, na sua
qualidade de Ouvidor, seestenderiaaté cinco leguas; e que mais tarde
parapremiar olealdade dos reis, que se tinham succedido até então, determinouem
1702 que se lhe desse um presente, que serepetiriaem
diversos tempos do anno, conforme o fosse merecendo.
Estes
presentes tomaram mais tarde a apparenciadetributos, e como se isto não fosse
já bastante vergonhoso,houve um Governndor Geralque em 1838 estabeleceu
umtributo mensal de uma espingarda, 25 arrateis de polvora,
e12 frascosde aguardente a fovor do Rei delntem,cujasinsolencias
exigiam severarpressão, e não o inceentivo quese lhe dava para seguir em maiores e
mais intoleráveis, co
PRAÇA DE CACHEU
Estabelecimento fortificado ao longo da margem
esquerda do rio de S. Domingos, cinco legas distante da sua foz,o qual foi construido em 1588 por MANUEL LOPES CARDOSOcom
licença do Rei da terra, e. junto do qual osportuguzes se estabeleceram: porêm
dous annos depois tiveram desustentar um combate que os negros deram ao
eslabelecimento,e ao qual foram vencidos porque, contavam com o surprezado
attaque, e acharam os nossos apercebidos pelo avisoque na vespera ánoite
receberam de duas negras.
Consta a
fortificação de uma palissada, e quatro pequenos reductos arruinados, cuja
collocação não é a melhor na opinião dos entendidos que a examionaram.
Chama-se a isto uma Praça, mas não lhe compete realmente
senão o nome de presidio. Não tem casa do Governo porque uma explosão de
polvora o demoliu em 1834, deixando-lhe apenas as paredes: e o quartelda tropa
é um edificio malconstruido. Acha-se actualmenle com 12 peças montadas.
Encoslada a este
presidioestá a povoação, que se divide
em dous bairros, a quecbamam no paiz, a Villa quente,e a Villa
fria:este onde residem as pessoas principaes ou brancos, como
lase lhes chama qualquer que seja a sua cor,é uma rua comprida ao longo o
rio na direcção de Oestepara Leste, onde acabanas ruinas do antigo hospicio dos
Antoninhos; e aquelle, onde unicamente residem os Grumetesda praça, éum
labirintho de choupnas do barro,cubertasde palha. Esta povoação soffreu
muito com uma explosão depolvora em 1846; mos os damnos que ella fez devem
d'estar já reparados com o auxilio de quatro contos de réis, que o Govêrno
mandou applicar para as reparações.Por o
lado da terra é a povoação cercada por uma tabanca feita de paus de sibede 10 a
12 palmos de altura, bem cravados no chão e bem juntos uns oom os outros, com
duas portas para o sertão; obra que mandou fazer o capitão mor ATONIO DE BARROS BEZERRA,nos fins do
seculo16: e que depois, e ainda modernamente, tem sido renovada.
Estas duas portas foram
em 1823 flanqueadas por
dousbaluartes de adobes, que o govemador da Praça mandou levantar por occasião
da guerra que teve com os Papeis do
Churo e deCacanda. Esta cerca tem uma milha de comprimento, e quasi um
terço de largura.
Depois de ter sido o
principal estabelecimento militar dos portugezes n’aquellas paragens, devido
isso unicamente aos seus próprios esforços, acha-se hoje reduzido a umaposição mais
do que secundaria; e essa mesmo, se a temmantido, se não està de todo
anniquillada, deve-se aos exforçospatrioticos de um homem, que realmente era
digno deviver em epochas em que o nome portuguezchegava á alturaem que elle
ainda o considera: fallo de Honorio PereiraBarreto.
Ha aqui umn freguezia
com a invocação da Senhora daNatividade, cuja Igreja veiu a terra, e por isso
está servindode Parochia uma ermida particular, que lambem ameaçaruina. Esteve
muitos annos sem Parocho: ignoro se jao tem.
