1844/10/04
«A intervenção dos
Franceses
Detendo o essencial do comércio legítimo, os
Franceses são os mais rápidos. Os primeiros socorros a chegar (4 de Outubro de 1844)
são, efectivamente, os marinheiros do capitão de corveta Baudin,
comandante da estação das costas da África Ocidental. Deixar-nos-á um relatório
publicado (144), no qual distingue cuidadosamente dois inimigos independentes: os
Papéis, «raça de homens selvagens mas não maus, unicamente
ocupados em cultivar milho miúdo, milho e arroz, e a criar gado para o venderem (145) e
os grumetes «gentes de diversas
nações, todas mais ou menos cristãs, criadas sob a
protecção do forte português ...ladrões, cruéis, e sempre
dispostos a servir-se da faca; muitas vezes fizeram passar os barcos de
cabotagem franceses e ingleses por vexames, tal como os Portugueses, que nunca ousaram
reprimir energicamente os seus excessos»
(146).
Baudin subestima amplamente os efectivos dos Papéis da ilha de Bissau, mas
introduz os grumetes no levantamento. Estes últimos aproveitaram o receio que os
Papéis inspiram aos negociantes para evacuar a sua aldeia para o interior da ilha, antes de se lançarem em
ataques de ratoneiros contra as casas dos comerciantes. Arrastando com eles os
Papéis, foram repelidos muitas vezes. Contrariamente a 1842, existe portanto,
em 1844, aliança militante entre Papéis e grumetes. Baudin recusa intervir
contra os Papéis (guerra colonial regular, a seus olhos)
mas, considerando os grumetes como salteadores, oferece o
seu concurso para os vencer. Aconselha, portanto, que se destrua a
sua aldeia,
demasiado próxima do forte e, a 7 e 8 de Outubro de 1844,
empresta 30 dos seus marinheiros para incendiar as suas choupanas. Bloqueados
pela artilharia do brigue e pelos atiradores, os grumetes não podem
regressar à feitoria. Como os telhados das choupanas impedem os tiros,
são incendiados (como em 1842), e o derrubar das suas paredes enormes exigirá vários dias de «guerrilha urbana»
aos 200 escravos dos moradores e aos soldados portugueses que terão de ripostar, passo a passo, aos grumetes, que
voltaram para defender a sua antiga aldeia.
Ao cabo de onze-doze dias em frente de Bissau, os Franceses retiram (16
de Outubro de 1844), deixando o forte quase totalmente liberto e
em estado de bater a planície a canhão. Segundo Baudin, os negociantes estão em condições de retomar «as suas operações comerciais
suspensas havia já bastante tempo, para grande prejuízo, não só da colónia, mas ainda
do
comércio do Senegal e da Gâmbia...» (147). Temos o sentimento de que este aspecto, estritamente
mercantil, o interessa muito mais que a sorte da colónia.
(144) Baudin [e Anónimo]: «Etablissement portugais de Bissao
(côte occidentale d'Afrique)»: Annales maritimes et
coloniales, 30º ano, 3ª série. Parte não
oficial.
Tomo III, 2ª secção, Revue Coloniale, I845, pp.
143- 148.
(145) Idem, p. 144.
(146) Idem. p.p. 144-145.
(147) Idem, p. 147.»
René Pélissier, História da Guiné Portugueses e Africanos na Senegâmbia
1841-1936, Volume
I, EDITORIAL ESTAMPA, 1997,
p.p. 92-93
O governador interino José Xavier Crato, da Praça de Cacheu e dependencias, em
22 de outubro de 1844, relatou ao Governador-geral o facto gravissimo do modo como estavam os
franceses exercendo a fiscalização no rio de Casamansa.
No sítio de Sejo (Selho) onde os franceses
fizeram uma feitoria, saiu uma canoa de Zeguichor; a duas milhas distante
do forte foi esta canoa atacada por uma outra dos balantas,
por estarem em guerra estas tribus; a canoa d'estes, com alguma gente, foi apprehendida
pela d'aquelles e como a polvora acabasse á gente desta tribu retrocederam a
Selho para compra-la.
O official francês que ali êstava estacionado, partidario
dos
balantas,
quis obrigar a canoa a fundear em frente do forte, negando-se a tripulação a obedecer-lhe; do forte
fizeram fogo sobre a canoa e de terra saiu um lanchão para a tomar, o
que conseguiu. A tripulação foi presa e os prisioneiros balantas foram postos
em liberdade.
Esse officüil francês dirigiu-se ao governador de Cacheu a exigir-lhe uma satisfação que este repelliu,
antes o intimou a soltar os presos.
Era intenção dos franceses expulsar-nos de Casamansa e
para isso indispunham contra nós os balantas que, com suas embarcações, andavam nesse rio exeecendo
pirataria; roubvam fasendas ás embarcações de Zeguichor e a iam vender a Selho.
