1879/03/18
AUTONOMIA DA GUINÉ RELATIVAMENTE A CABO VERDE
Foi publicada a Carta
de Lei, assinada por Fontes Pereira de Melo, Serpa Pimentel e Tomás Ribeiro,
pela qual o território da Guiné Portuguesa passou a Província independente de
Cabo Verde, com autonomia administrativa.
☻ Grande abandono e
verdadeira marginalização da "Senegâmbia portuguesa", sobretudo até
1879, concretizava-se visivelmente em
diferentes sectores da vida da colónia, nomeadamente:
- Um
pessoal administrativo muito pouco eficiente, sem preparação técnica suficiente
e muito mal pago. Por isso se dedicavam também quase todos à vida comercial e
militar, de modo a auferir mais alguns rendimentos. As próprias repartições do Estado, na cidade de Bissau
em 1884, funcionavam todas em casas particulares
e arrendadas, e isso já é sintomático. E também significativo que o primeiro
recenseamento de toda a população das praças da Guiné apenas tenha sido
iniciado em 1882.
- Uma força militar débil, em comparação com as
colónias francesas vizinhas: a força militar da Província (Exército)
compunha-se em 1882 do batalhão de caçadores nº 1 de África Ocidental, e duma
bateria de artilharia criada em 1 de Abril de 1879. A marinha compunha-se das
seguintes embarcações: «Guiné», lanchão «Cassine», dois escaleres «Buba» e
«Orango»: de vela, tinha o hiate «Marinha Grande» e três chalupas, das quais
uma estava em litígio. O mesmo Govemador
Pedro INÁCIO DE GOUVEIA atesta que estas forças não são suficientes
nem muito eficientes.(25)
-
Escolas e saúde eram quase inexistentes:
em 1884 havia apenas 4 ou 5 escolas primárias em todas as praças da Guiné, com
algumas dezenas de alunos cada uma e com resultados que podem ser vistos nos
Boletins Oficiais da colónia ao longo dos diferentes anos. Os professores mais
desejados (a julgar pelo testemunho de vários Governadores, a que mais adiante
se fará referência), parecem ter sido os Missionários. quando existiam. No entanto, também os poucos missionários (por diferentes razões,
mas certamente sobretudo de ordem económica) abandonavarn por vezes esta
actividade escolar. Por isso em 18 de Dezembro de 1873, após oomunicação
reoebida da Secreta ria do Ooverno Geral da Província, o bispo D. JOSÉ DIAS CORREIA censura os vários sacerdotes que ultimamente têm pedido sua exoneração de professores de instrução prlmárla. E adianta que, mesmo
que não tivessem alguma
remunerração
(como de facto têm), mesmo nessas condições deveriam continuar a ensinar.
23. Relatório de Damasceno Isaac da Costa (1884), in Boletim OficiaI do Governo da Províncta Portuguesa da Guiné, 1856, nº 15, p. 63
24
As instruções em 12
artigos, dadas pelo Governador PEDRO I. DE GOUVEIA para este recenceamento em 1 de Março de I882, podem ver-se
em Bol. 0f. da Prov. Port. da Gruiné, 1882,
p, 38.
25 Relalório de Pedro
I. de Gouveia, 1882, loc. cit., pp.
431-443
«A
«colónia» de uma colónia
Primeiro
ponto capital: até 1879, esta Guiné nunca será mais que a dependência
esquecida de um arquipélago miserável, por outras palavras, a “colónia de uma
colónia”, com tudo o que isso comporta de negativo no plano da gestão
administrativa, das prioridades nos investimentos, do próprio povoamento, pois
que na Administtração e no Exército o pessoal provém maioritariamente – e
raramente de sua própria vontade – não directamente da metrópole, mas do arquipélago
que desempanha um papel tanto de tutor como de guarda-fogo. É uma situação
pouco invejável, porém ainda é tolerável, enquanto os interesses portugueses se
mantêm marginais nesta Guiné de Cabo Verde. Ora, assim são e por muito tempo.
Antes de ir mais longe, é efectivamente conveniente recolocar as coisas numa
perspectiva mais ampla. Na escala dos valores coloniais, a Guiné vem muito
atrás das feitorias de Moçambique, as quais, por sua vez, fazem uma triste
figura, comparadas com a Angola dos Portugeses dos anos 1845-1848. Por outras
palavras, o governador-geral de Cabo Verde, na Praia, não expedindo para os
seus “rios de leste” senão funcionários e condenados dos quais deseja livrar-se
e deixando-os sem grandes meios de acção, o poder real está distribuído entre
algumas dezenas de traficantes mestiços ou negros lusitanizados, provenientes
essencialmente de Cabo Verde e, acessoriamente, de extensas famílias crioulas
locais. A relativa modértia das sua empresas e das sua ambições, o seu
parcelamento em centros isolados, ligados entre si unicamente pela vela e pelo
remo, a precaridade da sua posição face às populações que os rodeiam e por
vezes os abarcam, tudo isso se combina para fazer destes estabelecimentos um
arquipélago de minúsculas oligarquias fluviais e marítimas num mar africano.»
René Pélissier, História da Guiné Portugueses e Africanos na Senegâmbia
1841-1936, Volume
I, EDITORIAL ESTAMPA, 1997,
p.p. 41-42
1879/04/20
AGOSTINHO COELHO A data precisa desta
proclamação é 18 de Março de 1879, através de um decreto de desanexação,
passando a sua administração a ser independente da de Cabo Verde e passando
Bolama a ser a capital da nova província. Nesta
data tomou posse como primeiro governador da província Agostinho Coelho.
Governou dois anos.
1880
1880-1886
-Abolição progressiva da escravidão na colónia espanhola
de
Cuba.
Simplesmente, o clima
continuava a ser hostil e por vezes mortífero ao fim de pouco tempo, como no
caso do Padre ESPECIOSO FERNANDES, morto
em 1879 em Bolama pouco tempo depois da sua chegada. Os padres vindos de
Sernache do Bonjardim - e foram bastantes - eram obrigados a servir na Guiné ao menos durante cinco anos, e a
partir de 1884 passou para seis anos obigatórios, mas procuravam geralmente
sair de lá se possível antes do tempo. O documento
talvez mais paradigmático, neste sentido, é a carta do bispo de Cabo Verde, em 1880, ao Governador da Guiné AGOSTINHO
COELHO: "Experimento sempre
dificuldades graves quando procuro mandar padres para a Guiné, e raras vezes
que não tenha que invocar o preceito da obediência
e, ainda mais, a ameaça da pena de suspensão, para prestarem naquela província os serviços próprios do seu
oficio.
A inclemência do clima, o desconforto da vida, muitas vezes os atritos
produzidos pelos chefes dos presídios, de que resulta desfavor e falta de
protecção ao padre e à igreja, as dificuldades de comunlcações, e aínda a
ausência dum futuro que proporcione ao missionário...
1880/02/01
Ataque dos Fulas de Mamadu Paté à praça de Buba, repelido. Louvados o alferes MANUEL PEDRO DOS SANTOS, mais tarde (6-4-18RI) condecorado
com o grau de cavaleiro da Torre e Espada, CEZAR
MEDINA e HENRI GALAMBERT.
1880/04/08
Foi condecorado com o
grau de comendador da Ordem da Torre c Espada o primeiro Governador
da Província da Guiné, tenente-coronel AGOSTINHO COELHO,
por ter conseguido de modo enérgico sufocar, em Bolama, a revolta do batalhão de caçadores n.º 1 da África Ocidental, que tinha
por fim constranger o mesmo Governador a mandar pôr em liberdade 2 oficiais
daquele corpo.
1880/11/30
«Excellentissimo
Senhor,
(Despacho,
em letra
diferente): «Mande-se cópia desta carta ao Governador da Guiné, para a tomar
na devida consideração, acrescentandose-lhe que considerando este Vigário Geral
embom conceito, a S. Ex.' o Ministro pelos serviçosque há prestado à Igreja, e
de que sempre temdado boas informações o Prelado da Diocese,podem merecer
attenção as ponderações quefaz.
Ao
Vigário, accuse-se a recepção e diga-selheque serão sempre bem recebidas por S.
Ex.s
todas
as notícias c informações que o seu zelolhe reqquerer em favor da Guiné e dos
interessesque o Governo portuguez ali deseja proteger eanimar:8/1 .0 /81».
(À
margem do texto): «Offícios
ao Vigário daGuiné e ao Governador da Província da Guiné em24 deJaneiro de1881
».
Os
Portuguezes por direito de conquistaiforam ou deviam ser os únicos senhores de
todoo immenso território que se estende desde oSenegal ao Gâmbia, e que por ser
muito fértil ecobreto de 14 milhões de habitantes, poderiamais tarde constituir
uma potência sesoubéssemossempreedificarimpérios.Infelizmente, por cessões, por
troca ou ponabandono, os franceses por um lado, os inglezespor outro começaram
desde cedo e por tal formaa dividir entre si a Senegãmbia, que foi forçosotrocar-lhe
o nome por outro menos pretencíoso,o de «Guiné Portuguesa». Os dois
concorrentesà grande herança que nos legaram os nossosantepassados, não
contentes com limitar-nosà S.' parte quasi da antiga Senegâmbia,pretendem ainda
caneellar-nos os rios de Nuno ede Casamansa e as ilhas de Pissiz e deCanhabak.
Tudo
o que fizeram os ingleses constafelizmente de um «Memorandum», o que fazem eo
que pretendem os francezes é o ue talvez nãofoiaindaliquidado.
