sexta-feira, 1 de julho de 2016

GUERRAS 1853/05/02-1871/08/22

1853/05/02
Em 2 de Maio de 1853 rebenta uma rebelião no presídio de Geba, tendo HONÓRIO PEREIRA BARRETO partido para lá no dia 10 para a dominar. Conseguiu-o dez dias depois. Após a pacificação de Geba foi solicitada a sua intervenção para obter uma paz com os papéis que parecia não mais se realizar. Tentou negociar mas os comandos não aceitaram as suas propostas. No final de 1853 assumiu o governo interino de Bissau, tendo-o entregue ao seu proprietário, capitão-tenente ROMÃO FERREIRA, em Fevereiro do ano seguinte.
«Em 13 de maio de 1853 relatou o governador interino da Guiné, Azevedo, que em 2 d'este mez teve noticia de uma rebellião em Geba promovida pelos indigenas, que o obrigou a ir a essa povoação para restabelecer a ordem, sem resultado algum, por se negarem a prestar obediencia., e por isso convidou o governador interino de Cacheu, Honorio Pereiro Barreto, para se dirigir áquelle ponto, onde, pela sua influencia que tinha para com estes povos, os poderia submetter.
Acceitou Honorio essa incumbencia e tendo sido acompanhado, por solicitações suas, pelo negociante João Marques de Barros, seguiu no dia 10 do referido mês de maio e conseguiu pacificar Geba.
Em 18 de maio apresentou Honorio Barreto o seu relatorio. Em 11 chegou a Geba e a 13 reuniu os moradores e os aconselhou a serem obedientes ao governo. Responderam que haviam recebido de Nicolau Monteiro de Macedo algumas cartas prevenindo-os do exclusivo do sal, e que este exclusivo lhes era prejudicial, pois tinham de comprar por seis bandas a sangra do sal que até ali compravam por duas; que desesperados, por isto, tinham também impedido a saída das producções d'aquelle ponto.
Que emquanto aos direitos do sal, declararam que nenhuma protecção recebiam do governo, pois que a sua igreja estava a cair e não se dava dinheiro para a sua reconstrucção; que havia ali duas peças de artilharia montadas á sua custa e não do governo e que, finalmente, quando eram escravizados pelos gentios, a cujas terras eram obrigados a ir buscar o sustento, eram comprados pelos negociantes, ficando escravos, sem que o governo se intromettesse em tal.
Mais disseram que foram ameaçados por Nicolau Macedo que os havia de reduzir ao maior apuro, obrigando-os a serem mandingas e que estavam convencido.s que o imposto do sal fôra estabelecido só para satisfazer este negociante, o que explicavam mencionando o facto do gentio de Bericama ter tomado os hens pertencentes a Nicolau Macedo, os quaes se achavam naquelie territorio, por causa da questão José Valerio. Então Macedo pagou aos grumetes de Geba para atacarem Bericama; depois de pagos recusaram-se a combater; então jurou vingança a Geba e o imposto do sal proporcionou-lhe boa occasião para isso, vendendo ao gentio por 200 réis cada sangra que até ali era a 400 réis, prejudicando assim o commercio de Geba.
Garantiu-lhes Honorio que o Governador Geral não approvaria mais esse exclusivo e que só· pagariam o imposto como estava estabelecido; declararam então entrar na obediencia e não difficultariam aos negociantes de Bissau o commercio.
Todavia imploraram de Honorio para que conseguisse que a fiscalização do imposto fosse no forte de S. Belchior, porque eram obrigados a vir ao porto de Bissau despachar o sal antes de o comprar e assim despachavam muita vezes um certo numero de sangras que depois não compravam nos Balantas, perdendo taes direitos; estes direitos pagayam sobre os objectos que levavam para comprar sal; álem d'isto eram obrigados a desembarcar em S. Belchior para se verificar o despacho.
Finalmente solicitaram-lhe que os alliviasse de semelhante imposto, pois era com o sal que compravam generos alimentícios.
Honorio Barreto prometteu-lhes interceder junto do Governador Geral para que fossem attendidos nas suas justas aspirações, e muito concorreu João Marques de Barros para tão bom resultado, e tendo-se feito a despesa de 58$100 réis, com esta diligencia, não quis este negociante que a fazenda lhe pagasse.
No dia 20 apresentou-se em Bissau Honorio Barreto com dois homens de Geba que vinham em nome d'aquelle povo prestar obediencia e pedir que o sal se despachasse em S. Belchior pelos motivos allegados.
O governador de Bissau informon bem esta pretensão ao Governador Geral, bem como a da reconstruão da igreja.
Effectuada a pacificação de Geba empenhou-se Honorio Barreto em conseguir a paz com os grumetes e rei de Bandim, em Bissau, sob a condição de entregarem os escravos e soldados que para ali tinham fugido, garantindo-lhes o governo que algumas questões procedentes de dividas que tinham na Praça se davam por de nenhum effeito.
Nem os grumetes e nem e rei de Bandim se sujeitaram ás condições impostas.
Em 5 de junho de 1853 houve uma revolta, puramente militar, na Praça de Bissau, devido ao pouco senso do commandante da bateria.
Governava a Praça, interinamente, o major Diogo Maria de Moraes, que pediu auxilio ao governo francês para a sutlocar e para Cabo Verde ao Governador Geral.
Os soldados saquearam a Praça e embora fossem más as nossas relações com os grumetes e gentios vizinhos, estes apenas se approximavam da Praça, sem nos hostilizar, para receber alguns objectos roubados pelos soldados.
Em soccorro da Praça appareceu o brigue francês Palinure, sob o comando do capitão de mar e guerra Augusto Bosse, no dia 18 de junho, cuja guarnição logo occupou a Praça, depois de travar lucta com os insubordinados soldados.
O Governador Geral organizou uma expedição que partiu para Bissau no dia 15 de agosto, composta da escuna Cabo Verde e do patacho Eleonor; a bordo da escuna seguiu o major reformado Francisco Alberto de Azevedo, nomeado presidente do conselho de investigação a .que haviam de responder todas as praças do batalhão de linha, que se revoltaram, tendo sido também nomeado governador interino, durante o impedimento do effectivo., Correia da Silva.
No Eleonor seguiram um capitão, dois segundos tenentes e sessenta e nove praças.
Convencionou o Governador Geral, que tinha passado a Bissau, com o rei de Bandim e com o juiz dos grumetes para a entrega de escravos fugidos, concedendo-se liberdade aos gentios e grumetes de entrarem na Praça e aos moradores d'esta lívre passagem no terreno dos gentios.
Pcrmittiu mais que os grumetes tornassem a vir habitar junto á Praça, mas com sujeição ás autoridades portuguesas.