1844/10/12
«A intervenção dos Britânicos
A rendição naval dos Franceses é garantida por um brigue da Navy vindo (12-13 de Outubro) de Bathurst por urna
dezena de dias (voltará a partir a 26 de Outubro). A sorte dos Portugueses, em 1844, é que
os
Papéis (avaliados então em 20 000 almas na ilha de Bissau),
requisitados pelos trabalhos nos seus arrozais, enviam pouca gente para o cerco. Em
troca, os representantes de outras
etnias vêm, como mercenários, fazer fogo contra as muralhas onde, de uma guarnição de 80 soldados,
nem
50 ou 60
estão disponíveis. Ao ler as fomes portuguesas (148), é claro que o conflito é
triplo: a) os mercadores e a fortaleza contra os insurretos
(grumetes) e os assaltantes (Papéis); b) os comerciantes
contra
os militares de Bissau (Dziezaski) e o governador-geral de Cabo Verde; o
primeiro é acusado de não se empenhar a fundo e de recusar libertar o régulo
papel preso, o segundo, na Praia, de nada fazer; c)
os negociantes, entre si (a facção Nosolini contra a que apoia
João
[Marques] de Barros).
Seja como for, se não se acompanham muito bem as operações, é possível dizer que
elas são intermitentes
e, provavelmente, suspensas a partir de 18 de Outubro. Os Britânicos não
parecem ter participado muito nos combates e retiram. Combateram realmente? Não o sabemos.
(148) Barcellos: op. cit., Parte V,
pp. 28-29.»
René Pélissier, História da Guiné Portugueses e Africanos na Senegâmbia
1841-1936, Volume
I, EDITORIAL ESTAMPA, 1997,
p.93
1844/10/26
«A 26 de Outubro de 1844, Honório Pereira Barreto chega de Cacheu com 54 homens armados.
Oferece-se como mediador entre a praça e, do outro
lado, os grumetes e os Papéis (149). O régulo de Bandim e os grumetes recusam, porque querem proibir a construção
da
tabanca (cerca em paliçada reforçada por um muro de adobe à maneira mandinga). Além disso, os grumetes querem
reocupar a sua aldeia. Todos exigem a
expulsão de
Caetano José Nosolini e de sua família. Chega-se,
no
entanto, a um armistício,
enquanto se espera a resposta da
Praia.»
(149) As principais condições exigidas, a 27 de Outubro de 1844, pelos Portugueses,
para concluir a paz, são as seguintes: a) os trabalhos de construção da estacada não serão entravados; b) nenhum gentio armado
poderá transpor estas cercas; e) uma zona non aedificandi
de 50 m será imposta no exterior das fortificações; d) os
grumetes não mais ali poderão viver. Serão tratados como gentios. Todavia, os que prestarem juramento de fidelidade, poderão trabalhar em Bissau e serão readmitidos. Idem,
pp. 33-34.
René Pélissier, História da Guiné Portugueses e Africanos na Senegâmbia
1841-1936, Volume
I, EDITORIAL ESTAMPA, 1997, p.
94
1844/11/04
Indígenas Papéis, depois de cometerem
vários desacatos, assassinaram
barbaramente quatro pessoas na praça de Bissau, sendo uma delas um marinheiro
europeu. Uma escolta prendeu o régulo de Intim por ordem do Governador,
tendo conseguido desalojar o gentio para fora da paliçada.
1844/11/05
«Apresenta-se então (5 de Novembro de 1844), diante de Bissau, a corveta
americana do comandante T. W. Freelon (150). Vem defender os moradores, representando
os
interesses americanos. O governador «polaco» parece ter empolado
o valor dos bens americanos (50 000-60 000 dólares), adiantados aos moradores, para incitar o
comandante
Freelon a ficar. O
principal agente dos Americanos não é senão Caetano José Nosolini, o que explica muitas coisas (151). Segundo parece, este esforço inesperado volta a insuflar coragem entre os sitiados. Os seus escravos
querem (?) pegar novamente em armas. Mais verosimilmente,
são
os
comerciantes que levam o governador a suspender o armistício concluído por Honório
Pereira Barreto. Mais ou menos desautorizado,
este retira-se (7 de Novembro de 1844) para Cacheu, o que, incidentemente, dá a entender: a) que o super-patriota não o era ao ponto
de colocar o seu patriotismo antes do seu amor-próprio de negociador ferido; ou que, não estava tão
ameaçado como isso.
(150) Por ordem do comodoro Matthew Perry (o
comandante da esquadra americana que impôs ao Japão a abertura ao comércio estrangeiro), de que o African Squadron, com base na Praia desde
1843, tem a seu cargo reprimir o tráfico americano de escravos.
(151) O comércio americano virá em segundo lugar,
em Bissau, depois do francês, no começo dos anos 50. George E. Brooks, Jr: Yankee
Traders. Old Coasters & African Middlemen. Boston, 1970, pp. 196-197. Segundo George E.
Brooks, se Freelon teve, realmente, 40 marinheiros doentes, nenhuma menção é feita quanto a mortes na tripulação.»
René Pélissier, História da Guiné Portugueses e Africanos na Senegâmbia
1841-1936, Volume
I, EDITORIAL ESTAMPA, 1997,
p.p. 94-05
1844/11/09
Começa a guerra entre
os portugueses e o povo de Bissau (papéis e
grumetes) (11/09).
-
O govemador de BISSAU é obrigado apedir auxílio aos govemadoresde Cabo Verde, Gâmbia
e Gorée (18/09).
-
Vinda em socorro dos portugueses, chega a Bissau a corvetafrancesa ÉglantIne
(04/10).