Por
não ser minha intensão cançar apaciência de Vossa Excellência com uma
longahistória que seria na verdade escusada paraVossa Excellêncía, Ministro de
tanto saber eexperiência, tomo a liberdade de enviar a VossaExcelência, em
forma não de conselho mas deprevensão, alguns traços mais salientes dasminhas observações
feitas em 14 annos em
todas
as praças e prezíd ios desta Província, paraonde me têem levado os meus deveres
demissionárioobscuro.
Formalmente:
os francezes hoje muito mais queos inglezes, pretendem arrebatamos a
GuinéPortuguesa, e mais tarde ou mais cedo, por forçaou por artes, far-se-hão
senhores della. Ainda háquem concede a
Portugal esta collonia só dezannos, no fim dos quaes ver-se-háum temeroso
couraçado nas águas de Mambaid (1).
Começaram
já com os avisos sagrados: é cedodemais!O fra ncezma isi nsignificanteao
penetrarneste nosso pequeno Brazil, concebe ideiasambiciosas taes, estabelece
desde logo planostãocerteiros, queé umamaravilha.
Avedearribaçãoum naturalista francez por nome Bocandé,
que valendo-se da sua actividade ealentos. percorreu todas estas
paragens.estudou a sua fauna e flora, bem como os usos ecostumes e línguas
destes povos, fez sondas,amontoou colecções, e sabe Vossa Excellênciaqual foi o
resultado de seus trabalhos em 20annos? - A confecção de um rnappa exacto
detodaestaprovíncia, emquedeterminou com
tinta vermelha os pontos cuja ccupação as colónias francesas de realizar no
futuro(1).
Os pontos marcados são, além de outros:Selho, à margem direita do Casamança,
entreZeguinchor e Farim e não muito longe do rio e presídio de Geba; Jafunco, entre o rio Eblondok:e o S. Domingos, do lado de Bolor e perto
deCacheu; Pissiz, entre Bissau e
llhetas; Canhabak,no archipéllago
bujagó, junto à barra de Bolamaedo RioGra nde(3).
Comprehende-se
perfeitamente o jogo: aspopulações e comércio dos nossos presídios serão com o
andar do tempo absorvidas pelocommércío e perzídíos francezes, O estado deplorável de decadência e miséria
em que se acham os nossos prezídios de Zeguinchor, de Geba e de Farim está
ahi artestando comtristíssima eloquência a veracidade das minhas presumpções.
O próprio Bocandé apressou-se a dar
oexemplo, estabelecendo a sua feitoria
em Carabana. nono ilhéu dos Mosquitos, e emseguida vimos transformar-se «a miserável povoação
de Selho(4) em uma vila a mais bella e a mais florescente da Guiné Portugueza,Se
os francezes se tornaram cada vez maispreponderantes no Casamança, penso que se não deve attribuir a culpa
senão à criminosa indifferença e desleixo de muitos Governadores da Guiné, ou à
sua falta de alcance político, o queé maisprovável.
Andando
eu nas missoes de Bolor, deJafunco e de Varella em 1867, o famoso francez Alexis Huchardt obteve dos felupos de Jafuncoa
cedência de uns 20 metros quadrados de lodo,o que depois de aterrado começou
porestabelecer a sua feitoria de
"Santa-Maria" em barracas de cana e capim. Para mim ésimplesmente
o ninho informe de uma ave derapina. A
destruição de Bolor é uma das consequências fataes da aproximação
d'aquellaporenquantomiserávelfeitoriaestrangeira.É incontestável que ainda se
não encontramprovas positivas de conspiração de AlexisHuchardt contra a
integridade nacional; mastambémesperarse melhanteprocedimento deumfrancez
polido é desconhecer as tendências eespírito das nações! Honório Barreto
embirravacom os inglezes; eu receio mais as evoluçõessilenciosas e sublimes da
Águia do que o rugir franco eleaI doleopardo.
Naquella formosa, rica
e grande ilha de Píssiz existe uma feitoria francesa cujo agente é um portuguez: tantas e tão
repetidas insolênciastêem praticado os francezes de connivência como gentio
d'alí, que o Sr. AGOSTINHO COELHO se
víoos seus antigos protestos de submissão á CoroaPortuguesa, como fez. Mais:
durante o governo interino do major
Faria no anno passado, deofundo no porto desta villa de Bissau acanhoneira
franceza Le Castor, cujocommandante declarou officialmente ao
dignoreprezentante do Governo Portuguez que oGoverno da sua República
considerava o nossoexplêndido archipéllago de 40 ilhas como umazona neutral
para a livre navegação de todos osseusnaviosdeguerrae de commércio.
Entretanto,
como o Sr. Agostinho Coelhocomeçasse,
apenas veio, a consolidar o nossopredomínioemCanhabake porconsequênciaemtodo
aquellearchipéllago bujagó,mandandoparalábandeiraesoldados,
trocaramaspeçasdo seu xadrez substituindo os guerreiros diplomataspelos
pretendidos sábios exploradores, por secasar mais com as tendências e espírito
d'aquellanaçãode velhacos!Aimé Ollívier,
rico negociante, engenheiro,naturalista e talvez astrólogo, pedio e
obtevelicença (nem podiadeixar de ser!) para
explorar a ilha de Canhabak; acto contínuo, organiza umaformidável
carabana, faz correr que se vae lançarnuma arriscada travessia de Santa Cruz de
Subaa Tombuctu (5). Ora, por isso mesmo que osFuta-fulahs constituem uma nação
aguerrida eque só vive de guerras sanguinolentas, aquelleexplorador tendo
necessariamente de romper asua marcha pelo reino
de Futa-Totõ, não deixará de entabolar com AImame negociações políticas para
nós desfavoráveis (e vou jurar que nãoseriam outras as suas vistas) com o
qual, bemcomo com os seus súbditos guerreiros osfrancezes se fizeram
partidários, por serem osmais temíveis inimigos com que podemos contarnestas
paragens. Nós, por nobreza egenerosidade de condicção e de princípios,tomamos o partido dos fulahs, dos mandingas
e dos biafandas, por serem os menos fortes e os mais úteis; por isso
que se dão à paz dotrabalho.
De
sorte que temos em campo de um ladoduas potências: a bárbara e a monetária; e
dooutro a fraqueza da paz e a fragilidade do direitoperante a força. Restam-nos
tão somente aprobabilidade de vencer salvando esta colóniaque «é uma das jóias
de mais valor da Corôa dePortugal» 6, se os futuros Ministros de SuaMagestadeEI
-Rei tiverems empreo alto empenhoe o mais religioso cuidado de escolher para o díffícil e excepcional
Governo da Guiné Portugueza homens de quilate dos Honórios, dos Zagallos, dos
Caldeiras e dos Agostinhos.Homensaumtempo paraaadministração, paraa
política eparaaguerra.
(I) Palavras do Dr.
Juiz de Direito da Guiné a Sr.Duarte de Vasconcellos.
(2) Os francezes têem o
cuidado de exhibir este trabalho, cujos exemplares são raros, somente aos que
lhe não são suspeitos!
(3) Há muito que se
assenhorearam do Rio Nuno,não sei por que direito!
(4) Honório Pereira
Barreto, na sua «Senegâmbia Portugueza», folheto de 1830 a 1840 e tantos; muito
raro.
(5) Porque não partio
elle de Rio Nuno, ficando este a tão curta distância do nosso prezídio de
SantaCruz? ...
Que
diria eu a Vossa Excellência sobre o modoillicito e revoltante porque procedem
osfrancezes em suas transacções commerciaescom a colónia portugueza? - Essa
quadrilha deladroes tem por taes artes urdido a vasta,capciosa e inextricável
têa de seu comércio que, achando-nos com todos os meios detransacções
vantajosas com o gentio por eles cortados, lhes abandonamos em toda a parte asnossas
immensas propriedades rústicas eurbanas para a honrosa solução de
dividasinjustas e quasí sempre fabulosas. Foi dest'arte que se tomaram os
maiores proprietários emambas as margens do Rio Grande (6). E como asmesmas
causas produzem sempre os mesmoseffeítos, mais dias, menos dias empolgarão o
riodeTombalinoudeNalú, eumpouco maistardeorio de Geba e de S. Domingos; e o
temerosocouraçado não se fará esperar para defender osinteresses commerciaes e
políticos dadominadoracolóniafranceza.
(6)« ... de modo que hoje (no Rio Grande), com
excepção de pequenos tractos
que ainda são portuguezes»
(<<Comrnercio de Port . de 1870, p. 406, Secc. de Corresp.).
Os missionanos (até os
missionários! ... ) também fazem propaganda, esforçando-se por outros
caminhos «minar aqui o nosso domínio»(8). Os frades de Dackar, estando eu em
Lisboa,andaram sem licença em 1878 por Zeguinchor,Cacheu e Bolor, como por uma
Diocese semPadreiro, sem Bispo, sem Governador, nemVigário Geral. Consta mesmo
que, escorraçadospelo nosso Vigário Geral interino (9),sollicitaram ultimamente
do Ex. Bispo de CaboVerde a permissão de missionarem em todas asfreguezias
desta província, como se tivéssemosgrande necessidade de suas
missõesafrancezadas! ... Muito bem andou o Ex .... Bispoemnãoos consentircá!
(8) Commerc. de Port .• citado, n. · e pág.