Deixou contratada a construcç.ão de um edificio para alfandega, que seria custeada pele rendimento dos armazens.
O governador, em data de 8 de outubro de 1853, fez uma longa exposição ou relatorio, d'este acontecimento que o obrigou a embarcar no vapor ilfindello, mandado de Lisboa a Cabo Verde para o receber e conduzi-lo a Bissau, o que fez no dia 19 de setembro, saindo de S. Vicente, para onde tinha passado da ilha Brava, no referido vapor que ali fôra receber carvão.
Chegou a Bissau a 24., encontrando já a Praça em socego, para o que contribuiu o navio de guerra francês, e á activa vigilancia do governador interino, dos ofliciaes de guarnição e negociantes que, com seus escravos armados, auxiliaram as autoridades efficazmente, guardando os cabeças de motim presos em um brigue fundeado no porto, fazendo-se rondas e patrulhas.
Álem dos cabeças de motim tinha o major Moraes mandado para a Praia 24 praças de pret, 19 para Cacheu e algumas outras para o forte de S. Belchior, ficando só com recrutas ainda algum tempo depois da retirada do brigue francês. A guarnição d'este brigue occupou a Praça durante 21 dias, desde 18 de junho até 9 de julho, adoecendo-lhe muita gente, o que fez apressar a sua retirada. Recebeu este brigue algum mantimento por conta da fazenda e um pratico do canal, tudo ua imporlancia de uns 120$000 réis, que o commandante quis pagar. e no que não consentiu o governador Moraes.
Pretendeu o commandante da Palinure arvorar a bandeira francesa ao lado da portuguesa em Bissau, mas não conseguiu esse desejo por se oppôr a isso o governador.
A revolta, puramente militar, foi consequencia da pessima administração do commandante da bateria. Tanto este commandante como os cabeças de motim responderam, em Bissau, a um conselho de investigação e embarcaram, em 18 de setembro, no pataoho Eleonor para a villa da Praia, sendo o patacho comboiado pela escuna de guerra Cabo Verde.
Os gentios, munidos de cabazes e balaios, occupavam os arredores da Praça para auxiliarem os soldados no saque.
Por occasião d'essa revolta apresentou-se em Bissau o novo governador nomeado, o capitão de engenheiros JoMaria Correia da Silva, que mostrou sempre grande hesitação nas medidas que lhe eram reclamadas, e adoecendo com febres ligeiras, succumbiu a tal ponto que entregou o governo ao capitão Gregorio Alexandre Medina, que procedeu com energia.
Existia, havia annos, uma causa de desconfiança e de permanente hostilidade, que convinha remover no primeiro ensejo favoravel.
A guerra, havida em 1844, entre a Praça e os gentios vizinhos, deu logar a que fossem expulsos os grumetes que habitavam nos arredores da Praça, por estes consentirem que, da sua povoação, os gentios fizessem fogo contra a fortaleza; foram queimadas e arrasadas essas casas, e nesse terreno, junto á praia, edificaram alguns negociantes casas regulares e o mesmo fizeram alguns grumetes que se conservavam fieis ao governo, as quaes ficaram protegidas por uma tabanca, que se construiu de pedra, e pelo forte do Pigiguiti. O lado opposto da Praça estava fechada por uma estacada que terminava n'o mar.
As terras circumvizinhas á Praça pertenciam aos grumetes e não obstante isso conservavam-se incultas desde 1845, tendo sido infructiferas todas as diligencias por elles empregadas para as virem cultivar e habitar.
Esta tenaz denegação da parte da Praça, junto ao signal permanente da desconfiança contra elles, caracterizados pela tabanca e palissada, e bem assim os maus tratos de que muitas vezes eram victimas, quando vinham a Bissau tratar de negocios, pela soldadesca desenfreada sem que ninguém attendesse as suas reclamações, foram as causas por que os referidos grumetes estiveram em hostilidade permanente contra a povoação e Praça; e d'ahi resultou terem dado descarado acolhimento aos desertores e aos escravos dos habitantes da povoação, influindo para que o rei de Bandim se recusasse a entregá-los, como d'antes fazia.
Em março, quando ali esteve o Governador Geral, pela primeira vez, em Bissau, tinha encarregado Honorio Barreto de tratar d'esta questão com o rei de Bandim, promovendo a entrega dos escravos; o resultado não correspondeu á espectativa do governador, por aquelle rei e o juiz dos grumetes se recusarem a entregá-los, allegando a má fé com que sempre se tinha tratado com elles e falta de promessas.
Já em Cabo Verde pensava o governador no modo de realizar o seu desejo, de chamar grumetes e gentios á obediencia, sem derramamento de sangue e para isso nomeou interinamente para governador o major Moraes, official valente, a quem recommendou: muita prudencia no trato com os povos circumvizinbos á Praça, e a mais severa manutenção da disciplina na tropa da guarnição; e, tambem, o acabamento das reparações na fortaleza e nos quarteis.
Mais animado ficou o governador com o apparecimento do vapor Mindello, mandado pelo governo para restituir a paz e ordem em Bissau e aproveitando esse ensejo para nova tentativa, passou a Bissau.
A presença ali do primeiro navio a vapor português causou terror aos gentios e não menos aos grumetes.
Estabeleceu o governador sua residencia a bordo e ali convocou uma conferencia ao chefe dos . grumetes, que veio com os seus grandes, na companhia do negociante Nicolau Monteiro de Macedo; foram recebidos na camara do navio e ali disse-lhe o governador que era seu firme proposito trata-los com amizade, por se terem recusado a acceitar o convite que lhes fôra feito pelos soldados revoltosos e só lhes exigia a entrega dos escravos, fugidos no chão dos gentios.
O juiz do povo desculpou-se com o rei de Bandim, que deu hospitalidade aos referidos escravos.
O governador, então, chamou não só esse rei a uma conferencia, ou palavra, mas os de Antim, amigos da Praça, e de Antulla, a qual se realizou, na Praça, no dia 30, com assistencia dos grandes d'estes regulos e negociantes, obrigando ·se o regulo de Bandim a entregar os escravos e a conservar boas relações com o governo.
O Governador Geral, ao sair da Guiné, entregou uma carta de prego ao governador de Bissau, JoMaria Correia da Silva para, no caso de ter de abandonar o governo, o entregar a Honorio Barreto.
O conselho de investigação apurou como culpados 48 praças e um official, que responderam a conselho de guerra, sendo condemnadas a degredo perpetuo ; em ultima instancia responderam perante a Junta de Justiça, em 6 de junho de 1854, tendo sido condemnadas 41 praças e o official. Em 16 do mesmo mês, por terem sido condemnadas só 6 praças a degredo perpetuo para Angola, foram estas exautoradas na praça do Pelourinho da villa da Praia. assistindo a este acto o batalhão de artilharia e dois corpos de 2.ª linha.
