1844/08/23
Nomeação do tenente JOSÉ XAVIER CRATO no cargo de governador de Cacheu.
JOSÉ XAVIER GRATO, Tenente da Guarnição da província de Cabo Verde (1854), Governador da Praça de Cacheu (1846). Casou com D. Henriqueta Maria da Conceição dos Santos e tiveram: ANTÓNIO XAVIER GRATO, nascido em 1849 em Cacheu (Guiné).
1844/09/11
«Em 11 de setembro de 1844 declarou-se guerra á Praça de Bissau, devido a uma imprudencia do patrão-mor (1), que, por ser novo alli, ignorava os costumes do pais.
Entrara, naquelle dia, em casa do patrão-mór um rei gentio da tribu Papel, que lhe pediu um copo de aguardente, que, pelo uso da terra, nunca se negava aos reis. O patrão-mor não só lh'o negou como o expulsou da sua casa, causando isto um certo barulho entre os pretos, que dirigiram insultos ao dono da casa; este dirigiu-se ao governador, o tenente-coronel graduado Aloïs R. Dziesaski, a quem se queixou do rei, pelo crime commettido de aquelle lhe ter pedido um copo de aguardente. Peior andou o governador; mandou prender o régulo, por uma escolta, oppondo-se, que a prisão se realizasse, um gentio d'essa tribu, que, querendo maltratar a escolta, foi morto pelos soldados, passando-o á bai neta.
Seguiram-se represalias da parte dos gentios, que logo mataram fora da Praça dois homens que encontraram em sítios differentes; degolaram, dentro da Praça, um marinheiro europeu, que estava doente e de cama; deixaram por morto o enfermeiro; invadiram a casa de um negociante hespanhol, mataram um carpioteiro e saquearam o estabelecimento. O mesmo fizeram a mais duas casas que distavam da fortalrza de 10 a 15 braças. Até aqui nem uma só providencia tinha dado o governador.
Dispunham-se os gentios a atacar a casa de João Marques de Barros, quando então o governador accordou, mandando tocar a postos; esta casa foi defendida por soldados e 97 homens, quasi todos escravos, que o mesmo Barros mandara armar: assim mesmo sete vezes foi atacada, sendo sempre repellidos os atacantes, mas num dos àtaqnes a casa soffreu grandes prejuízos pelo fogo, á metralha, qce a fortaleza fazia.
Retirando-se o gentio das proximidades da Praça, vinham depois, de emboscada, aos grupos de 10 e 12, atacar os habitantes, ferindo e matando alguns que corajosamente se defendiam.
A pouca defeza da Praça, por falta de soldados e de polvora e balas, levaram os negociantes a pedir ao governador que, não os podendo soccorrer, solicitasse auxílio da Gambia e Goré. Annuiu o governador ao pedido depois de assinada uma representação pelos impetrantes.
Cumprida essa formalidade, afretou o governador a barca americana Emogene por 300 patacas (288$000 réis), que seguiu· para Gambia em 18 de setembro.
Emquanto isto se passava, a noticia da guerra espalhava-se por toda a Guiné e os gentios de Geba aproveitavavam a occasião para cortarem as comunicações com Bissau, que por causa de imprudencias do governador de Geba, João Monteiro de Macedo, e devido á inexperiencia, pouca edade e falta de princípios, os hostilisava. Durante tres mezes esteve interrompida essa communicação, até que o governador planeou com o negociante Caetano José Nozolini uma paz vergonhosa, mandando no brigue escuna Fortuna, d'este negociante, um carregamento de géneros para o commercio d'aquelle ponto.
O fim ostensivo da ida d'este navio era a abertura do rio, para a qual tambem o negociante Barros concorreu com 300 patacas.
Com géneros e dinheiro a paz effectuou-se sem maiores difficuldades.
De soccorros pedidos para Goré e Gambia, o primeiro navio que chegou a Bissau foi a corveta franceza l' Eglantine, a 4 de outubro, sahida de Goré sob o commando do capitão de corveta Baudin, commandante da estação das costas occidentaes de Africa.
Num relatorio d’este official francês, datado de 1 de novembro de 1844, dirigido ao ministro da marinha em França, e por este .dirigido ao ministro porluguez dos negocios estrangeiros, temos conhecimento dos relevantes serviços prestados por esse navio.
A esse tempo também se tinham revoltado os grumetes contra a Praça; nem podia deixar de ser assim, depois do triste exemplo havido de se conseguir uma paz vergonhosa com os gentios do Geba, celebrada a troco de géneros embora á custa dos negociantes.
O comandante Baudin, informado pelo governador do motirn das hostilidades, declarou a este que não se julgava com direito de intervir com armas numa questão desta ordem mas que offerecia o seu navio como asylo de protecção aos negociantes estabelecidos fora da fortaleza no caso de um ataque geral, porque a maneira de combater dos Papeis, aos grupos de dois e tres, escondidos e que atiravam para aquelles que se afastavam da Praça, não lhe parecia que offerecesse perigo e que podesse inquietar os habilantes.
O maior perigo era dos grumetes que viviam junto da Praça e que começavam a abandonar a sua povoação, enviando as mulheres e filhos para o interior da ilha. Deram, juntamente com os Papeis, ataque á Praça , sendo repellidos. O fim dos grumetes era a pilhagem, e como o commandante Baudin reflectisse no caso, reconhecendo a necessidade de auxiliar o governador, aconselhou a este a destruição da povoação dos grumetes, para a qual, era inútil o fogo da artilharia, por ser um abrigo para estes inimigos que estavam alli emboscados.