-
Os portugueses, auxiliados pelos franceses, atacam o bairro dosgrumetes, m
Bandim.Os portugueses iniciam a construção de uma paliçada, para protegera povoação de
Bissau contra o ataque das forças guineenses(outubro).
-
Chega a Bissau o brigue inglês Alert (13/10).
-
Na sequência da chegada do barco de guerra inglês, a corveta Églantine
retira-se (16110).
-
Retita-se o barco de guerra inglês (26110).
-
Honório Barreto faz uma mediação entre os portugueses e os papéis(26/10).
-
Chega a Bissau a corveta americana Preble. A guerra reacende-se
(05/10).
-A
corveta americana é forçada a retirar (23/11 ).
-
Os portugueses recebem reforços de Cabo Verde (05/12).
-
Os papéis fazem a paz com os portugueses.
Os grumetes refugiados em Bandim cotinuam a luta
(29/12).
-
Honório Barreto compra doze terrenos nas duas margens do rio Casamansa para
tentar deter o avanço dos franceses nesta região (29/12/1844 a 05/01/1845).
1844/11/10
«Recomeço das hostilidades diante do túmulo do branco
A partir de 10 de Novembro de 1844, os assaltos recomeçam, sendo repelidos os Papéis de Intim
e de Antula. Combates violentos (10,11, 12, 22, 25 de Novembro) opõem principalmente os escravos dos comerciantes (e os Balantas ao seu serviço) aos Papéis. Os marinheiros americanos servem,
antes
de mais nada, para proteger, pela sua artilharia,
a construção da grande tabanca ocidental, entre o baluarte da Balança e
o
mar. Mas têm de
retirar, como os Franceses e, antes deles, os Britânicos. Bissau é um matadouro
para os brancos. E entre eles, são os Americanos, segundo parece, que tiveram mais baixas nesta «guerra» porque, em dezoito dias de estada (5-23 de Novembro de 1844), as febres postaram 40. O número subirá a 90, à chegada a Cabo Verde. A tripulação
registará mesmo 13 mortos, entre os quais dois oficiais (152). A reputação de Bissau está, pois,
amplamente justificada. Abandonada pelos marinheiros estrangeiros, a feitoria é ainda atacada a 25 de Novembro.
A Marinha portuguesa, a última, envia finalmente de Cabo Verde uma goleta com
30
soldados.
Mas
os ataques contra os construtores da
tabanca repetem-se: (5 de Dezembro). Os 25 canhões da fortaleza, mais um obus, estando mal montados e mal servidos, não parecem ter desempenhado grande papel no cerco. No fim de Novembro de 1844, a grande tabanca do oeste está mais ou menos acabada, sob a direcção de Caetano José Nosolini. Une o flanco esquerdo do forte à praia.
(152) Barcellos: op. cit., Parte V, p. 29.
René Pélissier, História da Guiné Portugueses e Africanos na Senegâmbia
1841-1936, Volume
I, EDITORIAL ESTAMPA, 1997, p.
95
1844/12/19
Paz com o gentio de
Intim, Bandim e Antula, depois de vencida a guerra.
«Uma paz claudicante
A 19 de Dezembro de 1844, é finalmente concluída a paz com os régulos de Intim, Bandim e Antula, por intermédio de um enviado do régulo do Rio Grande (152). Os grumetes estão excluídos. O cerimonial, nesta ocasião, testemunha um sincretismo político-religioso revelador
da mestiçagem cultural das feitorias (153). A 20 de Dezembro de 1844, Dziezaski manda disparar uma salva de 21 tiros, para marcar o «fim» da guerra. Durara cerca de três meses e meio.
(152) Qual? O de Buba ou de Geba?
(153) O caso teve lugar no interior da fortaleza, em frente das autoridades e dos moradores, acompanhados pelo seu cura, perante os aliados dos Portugueses, Biafadas e Balantas, e na presença do mediador do Rio Grande, de três representantes de cada um dos três régulos Papéis, vindos com a sua feiticeira ou sacerdotiza (a balobeira). Trata-se de beber aguardente cortada por água benta, vertida pelo cura. A beberagem encontra-se numa grande bacia onde se molham balas de artilharia e de espingarda, e pólvora (Barcellos: op. cit., Parte V, p. 38). O régulo papel é libertado, recebe roupas e 24 galões de aguardente. Provavelmente para compensar o copo que lhe fora recusado, a 11 de Setembro. A sua libertação é saudada com sete tiros de canhão.
René Pélissier, História da Guiné Portugueses e Africanos na Senegâmbia 1841-1936, Volume I, EDITORIAL ESTAMPA, 1997, p.p. 95-96
1845
0s navios franceses Grenedier e Zebre em Bissau (05/01).
- Chegam de Lisboa o brigue Vouga e a escuna Cabo Verde, que atacam os grumetes. Estes enviam Sangu, rei de Bissau, parapropor a paz aos portugueses.
- Os grumetes fazem içar uma bandeira francesa em Bandim, nointuito de provocar um conftito entre Portugal e a França (30/04).
- Os papéis hostilizam os comerciantes portugueses. apoderando-sedas suas canoas com mercadorias.
-A guerra generallia-se e os papéis e grumetes chegam a destruiruma parte da paliçada.
- Coonvenção anglo-francesa para a partilha da África Ocidental(29/05).
