1780
Lei de abolição gradual da escravatura
na Pensilvânia (EUA).
1780/03/00
Francisco de Sá Sarmento, desembargador, provido
ouvidor em Março de 1780, faleceu no ano seguinte.
1780/09/18
Criação
de uma junta de arrecadação e distribuição da fazenda real em Cabo Verde.
1781
«O terceiro ciclo de colonização do arquipélago
trouxe a chancela da rainha D. Maria Primeira que, em 1781, através de um decreto, ordenou o povoamento das chamadas
desertas de Cabo Verde: São Vicente, Santa Luzia e a Ilha do Sal. De fraca
potencialidade para a prática agro-pecuária, a ilha de São Vicente só conheceu,
na segunda metade do século XVIII, um povoamento efectivo, graças ao seu porto
natural. Desta forma, a ilha mal
conheceu a experiência angustiante de escravatura e não acolheu no seu seio uma
população significativa de negros e escravos.
A riqueza dos
principais das ilhas apresentada, em 1781, como vinda
de
"muitas rendas e seus escravos e o rendimento do que trabalho
asi na cultivacão dos asucares e algodoins como
na Roupa que fazem pera Guiné /... /”. AHU, Cabo
Verde, Papéis Avulsos, cx. 6ª, doc. 169, 24 de Outubro de 1681.
A ilha de
S. Vicente, em 1781, foi mandada povoar regularmente, assim como as demais
ilhas desertas do archipelago, o que todavia só se levou a efeito em 1795,
quando JOÃO CARLOS DA FONSECA,
proprietario da ilha do Fogo, obteve licença para a ir povoar com vinte
casais daquella ilha, sendo nomeado
capitão mór. Mas, apesar das despezas feitas por aquelle capitão-mor, tão
superiores ás suas forças que chegou quase à mendicidade, não obstante os
esforços do governo da metrópole, e sem embargo do grande empenho que nisto poz
o governador JOSÉ DA SILVA MALDONADO DE
EÇA, não se obteve senão a aglomeração de umas poucas de choupanas, a que
se deu o nome de Povoação de D. Rodrigo.»
Africa Occidental,
Noticias e Considerações, por Francisco Travassos Valdez, impresso por ordem do
Ministerio da Marinha e Ultramar, Tomo I, Lisboa, Imprensa Nacional,1864, pg.
119.
1781/02/10
Chegada de D.FREI FRANCISCO DE SÃO SIMÃO como bispo
da diocese de Cabo Verde (tinha sido nomeado em 1778)
1781/02/19
Posse
do capitão e governador-geral de Cabo Verde DUARTE DE MELLO DA SILVA E CASTRO DE ALMEIDA. Morreu no dia 19 de
Março do ano seguinte.
O TERCEIRO GOVERNO DO
CORONEL JOÃO FREIRE DE ANDRADE (1781-1783)
Invocando a sua posição
de coronel mais antigo das forças milicianas, João Freire de Andrade acedeu
novamente ao poder com uma junta governativa meramente simbólica. Recusou
liminarmente o representante eclesiástico no governo, o cónego Francisco Robalo
que servia de deão e embora o 1º juiz camarário fizesse parte do governo, só o
coronel era reconhecido por governador interino e só em seu nome se passavam os
passaportes para as outras ilhas e se confirmaram algumas patentes.14 Exerceu o
poder de forma absoluta, não admitindo qualquer contestação à sua autoridade.
Apoiava-se no domínio da maioria das forças milicianas já que, além do seu
Regimento, podia contar com o do seu cunhado, o coronel Manuel Tavares da Silva
que entraria para o triunvirato governador a partir da eleição dos pelouros de
Dezembro de 1782. Dos três Regimentos militares existentes, apenas um era
comandado por um membro da facção oponente ou o que dela restara, o coronel
José Maria Cardoso.
Um ano depois
continuava a governar com o juiz ouvidor, seu cunhado, quando a rainha D. Maria
I encarregou o bispo do governo interino das ilhas “não obstante o alvará régio
que regulava a sucessão do governador.” A carta régia, datada de Agosto, só foi
promulgada em Novembro de 1782 e enquanto a ordem não chegava Santiago, João
Freire de Andrade continuava a governar. Tudo parecia conjugar a favor do
coronel. A burocracia, a distância, a residência do Bispo em São Nicolau
facilitavam as ambições do coronel e a sua manutenção no poder. E não só; uns
tantos militares, sobretudo capitães, regressaram ao Reino e alguns óbitos de
militares detentores de cargos de chefia permitiram ao coronel reforçar em
postos chave a rede de clientelas com os seus parentes e partidários.
Multiplicavam-se as patentes que se tinham transformado num lucrativo negócio
durante este governo interino. É sintomático verificar que nas petições os
impetrantes escrevem “o governador das ilhas de Cabo Verde,” ou até “o
governador João Freire de Andrade” em vez de “os governadores” ou “a junta
governadora.” Algumas provisões e patentes são assinadas apenas pelo coronel
João Freire de Andrade e esta situação de poder individual e absoluto
permaneceu até 12 de Abril de 1783 quando o Bispo D. Frei Francisco de São
Simão, depois de um périplo pelas ilhas, chegou finalmente a Santiago.
1782/11/16
FR. FRANCISCO DE SÃO SIMÃO substituiu o
governador por Carta Régia desta data.Na
História Geral de Cabo Verde, vol. III, pág. 333 vem o seguinte: "O novo
bispo D. FR. FRANCISCO DE S. SIMÃO
só chegaria a Santiago em 1781, tendo residido sempre numa remota fazenda em
Ribeira da Prata, junto do então longínquo porto do Tarrafal, no extremo oposto
da sede do bispado, 5 meses depois. A partir desta data, os bispos alternam a
sua residência por diversas ilhas, nomeadamente S. Nicolau, onde residiram D. FREI CRISTOVÃO DE S. BOAVENTURA (1786-1798)
..."
ART. II. – Duas Cartas Régias, um Decreto, e um Aviso, que nomeão
o Exm. Bispo D. Fr. Francisco de S. Simão, Governador interino das Ilhas de Cabo
Verde, e dão providências sôbre vários
objectos.
Aviso
Levei á Real Presença da Rainha Nossa Senhora a Carta que V.
Exc. me-escreveo com data de 9 de Junho do presente anno, em que dá conta
do que tem praticado depois que chegou a essas Ilhas, que tudo mereceo a Real
Approvação de S. M.; de sorte que Vendo a Mesma Senhora o zêlo, e actividade com
que V. Exc., tem procurado não só o bem espiritual dos seus súbditos, mas tambem
a sua felicidade temporal, promovendo o trabalho, e a indústria; e Querendo S.
M. facilitar todos os meios para que V. Exc. possa melhor adiantar estes
importantes objectos, Foi Servidanomear a V. Exc. Governador interino d' essas
Ilhas, como V. Exc. já saberá pelas Cartas Régias que lhe-expedi por uma Embarcação,
que saío á poucos dias, e de que remetto aqui as Cópias.Com o mesmo fim de dar
a V. Exc. os meios de fundar o Seminario,e de fazer as mais obras, que julgar
necessarias a benefício d’essa Igreja, Ordenou S. M., pelo Decreto da Cópia
inclusa, á Junta da Admínistração dos Fundos da Companhia do Pará entregasse á
disposição de V. Exc. o producto do Espolio, e Congruas do Bispo D. Fr. Pedro Jacintho Valente,
que estão debaixo de sequestro em poder da referida Junta, e importão em onze
contos e tantos mil réis. A' mesma Junta se Ordena de seguir as ordens de V. Exc.
a respeito do modo de lhe fazer a remessa da dita importancia. S. M. Vio com
particular satisfação o que V. Exc. Refere das disposições, que tem feito para
dar principio á obra do Semínario, e a Mesma Senhora Manda recommendar a V. Exc., que adiante
quanto for possivel este Estabelecimento, destinando principalmente para éstas despesas o producto do Espolio do Bispo defunto; e para não perder
tempo, póde V. Exc. ir logo cuidando em fazer os Estatutos porque se ha-de
governar o mesmo Seminario,e remettel-os a ésta Secretaria d’Estado para
S. M. os Approvar, e Confirmar, Sendo Servida. A respeito do que V. Exc,
refere, de que não ha mais que dois Conegos na Sé capazes de servir, e que ha
tres para quatro annos se lhes não pagão as suas Congruas, expdir-se-hão as
Ordens necessarias para que estes pagamentos se fação com regularidade; em quanto á falta
de Conegos d’aqui não se pode remediar esta necessidade, por não haver quem
queira ír viver a essas llhas, e até o Clerigo que V. Exc. mandou por Capellão
do seu Navio, foi necessario obrigal-o por força a voltar n'elle. N’estes
termos não ha outio recurso mais que servir-se V. Exc. dos Clerigos, e Frades que
ahi tiver, e for criando, e promover interinamente aquelles que
julgar mais capazes ás Igrejas, e Conesias, dando conta a S.M., para a Mesma
Senhora, Sendo Servida, lhe-mandar passar as suas Cartas de Apresentação. Em
quanto ao concerto que necessitava este Navio, S.M. em consideração do bom uso
que V. Exc. tem feito, e ha de continuar a fazer d'elle, o Mandou concertar no
Arsenal da Ribeira á custa da Real Fazenda. Do dinheiro que V. Exc. remetteo, ou
do seu emprêgo, dará conta o Religioso Leigo, que volta no mesmo
Navio. Deos Guarde a V. Exc. Palacio de Nossa Senhora d'Ajuda em 24 de Dezembro
de 1782.- Martinho de .Mello e Castro. – Sr. Bispo das Ilhas de Cbo Verde.