O commandante Baudin desembarcou uma parte da guarnição do seu navio que, com os soldados e comerciantes, incendiaram a povoação, tendo previamente collocado uma linha de atiradores e mudado a amarração da l' Eglantine para mais proximo da terra. Os grumetes avançaram em grande numerô até as planícies de Bandim, não proseguindo mais na marcha por causa do aturado fogo de artilharia da Praça e da corveta.
Passou-se depois á destruição das paredes qas casas, empregando-se neste serviço proximamente 200 escravos dos negociantes, todos armados com espingardas, e ainda protegidos pe!as forças de terra e mar.
Apesar d'isso os grumetes davam ataque todos os dias, alvejando os trabalhadores e soldados, ferindo uns quinze d'estes; não ousaram, porem, com receio de represalias dos francezes, atirar sobre os marinheiros, ficando no entanto um ferido.
Quando estavam nestes trabalhos apareceu, a 12 de outubro, o brigue inglês Alert, promettendo o commandante demorar-se ali dez dias, tempo necessário para a demolição dos muros, retirando-se a corveta francesa no dia 16 de outubro para Goré.
O certo é que os grumetes, animados pelo terror que os negociantes pareciam ter da guerra com os Papeis, e levados tambem por sua má índole, conceberam o projecto de se revoltare, aproveitando uma noite escura, atacaram e roubaram duas casas cujos donos degolaram; os negociantes, desconfiados de qualquer traição d'estes bandidos, fizeram barricadas.
Os negociantes não podiam resistir muito tempo ás fadigas d'uma vigilância e inquietação continua e nem podiam contar com a cooperação de seus escravos, a quem o engoda da liberdade e do roubo os poderia também tornar rebeldes, e por isso foi indispensavel soccorro pedido aos governos francês e inglês.
Informou, porem, João Marques de Barros que a corveta franceza fizera bons serviços, pondo gente em terra par auxiliar em dois ataques, mas que depois deixou de o fazer, porque o gentio batia-se a coberto das casas e que os negociantes estavam entregues aos seus proprios recursos, defendidos por seus escravos e por outros gentios, aos quaes pagavam, havendo mortos de parte a parte em diversos encontros, ficando sempre vencedores os nossos.
Lamentava o estado critico de tão poucos defensores, apesar do gentio aggressor ser apenas um por cem da sua gente, devido isso ás colheitas que se faziam nessa época, mas que terminadas ellas cahiriam todos sobre Bissau, que só resistiria se a sua guarnição fosse maior, como noutros tempos, de 400 homens; sendo até provável que .taes hostilidades não houvesse, porque então o gentio teria medo, o que agora não acontecia vendo só 80 homens, numero pequeníssimo para fazer frente a mais de 20:000 almas.
Em outra carta, de 22 de novembro, do mesmo Marques de Barros, deu noticia de Bissau estar sitiada pelos grumetes e gentios, havendo ataques quasi todos os dias; muitos gentios, de outras castas, vinham auxilia-los; recebiam armas e com estas-se retiravam .em paga do serviço prestado por alguns dias.
Das 80 praças da fortaleza apenas umas 60 estavam promptas ou disponíveis para acudir ao bluarte e que apenas havia 30 peças quando deviam ser 52.
Refere-se ao auxilio prestado por uma corveta americana do norte, na collocaçào de uma grande estacaria dos lados accessíveis ao inimigo para assaltar as casas dos negociantes, a qual servia ao mesmo tempo para impedir que invadisse a Praça.
Ali também eslava o brigue Victorioso, armado com seis peças, que poucos serviços prestou por ter adoecido a equipagem e vér-se forçado a sair do porto.
Em Bissau foram geraes os clamores por não ter chegado soccorros de Cabo Verde, havendo alli a certeza, por uma carta escrita da Gambia, de que o Governador Geral não ignorava os acontecimentos. O Governador Geral mandou a escuna Tarrafal com 30 soldados de reforço mais tarde.
Insurgiu-se Marques de Barros contra o facto do governador Dziesaski não se utilizar dos serviços de um negociante de Geba, que veio em soccorro de Bissau com 14 homens armados; estes foram então entregues ao negociante Nozolini e aquelle recolheu-se a Geba.
O negociantes pagavam os enterros, dos mortos em combate, ao capelão da tropa e tambem á sua custa tratavam do curativo dos feridos. O governador não eslava disposto a fazer despesas com uma guerra que, se não foi provocada pelo governo ou pelas suas autoridades, todavia não soube esse governo evitá-la, e para isso bastava ordenar que o regulo fosse posto em liberdade.
Não defendiam só o que era d'elles; defendiam a propriedade nacional, o nome, a honra, a dignidade do país e a integridade do território , serviços estes feitos com sacrifício de vidas, derramamento de sangue e dispêndio de fortunas.
No ataque de 21 de novembro houve sete feridos, sendo tres mortalmenle.
Em outra carta, de 20 de dezembro, descreveu como se fez a paz com o gentio, celebrada na vespera desse dia, com grande alegria para todos, gentios
e negociantes; numa das condições d'essa paz refere-se aos grumetês, que ficaram desligados da Praça e considerados como inimigos.