- Honório Baneto écondecorado com a Comenda da Ordem deCristo (16/07).
- Chega novamente a Bissau o brigue Vouga, que começa imediatamente a bombardear as forças guineenses (07/08).
- Os grumetes assinam a paz.
1845/01/01
Em 1 de Janeiro de 1815 constava de 534 homens a força de primeira linha na Província incluindo oficiais, que dava para a Guiné os seguintes destacamentos: Bissau, 112 homens, sendo 97 soldados; Bolama, dois saldados e um, cabo: Cacheu, 38 homens, sendo 29 soldados; Ziguinchor, quatro soldados; Farim, um segundo sargento e três soldados; Bolor, um furriel e dois soldados; Mata da Potama, dois soldados e um cabo.
1845/01/04
«O regresso dos Franceses
Não obstante as aparências, a guerra está realmente terminada? De facto, os grumetes foram postos de parte. Por seu lado, os Franceses do Senegal foram avisados do acordo e, a 4 de Janeiro de 1845, chega a Bissau uma corveta. No dia seguinte, é a vez de um brigue. É surpreendente que eles se ofereçam, também, como mediadores, numa questão puramente interna numa feitoria portuguesa (155). E, mais ainda, que sejam aceites. Apesar de tudo, a 6 de Janeiro de 1845, dia previsto para as negociações, um escravo de João Marques de Barros é morto na tabanca e tudo volta a ser posto em causa. Aqui, as duas embarcações francesas retiram-se (8 e 14 de Janeiro de 1845).
(155) A 1 de Janeiro de 1845, conta com 112 militares, entre os quais 97 soldados.»
René Pélissier, História da Guiné Portugueses e Africanos na Senegâmbia 1841-1936, Volume I, EDITORIAL ESTAMPA, 1997, p. 96
1845/01/26
«A chegada tardia da Marinha portuguesa
Finalmente alertada, Lisboa enviou, em Dezembro de 1844, um
brigue e uma goleta, a Cabo Verde. É só a 26 de
Janeiro de 1845, que a goleta se apresenta diante de Bissau e, esperando pelo brigue,
encarrega-se do policiamento do Rio [Grande de] Geba, onde as canoas dos grumetes têm a sua base no «porto» papel de
Bandim. A 27-28 de Janeiro de 1845, os marinheiros
portugueses trocam alguns tiros em frente de Bandim. Depois da chegada do brigue português (1 de Fevereiro de
1845), está previsto um desembarque de marinheiros e de soldados para
destruir as embarcações dos grumetes refugiados. Mas estes foram
prevenidos e estão decididos a bater-se para impedir a intervenção. Anula-se,
portanto, a operação. Todavia, a presença destes dois navios de
guerra
em
frente de Bissau tranquiliza a comunidade mercantil, tanto mais que
os Papéis são, dali em diante, declarados «dóceis». Deixam-se pois as coisas como estavam.
Um cerco dispendioso
O balanço das baixas em homens desta «guerra» de Bissau, de Setembro-Dezembro de 1844, não é conhecido. Os Portugueses e os Cabo-Verdianos perderam muito pouca gente, tendo sido a maioria dos mortos e feridos, do seu campo, escravos e auxiliares (150 balantas e manjacos que
Caetano José Nosolini chamou e pagou do seu bolso) (156). Papéis e grumetes tiveram talez uma cinquentena de
mortos. Decididamente,
pagou-se muito pouco em homens, quando se conhecem as baixas dos
Americanos, simples observadores: 13
marinheiros entre os quais dois oficiais varridos pelas febres de Bissau. Financeiramente, a «guerra» custou, contudo, muito caro à praça, ou seja, aos comerciantes.
João
[Marques] de Barros e Caetano José Nosolini dispenderam, respectivamente, 4000 e 8000 pesos (157), ou seja, só eles, entre metade e dois terços do «orçamento anual de toda a Guiné. Nada sabemos das perdas dos outros
comerciantes. A falta de receitas durante este período, também não é numerável. Notar-se-á,
portanto, que se encontram o seu lucro nos malabarismos
contabilistas e nas operações duvidosas, certos magnates cabo-verdianos e luso-guineenses sabem pagar da sua bolsa e com a sua pessoa (158) quando se trata de rivalizar em patriotismo. Sem mesmo falar do padrão de todas as «virtudes luso-tropicais», o insigne Honório Pereira Barreto, é bom sublinhar que um negreiro, tão notório como Caetano José Nosolini, foi a alma
da resistência durante o assédio. É verdade que, mantendo na sua dependência financeira todos os funcionários e todos os soldados, é ele quem mais teria a perder se Bissau tivesse caído, em 1844.
A sobrevivência dos enclaves
No plano estritamente defensivo, a «guerra» teve um efeito benéfico para os moradores. Não esvazia o abcesso grumete, mas afasta-o para
fora das muralhas. Além disso, a construção da tabanca envolve o poço de
Pidjiguiti, fonte de água, dali em diante,
em segurança. O campo de tiro, para o norte e
para leste, está igualmente liberto.