Carta Régia
Juiz,
Vereadore, e Procurador da Camara da Cidade de S. Thiago de Cabo Verde: Eu a
Rainha vos envio muito Saudar. Attendendo ao prestimo , e
zêlo com
que se tem distinguido no Meu Real serviço o Bispo
d'essas Ilhas, D. Fr. Francisco de S. Simão, fui Servida Encarregal-o
interinamente do Govêrno das mesmas llhas; não obstante o Alvará de 12 de
Dezembro de 1770, que regulou a successão dos Governadores d'ellas, para o que
Hei por bem Derogal-o por ésta vez sómiente para o dito effeito, ficando aliás
sempre em seu vigor; o que Me pareceo Participar-vos, para que assim o fiqueis
entendendo, e façaes executar pelo que vos pertence. Escrita no Palacio de
Nossa Senhora d' Ajuda em 16 de Novembro de 1782 - RAINHA.
Carta Régia
Reverendo
Bispo das Ilhas de Cabo-Verde, do Meu Conselho: Eu a Rainha vos Envio muito
Saudar. Sendo-Me presente o zelo, e prestimo com que vos-empregaes no Meu Real
Serviço Sou Servida Encarregar-vos interinamente do Governo d'essas
Ilhas: não obstante o Alvará de Successão dos Governadores das mesmas Ilhas; para
o que Hei por bem Derogal-o por ésta vez somente para o dito effeito, ficando
aliás sempre em seu vigor: o que Me pareceo Participar-vos, e o mesmo Faço á
Gamara d’essa Cidade. Escrita no Palacio de Nossa Senhora d' Ajuda em 16 de
Novembro de 1782. - RAINHA.
Decreto
Sou
Servida , que o dinheiro provenlente do Espolio, eCongruas do último Bispo de
Cabo-Verde, D. Fr. Pedro Jacintho Valente, que se-acha em sequestro em poder
dos Administradoresdos Fundos da Companhia do Grão-Pará , e Maranhão, seja
entregueá disposiçlo do actual Bispo Governador interino das mesmas llhas, para
que o-empregue no concerto, e reparo d’aquella Igreja,e mais no Seminario, e
casas dos Prelados, e outras obras,que entender mais uteis, e neccssarias a
benefício da mesma Igreja. A Junta da Administração dos Fundos da referida
Companhiado Grão-Pará, e Maranhão o-tenha assim entendido, e o-execute pondo-se
de acôrdo com o dito Bispo sôbre o modo mais conveniente de lhe-fazer as
remessas do referido dinheiro. Palacio deNossa Senhora d'Ajuda cm 17 de
Dezembro de 1782. - Com a Rúbrica de S. M.
De certa forma, a posição de Feijó era privilegiada,
equiparando-se à de ALEXANDRE RODRIGUES FERREIRA, uma vez que não
acumulava, como Silva e como Galvão, as tarefas científicas com as de
burocrata. Ferreira e Feijó não foram enviados como secretários de estado, mas
apenas como naturalistas. No entanto, é perceptível que a missão de Feijó era
encarada como algo menor em relação às demais. Todos os outros encabeçavam
equipes compostas por jardineiros e desenhistas, enquanto Feijó foi enviado
sozinho. Além do mais, foi-lhe reservada uma pequena armadilha. Ele foi
colocado ostensivamente na condição de tutelado do bispo do arquipélago, D.
Francisco de São Simão, que acumulava o governo de Cabo Verde. Pode-se
especular um pouco sobre os motivos que levaram Martinho de Mello e Castro a
estabelecer tal tutela. É provável que houvesse alguma coisa no comportamento
passado do naturalista que o tivesse levado a isso, no entanto é mais provável
que tenha pesado um facto mais simples e prosaico: a idade de Feijó.
V. Ex.ª tomará à sua conta esse
moço; que não tendo mau gênio nem sendo inerte na profissão, a mais leve sombra
lhe parece um gigante e o prende para não fazer o que deve, e não deixará de
ser muito desagradável que não havendo aqui coisa alguma que diga respeito às
produções naturais das Ilhas de Cabo Verde, e tendo-se um Naturalista para as
haver, se reduza todo o fruto dessa providência a Palavras e Relações inúteis
do dito Naturalista, a nada, ou pouco mais de nada, daquilo para que foi
mandado.
A documentação, com frequência, refere-se a ele como “jovem” ou “moço”.
Os erros que lhe foram imputados são atribuídos à sua condição de moço, coisa
que não acontece com os seus colegas enviados a outras partes do Império. Como
diversos outros dados de sua vida, as referências a respeito da idade de Feijó
são difíceis de precisar. Blake afirma ter ele nascido no Rio de Janeiro, em
1760. Se o dado é verdadeiro, o naturalista teria entre 23 e 24 anos quando
inicia a sua expedição. Se for considerado que GALVÃO DA SILVA e RODRIGUES
FERREIRA tinham 28, não parece ser grande a diferença. Todavia, estes 4 ou 5
anos, na época, parecem ser decisivos no estatuto de cada um. Se for observado,
ainda, que ele foi recrutado para o Real Gabinete com algo em torno de 18 anos
de idade, é possível entender melhor o porquê do seu persistente enquadramento
na categoria de jovem. Caso a da Acta de nascimento que lhe é atribuída esteja
correta, ele começou a cursar matemática em Coimbra com 16 anos e, em finais de
1778, quando aparece matriculado em Filosofia, tinha 18.24 Tudo isto torna mais
evidente o porquê de ter-se tornado Feijó o jovem e da relação severa e
paternal que o ligava a Martinho de Mello e Castro. Assim como todos os outros,
ele teria que enfrentar a batalha para ver reconhecida localmente a sua
condição autónoma de homem de ciência. No entanto, ao mesmo tempo, ele buscaria
escapar da tutela que lhe era imposta devido à sua juventude. Esta dupla
batalha inicia assim que Feijó desembarca, quando começam os pequenos
incidentes com o frei Francisco de São Simão a quem estava submetido. No afã de
se fazer valer, o naturalista comete um erro crasso na estratégia que adopta
para enfrentar o bispo: escolhe o texto filosófico como arma. Os historiadores,
ávidos pelas fontes escritas, tendem a dar à produção escrita desses
naturalistas uma importância que necessariamente não lhe era atribuída pelas
personagens que dominavam a cena administrativa do período. Martinho de Mello e
Castro era explícito quanto a isto. As “palavras inúteis” de um naturalista
eram “nada, ou pouco mais de nada”. O que lhe interessava era o envio regular e
bem acondicionado de minerais, vegetais e animais. Note-se que o ministro era
detentor do forte espírito coleccionista que caracteriza o período. Como já foi
mencionado, As explorações em Cabo Verde do naturalista
luso-brasileiro JOÃO DA SILVA FEIJÓ, nomeado secretário do governador geral, para se
impor na categoria de secretário e daí subir de posto, quem sabe?, vai criticar
o governo das ilhas. Com razão ou sem ela, o seu papel será o de acusar de
mau governo o seu mais directo superior, D. FRANCISCO DE S. SIMÃO. E como a
administração das ilhas está entregue a outros prelados, o resultado geral da
crítica exprime-se por um forte anti-clericalismo. Vejamos, em registo de
língua actual, extractos de cartas em que o bispo é objecto de censura,
atribuindo-se-lhe até sinistras intenções:
“Uns montes áridos, vermelhos, cortados de
inumeráveis vales, terminados pela parte do mar em elevadas, escarpadas rochas
a pique, foi a primeira ideia que concebi desta ilha [S. Nicolau] logo que se
me representou do mar. Saltei em terra, e dali fui conduzido a Povoação,
distante deste porto boas duas léguas pela ilha dentro, onde fui hospedado pelo
Exmº Bispo destas ilhas, D. Fr. Francº de S. Simão, a quem eu tive a honra de
ser recomendado por V. Exª, o qual tinha ali a sua residência.”“A demora que aqui
tive, que foram 2 meses, dar-me-ia muito lugar a comunicar agora a V.Exª
algumas observações filosóficas desta ilha, e remeter ao Real Gabinete amostras
de suas produções, se não se antepusesse a este meu desejo a sinistra
intenção daquele prelado, a cujas ordens vim cometido, o que deixo para quando
se me oferecer ocasião, pois tentando eu dar logo por ali princípio, me não
quis permitir, dizendo-me que havia dar princípio pela ilha Brava, ao que o
respeito, a subordinação me fez obedecer, em prejuízo meu, pois assim quis a
minha fortuna para que mais tempo andasse por uns países tão desgraçados como
este.”“Passados os 2 meses, a 16 de Abril parti em companhia do dito
prelado para Santiago, com escala pela ilha do Maio, onde no dia seguinte, 17,
surgimos no porto do Pau Seco, e ali se demorou o dito Bispo no interesse
das suas madeiras, fragmentos de uma nau dinamarquesa, que ali deu à costa, nos
baixos chamados do Galeão, que ficam a Norte da ilha, cuja madeira ele havia
arrematado como quis à Fazenda Real, com não pouco prejuízo da mesma.”“Não
posso deixar de reflectir aqui neste lugar a lástima que me causou aquele
espectáculo de tanta riqueza perdida: tanta madeira, aduelas de tonéis, ainda
sem trabalho; 60 e tantos mastros reais de 5 e mais palmos de diâmetro,
inteiros, e novos, grande número de vergas, peças inumeráveis de cabo, ferro,
chumbo, 100 e tantos barris de pez, grandes carretas de peças de artilharia,
etc., amontoados por aquele areal ocupavam uma boa légua de distância, excepto
o que dizem estar espalhado por toda aquela baía, como caixões compridos, que
mostram ser de armamento, artilharia; peças de amarras, etc., que a
negligência daqueles habitantes, e do feitor da Fazenda Real ali deixa perder.”[…]“Passados
os 8 dias, partimos para Santiago, e em 6 horas surgimos em o porto da Vila da
Praia, onde estavam fundeadas umas poucas de naus holandesas e inglesas:
desembarcámos pela tarde, e logo tomámos o caminho da cidade onde chegámos
pelas 8 da noite.”“Ali nos detivemos, enquanto se passavam os dias santos da
Páscoa, em que o Prelado, em razão do seu ministério, tinha obrigação de ali
assistir; passada a última oitava recebeu o dito Prelado a posse do governo
interino destas ilhas, em que Sua Majestade tinha feito a honra de o
promover.”“Recebida a posse, e deixando em seu lugar para o governo da ilha
o oficial de maior patente, partimos para a Ribeira de PrActa, sítio junto ao
Tarrafal, que ele havia escolhido como o mais saudável daquela ilha para a sua
residência e fundação de um seminário que devia servir para educação da
mocidade destas ilhas” [...].“Num lugar muito desabrido, muito cálido, estéril,
doentio, e deserto, onde só se vêem rochas escarpadas, povoadas de inumeráveis
cabras bravas, e chusmas de macacos devoradores e destruidores de todos os
frutos que ali se pudesse produzir: eis aqui, Senhor, em poucas palavras, a
verdadeira descrição do belo sítio que este prelado, contra o parecer de todos
os principais da ilha, tem escolhido para uma plantação de Letras, desprezando
então um dos sítios mais aprazíveis, mais frescos e mais férteis daquela ilha,
qual é a Ribeira da Trindade, de que a mesma Mitra é senhora.”