(9) João Chrisóstomo dos Santos, filho do
Collégiodas MissõesPortuguezasUitramarinas.
Os
indígenas em geral, apesar do abandono a
que têem sido condemnados há quatrocentos annos, e não obstante a
propaganda francesa,conservam ainda alguma sympathia aosportugueses seus
primeiros civilizadores eamigos. Agora o que se vae já tornando precizo
éestreitar por meio da cruz e da eschola esse laço frágil que ainda nos prende
ao reconhecimento de um grande benefício. E até mesmo se faurgente consolidá-lo
com uma carinhosa e liberal assistência nas suas aspirações, no se ucommércío,
na sua indústria, nas suas pendências com o gentio, que são frequentes, nos seus direitos perturbados, em suma: em todas
as manifestações da sua luta pela vida.
Quantas
coisas não me ficam ainda por dizer!...e contudo é forçoso concluir, e
VossaExcellência adivinhará o resto, na certeza de queas minhas profundas
apprehensões por seremcompartilhadas pelo actual e indispensávelGovernador da
Província e pelo patriótico Juiz da Comarca,
o Sr. DUARTE DE VASCONCELLOS, não sãodestituídas defundamento.
Deus
guarde a Vossa Excellência por muitosannos na qualidade de Ministro do
Ultramar, porser o mais digno sucessor do Sr. ThomáRibeiro, que teve a arrojada
e para semprelouvável lembrança de elevar a minha pátria aprovíncia
independente, e na firme esperança deque Vossa Excellência será para os
francezes omesmo que tem sido o Sr. Duque Bolama para osínalezes. peço licença
e desculpa para mesubscrever como maisprofundorespeito.-De Vossa Excellência,
Senhor Visconde de S. Januário, muito nobre e muito illustre Ministro
daMarinha, menor criado, atentoe venerador.
Bissau,
30de Novembrode1880.
MARCELLÍNO
MARQUES DE BARROS (Vig.ºGl. DaGuiné.)
A.H.U., Guiné, 2.3
Secção, 13 Repartição, Pasta 409 (1879-1882), doc. 442 in "Subsídios para
a biografia do sacerdote guineense Marcelino Marques de Barros
(1844-1929)", de João DiasVicente, OFM
1880/12/20
Foi marcada a data em
que o régulo de Ganadú deveria prestar termo de juramento e obediência à
bandeira nacional segundo os preceitos do seu rito.
1881/1914
(World War I): The Scramble for
Africa. The European imperial powers divide Africa. The Serer countries
affected and the old open borders seized to exist.
1881/02/01
«O embate luso-fula em Buba (1-2 de Fevereiro de 1881)
Pelas 9
horas da manhã, a 1 de Fevereiro de 1881, facto impensável para a Guiné das
feitorias, habituada apenas aos saltos de humor dos
Papéis e grumetes, cerca de três mil Futa-Fulas e Fulas-Pretos (?) atacam na nova «fronteira» portuguesa, a do Leste, em Buba, a porta de Forria. Ora Buba, em dois anos, tornou-se
a mais forte concentração militar portuguesa em África, entre
Lisboa e Luanda: talvez oito peças, três fortins, um blockhaus (39), 200 soldados,
uma
cerca
em estacaria de 900 m. (40); estes números não estarão, porém, exagerados? O viajante
alemão C. Doelter, pelo que lhe toca, não vê mais que uma centena de soldados africanos indisciplinados, fortificações desafiando todas as regras e seis canhões sem artilheiros de profissão,
tendo estes ficado em Bissau (41). Se nos referimos apenas às fontes portuguesas publicadas, os assaltos contra Buba são bastante mal conhecidos em pormenor, mas parecem
ter durado um dia e uma noite (1-2
de Fevereiro de 1881). Comandados por Yaya, outro filho de Alfa Ibrahima Sory
(1855-1881) (42) do Labé, os Futa-Fulas reuniram trezentos cavaleiros bem armados e, mais mesquinhamente, um milhar de
infantes. O resto das tropas (cerca de 1500-1700 homens) é composto por Fulas-Pretos, mas não se batem eles por Fulas-Forros?
Utilizando uma táctica completamente inadaptada (cargas
em vagas de dez fileiras em profundidade) e dando prova de uma inépcia de tiro inacreditável, os assaltantes oferecem um alvo verdadeiramente
magnífico aos soldados dos Portugueses, que atiram pelos buracos
da paliçada. O obus servido pelo «conde», ou conde Henri
de
Galembert (?) (43) e as outras peças de artilharia de
campanha, fazem igualmente maravilhas. Nunca os Fulas conseguem aproximar-se da paliçada.
Teriam perdido uma centena de homens (44). A 2 de Fevereiro, um novo ataque é, mais uma vez, repelido. Segundo parece, nunca os Portugueses puderam atravessar a rede de intrigas dos régulos fulas (45) e saber concretamente
quem os atacava. Mas Yaya compreendeu; inicia imediatamente negociações de paz com os sitiados e faz com que o caso passe por um mal-entendido. O alemão Doelter, que chegou a meio do combate, pensa que os Fulas vinham simplesmente
pilhar e apanhar escravos. Para não ser escasso na medida, entre outros motivos, acrescenta o ódio dos cristãos. Os Portugueses
considerarão,
ulteriormente, que os Fulas tinham chegado a este extremo
para recuperar os seus escravos fugidos (chegavam
a
ser
vinte ou trinta por dia) para Buba, transformada em terra de asilo sob o estandarte português (46). Outra interpretação de certos Portugueses: os Futa-Fulas teriam sido incitados
a
destruir Buba pelos Franceses - do Rio Nunes provavelmente, mas talvez igualmente do Cacine, onde Aimé
Olivier tem já uma feitoria (Le Cerf) - invejosos da sua prosperidade. Seja qual for a verdade,
mal aconselhados, mal informados ou demasiado confiantes da sua força, os Fulas sofreram um cruel revés em Buba, a 1-2 de
Fevereiro de 1881: mesmo com os seus medíocres soldados, os Portugueses não são tigres de papel quando estão bem entrincheirados. E arrebatar um campo de infiéis, onde muitos Mandingas e Biafadas também fazem fogo, não
pode ser comparado à pilhagem fácil de uma tabanca em campo raso. Outro ponto: os Portugueses, não obstante a sua tendência para
denegrir os comerciantes estrangeiros que vivem na Guiné, sabem, dali em diante, que estes farão bloco com eles, em caso de
ataque. Franceses ou não, a maior parte dos europeus fazem e sempre farão fogo a seu lado, e já não se contará, durante trinta anos, o número de acções em
que existe uma
frente comum de Marte e de Mercúrio contra os Africanos. Melhor ainda, com muita frequência,
serão os civis franceses que censurarão às autoridades (e aqui, elas são sinónimos de militares) mostrarem-se
demasiado benevolentes para com a impudência do gentio, subentendendo com isso que as coisas se
passariam diferentemente, se a Guiné se tornasse senegalense.
Mal conhecida e sobretudo mal apreciada (47),
esta vitória portuguesa em Buba que, pela sua data, pela sua amplitude
e
pelos
seus
efectivos envolvidos, noutras colónias, teria
sido engastado em alfinete, aqui nem sequer
releva quem é o seu artesão. Com dificuldade se soube
que o capitão Carlos Maria de Sousa Ferreira Simões, que comandava a guarnição,
prostrado pelas febres (48), tivera de
confiar a defesa a um subalterno, cuja identidade continuou duvidosa (49).
(39) A. de Barros: «A praça e porto
de Buba no Rio Grande de Bolola», As Colonias
portuguezas, 1º Anno, nº 5, 1 de Maio de 1883, p. 51.
(40) Segundo Ramos da Silva: op. cit.p. 340.
(41) C. Doelter: Über..., op. cit., pp. 106-107. A. de Barros: «Buba. O
estabelecimento
portuguez
no Rio Grande de Bolola», As Colonias portuguesas, 1º Anno nº 8, 1 de
Maio de 1883, p. 86 fala de 150 homens de «guarnição activa». Apesar de tudo, é
pura e simplesmente a «fronteira», no sentido mais forte, e Doelter que vem ao Rio
Grande de Buba/ Bolola, de onde esperava alcança o Futa-Djalon, mais que não poderã
transpor o paiís biafada em luta contra os Fulas, refere-se explicitamente ao Far-
West. Com a sua cintura de árvores mal podadas, os seus quartéis inacabados,
os seus dois comerciantes franceses (dos quais um é conde, real ou não, mas comerciante),
o seu capelão, etc, Buba faz lembrar um Forte Laramie cercado, onde o papel dos
índios a cavalo seria desempenhado pelos Futa-Fulas e o dos Federais por
vagabundos angolanos e cabo-verdianos de uniforme.
(42)
Segundo Paul Marty: L'lslam en Guinée. Fouta-Diallon. Paris, 1921, p.
39. Segundo este autor, o Labé torna-se sob o seu reino praticamente
independente do poder
central
em Timbo. E, quando falamos na «política do Futa-Djalom» na Guiné, será mais
correcto dizer «política do Labé».
(43)
A identidade deste Galembert é bastante obscura. Um autor anónimo faz dele um
«marquês» em 1878, preso pelo comandante militar de Buba por fazer uma proganda
anti-portuguesa junto dos régulos. Este autor amargo, muito hostil aos Franceses
da Guiné, parece associá-lo a Aimé Olivier e vê nele um agente político. Talvez
seja verdade, mas em benefício de quem? De Olivier, o construtor de impérios,
ou da França? (Anónimo: «Cartas do Ultramar. Guiné portugueza», As Colonias portuguesa, Anno VI,
nº 15-16, 31 de Agosto de 1888, p. 100). C.