Politicamente, as vantagens que os lusitanizados retiram são menores. Notar-se-á que o tratado de paz de 1844 não é um tratado de vassalagem, à imagem do que se pratica e se praticará
na
África
lusófona bantu. Neste aspecto, a Guiné não é Angola nem Moçambique. Aqui os chefes africanos não se reconhecem ainda leais vassalos da Coroa, nem obrigados a ajudar os
seus representantes e os seus súbditos. É um simples acordo de boa vizinhança e esta diferença é capital. Não tardará a ver-se que não resolve o
problema
dos grumetes de Bissau mas, mesmo violado e apesar de tudo, dará umas
tréguas de perto de
50 anos à praça, face aos Papéis, de quem o
régulo de Intim não receberá mais rendas. Esta «guerra de
Bissau» foi, pois, uma profunda inalação de oxigénio político para os lusitanizados. Mas não
resolve a questão do isolamento, nem o da dependência em
relação: a) às marinhas estrangeiras; b) às trocas externas; e) aos bloqueios
fluviais eventuais. Numa palavra, no final de 1844, Bissau e atrás deles Cacheu e os presídios interiores, continuam a ser o que nunca deixaram de ser: enclaves. Comparados com a Gâmbia e mesmo com o
«poderoso» Senegal da época, nada ali há de dramático. Apesar de tudo, é uma base
muito frágil e muito instável para transformar esta colecção de escalas
numa unidade territorial contínua. Principalmente quando a vossa metrópole
não quer ouvir falar de vós.
NA DEFENSIVA
As acções violentas durante estes quatro anos charneiras estão limitadas
a Bissau e a Cacheu. Comprometem apenas pouca gente do lado
português e são pouco mortíferas de um e outro lado. Em muitos aspectos, são «rixas de balcão (*)» tal como sobressai do breve quadro seguinte,
estabelecido segundo o modelo daqueles que elaborámos para Moçambique.
À medida que avançarmos no século, vê-los-emos
alongarem-se lugubremente. De momento, o primeiro é dos mais sucintos,
tal
como
convém a um curto período e para estabelecimentos que
nem sequer têm suficientes e bons soldados para
manter a ordem dos comerciantes.
(156) Barcellos: op. cit., Pane V, p. 40.
(157) Idem. Parte V, p. 29. O autor não diz se se trata do peso duro espanhol (1= 1000 réis) ou do peso mexicano (1 =800 réis) (Segundo lopes de lima: op. cit., Parte I, p. 50), o que faria 4000-32005000
réis para o primeiro e 8000-6400$000 réis para o segundo.
(158) Os custos de construção da
estacada foram cobertos por Nosolini, e ele participou financeiramente - e fisicamente - na construção da tabanca em adobe e em pedra que a reforça. Barcellos: op. cit., Pane V, p. 40.
(*) No original «rixes de comptoirs». Com esta expressão, pretende o autor realçar os aspectos mercantilistas destas «guerras», não havendo, em Português outra possível tradução. (N.T.)»
René Pélissier, História da Guiné Portugueses e Africanos na Senegâmbia
1841-1936, Volume
I, EDITORIAL ESTAMPA, 1997, p.
96-99
1845/04/27
«O governador de Bissau communicou em 27 de abril, 5 e 6 de maio, que os grumetes continuavam em sua rebeldia e tanto que tendo desprezado as propostas de perdão qrie se lhes offereceu, declararam que nada queriam da Praça e que passavam a ser subditos franceses. Que effectivamente arvoraram em Bandim, no ponto que escolheram para sua residencia, a bandeira francesa e que a seguraram com um tiro de peça, persistindo na sua rebelião e aggravando-a com mais. este acto de traição. Que um soldado, por nome João Soares, que havia tempos tinha desertado para os gentios de Bandim viera apresentar-se á Praça, onde fizera importantes revelações sobre os preparativos que os grumetes estavam fazendo para a guerra, logo que chegasse o tempo das aguas e os fins com que a recomeçavam, cujo primeiro acto foi o arvorarem a bandeira francesa no dia 30 de abril; e, finalmente, que os referidos grumetes sabiam tudo quanto se passava dentro da Praça.
O Governador, em sessão do Conselho do Governo de 11 de julho, apresentou essa questão e ainda a do roubo de uma chalupa do negociante João Marques de Barros, na qual foi prisionada a tripulação.
O Conselho foi de unanime opinião, que ao Governador de Bissau fosse autorizado a declarar a Praça em guerra contra os rebellados de Bandim, se estes não viessem prestar submissão e até contra os gentios que prestassem ãuxilio aos referidos grumetes.
No mesmo dia 11 de julho officiou o Governador Geral ao de Bissau dizendo-lhe que tinha resolvido mandar para essa Praça a bordo do brigue de guerra Douro, uma força de 50 pracas e os officiaes competentes, destinada a render um igual numero de soldados e officiaes ou como reforço à guarnição ali existente.
Fôra-ihe reeommendado para colher as mais amplas informações sobre a veracidade da revelação feita pelo soldado Soares; das intenções em que foi arvorada a bandeira francesa e dos planos que se attribuem aos grumetes de se submetterem aos françeses; e ainda sobre a exactidão das noticias que tinham corrido da pilhagem ás canôas dos negociantes e das prisões effectuadas.…
Recommendava-lhe para que tivesse prompto um contingente de fprça suficiente da guarnição commandada pelo capitão Francisco Alberto de Azevedo para que, logo que chegasse ao seu conhecimento que os rebeldes rejeitavam o perdão, rompesse as hostilidades, marchando sobre Bandim a força mencionada.