Nesta guerra dispendaram: Marques de Barros 4:000 pesos e Caetano Nozolini uns 8:000 pesos.
Tinha Marques de Barros num estaleiro de Bissau uma escuna em construcção e, para que os rebeldes não a queimassem, montou nella uma peça e com escravos armados, defendeu-a.
A corveta americana Preble prestou relevantes serviços em Bissau, sustentando fogo durante 18 dias; retirou-se com 40 doentes victimas de febres, elevando-se esse numero em Cabo Yerde a 90, succumbindo 13, incluindo dois officiaes.
Em 9 de janeiro de 1845 ancorou na praia o brigue Vouga, sob o comando do capitão-tenente Carlos Craveiro Lopes; seguiu para Bissau, em vista de instrucções qne recebera em Lisboa e do Governador Geral.
A escuna Cabo Verde, sob o commando do 2.º tenente Vicente Rodrigues Ganhado, tinha recebido instrucções, em 13 de janeiro, do Governador Geral para seguir até Bissau, em soccorro da Praça, onde chegou a 26.
Em Bissau teve uma conferencia com o governador sobre os grumetes que continuavam rebeldes e que no rio, com suas canoas, causavam os maiores prejuizos aos negociantes, atacando e roubando embarcações carregadas de generos e fazendas, decidindo-se esperar pelo brigue de guerra Vouga, por não ter a escuna gente sufficiente para um desembarque no porto de Bandim, onde os grumetes tinham duas canoas e não dispor senão de duas caronadas de pequeno calibre.
Empregou a sua tripulação, auxiliada por 5 soldados e um cabo, que lhe forneceu o governador, em ronda ao porto de Bandim com escaleres do navio; para este serviço offereceu-lhe o negociante Caetano Nozolini duas peça de calibre quatro e doze pistollas. Por differenttes vezes teve que entrar em fogo contra os grumetes, evitando assim que eses navegassem no rio.
No dia 1 de fevereiro ancorou no porto o brigue Vouga, que era esperado para, com a gente que podesse desembarcar, dar um ataque aos grumetes por lerra. Constando, porem, ao governador que os gentios se alliariam aos grumetes, consultou-se o Governador Geral se conviria nova indisposição com os gentios, sahindo para Cabo Verde a escuna desse nome com a correspondencia.
Corno não concordasse este governador com a offensiva, armou-se uma boa lancha em guerra, com uma caronada da escuna Cabo Verde, qúe ficou a policiar o rio.
O rei de Antim, de nome Sangu, como medianeiro dos grumetes, acompanhado do negociante João Marques de Barros, foi á presença do governador sollicilar perdão para os referidos grumetes, que se sujeitaram ás condições· impostas por este.
As hostilidadés, em Bissau, dos gentios e grumetes mereceram critica do official da armada, Antonio Maria Correia da Silva Leote, estacionado em Bissau, que attribuiu a causa d'essa guerra á desintelligencia entre os negociantes pela ambição do negocio, os quaes punham em acção, quando queriam, os grumetes e, os mesmos gentios, com quem negociavam em armamento e polvora.
«Que havia nesta Praça, dizia este official, dois negociantes poderosos, principalmente Caetano José Nozolini, que andavam em desintelligencia e que queriam absorver o negocio todo; para isso tinham em dependencia os pequenos negociantes, e até os mesmos officiaes da Praça, inclusive o governador, pois todos comiam em casa d'elle; assim faziam o que élles queriam e nem se intromettiam nas prepotencias que praticavam».
A bordo do brigue Vouga apresentou-se ao commandante o capitão de uma escuna americana a queixar-se do governador por este não o atender quando accusou o negociante Nozolini, que se negara a pagar-lhe um carregamento que lhe tomou; o mesmo tinha feito com outros navios que frequentavam Bissau.
Sobre os acontecimentos que ficam narrados informou o governador em 4 de novembro de 1844 que as tribus do Antim e Antulla, reforçadas pelos grumetes, romperam hostilidades contra a Praça de S. José de Bissau. Que o regulo de Antim commetteu excessos em casas do patrão-mor de Bissau, que lhe pediu protecção contra as demasias do régulo; então ordenou que lh'o levassem preso á Praça, o que se effectuou, mas os gentios de Antulla e grumetes que se achavam na feira pretenderam soltá-lo, e neste intuito um dos gentios se approximou de um soldado da escolta para lhe descarregar uma cutilada, que este evitou atravessando com a bayoneta o aggressor, que minutos depois morria; então fugiram os gentios e o régulo foi conduzido á Praça, onde ficou em refens por se conhecer que os gentios e grumetes iam fazer guerra. E com effeito poucas horas depois começaram as hostilidades, matando barbaramente um homem, natural de Cabo Verde ; roubaram as casas dos negociantes que estavam em boas relações com a Praça.
Não podia deixar de haver represalias da parte da Praça, que arrasou as casas dos grumetes, das quaes se serviam os inimigos para, a coberto d"ellas, hostilizarem os defensores da mesma Praça.
Vendo que os ataques dos gentios eram successivos pediu soccorros á Gambia e Goré, que mandaram um brigue e com o auxilio do qual os negociantes começaram uma estacaria, ou tabanca (palissada) para os proteger.