A Junta condemnou: o official, capitão da 5.ª bateria, Frederico de Abreu Castello Branco, expiada a culpa com o tempo da prisão jâ sofrida e na mesma pena a 12 praças; a degredo por cinco annos 2 praças; a dois annos de trabalhos publicos com cadeia do pé á cintura e presos a outros companheiros, oito praças; a um anno de trabalhos publicos como os antecedentes, treze.
O governo, por Portaria régia de 26 de agosto de 1853, pediu ao Governador Geral uma relação de nomes dos officiaes e praças do brigue de guerra francês Palinure, afim de serem agraciados pelos valiosos serviços que prestaram á Praça de S. José de Bissau por occaso da revolta militar havida em 5 e 18 de junho de 1853.
O ministro dos Negocios Estrangeiros, visconde de Athouguia, mandou ao da marinha a cópia de um officio que o nosso ministro em Paris lhe enviara, no qual informava ácerca da pensão que o governo francês arbitrara â viuva do tenente da marinha francesa de la Gillardaie, morto em Bissau, e propoz o quantitativo d'aquella que, por parte de Pórtugal, houvesse de conceder-se â mesma viuva, indicando igualmente as condecorações que julgava se poderiam conferir a alguns officiaes e indivíduos da tripulação do mencionado brigue, que mais se distinguiram por occaso do conflicto.
Subsidios para a História de Cabo Verde e Guiné, por Christiano José de Senna Barcellos,  parte V, pgs. 273-, Lisboa, 1911
1853/05/25
Depois de ter conseguido dominar a insubordinação dos moradores do Presídio de Geba, HONÓRIO PEREIRA BARRETO regressa à Praça de Bissau acompanhado dos grandes daquele território que vinham pres­tar acto de obediência.
Um decreto de 29 de Janeiro de 1855 transformou a nomeação por interinidade em definitiva, por um período de três anos. Nesse ano fez uma proposta que lhe fosse aumentado o vencimento de 1.000$00 réis para 1.500$00. Imposeram-lhe condições para isso que ele não aceitou.
1855/06/01
Contrato de Nozolini e herdeira sobre o Corubal
Havendo o contrato sido reconhecido desvantajoso para osreclamantes e para o estado, alem de pouco seguro, por nãoter prestado fiança o concessionario, o qual de mais a maisnão pôde satisfazer os encargos a queera obrigado, e tendoeste requerido finalmente a annulaçãodo seu privilegio, foio referido contrato rescindido pelo governador geral Arrobas no 1.º de junho de 1855.
O mesmo governador geral aboliu lambem em 8 do mesmo mez e anno o imposto do sal balanta que se importava em Bissaú e nos pontos dependentes d'esta praça, retirando o posto fiscal que havia em S. Belchior.
Este imposto havia sido estabelecido em 26 de março de 1847 com o fim de augmentar os rendimentos de Guiné e pagar as despezas da guerra que então cxistia com os povos de Geba e de Fá, que haviam fechado o rio ao commercio portuguez.
Para sustentar o posto fiscal em S. Belchior despendia oestado mais de 1:000$000 réis annuaes, afóra as despezaa deobras e transportes, que só em 1853 montaram a maisde1:000$000 ·réis, não havendo nunca produzido o imposto áfazendamais de 558$000 réis!
De mais a mais aquelle imposto reduzia ao mesmo tempoámiseria o povo deGeba, que estava emigrando jâ debaixodo peso d'este flagello.
Os habitantes de Geba, para quem este sal é um objecto deprimeira necessidade, porque atroco d'elle se abastecem dosgeneros alimenticios, descem o rio em canoas até ao ponto deS. Belchior, onde fundeampara serem veriftcados os passaportesdas canoas; depois descem atéao chão dos balantas qneoccupa a margem direita do rio desde a ilha de Bissau atéumas vinte milhas; ajustam o sal e são obrigados a seguiratéá praça de Bissau para tirarem o despacho pelo sal quesuppunham obter, e voltam enlão a toma-lo no chão dosbalantas(acontecendo frequenrtissimas vezes não acharem á venda a porção que despachavam, vlndo assim a pagar aindamais de 10 por cento) levando-o atê ao ponto de S. Belchior,onde o respectivo regolameonto os obrigava a descarrega-lo para ser verificado, reembarcando-o depois para ser levadofinalmente para Geba, dando-se a circumstancia de queem vez de sete dias de viagem eram assim forçados a gaslarquinze e mais, para satisfazerem por esta fórma absurdas exigencias, perdendo-se até muitas ccnoas por causados mausfundeadouros de S. Belchior e de Bissau no tempo das aguas.

Portanto este imposto lesava ao mesmo tempo o miserável povo que o pagavae o estado que o recebia, fazendo dobradadespeza, e o commercio de Geba, que quasi se acha aniquilado,dando-se alem d'isto a escandalosa excepção do que só os infelizes habitantes de Geba eram opprimidos com este flagello, por isso que o sal que era importado do Chíne, e no rio Curobal, que ficam áquem de S. Belchior, nada pagava, não obstante ser levado para commercio ás feitorias dos negociantes de Bissau, emquanto que o importado em Geba o era para, pela permutação, alimentar aquelle povo.
1856/07/08
Ainda em 8 de julho de 1856 foi Cacheu atacada por gentios de Cacanda (povo e aldeia proxima de Cacheu) em consequencia de desordens que alguns d’elles haviam tido com os grumetes da praça; mas o a taque foi valentemente repellido,sob o commando do administrador do concelho, seguindo-se depois em 27 o ataque de Cacanda por uma porção de grumetea embriagados, que a final se retiraram depois de terem alguns mortos e feridos.
Aquelle ataque apenas tivera togar por alguns indivíduos de Cacandacontra a vontade do regulo, sendo propriamenteum acto de vingança particular, que todavia poderia trazer aperda da praça e a morte de muita gente.
Era isto tanto mais desagradavel, que ainda havia poucotempo, em 27 de setembro de 1856, que o comendador Honorío Pereira Barreto e pessoas notaveís de Cacheu haviamcelebrado um tratado com os gentios de Cacanda e outrocom os de Nagas, em 9 de outubro de 1856, n'aquelle, restabelecendorelações de paz eamisade, e n'este, não só facilitandoas relações commerciaes, mas reservando aos portuguezesa navegação e commercio do braço do rio Farim, aque chamam Armada.