Este estabelecimento, e
os que delle depndem, foi em 1833 annexado ao de Bissau para juntos formarem um
so governo subalterno; mas em 1841 foi de novo desannexado para formar um governo separado d’aquelie, mas igualmente
sujeito ao Governador Geral de Cabo Verde; e assim estão hoje sendo
dependencias suas: Farim, Bolor, Ziguichor, e o ilhéu de Gonú, com a
denominação degoverno de Cacheu.
O
movimento commercial exterior deste estabelecimentoé muito menor que o de
Bissau, mas não me parece que sereiexaggerado calculando-o em 30 contos de réis
cada anno; ointerno andará pelo dobro com pequena differença para mais.Comtudo
ésta ultima supposiçãe é puramente arbitraria. Eimporta e exporta os mesmos
artigos que o estabelecimentode Bissau. Os seus rendímentos que em
1841estavam arremattadospor 1:250$réis foram em principios de 1847arremetados
por 3:500$réis em metal: e como asua despezaera então calculada em 5:000$ réis,
o deficit é hojemuito menor do que então. Este deficit é preenchido por a Junta
da Fazenda de Cabo Verde.
A
população de Cacheu apenas será de 1800 pessoas - entrando nesse numero 1:190
escravosde ambos os sexos,que são a totalidade dos do Districto. Note-se
porêm aquiumacircunstancia, e vem aser: que o numero dos varõesé muito superior
ao dasfêmeas, o que muito concorrenãoso para que a população não augmente, mos
ainda para quediminua a olhos vistos.
Não ha agua dentro do
forte, e por isso os seus habitantesusam da quecorre para o mar na ribeira
junto aorecife da Calaca, distante cousa de um quarto de milha a O.do forte; e
por isso offerecendo a sua ocquisição lambemrnuito perigo em occasiões de
guerra: e como ésta ribeiranão corre todo o anno tem de recorrer ao poço da
Cacanda,o que tornaesse perigo ainda mais formidavel.
Ha
neste estabelecimento as mais bellas madeiras deGuiné, algumas dellas muito
proprias para construcção navalde que se fornece o nosso Arsenal da Marinha ,
que mandaannualmente buscar um ou mais hiates della, que se cortados arvoredos
que estão sitos nas duas margens do rio de S.Domingos,nas immediações de Cacheu
; porem as da margemdireita são as melhores.
O
clima de Cacbeu é muito doentio; alli são mais frequentesas febres miasmaticas,
ou ataxicas do que em Bissau,o que se attribue á podridão dos resíduos
do arroz, que os negros deixam nos paúes, em que fazem aquella cultura; etalvez
se deva tambem attribuir a não ser tão ventilado oterreno, como é em Bissau,
segundo fui informado.
Ainda gue este presidio
seja de capacidade para umaguarnição de 100 praças. nunca ella chegou a esse
numero:em 1837 era de 74, e em 1843 apenas era de 45 praças, com 1 Tenente e 1
Alferes: hoje não sei qual seráaforçada guarnição, mas é quasi certo que não
serà maior;
e ouessa, ou menor, de pouco proveito pode ser pelos elementos
de que se compõe n’um paizcercado de inimigos, postoque os indigenas sejam aqui
mais doceis e tractaveis, quenão os de Bissau.
PRAÇA DE FARIM
Presidio
que dista 60 leguas de Cacbeu, situado em terrenodos Mandingas na margem
esquerda do Rio de S. Domingos.Começou
por ser uma aldea aberta , e assim esteveaté 1692, em que dousclerigos naturaes
de Santiago, queaIli estavam degradados pelo Bispoem castigo de serem dadosa
rixas, influiram os moradores para que a fortificassem,o que elles fizeram
cavando um fosso, e fazendo uma tabancade paus chamados de carvão,que
guarneceram com algumaspeças d'artilheria. que mandaram ir de Cacheu, e com
quese fortificaram.Hoje este presidio
consiste n'uma estacada com tres baterias de barro, cubertas de palha, e
guarnecidas de algumaspeças de artilheria, de que apenasestarão em menos
mauestado seis,que Honorio Pereira Barreto montou ásua
custaquando foi, em 1835, Provedor do concelho de Cacheu.