No referido brigue Douro seguiria para Bissau o tenente-coronel Nosolini a quem o Governador de Bissau devia consultar sobre a marcha a seguir contra os · grumetes e tambem requisitar-lhe, devido á sua influencia e grande prestigio ali, qualquer auxilio de gente.
Devido ao mau estado do brigue Douro seguiu para Bissau o brigue Vouga sob o commando de Carlos Craveiro Lopes, com a força, no dia 30 de julho, tendo embarcado nelle o tenente-coronel Nozolini, tres segundos tenentes de artilharia e 40 praças de pret, fondeando em Bissau a 7 de agosto.
Neste mesmo dia officiou o commandante do brigue Vouga ao Governador da Praça pedindo-lhe informações sobre a altitude dos grumetes. Respondeu que estes tinham vindo no dia primeiro de agosto, de madrugada, arrancar alguns paus da palissada junto ao mar, do lado do Pigiguiti, e que presentidos pelo guarda fugiram; depois do toque de alvorada um grumete que se achava émboscado junto ao baluarte da Poana fez um tiro á sentinella; esta immediatamente lhe fez fogo fugindo aquelle para dentro de tarafes, proximo da Praia; para ali se fez fogo de metralha que desalojou uns 12 a 15 homens que fugiram sempre perseguidos pela artilharia. Nesse dia, tanto os grumetes çomo o gentio mandaram seus embaixadores á Praça pretextando que se queriam sujeitar a todas as condições que o Governo lhe quisesse impor, e que deviam reunir-se no dia 8 para deliberarem e apresentarem a todo o povo as condições a que deviam ficar sujeitos.
Naquelle dia reuniu-se effectivamente o Conselho composto do Governador da Praça, commandante do brigue Vouga e tenente-coronel Nozolini que resolveram se çhamasse á Praça o regulo Aré, de Antim ; no dia 9 apresentou-se este rei com cinco pessoas da sua comitiva, exigindo-lhe o Governador que sem mais demoras tratasse da paz e entregasse o prisioneiro Miguel da Barros assim como havia de dar um dos seus filhos para ficar de refem. .
Esse rei, respondendo affirmativamente, mandou um dos seus fidalgos buscar a Antim a gente que d'aquelle chão devia ficar de refem, bem assim um filho seu que devia ir para Cabo Verde; depois d'esta gente entrar na Praça sairia, entao, o rei para ir buscar ás tribus de Antulla e Bandim, a outra gente, e. o irmão de João de Barros bem como os grumetes para jurarem novamente fidelidade á bandeira portuguesa.
O rei confirmou o que havia dito ao Governador na presença de Caetano José Nozolini, mas este declarou que essa paz era inutil e disse ao rei para mandar vir gente de Geba para servirem de mediadores ; o rei annuiu a isso e as negociações ficaram paradas contra os votos do Governador Azevedo AIpoim e commandante do Vouga.
No dia 9 seguiu para a Praia o brigue Vouga e pelo relatorio do com mandante do mesmo se viu que os grumetes não atacaram as canôas dos negociantes portugueses.
Em 11 de agosto communicou o Governador da Praça que se tinha dispensado a gente de Geba, como medianeiros, aceitando os regulos de Bandim e Antulla a exigencia de apresentarem seus filhos, que ficariam em refens e que a paz se trataria no dia 14 proximo.
Só em tres de novembro participou o governador ter-se concluído a paz com estes rebeldes, apresentando-se na Praça em numero de 200 homens que ractificaram o juramento de obediencia á Rainha.» -
Subsidios para a História de Cabo Verde e Guiné, por Christiano José de Senna Barcellos, parte V, pgs. 55-58, Lisboa, 1911
1845/05/00
«Em Maio de 1845, pouco tempo depois de firmado o suposto acôrdo ·de paz
entre o govêrno de Bissau e o grupo de papéis e
grumetes, o respectivo governador, Joaquim Azevedo de Alpoim participava que os grumetes continuavam em estado de
rebeldia.
Um
soldado desertor, João
Soares, que regressara à praça depois de ter passado seis meses entre os indígenas, informava que os
grumetes iam acumulando munições e aliciando gentios para atacar a fortaleza; que· pretendiam
hàbilmente
provocar
um
conflito
entre Portugal ·e França, declarando-se súbditos desta última nação, para o que fizeram
arvorar uma bandeira francesa em Bandim, salvando-a com tiros de peça no dia 30 de Abril.
Ao mesmo tempo os revoltosos hostilizavam os comerciantes
de Bissau apoderando-se das suas canoas com mercadorias e molestando
as
tripulações.
Em face dêstes informes, o governador geral de
Cabo Verde enviou novamente para Bissau o brigue Vouga, sob o comando de Carlos Craveiro Lopes, com 40 praças, 3 tenentes de artilharia
e o tenente-coronel Caetano Nazolini. Chegaram a Bissau em
7 de Agôsto. Durante êste tempo houvera troca de tiros entre a Praça e os
revoltosos, que por vezes chegaram a avançar até à palissada e destruir
uma parte dela.