1856/09/20

HONÓRIO PEREIRA BARRETO bate os indígenas de Cacanda, tendo o régulo prestado acto de submis­são na Praça de Cacheu.
1856/09/27
Tratado de paz com o gentio de Cacanda.
Em 27 de setembro de 1856 celebrou-se a paz entre a Praça de Cacheu e os gentios de Cacanda.
Em 20 de setembro expôs o governador da Guiné ao Governador Geral que tinha combatido estes gentios, destroçando-os, indo elles viver num mato fechado, onde fizeram uma barraca para habitarem.
Por espias seguras mandou examinar os caminhos até esse ponto e soube que o capim cobria o terreno a uma altura superior á de um homem e que havia grandes pantanos a atravessar. Tinha resolvido esperar pelo mês de novembro para lhe dar um novo ataque, apesar de todas as semanas implorarem perdão, solicitando a paz, que a recusou com varios pretextos.
Soube depois que os referidos.gentios tinham decidido abandonar definitivamente sua aldeia e espalharem-se pelas dos outros gentios, o que não vinha ao systema de equilibrio qne devia haver entre a Praça e os diferentes gentios, porque sendo as outras aldeias grandes e distantes pelo menos quatro leguas da Praça, por caminhos fechados de mato virgem, seria para s difficil atacá-los; e podiam, um dia, vir surprehender-nos quando menos esperassemos, ao mesmo tempo que havendo aldeias mais pequenas na nossa vizinhança, estas nos avisariam das traições que aquellas intentassem fazer, aviso que desde a existencia d·esta Praça até hoje sempre fizeram».
Em vista d'isto e por ser sua opinião que as aldeias dos gentios sejam contiguas aos nossos Estabelecimentos para com menos dispendio poderem ser castigados quando mereçam, e, tambem por conhecer o estado de apuro em que se acham as finanças d'este governo e vendo que o gentio escarmentado, depois da dura lição que levou, pedira por dez vezes humildemente, e até de joelhos, a paz, consentiu entrar em negociações para ella se realizar.
1856/10/09
Achando-se presente o tenente-coronel e Gover­nador HONÓRIO PEREIRA BARRETO, foi assinado o tratado de paz e convenção entre os gentios de Naga e a Praça de Cacheu com quem se restabeleceram por essa forma as relações suspensas cerca de 50 anos antes.
1961/05/00
«O governador Zagalo trabalhou activamente para continuar a obra da ocupação dentro do nosso território. Visitou Cacheu Ziguichor fez a ocupação da aldeia de Varela. Quando regressoBissau da :sua visita ao Nortesoube que o major da segunda linha, Correia Pinto havia sido preso pelos biafadas de Badora. Depois de· obtida a sua libertação, Zagalo fez uma batida contra os biafadas durantos meses de Maio e Junho de 186i, destruindo algumas das suas povoações e passando além ele Bambadinca.
Sebem que desta campanha não tivesse resultado uma derrota completa dos revoltosos, representava já o primeiro passo para a demonstração das nossas fôrças, que até ali não tinham passado dos fortes de S. Belchior de Geba. Para a guerra contra os indígenas de Badora o governador Zagalo requisitou fôrça europeia artilharia, requisição que naturalmente não pôde ser satisfeita.»
João Barreto, HISTÓRIA DA GUINÉ 1418-1918, edição do autorLisboa, 1938, pg. 242-243
1865/01/09
Os fulas atacam Geba
1865/09/25
O régulo Futa-fula Tudé Mussá, vencido pelos Fulas, refugiou se no Presídio de Geba. Avisa­ram os Fulas que entrariam nele pela força para resgatar o chefe inimigo. Porque o dever de leal­dade o obrigava a defender quem procurava pro­tecção na bandeira portuguesa, decidiu o coman­dante do Presídio recusar tal proposta. No assalto que os Fulas deram ao Presídio foram rechaçados.
«Na Guiné os gentios Fulas que habitam o territorio desde Sama ate Ganadú, limitrophe de Geba, mostrarám-se hostis a este presidio, que estava sob o commando do 2.º tenente de artilharia Manuel Joda Silva.
Davam-se, periodicamente, entre as differentes tribus daquelles paragens constantes correrias, com o unico fim de se assenhorear o mais forte da vida e fortuna do mais fraco; e nesta guerra de extermínio se viam, muitas vezes, envolvidas as auctorídades locaes conservando-se em pé de guerra.
Numa das taes correrias effectuadas os gentios Futafulas, habitantes do territorio mais distante de Geba, avassalaram muitas povoações de gentios mandingas desde Sama até Ganadú, tributando todas ellas e deixando em cada uma pequenas forças encarregadas da percepção dos tributos.
Os tributados logo que se viram livres da grande massa do inimigo que se retirou para suas terras, revolucionaram-se contra a oppressão, matando todos os Futafulas que não tiveram tempo de se refugiar em Ganadú, tribu que os refugiados reputavam amiga, por ter sido a unica poupada na vassalagem; mas parte desse povo tambem tomou o partido dos gentios vizinhos contra os Futafulas e contra seu proprio chefe, o rei Tudé Mussà, que, pelos laços de amisade que a uniam a Sory, chefe dos Futufulas, resistiu' aos diversos ataques contra a differença numerica dos assaltantes, e vencido retirou-se para o presidio de Geba com alguns dos seus Fulas.
Em 25 de setembro de 1865 havià mandado o rei Tudé Mussá pedir ao juiz do Povo de Geba para que conjunctamente com as pessoas mais notáveis fosse em seu auxilio tomar parle na guerra; a isso se recusou emquanto o commandante do presidio não o mandasse.
O alcaide dos mouros, visinhos do presidio, solicitou do parocho de Geba a sua iníluencia junto dos Fulas para a paz; e consultado o Commandante e o povo, concordaram em se mandar lá o parocho e tres confidentes escolhidos pelo povo, mas só depois de avisados os Fulas do fim dessa missão.
No dia 26 mandaram dizer os Fulas que, uma vez que se tinham batido queriam decidir tudo á força de ballas e advertia ao presídio que não desse asylo aos refugiados porque, do contrario, entrariam nelle á força de fogo para resgatar o inimigo.
Reuniram-se o Commandante, negociantes e povo de Geba, que resolveram defender o presidio, solicitando do Governador da Guiné reforços e munições de guerra, bem como instrucc:ões no caso do presidio ser invadido pelos inimigos; resolveu-se que as unicas ·duas peças de artilharia fossem colocadas nos pontos mais críticos do ataque e que fosse comprada polvora por conta das contribuições municipaes e requisitou-se ao Governador duas peças de campanha e munições respectivas.