O Governador Geral recebeu participação d'esta guerra no dia 2 de novembro, dalada de 15 de outubro, e em 3 reuniu o Conselho do Governo para se occupar d'este assunto, em vi sta do que determinou:
Art. 1º Que fosse declarada a Praça de S. José de Bissau em estado de guerra aberta com as tribus dos gentios Papeis da ilha de Bissau, conhecidas pela denominação de Antim e Antulla, e com os grúmetes da mesma.
Art. 2.º Que em virtude da disposição do artigo antecedente deverão seguir viagem de Villa da Praia para a referida Praça de Bissau, na primeira embarcação que houver, ou seja do Estado, ou para esse fim exgressamente afretada, por conta da Fazenda Publica, 30 praças de pret, com subalterno do batalbão de artilharia de 1ª linha d'esta província.
Art. 3.º Na mesma occasião se enviarão para abastecimento da Praça todas as munições de guerra que for possivel, tendo-se attenção á requisição que fez o governador da mesma. Em virtude do disposto nos dois artigos antecedentes se afretará para este efleito, por conta da Fazenda Publica, uma embarcação que esteja nas circunstancias de satisfazer a este serviço; medida que é indispensável tomar em consequencia de actualmente não haver ao serviço d'esta provincia embarcação alguma.
Art. 5. º Pela mesma forma é autorizada a Commissão de Fazenda de Bissau, para fazer qualquer despesa exextraordinária, ou seja para sustentar a .guerra ou para conseguir a paz; seguindo para isso o governador da Praça o que lhe está determinado no artigo 12.º das suas lnstrucções de 12 de abril do corrente anno.
Art. 6.º Quando pela saída das forças de que trata o artigo 2,° da presente portaria se ressinta o serviço da guarnição de Villa da Praia, e seja por isso indispensável ordenar que alguma força, dos batalhões de 2.ª linha da mesma villa, auxilie esse serviço até segunda ordem, o Governador Geral da provincia os convocará por meio de uma Portaria, vencendo as praças de pret assim empregadas o pret que a lei lhes marca, segundo as disposições em vigor.
Art. 7 .º Logo que chegue á provincia a embarcação de guerra que deve cruzar nestes mares, o Governador Geral mandará sair para Bissau, se assim o julgar conveniente, ou necessario para manter em respeito os gentios da ilha.
Art. 8.º O governador de Bissau prestará todo o auxilio, com a guarnição da Praça que governa, para se levar a effeito e ultimar a palissada que os negociantes alli residentes se propuseram a fazer, e já se acha começada.
Art. 9.º Logo que estiver fechada a referida palissada o governador de Bissau não consentirá que os gentios ou grumetes façam dentro d'ella construção de qualidade alguma, o que somente será concedido aus portuguezes, devendo comtudo estas construcções serem feitas com previa licença do mesmo governador, que a não concederá senão em virtude de um plano, pelo qual não só a Praça fique sempre desalfrontada e abe rta de qualquer hostilidade, mas que possa proteger as dilas construcções e obstar a qualquer insulto dos gentios.
Quartel General do Governo da Provincia na ilha Brava, 3 de novembro de 1814.-(a) Francisco de P. Bastos, brigadeiro governador geral.
O Governador Geral, na mesma data (3 de novembro), officiou ao governador de Bissau approvando as medidas por elle tomadas quanto á prisão do régulo e requisição de auxilio á Gambia e Goré e á palissada construida pelos negociantes, devendo dar todo o auxilio a estes com os soldados. Essa palissada ligou o baluarte da Balança com o mar.
Quanto a informação do governador de Bissau, que esta Praça estava mal armada, falta de munições e ter pouca força para se defender, respondeu-lhe o Governador Geral que acreditaria nisso se em abril não tives se ido a essa Praça, onde deixou um destacamento bem disciplinado, bem armado e fardado, e commandado por bons ofilciacs; que a Praça ficara em estado de defesa, porque tinha 22 boccas tle fogo promptas e as necessarias munições de guerra, e assim que chegou á província mandou para alli reparos e outros objectos que faltavam.
Attendendo, porem, que a guerra podia prolongar-se, mandou-lhe algum material, como soquetes, marrões, velas mixtas, lanternetas, pyramides, ballas, cartuchos emlrnllados (4:000), espoletas para granadas de obuz, etc.
Na mesma data o Governador Geral, em outro officio, recommendava ao de Bissau que, havendo de se fazer a paz, que procurasse alcançá-la nas condições mais vantajosas para a honra e dignidade nacional; que os poucos recursos de que a provincia podia dispor, para castigar efficazmente esses selvagens, não impediam que a Praça os hostilisasse emquanlo não se snbmettessem, concedendo-lhes a paz se a pedissem com submissão; todavia devia esse governador aproveitar a influencia que alli tinham, nessas tribas, Caetano José Nozolini e seu sobrinho, João de Barros, José Tavares de Almeida e Canuto, afim de chamarem os inimigos á pacificação; que ao fazer-se a paz, empregasse diligencias para que os gentios desistissem, de boje para o futuro, de qualquer dacha ou presente dos governadore.s da Praça, aproveitando a opporlunidade de se acbar preso o régulo para fazer taes negociações.
No dia 7 de outubro sahiram 40 homens da tropa com 30 marinheiros do brigue francês l'Eglantine, para a povoação dos grumetes afim de tirarem o alinhamento da palissada.