Doelter não fala de nenhum Galembert em Buba, mas de um conde de M.
Ver René Pélissier: «Peuls et Portugais en guerre. Un témoignage allemand
(1881)». Trabalho inédito no momento da redacção da presente obra.
O
autor anónimo, anteriormente citado, relata um incidente bem posterior (1888) no
Rio Pongo (futura Guiné francesa), onde as tripulações de quatro embarcações de
Bissau (grumetes provavelmente), vindas para
comprar nozes de cola, são presas e leva das para Dakar, sendo
os seus navios ulteriormente vendidos na Goreia. Sem nos rronunciarmos sobre a
equidade do processo, constatamos que, numa data tão tardia como 1888, a
cabotagem guineense para o Sul ultrapassa amplamente o Cabo Verga, limite putativo
da Guiné até 1886.
(44)
C. Doelter: Uber..., op. cit. p. 112.
(45) A. de Barros: «A praça...», op. cit.,
p. 51.
(46) João Barreto: op. cit., pp.
300-301
(47) Ignorada de Joye Bowman Hawkins: «Conflict...», op. cit., passim!, e aparentemente
dos autores franceses ou francófonos (C'f. Thierno Diallo: Alfa Yaya. roi du Labé
(Fouta-Djalon). Paris-Dakar, 1976, que só faz intervir a Guiné no final da carreira do seu herói, depois de as suas terras ocidentais se tornaram guineenses, em 1905. Idem , p. 47, p. 51).
(48) C. Doelter: op. cit., p. 106.
(49) Talvez se trate do tenente ou do alferes Manuel Pedro da Fonseca (Ramos da Silva: op. cit., p. 340) ou M. Pedro dos Santos (João Barreto: op. cit., p. 301).
René
Pélissier, História da Guiné Portugueses e Africanos na Senegâmbia
1841-1936, Volume
I, EDITORIAL ESTAMPA, 1997, pp.
193-196
1881/03/10
Louvados os alferes JERÓNIMO VIEIRA e FRANCISCO
MARQUES GERALDES pelo valor e brio com que repeliram os gentios Fulas c Fula-fulas que atacaram a praça de Buba em 1 de
Fevereiro.
1881/07/03
Tratado de paz com os régulos Fulas-forros e Futa-fulas do
Forreá e do Fula Djalon (B. O. n.º
12/1RS1).
1881/11/23
«A
vitória dos Biafadas contra os Portugueses: Jabadá (23 de Novembro de 1881)
No entanto
Agostinho Coelho não vai partir suportado por uma vitória, mas muito pelo
contrário. A sua súbita vontade de governar o sertão implica, para os militares, inevitáveis ingerências entre etnias. Melhor ainda, parecem querer recuperar
o seu atraso no domínio
da «política indígena». Em que medida a política pró-fula de Agostinho Coelho está na origem de um acidente grave com os Biafadas? Se bem que
maltratados pelos referidos Fulas, não são inimigos para desdenhar, como se vira em Junho de 1861, no Badora, com o governador Zagallo. Diz-se que eles se batem mal, mas que visam bem. Presentemente, os Biafadas teriam atacado Fulas protegidos pela Administração, em frente de Bolama. Para salvar as aparências,
Agostinho Coelho teria ordenado ao comandante militar de Bissau que fosse recuperar os 35 prisioneiros fulas e o saque,
conservado na principal aldeia dos Biafadas, em Jabadá, no rio Geba, que se pensava conter mil combatentes. Partindo
de Bissau, a 11 de Novembro de 1881, o capitão Pedro Moreira da Fonseca, de quem se voltará a falar em 1891, em Bissau, leva 51
atiradores, doze artilheiros e dois canhões. Postados numa ponta (Ponta São Francisco) a Leste de Jabadá, os Portugueses esperam que os Biafadas iniciem negociações. Na verdade,
as discussões depressa degeneram num ataque em que os Biafadas são postos em fuga.
A 23 de Novembro, Pedro Moreira da Fonseca marcha sobre
Jabadá com os seus homens, reforçados com quarenta grumetes de Bissau e
trabalhadores mandingas de quatro pontas, armados pelos seus patrões. A tropa
será interceptada antes de chegar à
aldeia, perdendo um soldado e um grumete, o que desmoralizará os auxiliares e os regulares. Na confusão, os Biafadas cairão sobre esta horda confundida,
que terá de retirar, deixando atrás de si três atiradores
e um sargento, considerados como desaparecidos (60). Outros números: um sargento e seis soldados mortos (61). Foi por pouco que o
capitão Pedro Moreira da Fonseca evitou um segundo «desastre de Bolor», porém este recuo, diante dos Biafadas, teve uma profunda repercussão e anulou
as vitórias em Buba e no Forria. Refugiada na Ponta São Francisco, a
tropa receberá a visita do governador (25-30 de Novembro de 1881),
sem
que
se
saiba bem se se manterá no local esperando reforços. Na outra
margem os Balantas também não estão seguros.
(60) Muitas vezes esquecido, este caso é
principalmente conhecido graças a Ramos da Silva: op. cit., pp. 341-342.
Nem uma palavra em João Barreto: op. cit., e entre que os que o copiam.
Segundo uma óptica anti-portuguesa, que deve ser o reflexo, em nossa opinião,
dos comerciantes franceses de Bissau e de Bolama, o chefe da missão de
delimitação franco-portuguesa de 1888, o capitão Henri Brosselard, relata que a
coluna deixou um grande número de soldados angolanos prisioneiros e que apenas
ficou a dever a sua salvação à valentia dos grumetes de Bissau (H. Brosselard: La
Guinée portugaise et les possessions françaises voisines. Lille, 1889, p.
23). Mutismo completo sobre estes prisioneiros, reais ou não, nas fontes
impressas portuguesas nossas conhecidas.
(61) Fausto Duarte (Ed.): «A Guiné...» op.
cit., p. 472.»
René Pélissier, História da Guiné Portugueses e Africanos na Senegâmbia
1841-1936, Volume
I, EDITORIAL ESTAMPA, 1997, pp.
199-200
1881/12/16
PEDRO INÁCIO DE GOUVEIA é governador da Guiné 1º Mandato. Capitão-tenente, conselheiro, nomeado em 10 de Novembro de 1881, tomou posse em 16 de Dezembro. Foi exonerado a seu pedido, em 26 de Dezembro de 1884.
Numa tentativa de
afirmação da soberania portuguesa, verifica-se então o inicio de acções
militares punitivas contra os papeis em
Bissau e no Biombo (1882-84), os balantas em Nhacra (1882-84), os manjacos em
Caió (1883) e os beafadas em Djabadá (1882). A estratégia colonial passa
igualmente por uma segunda vertente: o apoio sistemático com tropas e armamento
a uma das partes dos conflitos indígena, o gue se passa em 1881-82, com o apoio aos fulas-pretos do Forreá na sua luta com os
fulas-forros. Os focos de contestação e a rebelião permanente e conseguente
dos diversos grupos étnicos fez com que o
poder colonial se limitasse ao controlo de algumas praças e presídios (Bissau,
Bolama, Cacheu, Farim e Geba). Paralelamente, começa a instalação de propriedade de colonos ou de luso-africanos em várías explorações
agrícolas de grande dimensão (pontas) inicialmente dedicadas ao cultivo da
mancarra.
1882
«O dominio portuguez n'esta parte occidental
da Africa estende-se a 62.000 km2, isto é, acha-se reduzido a pouco mais da quinta parte da antiga Senegambia
portugueza... A sua população deve ser muito mais de 2,5 milhões…»
M. M. de Barros: «Guinê portugueza ou breve noticia sobre alguns dos seus usos, costumes, linguas e origens de seus Povos», B.S.G.L., Vol. IlI, nº 12, 1882, p. 708.
Apud René Pélissier, História da Guiné Portugueses e Africanos na Senegâmbia
1841-1936, Volume
I, EDITORIAL ESTAMPA, 1997, p.
179
1882
-Resistência dos Beafadas de Jabadá contra a penetração portuguesa.
- Beldades de Geba, por
Costa Pessoa (1882)
Quando
saí de Lisboa em Outubro de 1879 com direcção á Guiné portuguesa, julgava,
senão impossível, pelo menos difícil encontrar indivíduos da raça preta que me
parecessem bonitos; mas logo que cheguei a Bolama e Bissau desenganei-me e
muito mais depois que,navegando no rio Geba, vim parar à povoação deste nome.
É
realmente interessante ver chegar a este presídio todos os dias grandes ranchos
de fuJas, fulas-forras e mandigas (mouras) dentre as quais aparecem tipos tão
bonitos e regulares,que muitas damas da nossa terra invejariam (salvo a cor).
Principalmente
dentre as fuJas-forras, tribo de cor bronzeada, aparecem raparigas de
rostocomprido, nariz aquilino, pequeno, lábios delgados, olhos vivos, apresentando um conjunto agradável e simpático.
O
seu vestuário é o mais simples possível, consiste unicamente em um pano de
algodão de0,5m de largura, algumas vezes enfeitado com contas, que passam à
volta da cintura. Nopescoço e tornozelos trazem também muitos fios de contas e
nos pulsos quantidade demanilhas. Do cabelo fazem um penteado em forma de barco
com a quilha para cima, que vaidesde o alto da cabeça até à nuca, deixando áà
volta na testa e nas fontes pequenas trançasa que prendem fios de comas com
moedas de prata nas extremidades.