Não a politica aconselhava a protecção ao rei de Ganadú a quem pertencia o terrilorio de Geba como o dever da humanidade e de honra não permiltia que se entregasse ao vencedor, para ser immolado, quem, ao abrigo da nossa bandeira, procurava a salvação da morte.
Tendo o chefe do presidio repellido todas as tentativas traiçoeiras empegadas pelo inimigo para se apossar dos refugiados, deu aquelle um assalto ao referido presidio no dia 1 de novembro e ali foi rechaçado. Dos commerciantes, espalhados em varios pontos e que não tinham querido recolher-se ao presidio, foram presos 33 pelo Fulas revollosos; mas estes escarmentados pelos revezes que soffrcram no ultimo ataque e sabendo que vinha em marcha, contra elles, uma grande força de Futafulas, vieram ao presidio solicitar a paz; entregaram os commcrciantes prisioneiros, e comprometram-se a entregar, para as despesas da guerra, 100 vacas, calculadas em uns 500 pesos.
Na defesa do presidio entraram os grumetes de Bissau. nossos melhores auxiliares, não só pela sua valentia mas pela sua grande lealdade.
O tenente Manuel ·José da Silva, pelos relevantes serviços que prestou nesta guerra, tendo sob as suas ordens apenas 30 soldados e poucos auxiliares, e por saber manter a ordem entre os moradores de Geba, que, por mais de uma vez quizeram entregar se aos revoltosos, foi recommendado pelo Governador para a promoção ao posto irnmediato, por distincção, tendo· sido promovido por decreto de 9 de junho de 1866.» -
Subsidios para a História de Cabo Verde e Guiné,  por Christiano José de Senna Barcellos,  parte VI, pgs. 245-246, Lisboa, Imprensa Nacional, 1912
1865/11/01
O gentio de Geba ataca a praça, sendo rechaçado e pedindo a paz. O comandante do Presídio, 2.º tenente de artilharia MANUEL JOSÉ DA SILVA, foi promovido por distinção ao posto imediato, por decreto de 9 de Junho de l866, pelos relevantes serviços prestados nesta guerra.
1866
Lutas de algumas etnias, com incidência  negativa na vida comercial e agrícola. É o tempo das lutas entre fulas e mandingas (com a derrota dos mandingas na célebre  batalha de Kansalá, por volta de 1866) e entre vários grupos fulas entre si. Com a administração portuguesa  procurando defender os seus postos militarizados, bem como as facilidades comerciais na zona do rio de Geba e do Rio Grande  de Buba. Para se ter uma ideia da incidência negativa na agricultura, bastará referir que em meados do séc. XIX chegou a haver 60 feitorias no Rio Grande, enquanto que em 1884 já só umas 10 estavam activas. Às lutas entre fulas e mandingas na zona de Farim se referirá o Padre Marcelino de Barros numa das suas cartas (1870).
1867/05/21
O gentio de Churo, insubmisso desde 1861, presta obediência ao Governo.
1868/05/00

GREGÓRIO CORREIA PINTO era tabelião de Bissau em 1846, presidente interino da comissão municipal de Bissau em Julho de 1858, major de segunda linha em 1861, e em Maio de 1868 foi posto no comando das forças beafadas que guerreavam os Fulas no Rio Grande.
1869/05/07
Padre Marcelino Marques de Barros:
Em 7 de Maio de 1869, por Ofício n.º 87 do Governador de Cacheu, é convidado a intervir na pacificação dos «felupes antropófagos» Bote com os de BolorDesconhecemos os motivos específicos desta luta entre felupes, mas é provável que esteja relacionada com desejo de facilidades comerciais em Bolor, bem como com a stuação de privilégio desta útima localidade com as autoridades portuguesas, várias vezes reafirmada desde 1831.
1871
Dr. Augusto Carlos Cardoso e Pinto Osório – provido juiz de direito em 1871.
1871 -Lutas entre Papéis de Cacanda e militares Portugueses.
- Saiu da Praia (Cabo Verde) uma força militar de 200 homens, embarcados nas canhoneiras Zarco e Tejo, para combater a tabanca que deu refúgio aos guineenses que mataram o governador de Bissau (13/02).
- A expedição ataca Cacanda, que resiste durante cinco horas (08/03).
- A expedição ataca as tabancas de Bassarel. Bianga e Churo (09/03).
- Todos os régulos, excepto o de Churo, aceitam a paz (22/08).
EUGENIO PEREIRA foi urn dos grumetes acusados de matar o Governador Caldeira em Cacheu em 1871.
ANTONIO PEREIRA E VENCESLAU DE CARVALHO foi urn dos grumetes acusados de assassinar o Governador Caldeira, da Guine, em Cacheu em 1871.
JOAQUIM ALBERTO MARQUÊS é capitão-mor de Bissau (2º mandato)
1871/01/24
«Em Janeiro de 1871 o governador Álvaro Teles Caldeira, que se encontrava em Cacheu, foi assassinado por um grumete, involuntàriamente.
Na noite de 24, durante um batuque, houve uma desordem entre os soldados e grumetes, resultando dali a morte de um morador de Cacheu. Os grumetes resolveram, por isso, vingar-se dos seus adversários e dois deles foram buscar umas espingardas com intenção de atacar os soldados. O capitão Caldeira, que saira para a rua com o fim de pôr termo à desordem, foi alvejado por um tiro na escuridão da noite.
Os assassinos e alguns outros grumetes refugiaram-se na povoação indígena de Cacanda e o respectivo régulo recusou-se a ientregá-los, sendo apoiado nessa desobediência pelos chefes de Bassarel, Bianga e Churo.
O governador geral Caetano de Albuquerque, logo que teve conhecimento dos factos, .organizou uma expedição com 200 praças sob o comando do major José Xavier do Crato, nomeado governador interino do distrito.
A fôrça embarcou em 11 de Fevereiro nas canhoneiras Zarco e Tejo, comandadas respectivamente pelo capitão-tenente Novais e primeiro-tenente Fernando da Costa Cabral. Fazia parte da tripulação o segundo-tenente Guilherme de Brito Capelo, que fez o levantamento do rio de Churo, pela primeira vez explorado pela nossa marinha.
Diepois de feitos os necessários reconhecimentos, resolveu-se dar um ataque à povoação de Cacanda, no dia 8 de de Março.
Era comandante ·das fôrças terrestres o capitão Joaquim Alberto Marques. Após cinco horas de resistência, os papéis de Cacanda, que eram auxiliados por indígenas de outras povoações, retiraram-se para o mato, em condições de não pode·rem ser alcançados pelas nossas tropas. Da nossa parte houve sete mortos e oito feridos.