Em 8 sahiram outra vez para a palissada e do sitio do cemiterio, junto ao Pigiguiti, protegidos pelas cubatas, deram os grumetes uma descarga, ficando alguns soldados feridos, e como fosse impossível desalojá-los, incendiou-se-lhes as casas; o tiroteio continuava sem cessar, e no dia 10 foram feridos dois soldados e um marinheiro francês.
A 13 entrou o brigne inglés Alert, commandante Bosanquet.
Até este diâ 13, que houve sempre combates, ficaram feridos o tenente Francisco A. de Azevedo e 6 soldados, havendo 10 doentes com febres ; ficaram ao serviço 50 homens.
Em 23 de novembro de 1844 deu o governo de Bissau noticias ao de Cabo Verde do estado d'essa Praça que a contar de 14 d'este mês continuavam as hostilidades sendo o inimigo repellido.
Até essa data havia, entre mortos e feridos dos nossos soldados e paisanos 31 homens e do inimigo sabia-se que o numero de mortos era de 50; A 26 de outubro saiu do porto o brigue de guerra inglês Alert, que muita falta foz para a conslrncção . da tabanca que se fazia debaixo de vivo fogo.
Nesse dia chegara de Cacheu Honorio Pereira Barreto com 54 homens seus, armados, offerecendo-se ao governador Dziezaski, como medianeiro, para fazer a paz entre a Praça e gentios. Acceitou esse offerecimento de acordo com os negociantes, sendo as condições exigidas em 27 d'este mês as seguintes:
1. ª Não farão obstaculo algum a que se finalize a palissada a que já se tem dado principio, a qual ficará somente com uma porta da parte do Pigiguiti por onde podem entrar todos que vierem commerciar a esta Praça.
2.ª Que nenhum gentio, ou seja quem for, entrará dentro da palissada armada, e todo aquelle que transgredir esta ordem será castigado.
3.ª Pela parle do norte no sitio denominado Roxa não consentirá que sejam habitadas as casas por pessoa alguma, assim como da pallissada a 50 passos não se construirão casas; lambem serão demolidas as casas que ainda existem, no referido sitio da Roxa e cortadas as arvores que rodeiam os dois baluartes da Balança e Onça.
4.ª Os intitulados grumetes que eram sujeitos á Praça, d'hoje em diante ficam tratados como gentios; o governo não tem nada com elles, poderão fazer a sua habitação na Baloba, ou em Bandim, onde muito bem quiserem, devendo elles fazer sciente ao governador se ficam sujeitos ao régulo de Antim, ou se vão formar a sua povoação á parte e nomear o seu chefe; porem emquanto isto não acontecer, entrarão na paz como gentio.
5.ª Estes grumetes poderão !ervir na Praça de remadores se os negociantes os mandarem chamar para este fim, poderão entrar na tabanca e saírem d'ella quando quiserem, com tanto que não sejam aamados: porem ao toque de recolher tudo ficará fora da tabanca.
6.ª Visto haver em Antim seis reis, o governador escolherá de entre elles um, que a Praça recõnhecerá comô primeiro rei de Antim, assim como de Bandim e Antula podem vir á Praça quando quiserem, porem nunca trarão comsigo mais de oito pessoas, e todas ellas, inclusive o rei, entrarão desarmadas para dentro da tabanca.
7.ª A feira será feita dentro da tabanca; as mulheres que vierem ao mercado não serão offendidas por pessoa alguma assim como os homens, e, quando o sejam, o governador fará castigar as pessoas que os offenderam.
8.ª Qualquer desordem que houver dentro da tabanca, o offendido irá logo queixar-se ao governador e este fará castigar o motor della rigorosamente.
9.ª Será restituído tudo quanto a Praça apprehender pertencente aos gentios e grumetes, porem os gentios e grumetes restituirão tudo quanto roubaram nas casas de Dom Victor, Roballo, Catarina Gomes, Clara Correia, e Raposo.
10.ª Todos aquelles grumetes que por medo de seus maiores se retiraram para o gentio, querendo voltar para a Praça e morar dentro da palissada, poderão vir apresentar-se ao governador com um fiador capaz, e este o fará prestar um juramento em como será sempre para o diante fiel á bandeira portugueza.
11.ª Devem entrar na paz todos os balantas que vieram proteger a Praça, que vem a ser; Cumeré, Oco, Rncutú, Chugué, Bindouro, Baura; Data, e Tambassini; a mesma paz que se tratar com a Praça tambem será boa para os ditos balaotas = A. R. Dziezaski, governador interino.
No dia 28, acompanhado por João Gomes Barbosa Junior, embarcou Honorio Barreto para o porto de Bandim a fim de propôr ao respectivo regulo as condicções da paz as quaes foram unanimente regeitadas por não concordarem com a construcção da tabanca ; porque queriam occupar a sua antiga povoação e porque exigiam a expulsão de Bissau do tenente-coronel Caetano José Nozolini e de toda a sua familia.
Vendo Honorio Barreto a impossibilidade de se levar a bom termo negociações que seriam de utilidade para os negociantes e para a Praça, lembrou-se de propôr-lhes um armisticio até chegar a decisão do Governador Geral a quem se ta consultar, acceitando gentios e grumetes no dia 29 de outubro essa proposta. No dia 5 de novembru entrou no porto a corveta Americana de guerra Preble, commandante T. W. Freclom, que o commodóro, recebendo noticias da guerra de Bissau, mandou da villa da Praia para proteger os negociantes por motivos de interesses que tinham os dos Estados Unidos nesta Praça. No dia 6 os escravos, que os negociantes armaram, vendo a chegada d'este navio de guerra e contando com a sua protecção, pegaram em armas e sairam a campo, querendo assim romper o armistício; os seus senhores empregaram todos os meios de persuasão para que désistissem de novas hostilidades; nada conseguiram e até sendo representado ao governador que, se as hostilidades continuassem suspensas, ·haveria uma grande deserção de soldados e escravos para o inimigo e que combateriam a Praça; viu-se então obriado o governador a romper o referido armísticio.