Deu-se
um dia comigo um caso engraçado : Estando eu sentado à porta de um
negociantedeste presídio, vi chegar um rancho de fuJas que vinham fazer o seu
negócio. E entre elashavia uma que sobressaía mais do que qualquer outra por
ser mais bela e vir mais enfeitada.
Chamei-a
: ela aproximou-se e comecei então a examiná-la sem que ela a isso se
opusesse;porém uma rapariga cristã, que se achava entre elas, diz-lhe:
-Repara
que isto não é homem, é um boneco de molas movido por aquele (designando onegociante).
A
fula retorquiu-lhe:
-
Não, ele fala, tem olhos e cabelo.
-
Tudo é postiço, e não diz coisa que se entenda, respondeu a cristã. Tu percebes
algumacousa do que ele diz ? Já viste homem tão branco ? (Eu era o único
europeu que então meadiava em Geba, mas em Portugal não passava por ser dos
mais brancos).
A
esta última quartada fugiu a rapariga. Não se aproximou mais de mim, e hoje
seguem todasaquele exemplo.
☻
Numa segunda fase aos colonos e escravos, juntaram-se degradados banidos de
Portugal por crimes, questões políticas ou religiosas e judeus expulsos pela
inquisição. (sabe-se que, de 1802 até 1882, foram degredados de Portugal para o arquipélago 2433) (CARREIRA,
1983).
-
Os portugueses organizam uma coluna militar contra os beafadas de Jabadi (fevereiro).
-
Os portugueses fazem um tratado com Bambi Jai, régulo beafada de Jabadi e com o
régulo de Gam-Pará.
-
Os fulas forros atacam as feitorias do Río Grande.
-
Coluna militar contra os fulas forros ( 18/06).
-
Tratado com o régulo fula preto de lndomi, Demba Alfa Bacar (30/06).
-
Coluna militar contra a tabanca de de Cadíca, habitada por nalus (julho).
-
Coluna militar contra os fulas forros de Mamadi Paté.
-
Os portugueses fazem um tratado de paz com os régulos do Forreá: Bakar Kidaly,
Mamadi Paté e Baró Quentó Balanco (27/10).
-
Os fulas pretos, chefiados por Densá, atacam a feitoria de S.Belchior (março).
-
Campanha militar contra os balantas de Nhacra (05/07).
1882/01/00
«Agostinho
Coelho,
que
dispunha de tropas em quantidades não subestimáveis, mandou elevar a guarnição,
até
ali nominal, de Ziguinchor, a dezanove soldados válidos,
apoiados por dois canhões (Novembro de 1880). No entanto, é com o seu sucessor que se situou
o
salto português no Casamansa e atingiu, em 1882, as fronteiras do incidente
diplomático. É bom saber que, em 1882, os Franceses têm de fazer face, no Casamansa, ao último levantamento dos
Mandingas contra eles (79). As tropas que envolvem (cerca de 160 soldados e dois avisos) na margem
direita do Casamansa, são comparáveis às dos Portugueses no Forria, no mesmo
ano. Em Janeiro de 1882, o comandante do aviso La Cigafe, M. de
Rotrou, faz escala em Adeane e tenta
convencer os habitantes desta aldeia da margem esquerda, de que não são portugueses, pois que
estão situados em território francês, não possuindo os Pórtugueses mais que Ziguinchor. O chefe da aldeia, o mestiço instruído Manuel Custódio
Vermão (80), já encarregado do pavilhão em 1878, vai protestar
em Ziguinchor,
reclama
um
novo estandarte
e recebe-o. Para se proteger de um ataque dos Diolas (segundo os Franceses) ou
dos Banhuns (segundo os Portugueses), Adeane
pede a protecção de Ziguinchor. O chefe do presídio casamansense, o alferes Francisco A. Marques Geraldes desloca-se-á a Adeane e ali se fixará catorze
dias com uma força militar. Pela sua parte, de regresso da sua campanha
contra os Mandingas em torno de Sedhiou,
o comandante de Goreia, Jacquemart, desembarcou por sua vez (29 de
Fevereiro) em Adeane, ali hasteou a bandeira e impôs ao chefe
Manuel Custódio Vermão uma multa por se ter enganado, quanto a protectores. Era ao
posto francês de Sedhiou que deveria ter-se dirigido!
Jacquemart faz em seguida escala para Ziguinchor
onde convidou Francisco A. Marques Geraldes a não se intrometer mais nos assuntos de Adeane
(81). Tendo uma lancha a motor portuguesa sido acolhida
com entusiasmo em Adeane (fim de Março de 1882), vêem-se portanto os Portugueses içar a sua bandeira a três quilómetros da aldeia
(82). Nisto surge, cerca de 18 de Abril de 1882, um aviso francês
(83) que vem ancorar em frente desta «nova conquista» portuguesa com o
chefe do estado-maior do Senegal, o comandante Dodds, a bordo,
regressando da sua campanha contra os Mandingas. Podemos sorrir desta pequena guerra das bandeiras, porém as chancelarias em Paris e em Lisboa
estão alertadas (84). A marmita casamansense cozerá em fogo brando até 1884.
(79) Idem. pp. 168-179.
(80) O
Manel Verdade Christian Roche (Idem. p. 174). É divertido ver como a ignorância
linguística dos actores, dos copistas e dos compiladores, pode influenciar a historiografia.
(81) Idem, p. 174.
(82) Ramos da Silva: op. cit., p. 346. Parece realmente que os Portugueses anunciam que os Franceses vão saquear o país, o
que
faci
lita a reunião dos Banhuns.
(83) L 'Ecureuil. Paralelamente com a ignorância do português entre os Franceses, os secretários e os impressores portugueses
fazem
de L 'Ecureuil Lecurinil, promovido a comandante
de
canhoneira! Ibidem.
(84)
Negocios Externos: Documentos... op. cit., 1.0 Vol., 2.• Parte, pp. 72-75; pp.
82-87.»
René
Pélissier, História da Guiné Portugueses e Africanos na Senegâmbia
1841-1936, Volume
I, EDITORIAL ESTAMPA, 1997, pp.
207-208
1882/01/31
Louvado o major GERALDO ANTÓNIO VÍTOR comandante da
força encarregada de bater os Beafadas de Jabadá, os oficiais e demais
praças de pré pela maneira como souberam cumprir o seu dever. As operações foram primeiro comandadas pelo
capitão CARLOS MARIA DE SOUSA FERREIRA SIMÕES.
1882/02/11
«Durante
o ano de 1882 foram batidos os biafadas
de Jabadá, que em Janeiro dêsse ano haviam
incomodado as nossas fôrças. Em resultado da campanha· empreendida sob o comando do capitão Carlos Maria de Sousa Fierreira Simões, foi celebrado o tratado de paz e obediência, em 11 de Fevereiro, a
bordo do vapor Guiné, onde se encontravam o governador da colónia, Pedro Inácio de Gouveia, o 2.º tenente Francisco
Vieira, comandante do vapor, e os oficiais Boaventura Ribeiro da Fonseca e Jerónimo Vieira Magalhães.
No mesm.o· dia, foi
também assinado um auto de obediência da parte do régulo de
Gam-Pará.» João Barreto, HISTÓRIA
DA GUINÉ 1418-1918, edição do autor, Lisboa, 1938, pg.
304
Tratado de paz, amizade e obediência com o régulo beafada
de Jabadá,
Bambi Jai e com o régulo de Gam Pará (B. O.
11.0 10/1882).
1882/04/30
Em
30 de Abril de 1882, o comandante do
presídio (de Ziguinchor?), ANTÓNIO FIALHO renovou os direitos de Portugal sobre
Adeane. Fez saber aos comerciantes que deviam solicitar uma permissão para
se estabelecer lá. Dodds, que terminara uma campanha contra os Malinkés de
Sunkari Kamara de Morikunda, recebe a
bordo do "L'Ecureil" o régulo dos banhuns de
Adeane que lhe anuncia que uma lancha a vapor
portuguesa tinha vindo, em finais de Março, e que muitas bandeiras tinham sido
distribuídas nas tabancas vizinhas. O comandante do presidio terá dito, em
seguida, que uma coluna militar flancesa iria saquear o país
e que os banhuns timam interesse em colocar-se sob a protecção do governo
português. Desta vez, uma abordagem formal do Ministério dos Negócios
Estrangeiros é feita ao governo de Lisboa, que responde ao encarregado
de.negócios francês, em 14 de Outubro de 1882, com uma história completamente
diferente.
1882/06/30
«Em 30 de Junho, no presídio de Geba, prestou o preito de vassalagem o régulo fula-preto, Dembel, do Indornal
No mês de Julho, com o auxílio do vapor Guiné, deu-se um ataque à tabanca de Cadica, habitada por nalus.» João Barreto, HISTÓRIA DA GUINÉ 1418-1918, edição do autor, Lisboa, 1938, pg. 304
Tratado de paz e obediência do régulo Fula-preto de Indomá, Dembem Alfabacar (B. O. n.º 26, 1882).
1882/08/18
Jorge José Rodrigues Portela Prado - bacharel – nomeado
juiz de direito da Guiné em 18 de Agôsto de 1882. Serviu até 2 de Dezembro de 1884. Para delegado da Comarca foi
nomeado o bacharel José Inácio Delgado
de Carvalho, transferido para S. Tomé por decreto de 30 de Janeiro de 1883.