O
naturalista JOÃO DA SILVA FEIJÓ, do mesmo grupo de Galvão em Coimbra,
também sofreu com desavenças dentro do poderio local. Apesar de não ter sido
enviado como Secretário, executando apenas o seu cargo de naturalista, JOÃO
DA SILVA FEIJÓ, em Cabo Verde, não era bem quisto por ser uma pessoa bem
sucedida apresentando uma idade muito jovem. A inveja lhe rondava de tal forma
que lhe foram feitas denúncias administrativas - que serviam de instrumento nas
lutas de poder entre as facções locais e os emissários da Coroa - nas quais era
acusado de escândalos e roubos. De início, o seu texto como naturalista não
impressionava o seu tutor e governador de Cabo Verde, D. Francisco de São
Simão, e muito menos Martinho de Mello e Castro, que valorizava o envio de
exemplares para o Museu de História Natural. A falta de interesse no
trabalho de Feijó levou-o a fazer pequenas intrigas contra o Governador
ocasionando como conseqüência o aumento de sua fama como desordeiro. Suas
palavras eram vistas como desobedientes levando a denúncias de não cumprimento
das ordens da Coroa. Esses episódios da trajetória de Feijó em Cabo Verde
foram estudados por Magnus Pereira no artigo “Um jovem naturalistas num ninho de cobras: a
trajetória de João da Silva Feijó em Cabo Verde, em finais do século XVIII.”
Revista História: Questões e Debates, Curitiba: Editora UFPR, n. 36, p.29-60.
‘Usos do Passado’ — XII Encontro Regional de História ANPUH-RJ 2006: 6Feijó recebeu uma carta de advertência de
Mello e Castro, fruto de denúncias da elite local, por não ter pago pelo
transporte utilizado quando estava trabalhando. Acusaram-no também de excesso
de autoridade e de ter exigido mais algodão para empacotar as remessas de
animais para Lisboa. A população se sentiu muito ofendida com tal abuso. Porém,
a versão de Feijó é completamente diferente: com a morte do governador, ele
ficou sem saber o que fazer e como voltar da Ilha de Fogo, local onde estava
para o reconhecimento da fauna e flora. Tentou conseguir o transporte com os
representantes da Companhia do Grão-Pará, porém o seu pedido foi rejeitado.
Depois de um tempo, novos administradores da Companhia chegaram e, ao lhes
refazer o pedido, aceitaram fazer o transporte, por ser este do serviço da
Coroa. Tais fatos só demonstram e reforçam o carácter competitivo e de
intrigas administrativas vividas por Feijó, ou seja, como nas palavras de
Magnus Pereira, “um verdadeiro ninho de cobras”. Feijó se sentia tão
amedrontado pela força de elite local que chegou a exigir uma escolta militar
pessoal. Porém, isso não foi suficiente para impedir o seu envenenamento
que, por sorte, não levou à sua morte. Sua vida melhorou quando encontrou
no novo governador Faria e Maia, um aliado, que o defendeu perante a localidade
e a Martinho de Mello e Castro. Essa pequena comparação foi só para
demonstrar em que tipo de ambiente estavam inseridos estes naturalistas. Com
a chegada destes letrados vindos de Portugal, a elite sente-se ameaçada por
este corpo de alguma maneira próxima à Coroa, gerando uma grande
competitividade entre a elite e os novos oficiais. No caso de Galvão, outro
“funcionário” deveria ocupar cargo de Secretário de Governo, alguém ligado à
elite de Moçambique, capaz de administrar os acontecimentos de acordo com seus
interesses e os da elite, e não necessariamente os da Coroa. Afinal, formado na Universidade de
Coimbra com alto grau de instrução e aptidão, esse naturalista tinha um
poder de interferência em suas mãos que poderia prejudicar os interesses
locais. William Simon levanta a hipótese que o governador interino queria ver
nomeado para o posto de Galvão, JOSÉ NOGUEIRA DE ANDRADE. Para este autor,
como Manuel estava em uma colônia portuguesa que utilizada mão-de-obra escrava
africana, ele não se ajustaria ao modo de vida de Moçambique, que tinha sua
maior base de comércio na exportação de escravos. Mas esta hipótese tem
problemas, uma vez que hoje sabemos que o próprio GALVÃO DA SILVA acabará por
se inserir nessa economia, dedicando-se
ele próprio ao tráfico de escravos. Em 1793, Galvão possuía um navio
negreiro chamado Bazaruco. Sendo assim, é possível pensarmos que MANUEL
GALVÃO DA SILVA encontrou, assim como seu colega Feijó, dificuldades para se
inserir no panorama das disputas locais, No caso de Galvão, contudo, ele
acabou por se aproximar do governador DIOGO DE
SOUZA COUTINHO, ou seja de algum modo ele encontrou brechas e acabou
por se inserir, não pela via do apoio da Coroa ao Caso da Ata de nascimento que lhe é atribuída esteja correta, ele
começou a cursar matemática em Coimbra com 16 anos e, em finais de 1778, quando
aparece matriculado em Filosofia, tinha 18.24 Tudo isto torna mais evidente o
porquê de ter-se tornado Feijó o jovem e da relação severa e paternal que o
ligava a Martinho de Mello e Castro. Assim como todos os outros, ele teria que
enfrentar a batalha para ver reconhecida localmente a sua condição autónoma de
homem de ciência. No entanto, ao mesmo tempo, ele buscaria escapar da tutela
que lhe era imposta devido à sua juventude. Esta dupla batalha inicia assim
que Feijó desembarca, quando começam os pequenos incidentes com o FREI
FRANCISCO DE SÃO SIMÃO a quem estava submetido. No afã de se fazer valer, o
naturalista comete um erro crasso na estratégia que adota para enfrentar o
bispo: escolhe o texto filosófico como arma. Os historiadores, ávidos pelas
fontes escritas, tendem a dar à produção escrita desses naturalistas uma
importância que necessariamente não lhe era atribuída pelas personagens que
dominavam a cena administrativa do período. Martinho de Mello e Castro era
explícito quanto a isto. As “palavras inúteis” de um naturalista eram “nada, ou
pouco mais de nada”. O que lhe interessava era o envio regular e bem
acondicionado de minerais, vegetais e animais. Note-se que o ministro era
detentor do forte espírito coleccionista que caracteriza o período. Como já foi
mencionado, Isto sofreria uma certa mudança nos anos subsequentes. Com a
publicação das Memórias Económicas da Academia Real das Ciências de Lisboa, e
mais ainda durante o consulado Souza Coutinho, o texto filosófico ganharia um
outro estatuto. Embora desse continuidade à política de recolha e mesmo a
ampliasse, o conde de Linhares era antes um ávido coleccionador de memórias do
que de “curiosidades naturais”. Neste período subsequente, Feijó teria a sua
produção literária reconhecida e publicada. Todavia, quando elaborou os seus
primeiros relatos não fez mais que irritar o seu patrono. O texto
“científico” do naturalista entrou pelos canais administrativos por onde fluíam
as denúncias de desmando dos agentes da coroa e foi acolhido exactamente da
forma como o eram todos os outros. O jovem fazia intrigas contra o seu tutor, o
bispo-governador, o qual, aparentemente, contava com a simpatia de Mello e
Castro.O principal documento a informar os movimentos iniciais de Feijó no
arquipélago e que foi simultaneamente a causa de seus primeiros dissabores é o
Itinerário Filosófico que contém a Relação das Ilhas de Cabo Verde disposto
pelo método epistolar. Como o título sugere, este relato é composto de um
conjunto de cartas endereçadas a Martinho de Mello e Castro, dando conta de
suas atividades. Apesar de ser o mais importante texto de Feijó sobre aquelas
ilhas, permaneceu inédito, até onde pode-se alcançar, e desconhecido por parte
dos antigos historiadores de Cabo Verde.
1783
Petição dos quakers ao Parlamento inglês contra o tráfico de escravos.