Como sucedia em tôdas estas campanhas de efeitos incompletos, os indígenas acabavam por enviar os seus emissários a pedir paz, .e esta foi celebrada no mês de Abril nas seguintes condições: Seriam perdoadas as tríbus que tinham ofendido a praça, com excepção dos indígenas de Churo que se conservavam hostis; os chefes da Mata e Pecau perderiam o direito às contribuições que recebiam dos navios mercantes; em compensação dar-se-iam as pensões de 41$000 réis ao régulo da Mata, 51$000 ao régulo de Pecau e 10$000 ao de Cacanda, com obrigação de se considerarem subordinados ao presídio; continuariam em vigor os contratos anteriores. Os indígenas não deveriam opôr-se ao corte de mato em volta da povoação de Cacheu.
Somaram ·em 6.500$ooo as despesas desta expedição, uma das mais importantes que se organizaram para bater o gentio. No entanto a sua acção não foi completa, porque não era fácil alcançar os papéis de Churo, que continuavam a manter-se na rebeldia.
As canhoneiras não podiam subir o rio e a grande distância por terra por caminhos e regiões desconheddas tornava difícil o avanço. Todavia, a presença desta fôrça com mais de 400 homens trouxe um certo pnestígio às autoridades de Guiné.» João Barreto, HISTÓRIA DA GUINÉ 1418-1918, edição do autor, Lisboa, 1938, pg. 245-247
Foi assassinado, em Cacheu, por dois grumetes, que contra ele dispararam dois tiros à queima­-roupa, O Governador de Bissau, capitão ÁLVARO TELES CALDEIRA. Ao ter conhecimento do facto o Governador Geral de Cabo Verde, ALBUQUERQUE,organizou uma expedição composta de duas canho­neiras levando uma força de 200 praças e mate­rial de guerra. Presos os assassinos, foram julga­dos e condenados a degredo.
Em Cacheu, o Padre Marcelino teve papel também importante no apaziguamento da sublevação verificada nessa praça em 24 de Janeiro de 1871 e que culminou com a morte do Governador Álvaro Telles Caldeira. As razões desse levantamento e a morte do dito Governador ainda hoje não estão bem esclarecidas, atribuindo-as João Barreto a uma mera casualidade, visto que os grumetes locais que o mataram queriam era vingar-se dos soldados caboverdeanos que haviam morto um dos seus durante um batuque na praça65, mas René Pelissier apresenta outras hipóteses igualmente plausíveis66.
65 João Barreto, História da Guiné, Lisboa, 1938, p. 245.
66 René Pelissier, op. cit., vol. I, p. 150, notas 136 e 137:
Assassínio do governador Caldeira
O ano de 1871 abre um período negro na história das feitorias. E «negro», aqui, deve entender-se tanto no sentido de obscuro como de desastroso. O governador da Guiné, ÁLVARO TELLES CALDEIRA, em visita de inspecção a Cacheu, é abatido na noite de 24 de Janeiro de 1871, em condições controversas (136), mas que têm por denominador comum um caso criminal implicando grumetes. Ora, muito rapidamente, este acontecimento ganha volume e torna-se um conflito colonial clássico.
(136) a) Intencionalmente por um grumete, irmão de um outro que o governador matara ou mandara matar, porque protestava contra as intimidades a que Caldeira se arrogava, em relação a sua mulher (versão fornecida pelos Franceses de Carabane que disto só podem estar informados por rumor público. A.N. 200 MI 578): b) por engano, por dois grumetes locais, decididos a vingarem-se dos soldados cabo-verdianos, que mataram um dos seus, quando de um batuque.
«Em 24 de novembro de i870 realisou-se na ponta de S. Jorge, território de Nalú, Guiné, o auto da cessão d'este territorio feito por dez régulos ao governo, representado pelo Governador, capitão Alvaro Telles Caldeira.
Passou este Governador a Cacheu em janeiro de 1871 em visita, sendo acompanhado pelos seus ajudantes de ordens tenente JoFonseca, e alferes Jacintho Camacho.
Na noite de 24 do referido mez de janeiro foi Caldeira ali assassinado por dois grumetes, que contra elle dispararam dois tiros de espingarda à queima roupa.
Antes, porem, de narrarmos este triste successo devemos dizer que este governador, reconhecidamente valente, era temido.
Homem de bem, tinha o vicio da bebida, que muito o irritava a ponto de não gosar geraes simpathias, nem do funccionalismo e nem entre os gentios, que estavam habituados a ser tratados com muita brandura pelos Governadores passados, á excepção de Honorio Barreto que, por ser natural da Guiné, era idolatrado, até pelos gentios mais indomaveis, que o tratavam por parente.
Vivia, maritalmente, Caldeira com uma mulher que lhe correspondia aos seus affectos, mas não na doce paz do lar, porque sendo muito ciumento julgava-se trahido por ella e por isso não escondia uma enorme e permanente excitação nervosa que o dominava.
Nessa tragica noite de 24 de janeiro, jogava Caldeira o voltarete em sua casa com alguns amigos e ajudantes de ordens; estava um tanto agitado por causa do ciume e não da bebida, que, n'esse dia, ainda não tinha feito uso.
Jogava, em mangas de camisa, quando alguem lhe foi communicar, que um soldado tinha matado um grumete n'um batuque proximo da sua residencia; muito excitado, sem vestir um casaco, empunhou a espada, sabiu, dirigindo-se ao local do conflicto e só decorridos alguns minutos é que os ajudantes souberam que elle tinha sabido de casa; seguiram os seus passos e ao chegarem ao local do conflicto tiveram que parar porque um obstaculo lhes impedia a marcha ; apezar da noite estar bastante escura e não haver ali nenhuma illnminação, reconheceram o corpo inanimado do desditoso Governador.
Acabava ·de ser assassinado e os assassinos tinham fugido, seguidos de outros grumetes, para o chão do gentio de Cacanda. .
Originou o conflicto .referido o facto de alguns soldados provocarem desordem, n'um batuque, contra os grumetes da Praça, ficando um destes morto.
Armaram-se dois grumentes de espingardas, que foram buscar à sua povoação, mas jà não encontraram nenhum soldado, que tinham fugido para o Quartel e apenas viram um vulto, que mais se destacou pela côr branca da camisa; não sabiam quem estava ali mas, imprudentes e raivosos, alvejaram-o quasi à queima roupa.
Como se vê não houve intenção, propositada, de assassinar Caldeira que em Cacheu não tinha exercido nenhuma violencia que levasse os grumetes geralmente pacíficos a cometter um acto de tanta crueldade ; foi victima de engano dos grumetes e da sua nunca desmentida coragem e da sua imprudencia.