Tomou posse em 6 de Setembro e retirou-se para a metrópole em Maio do ano
seguinte, sendo transferido para Moçambique no mês de Novembro.
1883/09/28
É derrotado
por uma força militar o régulo Fula-forro
Mamadi Paté.
1882/10/03
Tenente-coronel FRANCISCO JOSÉ ROMA, comandante do
Batalhão de Caçadores n.º 1, louvado pela maneira brilhante como hateu as
tabancas de Marnadi Paté, no Forreá. Por decreto de 1 de Dezembro de 1882 foram condecorados o comandante FRANCISCO JOSÉ ROMA e o tenente VENTURA DUARTE BARROS DA
FONSECA, com os graus de Cavaleiro da
Torre e Espada e o capitão PEDRO MOREIRA DA FONSECA com ograu de Cavaleiro da
Ordem de Cristo.
1882/10/27
Tratado de paz, obediência e vassalagem do régulo de Forreâ,
Bakar Kidaly e chefes Fulas-forros Mamadi Paté e Baró Quentó Balanco.
1882/07/04
Louvado o comandante desta força, capitão CAETANO
FILIPE DE SOUSA, o capitão ANTÓNIO JOSÉ MACHADO, o tenente JOAQUIM ANTÓNIO DO
CARMO AZEVEDO, o alferes HEITOR ALBERTO DE AZEVEDO, o facultativo DAMASCENO
ISAAC DA COSTA, o furriel de artilharia JOSÉ MANUEL RODRIGUES, o soldado
ANTÓNIO HENRIQUESpela maneira como se portaram nessas operações dando ataque à grande tabanca de Cadica
(Nalús).
1883
«A população dos três
concelhos em que se divide a Guiné porlugueza, é a seguinte:
Bolama 3:731 indivíduos
Cacheu 1:881 »
Bissau 542 *
Total 6:154
D'esle numero, a que
não podemos dar inteira confiança, 5:500 representam indígenas, e o resto estranhos;
sendo a menor parte europeus.»
ESTUDOS SOBRE AS PROVÍNCIAS ULTRAMARINAS POR JOÃO DE
ANDRADE CORVO Volume I LISBOA POR ORDEM E NA TYPOGRAPHIA DA ACADEMIA REAL DAS
SCIENCIAS 1883, p. 94
«Na Guiné não ha que recuar, não ha que parar. Ou tudo ou nada. O gentio ali
ha de ser sempre insolente e sempre para temer emquanto não levar uma lição severa e geral que lhe sirva de escarmento... Effectivamente, das três principaes nações que dominam a Guiné, a portugueza é, e tem sido sempre, a mais sympathica aos gentios...»
Aleixo Justiniano
Socrates da Costa: «Provinda da Guiné portugueza», B.S.G.L. Vol. IV, n? 2, 1883, p. 100; p. 108.
Apud René Pélissier, História da Guiné Portugueses e Africanos na Senegâmbia
1841-1936, Volume
I, EDITORIAL ESTAMPA, 1997, p.
179
«Hoje o que temos dil o
o relatório a que acima nos referimos: «O districto da Guiné compoe-se
actualmente de tres concelhos, que tem por sede Bissau (capital do disfricto),
Bolama e Cacheu. Dependentes d'estes concelhos temos vários presídios, em que
conservamos auctoridades nossas e força militar, mais ou menos numerosa.
D'estes presídios os principaes são:
No concelho de Bissau o
presidio de Geba, no extremo navegável do rio de Geba. No concelho de Bolama a
povoação de Santa Cruz de Buba, onde por emquanto não temos força militar, por
não a haver sufficiente. Tem um chefe civil, que é ordinariamente um dos
negociantes alli estabelecidos. No concelho de Cacheu os presídios de Farim e
Zeguichor, onde conservamos pequenos destacamentos. Farim é situado no extremo
navegável do rio Farim, e Zeguichor no rio Casamansa.
«São estes actualmente os
estabelecimentos que temos nos extremos domínios da Guiné, ou aquelles em que
temos auctoridade e força, ainda que em muito pequeno numero, para occorrer a qualquer eventualidade»
Para acudir a este
estado de coisas, e em consequência de um accidente desastroso, entendeu o
governo da metrópole, de accordo com as indicações dos governadores de Cabo
Verde, dever crear um governo independente na Guiné.
Qual venha a ser no
futuro o resultado d'esta me ilida, não o podemos calcular: mas está-nos
parecendo que, se ella não for acompanhada de uma acção enérgica, de
demonstrações claras de força e do emprego de capitães consideráveis, virá a
ter a mesma sorte que a desastrosa medida adoptada por D. Pedro no fim do século
xvii.»
Estudos Sobre as Províncias Ultramarinas, por JOÃO DE
ANDRADE CORVO, Volume I, LISBOA, POR ORDEM E NA TYPOGRAPHIA DA ACADEMIA REAL
DAS SCIENCIAS, 1883, pg.50-53
«Antes de terminar este
estudo sobre a antiga província de Gabo Verde, devemos lançar as vistas para a
Guiné portugueza, que hoje occupa um logar pouco importante entre as nossas
colónias africanas; mas que, um melhor regimen administrativo, maior segurança
publica, mais constantes e regulares communicações, quer com o archipelago de
Gabo Verde, quer com a metrópole, um conhecimento mais perfeito dos seus
recursos c a mais completa liberdade de commercio, podem rapidamente
transformar.
Esteve por largos annos a Guiné unida á provincia de Cabo
Verde; e, como abandonada por todos, na sua situação subalterna. Infamado pela má
reputação de insalubridade, que sobre elle pesa, este território, situado na costa da Guiné entie 10° 21' e 13° 10' de
latitude norte, não era considerado senão como um mercado bem abastecido de
escravos; e. como tal, era procurado pelos especuladores de diversas
nacionalidades, que a esse trafico se entregavam.»
Estudos Sobre as Províncias Ultramarinas, por JOÃO DE
ANDRADE CORVO, Volume I, LISBOA, POR ORDEM E NA TYPOGRAPHIA DA ACADEMIA REAL
DAS SCIENCIAS, 1883, pg.89-90
«A organisação e o
progresso da Guiné é problema, sobretudo económico. Uma boa pauta pode
transformar o commercio naquella colónia, e ella não pode ser por nós considerada senão como uma importantíssima
estação commercial.
A população dos três
concelhos em que se divide a Guiné porlugueza, é a seguinte:
Bolama 3:731 indivíduos
Cacheu 1:881
Bissau 542
Total 6:154
D'esle numero, a que
não podemos dar inteira confiança, 5:500 representam indígenas, e o resto
estranhos; sendo a menor parte europeus.» Ib. Pg.94-95
1883 - A
povoação de S. Belchior é atacada por Fulas-pretos, comandados por Densá. Lutas
entre Portugueses e Balantas na região de Nhacra.
1883/02/23
Vigorosamente
defendidos
por seu prefeito, Félix Cros, os comerciantes de Goreia reivindicação
vice-governador, em Fevereiro de 1883, que seja dada uma mora
durante um ano aos comerciantes
franceses
estabelecidos e com depósitos de mercadorias em Ziguinchor. .-.e
carta datada de 23 de Fevereiro Félix Cros escreveu: «Penso que, para
simplificar as questões x comércio, é melhor negociar com Portugal a
anexação pura e simples de Ziguinchor, dado o seu
fraco poder». Em 22 de janeiro de 1884, renovou
as mesmas reivindicações e tamõér: reivindicou
isenção de taxa de porto para os barcos que vão Zlguinchor para aí armaze."'ar
j'l)(juJs, reservando-se a
aplicação desses impostos apenas aos navios ou barcos que .a.carreguem esses
mesmos produtos para exportação.
É a
afirmação do interesse dos comerciantes franceses por
Ziguinchor, o que fará que ela se me senegalesa
mais
tarde, a capital regional da Casamansa. No entanto, Zigulnchor
por si só não tem valor algum. O seu tamanho está reduzido a alguns hectares
de natureza agreste, e a sua defesa mílitar são algumas muralhas velhas e decrépitas,
mal servida por dois ou três
canhôes meio enterrados no chão. Para o
comércio vale zero.
Três razões essenciais levam os
comerciantes franceses a reivindicar o enclave português. Em primeiro lugar, a sua
localização no rio entre Seejo e Carabane .. Bem colocada. acessível aos barcos, tem a vantagem de evitar transbordas impostos pela baixios de Piedras,
ponto a evitar pelos barcos de grande tonelagem para chegar a Sejo. Apesar
dos ataques de Fodé Kaba e do seu rival Birahim N'Draye
que saqueiam o baixo Soungrougrou desde 1883, há pontos
do
rio
com
ligações mais fáceis com Ziguinchor do que com a
capital do Bujé. O declínio na produção de amendoim nas regiões malinkés e o desenvolvimento dos recursos florestais fomentam a procura e o controlo de novas terras a
jusante. O progresso espetacular
da borracha, o aumento da procura de sementes de palma
e coco dá à Baixa Casamansa uma nova importância. A zona
diola cria ambições. O comércio vai sugerir novas conquistas.
Pela sua
situação, Ziguinchor
torna-se o seu objectivo imediato ..