A chegada do refôrço, vindo pelo Vouga, levou os grumetes
e papéis a enviar seus emissários, declarando aceitar a soberania
portuguesa, e começaram as negociações da paz, que ainda levaram
muito tempo, até que os grumetes, em número de 200, se apresentaram na Praça, ratificando o juramento
de fidelidade.
O brigue Vouga retirou-se para Cabo Verde,
levando a bordo o comerciante José Valério Gonçalves, acusado de entendimento
com os ingleses para a venda
de territórios na região de Geba.
Tempos depois, o mesmo governador de Bissau, Azevedo de
Alpoim, realizava a compra do pôrto de Bandim ao régulo da
região, confirmada por tuna escritura lavrada em 14 de Fevereiro de 1846, na qual o régulo declarava:
«que cedia de hoje para
todo o sempre o porto de Bandim,
bem como uma porção de terreno junto, a Joaquim
de Azevedo Alpoim, cujo porto bem como a terra adjunta, ficará desde hoje pertencente ao dito
Alpoim, e outrossim declarou o rei que tudo tinha cedido por ser muito obrigado e amigo
do actual governador desta praça, Alpoim, de quem tinha
recebido varios presentes e ao fazer desta uma boa gratificação
... »
Participou também o· mesmo governador
de Bissau, em Março de 1846, que estava concluída a construção do forte de Pigiguiti, de pedra e cal, devida em grande parte aos serviços de Caetano Nazolini, propondo que se desse ao forte
o nome deste tenente-coronel como grande benemérito de Bissau.
Deu-se, porém, a: circunstância de, na mesma época, subir às estâncias superiores uma reclamação dos moradores de Bissau contra o mesmo Nazolini, acusando-o de abusar
da sua situação, tornando-se prejudicial à praça.»
João
Barreto, HISTÓRIA DA GUINÉ 1418-1918, edição do autor, Lisboa, 1938, pg. 227-228
1845/07/11
«Em 11 de julho de 1845, na Villa
da Praia, officiou o Governador D. José Miguel de Noronha ao commandante do brigue de guerra Vouga, expondo-lhe que,
não só por vias officiaes directas mas tambem por via de Goré, estava informado de novas hostilidades á Praça de Bissau,
provocadas por grumetes e que essa Praça reclamara soccorros d'esse navio.
Teve noticia o Governador Geral que no chão salgado (terreno sagrado onde o gentio não
pode ser batido) que os papeis occupam em Bandim, fôra arvorada a.bandeira francesa, e que de novo se preparavam para uma guerra tendo os grumetes commettido actos de pirataria,
roubando canoas de negociantes portugueses, cujo paradeiro e da gente se ignorava; um dos roubos deu-se numa
chalupa do negociante João Marques de Barros, cuja tripulação constava estar a ferros, em poder dos grumetes, incluindo um
irmão d'este negociante Barros.
Mais constara que os grumetes se tinham abastecido de muita
polvora, e que esperavam pela estação chuvosa para atacarem a Praça, auxiliados pelos papeis de Bandim e de Autulla.
O Governador
mandou que o brigue Vouga, depois de recolher
cincoenta soldados do batalhão de artilharia com os respectivos officiaes, seguisse
para Bissau. Embarcaram, dos officiaes, o tenente-coronel Caetano Nozolini e três tenentes, a 30 de julho e chegaram a essa Prava a 7 de agosto.
Determinou o Gorernador Geral que, depois do desembarque da tropa, se organizasse a força que sahiria a campo e que, reunindo-se a ella uma outra disponível de bordo, procurariam occupar
Bandim e destruir as canoas dos grumetes. Antes porem, de começarem estas hostilidades, recomendou o Governador, que da Praça se enviasse um parlamentario a Bandim, para intimar os grumetes que entregassem todos os prisioneiros e roubos que conservavam em seu poder, e que se rendessem á descrição dentro de um prazo, que seria accordado com o Governador da Praça e com Caetano Nozolini, assegurando- lhes, neste caso, inteiro perdão e esquecimento do passado, e qur
ninguem seriá perseguido ou inquietado pelo que anteriormente houvesse
feito, mas que findo o referido prazo, e não se tivessem submetido, que se rompessem as hostilidades e os grumetes ficariam sujeitos a todos os
rigores que as leis da guerra autorizam em taes casos.
Em Bissau
estava
fundeado
o brigue Douro que sahiu d"este porto na vespera de se. romperem as
hostilidades.
O Governador da Praça de Bissau, Joaquim de Azevedo Alpoim, relatou ao commandante do brigue Vouga qne os grumetes tinham
vindo no dia 1 de agosto, de madru!!ada, arrancar alguns .paus da
paliçada junto ao mar, do lado de Pigiguiti, mas sendo presentidos pela guarda que se achava
colocada a pequena distancia d"aquelle ponto, retiraram-se sem fazer um só tiro e nem tão
pouco fizeram os soldados, porque, quando ali chegaram já não viram ninguem.
Depois do
toque de alvorada partiu um tiro do lado da porta da Poana, que foi feito por um grumete, que ali
estava emboscado, contra a sentinella collocada no baluarte proximo, a qual
immediatamente tambem lhe fez fogo.
O
Governador mandou bater as moitas de tarafes com metralha e d'ali sahiram uns quinze grumetes que fugiram para um outro bosque; então fizeram fogo contra a Praça,
mas esta com artilharia os desalojou.