Refu giados os grumetes na Cacanda exigiu a Praça ao régulo d'esta tribo a prisão dos mesmos ; negou-se ·a entrega-los e antes se declarou hostil, no que foi appoiado pelos régulos de Bassarel, Bianga e Chuôro.
Levou-se ao conhecimento do Governador Geral Albuquerque estes factos. Com a sua reconhecida energia organisou em menos de 24 horas urna expedição composta das canhoneiras Tejo e Zarco que conduziram o batalhão de Caçadores n,º 1, em numero de 200 praças e com bastante material de guerra.
Era commandante d'este batalhão o major José Xavier Crato, que foi nomeado Governador interino da Guiné e investido no commando superior das forças que deviam entrar em campanha.
Em 11 de fevereiro seguiu com rumo a Bissau a canhoneira Tejo, sob o commando do 1.º tenente Fernando da Costa Cabral e para o mesmo destino sahiu a canhoneira Zarco no dia 14, d'aquelle mez, sob o commando do capitão tenente Novaes.
Em Bissau receberam uma importante força do destacamento ali aquartelado e d'ali seguiram para Cacheu onde chegaram a 25 do referido mez, sendo o total da expedição,· incluindo praças das canhoneiras, de 400 homens.
O Governador Crato ao mesmo tempo que empregava os seus esforços para chamar á obediencia os gentios, sobretudo da Cacanda, entregando os grumetes, de accôrdo com o conselho de officiaes, de terra e mar, mandou proceder a alguns reconhecimentos: da praia da Cacanda, pelo tenente SaintMaurice, ponto indicado para o embarque da expedição, quando esta tivesse de regressar á Praça, a qual seria reéebida em lanchas, sendo o embarque da mesma protegida pelas canhoneiras ; e ào rio de Bassarel, que íoi confiado ao habil 2.º tenente da armada Guilherme de Brilo Capello que teve, para esse fim, ás suas ordens o palhabote Bissau, que foi guarnecido com marinheiros da canhoneira Zarco e uma força do batalhão.
Fôra julgado conveniente esse reconhecimento para, no caso do rio dar acceso ás canhoneiras estas castigarem os gentios que auxiliaram os da Cacanda, sobretudo 'os do Chuoro, que mais, e de longa data, hostilisavam a Praça.
O palhabote ao passar no territorio de Bianga, foi atacado pelos gentios que, batidos pelo fogo de bordo, se retiraram.
Apoz um trabalho fatigante, sobre as ardencias do sol da Guiné e de risco de vida, num rio apertado, occupado por gentios aguerridos, conseguiu aquelle distincto official, explora-lo numa enorme· extensão, até ao chão de Qués ; fez um levantamento rapido, que mostra rapidas curvas, com um grande numero de sondas, começando estas, em 5 braças depois de se transpor a barra, situada entre a Matta da Potama e a de Cacheu ; fôra da barra o fundo é esparcelado, com sondas de 3 braças até a· entrada da mesma onde proximo accusou sondas de 2 e 1/2 braças.
N'estas condições não podiam as canhoneiras subir o rio, como foi de parecer do illustre official, que apresentou tambem ao governo um desenvolvido relatorio sobre a espinhosa missão de que foi encarregado e da qual se houve com tal distincção, que mereceu da corporação a que pertence a mais alta consideração e respeito.
Esgotados todos os recursos empregados pelo Governador Crato para a entrega dos criminosos, resolveu-se atacar Cacanda no dia 8 de março ; pelas 5 horas da manha marchou a expedição, commandada pelo capitão Joaquim Alberto Marques, que desempenhava o logar de major do batalhão, e que dirigia os soldados, sendo a pequena força de marinhagem, 20 praças, sob o commando de Brito Capello tendo como subalternos o tenente Filippe Dias e o guarda marinha Avellar Pereira.
Uma foa de uns 10 homens , composta de incorrigiveis, foi para o campo sob as ordens do guarda marinha Julio José Marques da Costa.
Os gentios da Cacanda eram tambem auxiliados pelos das tribus de Pucau, Berny, Bijop, e d'alguns da Matta .
Ao cabo de 5 horas de combate fugiu o inimigo, com grandes perdas, do bosque de Cacanda e foi arrasada a povoação ; no porto da Cacanda embarcou para lanchas a expedição; ali foi, de subito, atacada pelos gentios emboscados no matto, retirando-se estes, em debandada, depois de um pequeno tiroteio.
Morreram no campo um marinheiro e cinco soldados e ficaram feridos dois marinheiros, um dos quaes falleceu e seis soldados.
Nos dias 5 e 6 de abril voltou o batalhão á Cacanda para destruir ainda algumas cubatas ; não encontraram nenhuma resistencia por os seus antigos moradores se encontrarem dispersos no matto, .
O commandante do batalhão Crato, na qualidade de Governador interino, entendeu que não devia acompanhar a força expedicionaria para o combate e ficou na Praça com uma pequena força, com a qual elle sahiria se houvesse necessidade de proteger a retirada no caso de um fracasso. O Governador Geral desapprovou este procedimento.
O que se conseguiu d'esta expedão foi uma grande força moral para o governo, que teve sollitações dos regulos da Malta, de Banhum e d'outros pontos, para serem recebidos pelo Governador da Praça, a fim de afirmarem sua obediencia e amisade, e intercederem, ao mesmo tempo, para que a tribu de Cacanda fosse admittida á amisade, bem como as de Bassarel, Pucau e Bianga.
Tinha sido exonerado Crato do governo interino e nomeado o capitão Joaquim Alberto l\Iarques, que se occupou das negociações impetradas por aquelles gentios, as quaes se concluiram a 22 de agosto, apresentando-se na Praça 86 pretos, entre os quaes os .régulos e grandes, que notificaram a amisade, na presença do referido Governador Marques e dos membros da Junta Consultiva de Cacheu, estipulando-se;
1.º Perdão ás tribus que tinham offendido a Praça, com excepção da de Chuôro, que se conservou hostil.
2.º Perderem as tribus da Matta e Pucau o direito que tinham ás dachas ou contribuições que pagavam os navios que iam cornmerciar no rio de Cacheu.
3.º Assegurar, como compensação, pensões aos regulos: da Matta réis 41&280; de Pncau 51&600 réis e da Cacanda 10&320 réis, com a obrigação de sempre informarem á Praça, de tudo que importasse saber sobre a sua segurança.
4.° Faltando os régulos á condição 3.ª deixariam de receber as pensões annuaes.
5.º Promessa de castigar os criminosos de novas offensas, fossem portugueses ou gentios.
6.° Continuarem em vigor os ·contractos anteriores.
7. º Faculdade à auctoridade .portugueza de cortar o matto em roda da Praça.