1883/03/00
«Os
conflitos intra-fulas no Forria
Em compensação, o governador Gouveia decide encontrar uma solução para o
problema do Forria. É o mais urgente, pois que as pontas vêem o seu comércio
paralizado pelas desordens. Mais perspicaz ou melhor informado que Agostinho
Coelho, pró-Fulas-Pretos até ao exagero, Gouveia compreende que se trata, acima
de tudo, de um conflito social entre os senhores de ontem, os Fulas-Forros e os
seus (ex-) escravos, os Fulas-Pretos que, até aqui, beneficiaram do apoio
português. Papel raro para os Portugueses em África, o mastro da bandeira em
Buba passou a ser o símbolo da emancipação e, quase todos os dias, refugiados
fulas-pretos vinham ou vêm abraçá-lo para acentuar, assim, que romperam com os
seus antigos opressores. Para manter um ar de calma, a solução do governador
consistirá em separar geograficamente os Fulas-Forros dos Fulas-Pretos, mesmo reactivando
as trocas; mantendo os Fulas-Forros no Forria, espera reconquistar para Buba o
comércio do Labé e do resto do Futa-Djalon e, ordenando expressamente aos
Fulas-Pretos para se reinstalarem no Corubal ou, muito mais longínquamente, no
Firdu (ou Fuladu) no Alto-Casamansa (92), conta voltar a dar vida a Geba e a
Farim (93). Mas o acordo não se mantém e os Fulas-Pretos regressam a Bolola e, ven doisto, os Fulas-Forros,
sob o comando de Bakar Kidali, obtêm autorização dos Portugueses para os desalojar. Estando em desvantagem, os Fulas-Pretos locais refugiam-se numa tabanca perto de Buba e, derrubando
as velhas alianças, os Portugueses do posto, intimam-nos a partir para o Norte, sob pena de os mandarem
expulsar pelos Fulas-Forros (datas desconhecidas). Questão má
para os Fulas-Pretos, que voltam a subir em direcção ao Corubal, lançando-se em incursões de rapina que só conhecemos quando são dirigidas
contra um ponto português. E é o que acontece no começo de Março de 1883: o velho estabelecimento abandonado de São Belchior
dependendo, nominalmente, de Geba, é posto a saque por Fulas-Pretos, comandados por Densá (Deusá, Dansá ou Dansó Demba)
filho do rei do Firdu (ver a seguir). Aprisionam 12 grumetes, homens e mulheres.
Os primeiros
choques entre o Firdu e
os Portugueses
É evidente que, enquanto os assassínios e os raptos se limitam
ao gentio, os Portugueses não reagem muito.
Mas, «cristãos», os grumetes são eleitores que não se podem deixar capturar e vender em escravatura
impunemente, mesmo em pontos abandonados. Densá, aliás, sai-se muito mal
quando vai oferecer ao alferes Francisco A. Marques Geraldes (transferido do Casamansa para Geba) gado apanhado em São Belchior. Este oficial enérgico - que se ganharia em conhecer melhor (94), porque
parece ser um precursor daqueles a que chamamos Centuriões
em
Moçambique - recusa o presente, exige a libertação dos cativos, obtém a
de dez homens, mas chega demasiado tarde para a de duas mulheres. Provavelmente,
para as trocar na Gâmbia por cavalos, Densá mandou-as partir para o Firdu (ou Fuladu), no
Alto-Casamansa. O que é portando o Firdu?
(92) Por que não no antigo Gabu, mais próximo?
(93) Ramos da Silva: Ob. Cit., p. 348. Farim caiu numa
decrepitude económica momenrâhea, tcndo-se retirado as grandes casas francesas
e desviando-se as caravanas em direcção a Sedhiou (A. de Barros: «A força
armada na Guiné», As Colonias Portuguezas, 1.º anno. n.º
1, 1 de Janeiro de 1883. p. 5). O autor deste texto preconiza um redesdobramanto
irrealizável das guarnições (abandono de Bissau à segunda linha grumete, instalação
em Bolor. Etc.!
(84) Viram-no em Ziguinchor em 1882, porém era igualmente alferes na guarnição de Buba que repeliu Yaya a 1 de Fevereiro de 1881.
René
Pélissier, História da Guiné Portugueses e Africanos na Senegâmbia
1841-1936, Volume
I, EDITORIAL ESTAMPA, 1997, pp.
210-211
Ataque dos Fulas-forros a S. Belchior.
«No ano
de 1883 no mês de Março a povoação de S. Belchior foi atacada pelos fulas-pretos, capitaneados por Densá, que destruíram as casas e
aprisionaram os moradores cristãos.
Por conselho do allferes Marques Geraldes, comandante
de Geba, Densá mandou apresentar no presídio os
prisioneiros, talvez para não comprometer o seu pai, régulo
Dembel, que no ano anterior havia prestado obediência ao govêrno português.
O régulo deu satid ações procurando desculpar os excessos do filho
e mandou entregar uma pequena quantia em dinheiro como indemnização pelos
prejuízos causados.»
João Barreto, HISTÓRIA DA GUINÉ 1418-1918, edição do autor, Lisboa, 1938, pg. 304
1883/04/05
Tratado de paz com Adju Pumol, régulo das ilhetas; foram louvados os
oficiais que nele intervierarn, capitão
CARLOS MARIA DE SOUSA FERREIRA SIMÕES, 2.° tenente EUGÉNIO SOARES ANDREA e
guarda-marinha AUGUSTO EDUARDO NEUPART e o capitão de 2." linha ESTÊVÃO
ANTÓNIO TAVARES. O tratado foi publicado no «Boletim Oficial» n.º 23/1883.
1883/06/23
Campanha contra os Balantas de Nhacra, sendo louvados os
capitães CARLOS MARIA DE SOUSA FERREIRA SIMÕES, CAETANO FILIPE DE SOUSA (este capitão acabou
por morrer em Bolama em 1886 evido a ferimentos sofridos em campanha) e
ALFREDO BALBINO ROSA e os comerciantes César Medina e a casa Blanchard e Olivier.
1884
1884-
Resistência das tabancas de Jebelor, Jebocuer e Bori, contra
uma coluna portuguesa capitaneada por António Machado. Os
Felupes aprisionam uma chalupa portuguesa em Boqué.
- Campanha mililar contra as tabancas de Jebelor, Jebecuer
e Bori, nas imediações de Ziguichor (1 a 16 de abril).
- A canhoneira portuguesa Bengo bombardeia Biombo,
seguindo-se o desembarque e destruição da tabanca de Silho.
1884/1885
Conferencia Berlim
1884-1885. Os países imperialistas europeus dividem a África.
A Conferência de Berlim realizada
entre 19 de Novembro de 1884 e 26 de fevereiro de 1885 teve
como objetivo organizar, na forma de regras, a ocupação de África pelas potências coloniais e resultou numa divisão que
não respeitou, nem a história, nem as relações étnicas e mesmo familiares dos povos do
Continente. No congresso, que foi proposto por Portugal e organizado pelo Chanceler Otto von Bismarck da Alemanha— país anfitrião, que não possuía
colônias na África, mas tinha esse desejo e viu-o satisfeito, passando a
administrar o “Sudoeste Africano” (atual Namíbia) e o Tanganhica—participaram ainda a Grã-Bretanha, França, Espanha, Itália, Bélgica, Holanda, Dinamarca,Estados
Unidos da América, Suécia, Áustria-Hungria, Império Otomano. Os Estados Unidos possuíam uma colônia na
África,a Libéria, só que muito tarde, mas eram uma
potência em ascensão e tinham passado recentemente por uma guerra civil (1861-1865)
relacionada com a abolição da escravatura naquele país; a Grã-Bretanha tinha-a abolido no
seu império em 1834. A Turquia
também não possuía colónias na África, mas era o centro doImpério Otomano, com interesses no norte de África. Os restantes
países europeus que não foram “contemplados” na partilha de África, também eram potências comerciais
ou industriais, com interesses indirectos naquele continente. Num momento desta
conferência, Portugal apresentou um projecto, o famoso Mapa cor-de-rosa, que consistia em ligarAngola a Moçambique para haver uma comunicação entre as duas
colônias, facilitando o comércio e o transporte de mercadorias. Sucedeu que,
apesar de todos concordarem com o projecto, a Inglaterra, à margem
do TrActado de
Windsor,
surpreendeu com a negação face ao projecto e fez um ultimato, conhecido como Ultimato
britânico de 1890, ameaçando
guerra se Portugal não acabasse com o projecto. Portugal, com medo de uma
crise, não criou guerra com Inglaterra e todo o projecto foi-se abaixo. Como
resultado desta conferência, a Grã-Bretanha passou a administrar toda a África Austral, com excepção das colónias portuguesas de Angola e Moçambique e o Sudoeste Africano, toda a África Oriental, com excepção do Tanganica e partilhou a costa
ocidental e o norte com a França, a Espanha e Portugal (Guiné-Bissau e Cabo Verde); o Congo – que
estava no centro da disputa, o próprio nome da Conferência em alemão é “Conferência do Congo” – continuou como
“propriedade” daAssociação Internacional do Congo, cujo principal accionista era o rei Leopoldo II da Bélgica; este país passou ainda a
administrar os pequenos reinos das montanhas a leste, o Ruanda e
o Burundi.
A
ocupação do Estado livre do Congo causou discórdia com outros imperialistas que
exigiam direitos iguais e mostrou a necessidade de um pacto que establecesse
uma determinada ordem no processo imperialista. O ministro de estado alemão
Bismarque tomou então a iniciativa de organizar uma Conferência dos estados
europeus em Berlim 1884-1885 onde participaram a Inglaterra, França, Alemanha,
Italia, Portugal, Espanha e o rei belga Leopoldo II a título pessoal.