JOSÉ ANTÓNIO PINTO, Capitão-mor de Bissau, aquando de uma
insubordinação dos soldados teve de fugir para Geba para salvar a vida.
JOSE DE ARAUJO GOMES nasceu em Lisboa, chegou ao Arquipelago de Cabo
Verde em 1783 e viajou para a Guine em 1790 (?) Fizeram-no capitão de
infantaria em 1793, serviu como tesoureiro da Real Fazenda de Bissau de Maio de
1793 ate Junho de 1795, e em Dezembro de 1803 tinha13 anos de serviço em
Africa; foi escrivao da Índia e Mina (Junho de 1801) e fez de govemador de Bissau em Maio de 1803. Em 1803 visitou Pará no
brigue Pensamento d'America acompanhado
pelo seu filho ANTONIO MONIZ DE ARAUJO GOMES, por seu genro GONÇALO
CARDOSOe por sua sobrinha THOMAZIA MARIA, mais tres criados: VALENTIM GOMES (preto,
de 16 anos); JOÃO ANTONIO GOMES (preto,
de 8 anos); VIOLANTE GOMES (preta,
de 19/20 anos, solteira), e por MANUEL DE SOUSA CARDOSO, homem pardo,
nascido em Bissau, solteiro, de 20 anos de idade. De Para foi para Lisboa. Foi capitão-mor da ilha do Fogo de 1807 a
1819 e nomeado comandante de Cacheu em 1820, de que tomou posse a 13 de
Abril de 1821 ja no posto de coronel.
1783/01/02
Criação da Sociedade de
Comércio das ilhas de Cabo Verde
«Terceira Companhia de Cabo Verde e Guiné
Em 1783, resolvia o Govêrno
central arrendar a cobrança dos rendimentos públicos a uma
emprêsa particular, a Sociedade do Comercio das Ilhas de Cabo Verde, à qual já antes
disso havia sido concedido o exclusivo do
comércio na mesma província. O contrato, assinado em 2 de
Janeiro de 1783, continha as seguintes disposições:
O acôrdo
começava em Janeiro dêsse ano e deveria vigorar durante 4 anos. Pertencia
à
Sociedade
arrecadar todos os rendimentos reais, ou sejam, os
direitos alfandegários, dízimos, foros e outras quaisquer rendas do
Estado, tanto em Cabo Verde como na Guiné. A cobrança era feita pelos
empregados nomeados pela Sociedade sem qualquer intervenção
dos governadores. Além disso a Sociedade continuava a gozar do
exclusivo do comércio em Cabo Verde e Guiné.
Em
contra-partida oferecia ao govêrno a contribuíção anual de 5.000$000
réis e transporte gratuíto para o material do Estado e degredados. A
contribuíção era paga em Cabo Verde e Guiné e destinava-se a satisfazer
as
folhas dos vencimentos e mais despezas.
Era
evidente que o rendimento de 5.000$000 era mais que insuficiente
para
cobrir
as
despesas dos dois distritos. Tanto em Cabo Verde como na Guiné, a média
anual dos gastos indispensáveis regulava
por 6.000$000, sendo portanto necessários pelo menos
12.000$000 para uma administração regular.
Enquanto
não surgissem novas fontes de receitas públicas, tornava-se indispensável
que a metrópole auxiliasse a colónia.
Infelizmente
o Govêrno central não prestava grande atenção a esta situação
e a província teve de se remediar com os seus próprios recursos.
Como a
franqueza da sua economia não permitia suportar a acumulação
dos
deficits, foi forçada a reduzir os serviços ao mínimo, o
que importa dizer que tanto o Govêrno de Cabo Verde como nas capitanias de Cacheu e Bissau viram-se quási abandonadas.
No
arquipélago, com a actividade comercial reduzida ao mínimo,
não conseguia a Sociedade cobrar sequer um conto de réis de
impostos. Nestas condições, embora tivesse os benefícios do monopólio
comerdal,
a Sociedade abriu falência em 1786, antes de
completar o prazo
de 4 anos.
Para a
decadência da nossa colónia e morte das iniciativas portuguesas
contribuiu poderosamente o desenvolvimento do comércio e navegação
da
Inglaterra, que ao tempo tinha, por assim dizer, um monopólio
do tráfico de escravos para a América e o domínio no comércio em geral.»
João Barreto, HISTÓRIA DA GUINÉ 1418-1918, edição do autor, Lisboa, 1938, pgs. 158-159
1783/04/23
O GOVERNO DO BISPO D.
FREI FRANCISCO DE SÃO SIMÃO (ABRIL A AGOSTO DE 1783)
A 23 de Abril de 1783 a
Câmara dava posse ao bispo D. Frei Francisco de São Simão. Todavia, o governo
do Bispo durou pouco mais de 3 meses mas o prelado ainda conseguiu pôr em
prática uma ideia antiga, a da construção de um seminário para a educação de
jovens. Escolheu o sítio da Ribeira da Prata do Tarrafal, 18 léguas distante da
cidade, onde passou a residir e deu início à construção do seminário e onde
também faleceu a 10 de Agosto de 1783. Aí foi sepultado, conforme determinou em
seu testamento.
1783/08/10
Falecimento de Frei Francisco de São Simão.
O QUARTO GOVERNO DO
CORONEL JOÃO FREIRE DE ANDRADE (1783-1785)
A sorte favorecia de
novo João Freire de Andrade que, como coronel de patente mais antiga, pôde
avocar novo governo interino. Tal como na vacância anterior, rejeitou o
representante eclesiástico que devia fazer parte do triunvirato e governou
juntamente com o seu cunhado, o coronel Manuel Tavares da Silva que continuava
a servir de juiz ouvidor. Com efeito, as numerosas patentes são assinadas
apenas por estes dois membros da junta governadora e só seis meses depois
comunicaram ao governo central o óbito do bispo D. Frei Francisco de São
Simão.20
Logo após o falecimento
do bispo inventariaram os seus bens em Santiago e São Nicolau e mandaram-nos
vender, não respeitando as instruções precisas que o prelado dera sobre a não
ingerência das justiças seculares na inventariação dos seus bens, precisamente
para evitar que fossem vendidos, com excepção dos comestíveis que seriam
destinados aos pobres. Por isso tinha determinado que o cabido haveria de
nomear um juiz eclesiástico que depois entregaria tudo ao procurador da
mitra,21 mas o novo governo de Freire de Andrade não honrou os seus últimos
desejos.
No que diz respeito à
actuação como governo, muito se poderia dizer acerca da recepção e extravio dos
ofícios expedidos pela Secretaria do Estado e das incumbências solicitadas que
possibilitaram a recepção de géneros e arrecadação de 1.472$000 (um conto, quatrocentos
setenta e dois mil réis), importância de uma barra de ouro que ficou em poder
do coronel João Freire de Andrade.
Como qualquer governo
regular, alargaram as suas jurisdições às restantes ilhas, tendo procedido ao
provimento de capitães da guarnição da ilha do Fogo. Mas foram longe de mais
quando, em virtude do falecimento do comandante da praça de Cacheu em Dezembro
de 1783, o nomeado para o substituir foi o coronel Manuel Tavares da Silva,22
cunhado de João Freire de Andrade e segundo membro do governo interino.
Dois factos alteraram
então as relações de força e de poder estabelecidas na ilha. A chegada do novo
capitão-mor da vila da Praia, Luís Pedro de Araújo e Silva e do ouvidor-geral
José Ferreira da Silva.
O primeiro, reinol
recém-nomeado capitão-mor da vila da Praia, contestou energicamente a
legitimidade do coronel no poder, o que lhe valeu pouco depois uma ordem de
prisão. Não desistiu e em diversas cartas endereçadas ao poder central
questionou a primazia do posto do coronel Freire de Andrade sobre a sua patente
militar. Segundo, as ilhas tinham estado cerca de sete anos sem ouvidor-geral o
que permitia a João Freire de Andrade orientar toda a jurisdição judicial em
segunda instância sempre que podia colocar na Câmara um partidário como primeiro
magistrado camarário que passava a desempenhar essas funções do ouvidor-geral.
A partir de 21 de Abril de 1784 mudaram as circunstâncias com a chegada do novo
magistrado, José Ferreira da Silva. Inteirando-se da situação insólita, um
triunvirato governativo em teoria mas na prática um único membro reconhecido
por governador interino, dispôs-se a cumprir as determinações régias e procedeu
a uma reorganização do governo (que o coronel Freire de Andrade vivamente
impugnou) dando posse ao tesoureiro-mor que ocupava o cargo de deão, como
adjunto do governo. Durante os restantes meses até à chegada do governador
António Machado de Faria e Eça (1 de Abril de 1785) o coronel não teve grande
margem de manobra, vendo-se obrigado a governar em triunvirato com o
ouvidor-geral e o representante eclesiástico.
1784
JOÃO PEREIRA BARRETO capitão-mor de Cacheu, interino, até
1786
AMBRÓSIO DA COSTA ALVARENGA e a sua consorte, ISABEL LOPES DA CONCEIÇÃO, são lembrados como patronos da capela de Cacheu
por uma inscrição comemorativa da morte da ultima em 23 de
Abril de 1784.
Entre 1784 e 1789, todo
o Fouta foi assolado por uma guerra violenta, resultante de um levantamento de
animistas,
com um exército tão vasto que certas tradições chegam a estimá-lo composto por
quatrocentos mil homens (o que é certamente um exagero mas transmite uma noção
da sua dimensão), que reagiram às
campanhas dos “almany” (chefes dos fulas) Karamoko Alfa (contra o Gabú e
Konkodougou) e Ibrahima Sory Maoudo (para Leste), demasiado destrutivas e
frequentes contra as suas aldeias. Os animistas (incluindo fulas não
islamizados), conduzidos por Koné
Bouréma Sidibé quase exterminaram os muçulmanos mas, confiantes na vitória
definitiva, não perseguiram nem capturaram Sory Maoudo que conseguiu reunir
tropas e contra-atacar Kondé Bouréma em plena estação das chuvas, vencendo-o.