Contristado communicou Honorio Barreto essa resolução aos régulos gentios, e, como não pudesse concluir a paz, seguiu no dia 7 para Cacheu.
O fim de Honorio Barreto era santo, acabar com uma guerra que só prejudicava ao commercio local; nem por isso deixaram alguns da Praça, a quem mais interessava essa guerra, de querer manchar esse honrado portugllês por tentar conseguir uma paz que fosse tambem favoravel aos gentios ; a Guiné devia os maiores e melhores serviços a Honorio Barreto, como vamos ver do seguinte officio que dirigiu ao governador, por intermedio do secretario interino de Bissau João Gomes Barbosa Junior em 7 de novembro de ·1844.
Vou hoje ter a honra de dar a V. S. ª uma exacta conta da comissão de que me incumbi com previa licença de V. S.ª.
Em Cacheu ouvi com pesar a noticia da guerra que havia entre esta Praça e os gentios limitrophes, circunstancias, que não referirei, me fizeram sair d'alli no dia vinte e quatro do passado com tenção de ver se podia fazer a paz tão desejada, uma vez que fosse honrosa para a Praça . No ·dia 26 fundeei no porto de Bandim e expedi uma das canoas que trouxe de Cacheu para sollicitar de V. S.ª a permissão de interferir nesta guerra como medianeiro da paz; V. S.ª teve a condescendencia de me conceder a faculdade que implorei. Desembarquei então, só então, em Bandim e fiz com que os gentios e grumetes a elles alliados suspendessem as hostilidades que de facto estavam sustadas desde o dia 18.
Passei a esta Praça e entreguei, em mão propria, a V. S.ª o meu officio do mesmo 26, em que lhe communicava o resultado da minha primeira negociação, e pedia ao mesmo tempo me dissesse quaes eram as condições que V. S.ª exigia para conceder a paz. V. S. ª em seu officio de 27 me remetteu essas condições. No dia 28 parti para Bamlim, acompanhado pelo secretario d'este governo João Gomes Barbosa Junior e por Manuel Correia. Depois de expôr as causas da guerra e o procedimento dos inimigos, e o d'esta Praça, li as condições que V.S. ª me enviou, explicando-lhes no dialecto do pais; infelizmente foram regeitadas, depois de longa discussão. D'isso participei a V. S. ª em meu officio do mesmo dia, dizendo-lhe que os gentios tinham muito interesse na causa dos grumetes, e que todos pediram que se findasse o armisticio.
V. S. ª, julgo eu, tinha resolvido começar novas hostilidades, quando me lembrei de propôr a continuação do armisticio até chegar as ordens de Sua Ex.ª o governador geral da provincia; eu fiz tal proposta vocalmente a V. S.ª, que por seu officio de 29 me autorizou a faze-la aos gentios. Nesse mesmo dia fui a Bandim levando em minha companhia as mesmas pessoas acima nomeadas, e tive a satisfação de obter a continuação do armislicfo na conformidade das ordens de V. S.ª, o que lhe participei em meu officio d' esse dia.
No dia 31 pessoalmente entreguei a V. S.ª um officio d'aquella data em que eu lhe rogava me autorizasse a negociar a paz sob as condições que eu jμlgasse mais vantajosas para a Praça, ficando o tratado que eu fizesse dependente da approvação de V. S.ª.
Depois de V. S. ª ter-me feito algumas observações sobre as condições que exigia para paz, me concedeu a licença pedida. No primeiro deste fui de novo a Bandim e aqui propuz a condição ordenada por V. S.ª de se fechar a palissada, condição esta sine qua non para a paz; fiz todos os exforços possíveis para obter dos gentios o assentimento, isto na presença de Antonio Joaquim Carvalhal e de Manuel Correia; depois de longa discussão me disse o régulo de Bandim que voltasse eu ahi no dia 4.
Fui no dia aprazado e propuz a mesma condição que foi vivamente debatida, e pela discussão colhi eu que os gentios, vendo que não obtinham concessão alguma da Praça, queriam, com um fingido consentimeuto, ãquella proposta para ver seu régulo solto para depois renovarem a guerra.
A minha franquesa e lea!dade não permitiram que eu occultasse a V. S.ª esta grave circunstancia, e por isso em meu officio de 5 lh'a communiquei, declarando-lhe que se tornava impossível toda a negociação. Declinei então de mim toda a responsabilidade moral que sobre mim pesava de concorrer, como diziam e ainda dizem, para que os gentios fizessem colheita de seu arroz.