Um
dos resultados da Conferncia foi que o rei Leopoldo II conservou o Estado livre
do Congo como sua propriedade pessoal. A confereência decidiu também a divisão
da África pelos países representados, o que foi feito com uma régua em cima do
mapa unindo pontos determinados simplesmente por longitude e latitude sem a
mínima consideração, dos diferentes povos, nacionalidades, culturas ou
condições geográficas. Em muitas fronteiras entre os estados Áfricanos ainda
hoje se vê a ”política da régua” da Conferência de Berlim. Uma outra desisão da
Conferência foi que nenhum país europeu podia ocupar novas regiões sem primeiro
informar os outros e obter a sua aprovação.
Assim
começou a ocupação massiva de África feita por exércitos bem equipados e
armados com armas modernas, vindos de todos os lados, entrando em todos os
países e destruindo e eliminando sem piedade qualquer tipo de oposição. Depois
de 400 anos de comércio de escravos a estrutura das sociedades africanas estava
muito fraca em quase todos os lados e os africanos não tinham quase nenhumas
possibilidades de defender os seus países. O comércio de escravos não tinha
implicado sómente o desaparecimento de pessoas jovens, as esperanças do
desenvolvimento e do futúro. O comércio de escravos produziu também uma
estagnação no desenvolvimento da produção em África. A causa desta estagnação
foi a monopolização do comércio africano pelos europeus e a consequente
diminuição do comércio com produtos africanos uma vez que pessoas feitas
escravas era só o que os europeus aceitavam nas trocas comerciais.
Depois
da ocupação de África, a classe dominante europeia submeteu os povos africanos
a uma exploração e opressão sem precedentes, por vezes pior que o comércio de
escravos. Todos os colonialistas dos países europeus tomaram parte nesta
barbaridade sem terem grandes problemas. E quando dizemos todos os
colonialistas significa todos! Desde as velhinhas belgas com muito boa
educação, dos ingenheiros inglêses com qualificações universitárias, dos
tenentes franceses bem perfumados, dos investigadores alemães de línguas, dos
camponeses senhoriais portuguêses, até aos soldados, polícias, padres e
missionários de todos os países da Europa.
1884/02/08
Em Fevereiro
de
1884 houve um incidente entre as autoridades francesas e portuguesas. Na manhã
de 4 de fevereiro de, um caçador francês, Laglaise, fez o seu
acampamento nas margens do rio Gasamansa, a uma curta distância da tabanca banhum de
Sinedone. Hasteou uma bandeira francesa num mastro rústico para dar a conhecer
a sua nacionalidade. Algum tempo depois, Diul, o régulo
da tabanca, vem dizer a Laglaise para arrear a sua bandeira e substituí-la
pela bandeira portuguesa. A 8 de Fevereiro, às 22 horas, o comandante do presídio de Ziguinchor prende Laglaise e fá-lo encarcerar em Ziguinchor
por insulto às cores portuguesas. Foi liberado com a intervenção do comerciante CHAMBAZ, sob condição de não sair de Ziguinchor. Tendo
notícia disso em Sejo, o vice-qovernador Bayol chega a Ziguinchor na manhã de
14 de Fevereiro.
Lembra
que Sinedone está sob proteção francesa desde o tratado de 18 março de 1865 e
que a prisão de Laglaise é ilegal. O comandante do presídio nega o facto e
alega que o território de Sinedone é
protectorado de Portugal., É propriedade da
família do chefe da alfândega de Ziguinchor, Ernesto José Afonso, que comprou o terreno ao régulo
banhum Fati Dinali, signatário do tratado de 1865. A família Afonso está representada em
Sínedone por uma mulher e sempre desejou que a sua propriedade estivesse
sob a proteção de Portugal. Bayol argumentou que os direitos de propriedade não
podem sobrepor-se aos direitos de soberania da França, mas o seu interlocotor diz-lhe
que vai informar o seu superior imediato, o comandante do presídio de Cacheu.
Em 18 de Fevererro, não havendo ainda nenhuma resposta, o aviso "Le Héron"
colocasse em frente a Sinedone ao início da tarde.
Os seus habitantes,
assustados,
aceitam astear uma bandeira francesa, mas ficam com medo das represálias
dos pmtugueses. Por isso, no dia seguinte hasteiam novamente a bandeira portuguesa e
recusam negociar com os franceses, abandonando a aldeia. O destacamento militar
de '"Héron" desembarca e, comandado pelo capitão Lenoir.
incendeia as palhotas de Diul, os celeiros de arroz e chacina os rebanhos.
Laglaise é libertado a 21 de Fevereiro e, a 22,
Sinedone, apertada entre seus dois "protectores" pede paz. O
vice--governador encontra em Ziguinchor
Joaquim d'Almeida, Secretário-geral da Guiné Portuguesa, chegado de Bissau, e que
protesta contra a punição infligida a Sinedone. Os dois homens concordam em
submeter a controvérsta a seus respectivos governos, Enquanto
isso, o statu-quo é respeitado por ambas as partes.
Em 8 de março
de 1884, o governador Bourdiaux envia ao Ministro Félix Faure
relatório completo sobre o incidente de Sinedone feito por Bayol. Aprova a
conduta do vice-governador e acrescentou: «Acho que podemos
tomar por base em um acordo com os portugueses a venda de Ziguinchor
e
dar
em compensação o rio Cassimi, que não ocupamos mas que nos
pertence em virtude do tratado de 28 de Novembro de 1865,
assinado por Pinet-Laprade». A sugestão parece particularmente apropriada, por
ser inspirada em interesses comerciais e porque um novo incidente
lranco-português
irá dar-lhe mais cabimento.
1884/03/03
Nomeação
de D.JOAQUIM AUGUSTO DE BARROS como
bispo da diocese de Cabo Verde
1884/04/03
Em 28 de
março, o vapor
português "Cassini"
passa per Carabane para exigir
aos habitantes de M'Béring a entrega de quinze pessoas que eles tinham seqüestrado perto de Zrguinchor. Aterrorizados com as
histórias de razias feitas por Fodé Kaba a norte do rio, tinham dixado as
suas
tabancas
para refugiar-se em Ziguinchor. Os
régulos de M'Béring recusaram entegá-los ao comandante
do presídio, o qual os ameaçou
de
represálias.
A 3 de abril, a canhoneira “Bengo", tendo a bordo o governador da Guiné Portuguesa, Pedro
Inácio de Gouveia, passa por Garabane em direcção
a Ziguinchor, onde chegou na noite do dia 4, atrasando-se por um encalhamento
sofrido.
O
sargento Tellier, chefe de posto de Carabane, vai à noite a M'Béring em visita as
suas
três
tabancas,
Jirel,
Jiguero e Butemol. Os régulos dizem-lhe que o governador tinha enviado um delegado, António Pereira de Carvalho, pra
reclamar as pessoas tinham sido sequestradas. Eles responderam-lhe
que tinham sido os da tabanca vizinha de Jibonker os raptores e que tinham tentado
que eles fossem devolvidos. Furioso, Carvalho ameaçou pegar fogo
às tabancas. Eles responderam, então, que pertenciam aos franceses. Tellier
decidiu ficar em M'Béring no dia 5 de Abril para tranquilizar a
população e esperar pela eventual chegada dos portugueses. Voltou para
Carabane no dia 6. E, é claro, os portugueses incendiaram e saquearam as três tabancas de M'Béring. A canhoneira "Bengo"
torna a passar dia 8 em frente de Carabane. Tellier vai dia 9 a
M'Béring para ver os estragos. A 10 visita os régulos de
Jibonker que lhe mostram um papel com o carimbo da canhoneira '"Bengo"
e
assinado por Pedro Inácio de Gouveia. Os portugueses tinham escrito que os habitantes de
Jibonker, a conselho dos de Jibelor, tinham pedido perdão ao governador pelas ofensas feitas ao
presídio. E prometido, como indemnização., vinte
vacas e cem alqueires de arroz para ser distribuído pela população de Ziguinchor. Mas
apressaram-se a dizer que esta “indemnização"
era
uma
imposição
e que não tinham intenção de a pagar.
Com mais
sorte que M'Béring, Jibonker escapou de ser incendiada. Mas não foi
por acaso. A decisão dos portugueses foi alterada por uma carta do
vice-governador Bayol enviada por Tellier e que chegou a Ziguinchor a 6 de Abril às 22h15. Entre outras coisas, continha uma cópia do
tratado assinado a 30 de Março de 1828 entre o comandante do aviso "Le Serpent"
e o régulo de !'Béring e das regiões vizinhas. O governador da Guiné Portuguesa respondeu
na
manhã de 7 de Abril. Declarou que esse tratado não era do conhecimento
dos habitantes de Ziguinchor , nem dos de
M'Béring, os quais nunca tinham feito alusão a
um protectorado francês. Em conclusão manifestou o desejo
de ser mantido o statu-quo até que os governos de Paris e de Lisboa decidam de
maneira definitrva a questão das fronteiras entre o Senegal e a Guiné
Portuguesa.
Assim, com essas
várias tentativas para impor a sua autoridade nas várias tabancas próximas óe Ziguinchor, os
portugueses procuram fazer valer os seus direitos sobre a Casamansa e adquirir algumas
vantagens e conseguir garantras na perspectiva duma troca com
os franceses.
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