O Fouta estava salvo, e os fulas prepararam um exército forte, condição de
sobrevivência necessária do Estado muçulmano rodeado por vizinhos animistas.
1784/04/21 José Ferreira da Silva, desembargador, tomou posse
como ouvidor em 21 de Abril de 1784. Provocou vários conflitos de jurisdição com o Governador
Faria e Maia,
enfileirando-se entre os partidários dos Freires de Andrade; foi forçado a embarcar para o Reino, sendo
substituído por Gregório de Vasconcelos Martins que
serviu interinamente até 1793.
1784/04/30
Nomeação
de D.FREI CRISTOVÃO DE SÃO BOAVENTURA
como bispo da diocese de Cabo Verde. Partiu a 2.05.1786. Residiu sempre na ilha
de São Nicolau. Nesta ilha fundou escolas de gramática e moral.
1784/08/23
ANTÓNIO
MACHADO DE FARIA E MAIA capitão e governador-geral de Cabo Verde.
Esteve até 1789. No seu tempo foi
renovada pelo Alv. de 14 de Abril de 1785 a proibição aos Governadores,
Ouvidores e mais pessoal de comerciarem tanto com estrangeiros como com
nacionais, de todo e qualquer modo.
Tenente-coronel António
Machado de Faria e Maia foi nomeado governador das ilhas de Cabo Verde a 23 de
Agosto de 1784, tomou posse a 1 de Abril de 1785. Foi mais um governo
atribulado, cheio de intrigas, queixas e acusações. O governador António Machado de Faria e Maia queixava-se constantemente
de estar a sofrer moléstias das ilhas e que muitas vezes o deixava inactivo e
temia bastante que estas moléstias o levasse para a sepultura, “o que
desarranjaria bastante os interesses particulares de um sobrinho e dois
irmãos, pois, talvez, não podem recolher a metade do meu espolio devido á
confusão lastimosa, e as aves de rapina que abundam naquelas ilhas […]”. Quando terminou o governo, em 1788, foi o
próprio a representar e a pedir o envio do seu sucessor.
Ao tempo da chegada de Feijó ao arquipélago, a lição pombalina já parecia
um tanto esquecida e os conflitos envolvendo a elite local e os emissários da
coroa tinham voltado à sua turbulenta rotina, movimentada exactamente pelas
mesmas personagens do passado. Após a morte do bispo, o governo foi assumido
por ANTÓNIO FARIA E MAIA, que passa a se degladiar indiscriminadamente com a
elite local, com o clero, com os militares e, principalmente, com o ouvidor das
Ilhas. Este, por sua vez, faz uma aliança com o clã de JOÃO FREIRE DE ANDRADE,
que havia escapado da razia pombalina e continuava a ser o maior potentado das
ilhas. Ambos seriam os principais responsáveis pela campanha de descrédito
conduzida em Lisboa contra Feijó. É interessante perceber que o
naturalista era provavelmente encarado como um homem do governador. Feijó, inicialmente,
parece ter entrado em conflito com Freire e Maia. “Não sei que mal tenho feito a este senhor que aqui governa, que não faz
mais que me ultrajar,” queixava-se a Mello e Castro. No entanto, aos
poucos foi-se estabelecendo uma aliança entre os dois, pois o governador passa
a defender activamente Feijó das acusações vindas do Reino. Outras das queixas
levadas a Lisboa era a de Feijó exigir uma escolta militar pessoal. Pode-se ver
duas dimensões nesta exigência. Uma primeira era o medo de ser eliminado pela
facção local desgostosa com ele. É a partir do retorno das Ilhas de Barlavento
que Feijó encontraria um aliado em Faria e Maia. Na sua luta por se afirmar
no arquipélago, o governador conseguiu, por algum tempo, anular todos os seus
concorrentes. Acabou prendendo o ouvidor e mandando-o de volta a Lisboa.
Conseguiu, também, enquadrar os comandos militares locais e parte do clero. Ao
fazer esta razia livrou Feijó de seus contendores. Além disso, assumiu
pessoalmente a defesa do naturalista frente a Mello e Castro. Escreve ao
ministro dizendo que Feijó, “por falta de
malícia, ou dos conhecimentos do homem, tem praticado algumas rapaziadas, mal
pensadas sim” mas que não era malévolo ou temerário. Tendo chegado o naturalista
à estas Ilhas, e devendo sempre empregar-se debaixo da direção do
Reverendíssimo Bispo D. Frei São Simão, principiou a sua desgraça pela morte
deste Prelado; não só porque não pôde justificar muitas ordens que recebeu
localmente, mas porque lhe faltou muito cedo uma pessoa de maior idade e mais
conhecimento do mundo, que fosse pouco a pouco dando-lhe a conhecer quais
deviam ser ou seus verdadeiros cuidados e quais poderiam ser os seus princípios.
É certo que nas Ilhas de Santo Antão e São Nicolau houveram queixas do referido
naturalista porque ele entreprendeu um numeramento dos gados todos; e achando
que muitos diminuíam o número que lhes pertencia, fazia passar para a Fazenda
Real o acréscimo destes gados, dizendo que não tinham dono e que
consequentemente pertenciam à Real Fazenda, o que participou ao Administrador
JOSÉ LOPES QUARESMA. O naturalista diz que recebera ordens a este respeito
do Prelado defunto. Faria e Maia insiste que Feijó não era culpado da maior
parte das coisas de que fora acusado e que realmente tinha andado muito doente.
“Mesmo na minha casa o vi sofrer sezões
muito fortes, que o impediam até de voltar à sua por muitas horas.” Neste
estado, ele teria embarcado para as Ilhas de Barlavento. Note-se o tratamento
quase paternal(ista) dispensado ao naturalista. Por ordem de Mello e Castro,
Feijó passaria, desde então, a ser tutelado pelo coronel JOSÉ MARIA CARDOSO.
Este oficial havia feito anteriormente, por conta própria, uma remessa de
curiosidades naturais para o Gabinete da Ajuda, a qual foi considerada de óptima qualidade. Não há indícios de que tenham ocorrido maior conflito entre os dois.
É mesmo provável que Feijó tenha encontrado nele o auxiliar de que sentia
falta. Desde o retorno a São Tiago, torna-se mais difícil acompanhar os passos
de Feijó, uma vez que, aparentemente, ele abandonou a escrita de seu Itinerário
filosófico. Se ele o continuou, a sequência está hoje desaparecida. O ano
de 1786 ele gastaria refazendo os passos de suas primeiras viagens, tentando,
assim, se redimir perante os seus superiores em Lisboa. Uma das queixas que
recebera era de não ter dado suficiente atenção ao salitre da Brava e ao
enxofre do Fogo, de que mandara amostras insignificantes sem a indicação de
existirem, ou não, jazidas economicamente aproveitáveis. No início do ano,
por instrução de JULIO MATTIAZI, retorna à Brava. Ali ele e Cardoso concluem
que não é viável a exploração de salitre. Passa a seguir ao Fogo, para ver
de perto a erupção do vulcão que era responsável pelo nome da ilha e estudar a
possibilidade de explorar enxofre. A observação do fenómeno está relatada em
sua Memória sobre a erupção do Fogo. Originalmente, ele pensou este relato como
uma continuidade do Itinerário Filosófico, percorrendo para isso 2/3 da
circunferência da ilha, segundo informação de Faria e Maia. Todavia, este texto
ganharia autonomia e é uma de suas obras mais conhecidas, tendo sido publicada,
com algumas variações em relação ao original, no Rio de Janeiro.
O GOVERNO DE ANTÓNIO
MACHADO DE FARIA E EÇA (1785-1790)
Pouco depois do início
do seu mandato, estalavam as clássicas discórdias entre o governador e o
ouvidor-geral de Andrade no sentido do aliciamento do magistrado régio.
Enredado por D. Violante Freire de Andrade, irmã do coronel, o ouvidor-geral
“esqueceu-se” dos descaminhos dos bens da Casa da Misericórdia que tanto
denunciara inicialmente assim como do despotismo do coronel na monopolização do
governo interino que ele próprio teve de reformular.
Não podendo contar com
o apoio do ouvidor-geral com quem estava em permanente conflito e tendo de
enfrentar os constantes entraves colocados à sua acção governativa pelo coronel
e seus correligionários, o governador António Machado de Faria e Eça viu-se
obrigado a exercer o poder com grande autoridade e firmeza. O conhecimento
detalhado das prisões arbitrárias ordenadas pelo coronel, dos abusos
perpetrados pelos partidários da sua facção, da delapidação dos bens da Casa da
Misericórdia durante o governo interino e sobretudo, as provocações e as
incessantes obstruções ao seu governo (em Lisboa já corria a notícia de um
pretenso levantamento do coronel contra o governador) levaram-no a ordenar o
degredo do coronel Freire de Andrade para a ilha da Boavista, a proibição de
qualquer contacto com pessoas da ilha de Santiago e a prisão domiciliária de D.