V, S.ª me disse para intimar aos gentios que continuaria o armistício até receber ordens do governador geral, a quem já tinham participado o occorrido. Cansado e molestado como então me achava, não pude ir a Bandim porem escrevo para alli communicando-lbes a resolução de V. S.ª. Eu devia ficar nesta a espera da decisão de S. Ex.ª, não era sem sacrifício meu esta demora, mas eu o faria de boa vontade. Hoje porem e torna inútil a minha presença, pois se resolveu começar as hostilidades, e portanto ecusada a minha mediação; e por .isso me retiro para minha casa em Cacheu onde farei sempre votos para que esta Praça alcance uma serie de brilhantes victorias, que reduza o inimigo ás necessidades de acceitar e não de discutir, as condições que então se lhe impuzerem. Estes votos partem d'um coração verdadeiramente patriota, e lealmente português.
Bissau, 7 de novembro de 1844. = Honorio Pereira Barreto.
Inuteis foram os esforços empregados por Honorio Barreto. No dia 10 atacavam os revoltosos a Praça, fazendo fogo sobre os escravos que os negociantes tinham mandado cortar o mato junto ao baluarte da Poana, e nos dias 11 e 12 houve combate entre os mesmos escravos e balantas que os negociantes mandaram vir, a sua custa, sendo estes protegidos pela artilharia da Praça e da corveta de gnerra americana Preble sob o commando de Freclom; os inimigos foram batidos em toda a linha, morrendo dos auxiliares um homem e ficando tres feridos.
Até o dia 22 não appareceu o inimigo e o trabalho da tabanca continuou. Neste dia vieram atacar a Praça durando o fogo desde as seis horas da manhã até as onze; o inimigo foi batido com grandes perdas; dos nossos um soldado ferido e dos auxiliares dois mortos e tres feridos.
No dia seguinte, 23 de novembro, decidiu deixar Bissau o comandante da Preble, por estar a guarnição, incluindo officiaes atacada dé febres e assim ficou Praça sem um navio de guerra para evitar que os grumetes roubassem as embarcações que navegavam no rio.
Esperava o Governador Geral um brigue de guerra para o enviar a Bissau.
Em 25 de novembro renovaram os gentios ataques á Praça especialmente depois da corveta americana Preble deixar as aguas de Bissau.
A 5 de dezembro chegou o reforço de Cabo Verde e o governador mandou logo 20 homens, munidos de machados e terçados, para cortar o resto do mato que faltava, proximo do fosso, e 30 homens para os proteger; apesar d'isso os gentios e grumetes avançaram sobre a Praça e, recolhendo os trabalhadores e a força armada, houve vivo fogo que obrigou o inimigo a retirar-se ao cabo de duas horas com perdas de vidas.
Desde o prirrcipio da guerra os soldados viviam, tanto de dia como de noite, nos baluartes onde se armaram barracas para os abrigar; os quarteis estavam occupados por pessoas doentes.
A frente, do norte da Praça, do baluarte da Balança até ao da Onça, estava defendida por 14 peças de artilharia de maior calibre e por 1 obuz ; o baluarte da Poana com 5 peças e o do pau da Bandeira, o menos exposto por ser protegido pela tabanca ou pallissada, com 6 peças sendo duas de campanha.
Em fins ele novembro a tabanca ficara concluida e estava sendo, sob a direcção de tenente-coronel Nozolini, reforçada com uma parede de taipa á semelhança da que usam os mandingas nas suas fortificações.
No dia 19 de dezembro realizou-se a paz com os regulos de Antim, Bandim e Antulla, por mediação do enviado do rei do rio Grande que se apresentou na Praça, no dia 8 d' esse mês, a sollicità-la, em nome dos gentios mediante as condições anteriormente apresentadas, ficando excluidos d’este tratado os grumetes por não terem apresentado, pela sua parte, intermediarios, a quem chamam grandes, para pedir a paz.
Promettiam os regulos submetter-se a todas as condições; de não se metterem mais com a Praça e nem darem protecção aos grumetes.
A cerimonia da paz realizou-se, segundo o uso do pais, debaixo dos poilões na frente do portão da casa do governo, depois de reunidas alli as autoridades e babitantes de Bissau, acompanhados pelo parocho com suas insígnias, assistindo tambem os nossos alliauos, Beafadas e Balantas; e da parte dos gentios, o fidalgo enviado pelo rei do rio Grande, e por parte de cada um dos regulos grandes, tres fidalgos, com a sacerdotisa da sua seita (Balobeira) com as suas insignias.
Consiste esta cerimonia em beber aguardente que é abençoada com agua benta pdo parocho em uma bacia grande de arame, onde se acham balas de artilharia, de espingarda, plaquetas dos gentios, e polvora como sinal de paz e amisade.
Depois de realizada esta cerimonia mandou o governador soltar o regulo que tinha sido preso, sendo vestido de novo à moda da terra e recebeu de presente vinte e quatro galões de aguardente, salvando-se com 7 tiros ; no dia immediato mandou o governador dar uma salva de 21 tiros em memoria d'esta guerra que durou tres meses e meio.
O.governador geral por portaria de 3 de janeiro de 1845 approvou essa paz que foi feita nas mesmas condições das apresentadas por Honorio Pereira Barreto quando a exigiu aos referidos regulos.
Empregava o governador de Bissau Dziesaski as maiores diligencias para submetter os grumetes; no dia 4 de janeiro de 1845 fundeou no porto a corveta de guerra francesa Grenadier por ter o seu commandante recebido noticias de que se tinha celebrado a paz com os gentios e como faltasse faze-la com os grumetes ia alli para servir de medianeiro entre estes e a Praça. No dia immediato, 5, fundeou o brigue tambem francês Zebre, comandado por MontLeon.