Tanto o gentio como os
grumetes, desde que ali chegou o brigue Vouga com Caetano Nozolini, mandaram seus embaixadores
ao Governador a dizer-lhe que queriam sujeitar-se
a todas as condições que o Governo lhes quisesse impor, e resolveram reunir-se no dia seguinte para deliberarem e apresentarem a todo o povo as condições a que deviam ficar sujeitos.
Çomo de costume, a paz conseguiu-a Caetano Nozolini e outros negociantes com dinheiro e presentes que davam a essa horda de selvagens, seguindo no dia 12
para Cabo Verde a Vouga, conduzindo preso o negociante José Valerio Gonçalves, accusado de querer vender os pontos de Fá e Ganjarra
aos ingleses.»
Subsidios para a
História de Cabo Verde e Guiné, por Christiano José de
Senna Barcellos, parte V, pgs. 50-51, Lisboa, 1911
1845/08/01
«Ainda os grumetes de Bissau (1 de Agosto de
1845)
Em Abril e Maio de 1845, o governador-geral de Cabo Verde, José Miguel de
Noronha, tem conhecimento de que os Papéis e os grumetes refugiados em Bandim arvoram a bandeira francesa (30 de
Abril) «esperando» fazerem-se súbditos de Louis-Philippe, e que os grumetes, de acordo com o que são, cometem
actos de pilhagem contra as embarcações dos negociantes de Bissau. Os grumetes recrutam mesmo aliados para tentarem
apoderar-se da vila. Cabo
Verde envia, portanto, o seu brigue
de guerra, 40 artilheiros, três oficiais e o inevitável Caetano José Nosolini, encarregado de negociar uma paz mais duradoura
que a do ano precedente. Os grumetes parecem querer atacar a tabanca, a 1 de Agosto de
1845, mas
a artilharia deteve-os. À chegada do brigue (7 de Agosto), Papéis e grumetes enviam representantes a Bissau, onde Nosolini e o governador, Joaquim de Azevedo Alpoim (3), terão muita
dificuldade em comprar a paz (4). Intervirá muito tardiamente, mas numa data de nós desconhecida
(Outubro ou começo de Novembro de 1845), provavelmente por cansaço.
Nesta data, a guarnição de Bissau é numericamente
forte (123 homens), porém é totalmente incapaz de sair da sua fortaleza. Portanto, para se antecipar às ameaças francesas e inglesas, o governador
de Bissau, à maneira de
Honório Pereira Barreto compra, em seu nome pessoal,
o que não pode conquistar pelas armas: o «porto» de Bandim (14 de Fevereiro de 1846) que o régulo papel local, respondendo ao nome
bombástico e inesperado de Jery Napenac da Roca, lhe vende. Esta «personalização» ou individualização da
expansão tem uma dupla finalidade, aos nossos olhos: a) não
assustar a parte cedente, a qual se melindraria por vender um território
à Coroa portuguesa, mas não vê senão vantagens em ceder a um particular, mesmo governador; b) promover
os negócios do funcionário «comprador» junto dos seus
superiores. Este último ponto é confirmado pelo exemplo de Caetano José Nosolini, que
oferece às autoridades, a 7 de
Abril de 1846, um fortim construído a expensas suas, na ponta da
tabanca, lançada em construção pelos seus cuidados, durante o
cerco de 1844. Este benfeitor da humanidade joga, portanto, em dois registos complementares:
negreiro todo-poderoso, mas invejado
pelos seus pares, que o acusam de abuso de poder,
ele tem necessidade de
aparecer como protector da Coroa, da qual espera que feche os
olhos às suas actuações duvidosas. Não é desiludido
na sua expectativa. Isto para Bissau, na margem,
que captou a atenção depois de 1841.
(3) Já conhecido governador
de Quelimane, atacando Massangano, em
Moçambique, em 1855. René Pélissier: Naissance .... op. cit., p. 71; p. 324.
(4) Barcello, Op. cit. Parte V. pp 55-58.»
René
Pélissier, História da Guiné Portugueses e Africanos na Senegâmbia
1841-1936, Volume
I, EDITORIAL ESTAMPA, 1997,
p.p. 106-107
1845/09/17
O comandante francês Baudin, oficial da marinha, prestou auxilio à Praça de Bissau quando os
Grumetes e os Papéis a atacaram, Provou-lhe o seu reconhecimento o
Governador da mesma, e o Governador de Cabo Verde dirigiu-lhe uma lisonjeira
carta de agradecimento. A corveta americana
«Preble» concorreu igualmente para pôr os revoltosos em debandada.
1846/02/13
Os negros da tribu Zigoche, no
rio de Casamansa, não estavam em boas relações com o Presidio de Zeguichor. O commandante militar e civil d'esse Presidio, Francisco de Carvalho Alvarenga participando ao Governador
de Cacheu, José Xavier Crato, um breve rompimento de hostilidades, o avisou de ter o inglês, da Gambia, Pierre Mengue, vendido polvora e armas aos Zigoches para nos atacar.
Em 13 de fevereiro de 1846, o governador Crato
num seu relatorio para o governador geral, lhe communicava o facto de essa tribu ter sido batida no ataque que deu.
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