Violante Freire de Andrade na sua fazenda dos Órgãos de onde nunca poderia sair
sem ordem régia, autorizando-a apenas a assistir a missas mas proibindo-a de
sair de casa com mais de 8 escravos, não podendo qualquer membro dessa família
aparecer armado em parte alguma da ilha de Santiago.23
O governador António
Machado de Faria e Eça pôde então dedicar-se à distribuição de mantimentos a
diversas ilhas onde a fome se instalara, sobretudo na Boavista. Nesta ilha o
coronel degredado actuava, distribuindo recursos e adquirindo partidários,
fazendo petições e acusando o governador de administrar com despotismo. Atacado
pela doença da terra, o governador incessantemente pedia sucessor o que só se
verificou quase um ano depois do cumprimento do seu triénio (1790).
1785
Por ter falecido
em 1785 o capitão-mor de Cacheu, Antonio
Telles de Menezes, ficou com o
governo interinamente o padre João
Pereira Barreto, que foi substituído em 26 de maio por Luís Pedro de Araújo e Silva, nomeado interinamente
pelo
governador.
João Pereira Barreto, fundador de famosa família de Cacheu, era urn
luso-africano, nascido em Santiago, onde recebeu o sacerdócio. Foi transferido
para a Guine em 1770 (?), provavelmente por causa das suas relações com uma
escrava de que lhe nasceram dois filhos (conhecidos).
1786
LUÍS PEDRO DE ARAÚJO E
SILVA é
capitão-mor de Cacheu em 1786 e 1787
1786/04/21
Nomeação de JOSÉ
VICENTE PEREIRA no cargo de capitão-mor da Vila da Praia, ilha de Santiago.
1786/05/17
Luís de Araújo e Silva é capitão-mor de
Cacheu
«Em 17 de
maio representaram os principaes moradores da ilha de S. Thiago contra o governador Faria e Maia, a
quem chamavam despota por querer tratai-os como escravos; que era um doido, pois poucas vezes
falava com acerto, usando de linguagem grosseira e obscena, e os castigava
com açoites e degredo; que prendera um corpo inteiro dos camaristas tia
cidade, ameaçando-os de morte; que vexava e opprimia os officiaes militares com
as pa tentes, dando a miado altas a uns e baixas a outros, só para receber
os emolumentos que já tinham acabado por lei, sendo dos capitães 8$000
réis, tenentes e alferes 4$000 réis e capitão-mór dos fortes 14$400 réis;
supplicavam todos a sua substituição.
Ainda contra o mesmo governador representaram
o coronel João Freire de Andrade,
degredado na Boa Vista; D. Violante Freire de Andrade, degredada nos Orgãos; o capitão Paulo da Silva Rebello e
Candido Almeida Spinola, ambos degredados na Guiné.
Splnola
fundamentou largamente a sua queixa contra as tropelias d'esse governador,
especie de D. Juan, dizendo que a razão d'elle ter cahido fóra das graças era a
Infelicidade de possuir uma mulher que a natureza dotara com os melhores
requisitos de formosura, a qual sensibilisara o coração de Faria e Maia, querendo este por bem ou por mal
assenhorear-se d'ella,. como já tinha reito com a esposa de Antonio José Baptista.
Esta mulher, com os seus filhos, foi depositada em casa de um
caixeiro da sociedade a pedido do governador.
Accusaram-no de mandar vir de Lisboa navios e dinheiro para comprar milho, e os
carregava para vender nas Canarias e America.» -
Subsídios para a
História de Cabo Verde e Guiné, por Christiano José de
Senna Barcellos, parte III, pg. 97, Lisboa, 1906
1787
Thomas Clarkson e William Wilberforce fundam em Londres a Society for the Abolition
of the Slave Trade (antepassada
da British
Antislavery Society), modelo de outras associações similares em vários
países da Europa e da América.
1788
«A escrituração minuciosa da Companhia do Grão-Pará e
Maranhão dá-nos números muito significativos para um período
em que se esperariam valores muito mais baixos, permitindo-nos projectar para os séculos anteriores quantitativos próximos ou eventualmente
superiores. Entre 1756 e 1788, os agentes da Companhia compraram
na região entre o Casamansa e a Serra Leoa (os
chamados «rios da Guiné») 2.404 escravizados, entre adultos e crianças
pequenas, dos quais morreram 192 antes do embarque, isto é, 7,9%. Mais a sul, nos
reinos de Angola e Benguela, adquiriram 8.913 indivíduos, de que, na mesma situação,
faleceram 641 (7,1 %). E isto apesar de, nas instruções da direcção da Companhia para os seus representantes, se insistir em que
fosse dado bom tratamento aos escravos e se recomendar «particular
cuidado de resgatar escravos que sejam livres de
queixas e como tais de fácil venda», devendo fazer-lhes «as necessárias
acomodações
para
se
conservarem com cautelas e livres de doenças até haver condição de se transportarem»
ESCRAVOS E TRAFICANTES NO IMPÉRIO PORTUGUÊS, O
comércio negreiro português no Atlântico durante os séculos xXV a XIX, Arlindo
Manuel Caldeira, A Esfera do Livro, Lisboa, 2013, pg. 107
É fundada
em Paris a Sociedade dos Amigos dos Negros, que tinha como objetivo
acabar com o tráfico de escravos.
Arquivo do Tribunal de
Justiça do MA. Inventários post
mortem de Bento da Cunha, 1788:
[...] Escravos
MANOEL, Benguela, de idade de quarenta anos, avaliado em cento
e vinte mil réis ...120$000
RITA, Mina, sua mulher, vinte e cinco anos, avaliada em cento
e quarenta mil réis 140$000
BONIFÁCIO, mandinga, de idade de vinte e oito anos, avaliado em sessenta
mil réis...... 60$000
LUZIA, Caxeu, sua
mulher, de idade de vinte e cinco anos, avaliada em cento e vinte mil
réis..... 120$000
ÚRSULA, crioula, filha dos ditos, de idade de seis
anos, avaliada em sessenta mil réis .... 60$000
A minha neta Raimunda
Isabel deixo-lhe uma rapariga crioula
por nome MARIA COTA (...) Tenho uma mulata
chamada RITA a deixo a minha irmã Margarida Mendes, e a dita mulata está em
seu poder para servi-la durante a sua vida, e depois de morta a deixo [a
muacta] a minha afilhada e neta Ana Francisca, filha de meu genro Francisco das
Chagas, com todos os produtos que
poderá ter a dita mulata(...) Deixo a um menino que criou minha irmã
Margarida Mendes, chamado Antonio David, um
rapaz por nome RAIMUNDO, nação
Bijagó, como tão bem cinqüenta mil réis para o seu vestuário, e tudo o faço
pelo amor de Deus. (Arquivo Público do Estado do Maranhão, testamento de Felipe Carvalho Matos).
1789
O rei de Espanha
concede liberdade de comércio a espanhóis e a estrangeiros
para o tráfico
de
escravos
com as ilhas de Cuba, São Domingos, Porto Rico e província
de Caracas.
Rejeitada
pelo Parlamento inglês a primeira moção propondo a abolição do tráfico de
escravos.
Situação
de fome na ilha da Boavista
1789/04/02
Nomeação de FRANCISCO JOSÉ TEIXEIRA CARNEIRO no
cargo de capitão e governador-geral de Cabo Verde. Chegou à ilha a 18 de
Janeiro de 1790.
1790
1790/01/21
FRANCISCO
JOSÉ TEIXEIRA CARNEIRO Governador de Cabo Verde e da Guiné, nomeado a 2 de Abril
de 1789 mas só tomou posse a 21 de
Janeiro de 1790.
O GOVERNO DE FRANCISCO JOSÉ TEIXEIRA CARNEIRO
(1790- 1795)
Tendo tomado posse em 21 de Janeiro de 1790, uma
das primeiras medidas do governador Francisco José Teixeira Carneiro, foi a
concessão do deferimento da petição do coronel João Freire de Andrade que
imediatamente concretizou o seu regresso à ilha de Santiago. Durante o seu
mandato, Francisco José
Teixeira
Carneiro deixou-se manobrar pelo coronel Freire de Andrade que aproveitando-se
da sua fraqueza, revitalizou o seu partido e procurou colocar os seus correlegionários em postos civis e militares de chefia. Francisco José Teixeira Carneiro foi substituído pelo governador José da Silva Maldonado de Eça em
19 de Junho de 1795 que apenas governou perto de três meses, tendo falecido a
10 de Setembro do mesmo ano da supradita doença da terra.
1792, Dezembro, 7,
Queluz AVISO (minuta) do [secretário de estado da Marinha e Ultramar], Martinho
de Melo e Castro, ao provedor da Casa da
Índia [e Guiné, D. JOSÉ JOAQUIM LOBO DA SILVEIRA], transmitindo a ordem
real para que se admitisse, pelo Consulado da Saída, o despacho de armas que
João Teixeira de Barros pretendia mandar para Guiné, Benguela e Angola A partir do início da década de 1790, FEIJÓ
começaria a acumular interinamente algumas funções burocráticas. Aparece em
documento de 1793, como Secretário do Governo da Capitania de Cabo Verde e
Escrivão da Matrícula da Gente de Guerra. No mesmo período, começa a fazer
gestões para retornar a Portugal. Vai utilizar como intermediário o governador
FRANCISCO JOSÉ TEIXEIRA CARNEIRO, que escreve a Martinho de Mello e Castro
“Este pobre naturalista, que já se acha aqui a dez para onze anos se tem
comportado em todo o tempo do meu governo, digno de que V. Ex.ª o atenda, e o
felicite.” Ao mesmo tempo, é enviado ao Conselho Ultramarino um atestado
do governador, confirmando que Feijó tinha urgentíssimos motivos para ir ao Rio
de Janeiro, tratar dos bens herdados pela morte do pai e da mãe. Ele também
contou com a cumplicidade de sua mulher, que intercedeu, com sucesso,
directamente à D. Maria I.