Este presidio não passa
de uma feitoria,
onde os negociantesde Cacheu tem os seus caixeiros e agentes, a quemremettem
artigos de vestuario, agua ardente, armas. polvora,tabaco, missangas, prata e
cobre , e outros objectos; e dequem recebem em troca cera, marfim, peles, couros,
e algumouro, o que dá um movimento commerciel de 24a 30 coutosde réis
annualmen\e, protegido mais pelo caracler inofensivo dos Mandingas, e interesse
que tem na continuação dotrato commercial, do que no destacamento de tresbaionetas queo guarnece.
A suapopulação
regulapor 670 habitantes, incluindo250 escravos,com uma freguesia
deinvocação de Nossa Senhorada Graça, que se veneran'uma Igreja de barro,
cubertade palha, em muito mau estado, e sem parocho há uns
poucos de anoos. No calculo da população
não estão incluidosos chamados Grumetes da Praça.
O
estabelecimeoto dos Francezes e
Inglezes no Sejo, sobreo Casamansa, na distancia
somente de
2 dias de jornadadeste presidio, tem causado males incalculaveis ao seu
commercio, que vai diariamente decaindo, e ameaça anniquillar-sede todo se não
se adoptarem providencias efficazes. Ja
tinha soffrido muito com o estabelecimento de Gambia, agora odo Sejo deu-lhe
golpe de morte ao seu commercio; de que nãopoderá restaurar-se senão por
meio d'estabelecimentos ruraes,para o queparece mui asado porque ambas es suas
margensformam vastas lesirias susceptiveisde grandes culturasde arroz e de
canna deassucar.
Os indígenas de Farim
são Mandingas, como os de Geba; mas os Grurnetes do Presidio são insolentes e
attrevidos,e em nada se parecem com os de Geba.
PRAÇA DE BOLOR
Estabelecimento
portuguez fundado em terreno Felupe, na
Ponta do Baluarte, no extremo de uma
praia de area. Corre-lhe a meia
milhade distancia oo Sul o cachopo do Banquinho, e entre elle e esta ponta fica
o canal por onde a tiro de mosquete passam os navios que vão ao Rio de Farim,ou S. Domingos,e
os que se destinarem ao porto deBolor, que ésla Ponta domina por L. e L. N. E. Conslava este presidio de dous meios
reductos horisonlaes do fachina sobre estacaria, um do lado do Sul dominando o
canal, e outro na Ponta de Leste varejando o Porto de Bolor , ligados entre si
por uma estacada, e guarnecidos com 6 peças, occupando uma área de tresentos
pés quadrados. Tinha quartelpara o Governador, e para a guarnição, o outras
oficinas,obrs estas que sefizeram em 1831, mas de que hoje se póde dizer que janada
existe porque estão completamente arruinadas.
Este ponto, que é uma
dependencia de Cacheu, ê talvezo mais salubre da Costa porque se dessecou o
terreno,abrindo uma valla profunda de roda do Forle,e dous canos que attravessam
o mesmo, e vão desaguar no valla.
☻ Manuel António Martins, um abastado comerciante
caboverdiano e vice-cônsul honorário dos Estados Unidos, começa a desenvolver
um negócio de extracção de sal em Pedra de Lume, na Ilha do Sal. A salina
natural situa-se no interior dum vulcão extinto.
☻De recordar que, em
meados do séc. XIX, na zona do Pigiguiti, houve, não só, o Fortim Nozolini,
assim com o Cais Nozolini, este, mais para Este ficava, sensivelmente, onde
hojese encontra a última ponte que, há poucos anos, foi construída em Bissau.