8.º Estas estipulações dependiam da .approvação do Governador Geral.
Para occorrer á despesa extraordinaria de 6:493&335 réis feita nesta guerra, realisou-se um ernprestimo de seis contos de réis.
O secretario do governo da Guiné, Castro de Moraes, em um relatório sobre o assassinato do Caldeira, accusou os officiaes : tenentes Francisco de Figueiredo Pereira de Azevedo, Joda Fonseca, e alferes Jacintho Augusto Camacho Junior, de não terem soccorrido o Governador Caldeira; responderam a conselho de investigação, ficando o primeiro isento de culpa e os outros dois presos para conselho de guerra.
O tenente Azevedo era official da guarnição em Cacheu; estava recolhido no seu quartel e não teve conhecimento, senão muito tarde, da triste occorencia.
Dos outros já dissemos como procederam, indo nos encalços do Governador até ao local do crime.
Cumpriram com. o seu dever e por isso foram absolvidos.
No processo judicial que se instaurou, em Cacheu, foram pronunciados como auctores da sedição 11 grumetes e como cumplices 7; estes, foragidos, recolheram á Praça, e entregaram ao Governador dois dos mesmos, que assassinaram Caldeira.
O gentio do Chuôro havia tomado corno fraqueza da Praça o facto de não ter sido atacada a sua povoação em seguida á Cacanda, e passou a hostilisa-la, matando e ferindo mulheres que extra muros iam buscar agua.
Eram repellidos com a artilharia e fusilaria.
O Governador Geral, attendendo á grande distancia que viviam estes gentios da Praça, por maus caminhos, e ser preciso atravessar pantanos e cerradas mattas, pediu ao governo um reforço de 60 marinheiros para cooperar com o Batalhão afim de os castigar; seu pedido não obteve deferimento e esse gentio conservou-se sempre altivo.
Concluída a paz com os gentios revoltados e garantido o socego na Praça seguiu a expedição, sob o commando do capitão Marques, para Cabo Verde a bordo das canhoneiras, tendo tocado em Bissau a Zarco onde deixou um destacamento; a 10 de maio do referido anno de 1871 fundeou na Praia.
O Governador interino Crato sabendo que os grumetes fugidos, se achavam no sitio denominado Poilão do Leão, onde, abandonados pelas tribos, estavam soffrendo fome e se mostravam desejosos de regressar à Praça, mandou-lhes emissarios convidando-os a se recolherem; apresentaram-se 8, entre os quaes Antonio Pereira e Wenceslau de Carvalho, assassinios do Governador, faltando Eugenio Pereira que era accusado, ·pelos seus companheiros, de ter sido tambem um dos auctores do assassinato, e que se encontrava refugiado n'uma tribu distante. Seguiram os dois presos tambem na Zarco para a Praia, onde foram julgados e condemnados a degredo.
A força expedicionaria foi recebida festivamente na Praia pelo Governador Geral que offereceu num banquete aos officiaes de terra e mar, aos quaes já tinha elogiado em Portaria de 31 de março, pelas provas de firmeza e arrojo que haviam dado, e, em honra dos mesmos, houve uma recita no teatro Africano.
Entre tantas guerras com os povos gentilicos da Guiné nenhuma houve que imprimisse uma derrota tão notavel nos rebeldes como esta da Cacanda.
Muito a miudo se annunciavam gnerras, principalmente em Bissau, limitando-se as nossas forças só a tomar a defensiva, abrigadas peias muralhas ou palissadas ; não se organisavam expedições para sahir a campo e apenas se lançava mão de gentios, das outras tribos, como auxiliares, que sabiam a campo, não para combater mas para saquear as palhoças e roubar gado. O nosso prestigio estava, por isso, multo enfraquecido, tanto mais que, por vezes, implorando, as nossas auctoridades, soccorros das colonias francezas e inglezas, nossas visinhas, não deixavam os rebeldes de commentar, desfavoravelmente, a nossa precaria situação; e d' esta, aproveitavam-se os nossos generosos auxiliares para fazer convencer aos pretas a impotencia de Portugal, e assim a França não encontrou difficuldades para occupar o rio de Casamansa e a Inglaterra, que lançava suas vistas para Bolama e Rio Grande de Bolola, se não ponde expulsar-nos, tentou fazê-lo comettendo os seus vasos de guerra toda a casta de violencias durante 30 annos.» -

Subsidios para a História de Cabo Verde e Guiné,  por Christiano José de Senna Barcellos,  parte VI, pgs. 282-287, Lisboa, Imprensa Nacional, 1912
1871/02/09
JOSÉ XAVIER CRATO em Cacheu e que também seguiu a carreira militar tendo falecido em 02 de Abril de 1890 na ilha de Santiago, sendo coronel reformado. Anos antes, sendo tenente-coronel, foi nomeado, por port. nº 46 de 09/Fev/1871 do governador-geral de Cabo Verde, governador interino da Guiné Portuguesa, tendo como missão pacificar a praça de Cacheu e punir os autores do atentado contra o anterior governador interino que faleceu vitimado por duas balas. Este governador era o major ÁLVARO TELES CALDEIRA.
Pela mesma altura o tenente FRANCISCO TAVARES DE ALMEIDA também era colocado na Guiné
1871/02/11
Embarcou nas canhoneiras «Zarco» e «Tejo» a força composta de 200 homens para bater a povoa­ção de Cacheu onde se refugiara o assassino do Governador Caldeira que o régulo recusava a entregar. Um dos oficiais de marinha que tomou parte neste combate foi o 2.0 tenente GUILHERME BRITO CAPELO.
1871/02/13
Aprestou-se para sair da Praia a canhoneira «Zarco» sob o comando do capitão tenente Novais, que ia com a canhoneira «Tejo» castigar os gen­tios de Churo e Cacanda que haviam hostilizado a Praça de Cacheu e dado guarida aos autores do assassínio do governador Caldeira, de nome ANTÓNIO PEREIRA e VENCESLAU CARVALHO.
1871/03/08
Foi batida a povoação de Cacanda, que resistira durante 5 horas ao ataque da expedição militar para ali enviada.
1871/03/09
Campanha contra os régulos de Caeanda, Bassa­rei,  Bianga e Churo, em que tomaram parte as canhoneiras «Zarco» e «Tejo». O 2.° tenente GUI­LHERME DE BRITO CAPELO fez o levantamento do rio Churo.
1871/06/30
Foi exonerado por portaria de 30 de junho de 1871 do governo interino da Guiné o major José Xavier Crato e nomeado o capitão de caçadores de África Joaquim Alberto Marques.
1871/08/22
O gentio, com excepção do de Churo, fez o acto de submissão.



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