1791
Rebelião dos escravos da parte
francesa da ilha de São Domingos (actual Haiti} e consequente
abolição da escravatura.
Em
1791 é publicado um volume de narrativas que serviu de base para os esforços em extinguir o tráfico negreiro
inglês, (1) dando sequência a uma série de colectâneas publicadas pelo
Legislativo britânico. (2)
Nos
relatos da colectânea de 1791, guerra,
roubo, adultério e pilhagem eram citados como formas corriqueiras de se
conseguir escravos. Quase todos
esses modos de captura eram comuns em lugares como a foz dos rios Senegal e
Gâmbia. Era para lá que os mouros (moors) que dominavam o tráfico
com o interior levavam as caravanas de escravos - compostas de prisioneiros de
guerra, condenados por crimes ou produtos de pilhagens, de acordo com Dalrymple. (3) Os soldados negros
muçulmanos atacavam uma vila e prendiam quantos podiam - um número variável
entre trezentos e 3 mil de cada vez. (4) Tais informações sobre os mecanismos
para se conseguir escravos seriam úteis na definição de uma estratégia inglesa
de combate às bases do tráfico negreiro no litoral africano, tanto em termos
militares quanto diplomáticos. Fosse para atacar os barracões, fosse para
propor um acordo aos soberanos locais, era preciso conhecer em detalhes o
funcionamento da captura.
(1) An Abstract of the Evidence
Derivered before a Selected Committee of the House of Commons in the Years
1790, and 1791: on the Part of Petitioners for the Abolition of the Slave
Trade. Londres,
James Phillips, 1791.
(2)
Outra coletânea fora publicada dois anos antes, reunindo depoimentos de pessoas
ligadas ao tráfico na África, no Brasil e nas Antilhas. Ver Grã-Bretanha, Board of Trade. Report of the Lords of the
Committee of Council Appointed for the Consideration of Ali Masters Relating of
Trade and Foreign Plantations. SI 1, s/e, 1789. Até meados do século XIX, outros
volumes seriam editadas pelo Parlamento inglês.
(3)
W. Dalrymple é o autor de Traveis through Spain and Portugal in 1774, editado
em Londres em 1776.
1792
Abolição do tráfico negreiro
na Dinamarca (primeiro país a fazê-lo), com efeitos dentro de dez anos.
Em Inglaterra, uma moção para
abolição
do
tráfico é aprovada na Câmara dos Comuns
mas rejeitada na dos Lordes.
Os Bijagós escravizam cidadãos
ingleses, vendendo-os depois pelo mesmo preço dos outros escravos.
JOSÉ DA SILVA CARDOSO era um dos «principais comerciantes» de Bissau em 1792,
quando Philip Beaver e outros colonos britânicos estiveram em Bolama. Beaver era associado com a firma de Lisboa Pedro
Nolasco Gaspar & Irmãos quando morreu em 1805 (?).
A concorrência estrangeira no comércio da Guiné
continuou muito forte, a tal ponto que, em Agosto de 1739, houve uma tentativa
dos franceses para se apoderarem de algumas áreas de Bissau e, em 1792, algumas centenas de ingleses
fundaram uma colónia na ilha de Bolama. Dois anos mais tarde abandonaram-na
devido a retaliações fortes por parte da população indígena.
João Dias
da Mota (1744 - 1793) - Nasceu em Vila Rica. Foi capitão do Regimento da
Cavalaria Auxiliar da Vila de S. João e fazendeiro. Era amigo de Tiradentes.
Morreu em Setembro de 1793, nove meses após chegar a Cacheu, de uma
epidemia que assolou a região.
Inconfidente da revolta do Tiradentes foi degredado
para Cacheu em 1792
Depois da execução brutal
de Tiradentes, condenado à morte, enforcado e esquartejado
em 21 de Abril de 1792, os outros
inconfidentes foram exilados para Portugal e África. Entre eles estavam os
mineiros José de Resende Costa (pai), João Dias da Mota e Domingos Vidal de
Barbosa. Os três foram enviados para Lisboa em Junho de 1792. De Portugal, seguiram para o degredo na
África -dois para Cabo Verde e outro (João Dias da Mota) para a Vila
de Cacheu, Guiné Portuguesa, uma região
inóspita onde viviam algumas tribos.
O inconfidente José de
Rezende Costa (1728-1800)- um dos heróis da Inconfidência Mineira, o prestigioso
lavrador,
da fazenda dos Campos Gerais, que tomara parte saliente na Inconfidência
Mineira e, por isso, condenado que com baraço e pregão fosse conduzido
pelas
ruas públicas ao lugar da forca, e nela morresse morte natural
para sempre. A pena, entretanto, fora comutada para o degredo em Bissau, na África, por 10 anos, aí morrendo, dele compartilhando o Conselheiro José de
Rezende Costa, filho do Capitão José de Rezende Costa, que
falecera em 1789, com a idade de 72 anos. De regresso á pátria, José de
Rezende Costa fora investido de importantes cargos públicos:
Administrador
da Fábrica de Lapidação de Diamantes, Contador Geral do Erário. Escrivão
da Mesa do Tesouro e, ainda, agraciado com a Comenda da Ordem
de Cristo. UT (Gumbleton Daunt, VIl) .
1793/05/04
FRANCISCO JOAQUIM DE
ALMEIDA HENRIQUES capitão-mor de Cacheu desde Maio de 1793 até 1798
TEMPOS
DE PERTURBAÇÃO NA GUINÉ
Chamava-se
JOSÉ ANTÓNIO PINTO e governava Bissau
desde Maio de 1793 o capitão-mor que negociou com o tenente Beaver a
aquisição dos bens deixados em Bolama quando se extinguiu a aventura britânica de
colonização. Zeloso da regularidade administrativa, logo demonstrara isso após
a sua entrada em exercício pois seus primeiros cuidados consistiram no exame
dos livros de escrituração da capitania que achou num lamentável estado de
abandono. Zeloso também na defesa dos rendimentos da
fazenda pública.
JOSÉ ANTÓNIO PINTO tomou o comando de capitão-mor de Bissau em 4 de Maio de
1793. Deixou-o quando os soldados se
amotinaram. Em Junho de 1803 obteve a nomeação de comandante
de Cacheu, com o seu filho NARCIZO
EDUARDO PINTO, que servia como tenente de artilharia.
Pela
“obrigação do fiel vassalo que é e grato aos benefícios” que tem recebido o rei
obriga, por volta de 1806, o ex-Feitor da Fazenda Real José António Pinto a
“dar-nos uma notícia das terras [ilhas de Cabo Verde e Guiné]” em que teve a
honra de comandar, representando o “carácter que as domina”. A “notícia” cujo
marco cronológico se iniciara a 4 de Maio de 1793, dia em que chegou a Bissau e
até 1797, fim da sua missão, é também consagrada às ilhas de Cabo Verde. O
documento intitula-se “Relato do feitor da Fazenda Real, em Bissau, que serviu
como subalterno em Cabo Verde, de 1795 a 1797”67, apresentado, anotado e
comentado por António Carreira, editado em Documentos para a história das
ilhas de Cabo Verde e “Rios de Guiné”: séculos XVII e XVIII (1).
Não
tendo muitas referências sobre este autor, confia-se no que diz António
Carreira, mesmo sem citar as fontes. Segundo Carreira, José António Pinto foi
um oficial do exército, nomeado Capitão-mor e Provedor da Fazenda Real da ilha
de Bissau, tendo tomado posse no dia 4 de Maio de 1793 e ocupou o cargo até ao
segundo semestre de 1795, período em que passou como subalterno às ilhas de
Cabo Verde até 1797; depois da missão, regressou a Portugal e redigiu o seu
“Relatório” nove anos depois, isto é, aproximadamente em 1806. Deduz-se, também
por Carreira, esta data a partir de um trecho da parte final do “Relato”
em que diz o seguinte: “esta observação e sentimentos já têm de idade 9 anos”,
ou seja, 9 anos depois de 1797 corresponde aproximadamente a 1806.
No
AHU encontram-se duas referências sobre José António Pinto fora das duas datas
em que situa o Relato: uma é de 1789 em que este suplica na condição de
Ajudante do Nº 1 do Regimento da Cidade da Ribeira Grande das Ilhas de Cabo
Verde e Coronel do mesmo Regimento, e a segunda é de 1807, referida pelo
Governador D. António Coutinho de Lencastre como Comandante de Cacheu. Porém,
não se encontrou dados suficientes para afirmar que se trata da mesma pessoa.
Contudo, o Relato de José António Pinto que se refere aqui aborda os
dois sítios onde o mesmo diz ter laborado: o primeiro a ilha de Bissau e, em
segundo lugar, as ilhas de Cabo Verde.
(1) Vide Documentos para a história das ilhas de Cabo Verde e "Rios de
Guiné": séculos XVII e XVIII,
Apresentado por António Carreira, Lisboa, [s.n.], 1983.
1793/09/27
Nomeação de JOSÉ DA
SILVA MACHADO DE EÇA no cargo de capitão e governador-geral de Cabo Verde.
1793/10/29
Dizimada a expedição
inglesa pela malária. O
resto dos colonos estabelecidos na Ponta Oeste de Bolama exige do seu chefe,
tenente Beaver, o regresso a Inglaterra. Das
300 pessoas que a compunham no início apenas meia dúzia conseguiu ser
repatriada.
1793/11/00
FRANCISCO CORREIA nasceu na área de Geba, filho de português e rnandinga; era
um rnestre que teve urna porção de pequenos barcos e
visitou nurnerosas vezes o Arquipélago de Cabo Verde e Portugal. Comprou mercadorias a Philip Beaver
quando a feitoria britânica de Bolama foi desfeita em Novembro de 1793,
agindo como intermediário dos cornerciantes estabelecidos em Bissau.