Quanto a Aurélia
Corrêa, deparamos231 com a referência ao "Concerto na Lancha
Aurelia Corrêa e concerto da ancora e do bote'' no valor de duzentos e três
mil reis e quatrocentose cinquenta e oito tostões (203$458).
No ano seguinte,
encontramos232, iguahnente, na relaçãodos ·'Vapores e lanchas de
vela' '. referência à dita lancha.
Na realidade, Júlia da
Silva Cardoso, Aurélia Correia e CaetanoJosé Nosolini deixaram os seus nomes
ligados à Guiné
Cerca de 1.820
politicamente influentes Julia da Silva Cardoso da Guiné-Bissau
A esposa do governador
Joaquim Antonio de Matros da Guiné Buissau, ela segurou status elevado na
sociedade local, decorrente de um estatuto especial a partir de suas raízes
Bijagós, e ela também pode reivindicar autoridade de seu fundo Bissau em
relação ao Pepel vizinho, em uma ocasião , quando o Pepel ameaçou attaca a
liquidação Bissau: ". esposa do governador foi enviado para os Papels, as
conferências que ela realizadas com o rei D. José" em outra occation disseram
as fontes: "a doação da ilha de Gallinhas à Coroa Português em 1830 foi
muito influenciado pelo parceiro de Mattos ', descendente da Bijagós e com quem
teve filhos, uma pessoa muito respeitada, Julia da Silva Cardoso. "Não só
ela foi fundamental na negociação da concessão de direitos de assentamentos
para a ilha de Gallinhas, ela também tinha realizado o mesmo serviço dois anos
antes em relação à ilha de Bolama. Os dois tratados foram ambos feitos com uma
olono (rei) de Kanabak (Roxa), Damião, que, na verdade, "doado" a
ilha para De Mattes. Ela era a tia da Reinando Okinka Aurélia Correia da ilha
de Orango Grande (circa 1830-1874 / 1879).
231Na pág. 299 do B.
Official n.º 22 da Guiné, de 28.05.1910.
232No Boletim Oficial n.º
2 da Guiné, de 14.01.1911.
☻ Em 1850, o Gabú, que
perdera o mito da invencibilidade, sofre com as incursões peuls, com as
sublevações dos muçulmanos e com a implantação cada vez mais forte dos europeus
na Senegâmbia.Kansala já não controlava, por exemplo, as províncias do rio
Geba, na actual Guiné-Bissau, nem as vias para Cacheu e Farim. O reino era
ainda grande, mas encontrava-se dividido pelas guerras e minado por dentro, não
pelo peul mas pelo muçulmano malinké, aliado natural do Fouta.
Do
seu lado, as provínicas malinkés da margem Norte do rio Gambia separaramse do
Gabounké, embora sendo consideradas territórios de Tiramaghan34. Assim, nos
séculos XVII e XVIII, os reinos do Badibou, do Niani e do Wouli teriam uma
grande autonomia.
Por volta de 1850, os
franceses tinham conseguido tornar Sédhiou uma praça comercial mais importante
do que as de Ziguinchor e de Cacheu, controladas pelosportugueses, mas a
influência portuguesa estava ainda bem presente sob forma do crioulo: «En 1849,
le nouveau résident Emmanuel
Bertrand-Bocandé nous a laissé de fort riches Notes sur la Guinée
Portugaise ou Sénégambie méridionale. Ayant appris le créole portugais et
le malinké, il avait une grande expérience des pays mandingues»36. Ou seja, as
duas línguas francas nos territórios mandingas eram o malinké, naturalmente, e
o crioulo do Português.
A desagregação lenta do
reino do Gabú foi explorada pelos franceses que, a pouco e pouco, foram
considerando território seu, áreas da Casamansa (Boudhié em 1849, seguida das
aldeias de Patiabor, Bajari e Bunu), não sem resistências locais: soninkés, primeiro, e balantas, depois,
opuseram forte resistência às forças muçulmanas aliadas dos franceses.
Chuvas fracas e escassez de colheitas nas ilhas do barlavento
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