Estava determinado o dia 6 para a entrevista com os grumetes quando, nesse dia, pelas 5 horas da manhã, alguem da parte de fora da pallissada e por uma abertura disparou, à queima roupa, um tiro que logo deixou morto um escravo do negociante Marques de Barros. O governrnador mandou logo fechar a porta da tabanca e todo os homens e mulheres dos gentios que estavam na feira a negociar foram apanhadas, não só para as livrar do furor dos escravos que queriam vingar a morte do seu companheiro como também para obrigar os régulos a entregar o criminoso ; e, por isso, ficou sem efeito a mediação do commandante da corveta, que se retirou no dia 8 do porto, ficando o brigue por mais alguns dias até se restabelecer o socego.
Tanto os gentios como grumetes lavraram o seu protesto contra as falsas accusações de que foram elles os autores d'aquelle assassinato, afirmando os grumetes que tinham a certeza de que o culpado era alguem da Praça.
O facto é que nunca se poude apurar quem tinha sido o autor do assassinato referido.
No dia 14 de janeiro sahiu o brigue Zebre para o rio Nuno.
Para prestar serviços na Guiné durante a guerra saiu em 21 de dezembro de 1844. de Lisboa a escuna Cabo Verde; o Governador Geral enviou essa escuna ás aguas de Bissau em 9 de janeiro de 1845 a fim do governador da Praça conseguir a paz com os grumetes, empregando as necessárias diligencias para os reduzir á obediencia, usando de toda a prudencia para não desafiar de novo a guerra com os gentios; para o mesmo fim saiu de Lisboa o brigue de guerra Vouga que em 23 do referido mês de dezembro seguiu para Bissau.
Chegou a essa Praça a escuna Cabo Verde em 26. O governador da Praça recommendou ao commandante da escuna para que durante a sua demora e emquanto não chegasse o brigue Vouga, que impedisse a navegação dos grumetes no rio e apprehendesse as canoas que entrassem e saíssem do porto de Bandim.
No dia 27 mandou o commandante que um escaler fosse, de noite, reconhecer o referido porto de Bandim, e querendo a guarnição d'esse escaler apoderar-se de uma canoa, fundeada nesse porto, fizeram-lhe os grumetes alguns tiros ficando ferido um marinheiro, respondendo com vivo fogo os marinheiros do escaler que se retirou para bordo sem levar a canoa.
Em 28 requisitou o commandante uma escolta de seis homens para fazerem rondas de noite com marinheiros e no dia 30. a escuna approximou-se de porlo de Bandim e fez alguns tiros de peça a uma lancha dos grumetes que tentava sair, respondendo os grumetes de terra com tiros de fusil.
No dia 1 de fevereiro ancorou no porto o brigue Vouga, e no dia imediato reuniu o governador e os commandantes dos dois navios com Caetano José Nozolini e resolveu-se dar um desembarque em Bandim com a guarnição dos navios e trinta praças da guarnição, para, auxiliados por carpinteiros, quebrarem as canoas; não se realizou este desembarque porque os grumetes, sendo prevenidos, retiraram do porto as melbores canoas e estavam preparauos para se opporem ao desembarque referido. Suspendeu-se, pois, a execução d'este plano.
Com a permanencia dos dois navios de guerra no porto e mostrando-se obedientes os gentios, não dava cuidado a attitude dos grumetes, que viviam no alto de Bandim.
Reinava o maior socego ainda em março de 1845.
Em 16 de fevereiro de 1845 ordenou o Governador Geral ao de Bissau para armar, ímmediatamente, uma canhoneira, de acordo com o comandante do brigue Voúga, uma das embarcações mais proprias que alli houvesse, a qual seria guarnecida com gente de bordo e uma força da Praça, a fim de poder seguir para Cabo Verde esse brigue.
Nas condições da paz com os gentios não se mencionou a obrigação de se pagar qualquer dacha ao regulo de Antim, como era costume, sendo Ondotó o ultimo regulo que a recebia.
Relevantes foram os serviços prestados por Caetano José Nozolini nesta guerra. Este official apenas ella se rompeu chamou 150 balantas e manjacos, aos quaes armou e sustentou à sua custa para a defesa da Praça por todo o tempo que a mesma durou; do seu bolso fez a palissada que cérca o recinto da antiga povoação, o que muito concorreu para aumentar os meios de defesa da Praça, visto que o poço do Pigiguiti, de onde os habitantes se forneciam de agua, ficou dentro d'ella, perdendo os inimigos mais uma occasião de nos hostilizarem quando era preciso a Praça refazer-se d'agua.
Com os mais habitantes concorreu Caetano Nozolini com a sua quota nas despesas da construcção da muralha que se levantou junto á palissada, sendo elle o primeiro a dar o exemplo nisto, como em acarretar pedra e barro para aquella obra, o que excitou todos os outros individuos alli residentes a imitarem o seu exemplo; e a tal ponto chegou o enthusiasmo que suscitou este procedimento, que até as senhoras rivalizaram com os homens, transportando ellas tambem pedra e barro para essa construcção da muralha
(1) Archivo da Direcção Geral do Ultramar, pasta 5.ª- Carta de João Marques de Barros, e outros documentos.» -
Subsidios para a História de Cabo Verde e Guiné, por Christiano José de Senna Barcellos, parte V, pgs. 17-40, Lisboa, 1911
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