1793/11/29
O tenente inglês
Beaver,
desiludido após a grande mortalidade de que foram vítimas quase todos os
membros da expedição que chefiava e se estabelecera na Ponta
Oeste, resolve regressar à Serra Leoa.
1794
No seguimento da revolta no Haiti, a convenção
republicana
francesa
declara a abolição da escravatura, legislação revogada por
Napoleão em 1802.
Reunião em Filadélfia de todas as sociedades
abolicionistas dos Estados Unidos.
José dos Reis Borges, coronel
de milícias, exerceu em comissão interina as funções
de ouvidor com pequenas interrupções, de 1794 a 1800, revelando bom senso e serenidade
no
meio da agitação e indisciplina social que lavrava na província.
A
partir de 1974 intensifica-se o
povoamento da ilha de São Vicente, com a chegada de
casais de madeirenses e outros.
1794/04/25
O capitão-mor JOSÉ ANTÓNIO PINTO procura aumentar os réditos da Fazenda
Real
Caótico
deveria ser o estado da administração em Bissau quando JOSÉ ANTÓNIO PINTO assumiu as funções de capitão-mor; livros de
escrituração com falta de folhas e de assentos, o Foral da Alfândega que, pelo seu conteúdo,
era uma verdadeira pauta aduaneira, não existia.
Em
25 ds Abril de 1794 teve conhecimento que tinham aportado a Bissau três navios
vindos de Lisboa, a fim de carregarem escravos destinados ao Maranhão, sem que
tivessem passado pela ilha de Santiago para, na respectiva
Alfândega e dando cumprimento à lei, darem a fiança referente aos direitos da
escravatura; perante este facto ordenou que pagassem na Alfândega de Bissau os
direitos que deveriam ter satisfeito na de Santiago, permitindo-se assim que em
Bissau pudessem efectuar-se pagamentos a dinheiro, em vez de ter de recorrer a
passar letras sobre o Real Erário para o pagamento das despesas; questão
que veio a solucionar-se quando, com a nomeação do Governador MALDONADO DE EÇA para Cabo Verde, em 7 de Março
de 1795, o ministro Marquês de Ponte de Lima salientou que, não obstante
«a jurisdição do Governador das ilhas de Cabo Verde se estendia a todas as
referidas praças e portos », (Bissau e Cacheu), os Governadores de
Cabo Verde não deveriam exigir que os navios que fossem negociar a
Bissau, Cacheu e outros portos da Guiné fossem a
Santiago pagar os direitos, visto que os navios deveriam pagar os direitos nos
portos onde carregassem, não devendo ser obrigados a regressar por alguma das ilhas
de Cabo Verde.
Para aumentar os
réditos da Fazenda Real, mandou subir de 5 % para 10 % os direitos que as
mercadorias pagavam quando entravam em Bissau, ao mesmo tempo que ordenou a supressão dos 5 % que os moradores da terra,
que as levavam ao sertão para as trocarem por escravos, pagavam até então, decisão que
lhe acarretou dissabores, pois contra ela reclamaram junto do governo da metrópole os comerciantes de Lisboa
que negociavam com os portos da Guiné.
Em face das representações dos comerciantes foi por ordem régia cancelada a
inovação.
1794/06/13
É possível, mesmo muito provável, que
este capitão-mor comungasse nos anseios de separações relativamente ao
governo conjunto de Cabo Verde e Guiné, que
animavam os demais, visto que e esse sentimento,
dando-o
como generalizado, se referia o Governador
TEIXEIRA CARNEIRO num oficio dirigido ao governo a 13 de Junho
de 1794, solicitando que o isentassem da autoridade que tinha sobre os capitães-mores da Guiné, visto eles não obedecerem a seus mandados, pedido
que, todavia, não foi deferido. Essa aspiração, se realmente viveu
no espírito
de JOSÉ ANTÓNIO PINTO, foi nele parceira dum certo autoritarismo,
traduzido nas violências de que se queixavam os soldados. Aquele foi
o motivo apresentado ao insubordinarem-se os soldados e por forma tal que ele
resolveu pôr-se a salvo e foi para Geba.
1795
1795
1795/09/10
Falecimento do capitão e governador-geral de Cabo Verde JOSÉ DA SILVA MALDONADO DE EÇA
O
ÚLTIMO GOVERNO DO CORONEL JOÃO FREIRE DE ANDRADE (1795-1796)
O
coronel João Freire de Andrade assumiu então o seu último governo interino, já
numa situação política bastante fragilizada porque o novo Bispo, Frei Cristóvão
de São Boaventura, recusou-se a partilhar com ele o governo e o juiz ouvidor
eleito em pelouro, Francisco da Silva Pereira, rejeitou pactuar com as suas
arbitrariedades e corajosamente denunciou os vários atropelos à lei, a
apropriação do selo real, a recusa em devolvê-lo à Câmara, sua inata
depositária, assim como o aliciamento da maioria dos oficiais camarários.
Configurava-se
nos últimos anos de setecentos uma natural luta pelo poder em Santiago,
protagonizada pelos 3 coronéis dos Regimentos existentes, 2 reinóis e 1 natural
de Santiago, de olhos postos no ambicionado posto de capitão-mor da vila da
Praia, cargo que, para além de outras benesses inerentes, possibilitava o
acesso ao governo interino local em caso de vacatura. Apesar de ter concorrido
a esse cargo, o descrédito a que tinha sido votado e a avançada idade do
coronel João Freire de Andrade colocavam-no já fora da corrida pelo poder.
Tentou jogar uma última cartada mas sem grande sucesso, procurando aliar-se ao
emergente coronel de cavalaria, o recém-nomeado capitão-mor da vila da Praia,
Marcelino António Basto. Este militar e antigo escrivão da Fazenda Real não
teve de esperar por qualquer vacatura; de modo insólito, a 13 de Agosto de 1796, foi nomeado pela Coroa governador efectivo de Cabo Verde.
Deste
modo terminaram as ambições políticas e os governos interinos do coronel João
Freire de Andrade que haveria de falecer durante o segundo mandato do
governador Marcelino António Basto. Para além dos 8 anos e 2 meses de
participação ou chefia de governos interinos, não há dúvida que deixou
profundas marcas nos anais da história das ilhas da segunda metade do século
XVIII.
1795/12/00
A ordem para que Feijó retornasse a Portugal foi
assinada em 9 de junho de 1795 e partiu directamente do Palácio de Queluz.55
Todavia, ela chegou a Cabo Verde apenas em Dezembro de 1795, em óptimo momento para Feijó, pois JOÃO FREIRE DE ANDRADE, um de seus principais desafectos, assumira interinamente o governo do arquipélago. Os velhos
rancores não tinham sido esquecidos e o próprio FREIRE DE ANDRADE anunciava que
estava no comando e que iria retaliar.
Ora Excelentíssimo Senhor permita-nos V. Ex.ª de por na Sua presença o
que há a respeito do dito Naturalista. A ordem ou licença para se retirar o
livrou de alguma que poderia experimentar; porque justamente ao tempo que a
recebemos nos vimos consternados com requerimentos contra ele, em que uns se
queixavam de opressões, que lhes fazia no emprego de Juiz de Órfãos em que
ilegitimamente se tinha introduzido, ofício este incompatível ao seu destino a
esta Ilha, e outras aleivosias e intrigas, que vergonhosamente fomentava já
contra este, já contra aquele. (1)
Para marcar bem a sua posição, FREIRE DE ANDRADE
não se esqueceu de anexar uma cópia da carta, de 1784, em que Martinho de
Mello e Castro apontava, ao então governador FREIRE E MAIA, todos os pontos
frágeis do naturalista e as acusações que sofria. A este tempo Feijó era
Sargento-mor da Praça de Ribeira Grande, a cidade fantasma que oficialmente
ainda era a capital do arquipélago, e Juiz de Órfãos, o que fazia prever que a
disputa que se avizinhava iria mesmo ser portentosa. Ambos os cargos eram muito
apreciados pela elite local, principalmente o segundo, que eram uma das maiores
fontes de enriquecimento ilícito. A ascensão do naturalista na estrutura política
das ilhas pode ser creditada à política que adoptara de aliança
com os governadores. No entanto, os cargos que obtivera não iriam continuar com
ele de mão-beijada. Feijó, a essa altura, não era mais o menino desamparado
e pensava seriamente no futuro, procurando acumular o seu pé-de-meia. Apesar da
conjuntura desfavorável, não embarcou às pressas para Portugal quando recebeu
permissão para tanto. Permaneceu por mais algum tempo no arquipélago
para não ter “grave prejuízo, pelo pequeno prazo que têm para se preparar, em
razão de ter muitos bens de que dispor e apurar.” (2)
Desde então, a documentação não mais fornece
referências que atestem a presença de Feijó em Cabo Verde ou que permitam saber
com exactidão quando partiu. Por despacho do Conselho Ultramarino, de 11 de Junho de 1796, foi-lhe concedida licença não remunerada de um ano para ir tratar de seus negócios no Rio de Janeiro. Neste mesmo ano morre Martinho de
Mello e Castro. E se era o velho ministro que mantinha Feijó em exílio branco
nas ilhas, como chegou a afirmar Faria e Maia, o caminho estava livre para o
naturalista, que passaria a integrar as hostes científicas espalhadas pelo
império agora sob o comando de D. Rodrigo de Sousa Coutinho.
(1) AHU, Cabo Verde, cx. 48, n. 82. História: Questões & Debates,
Curitiba, n. 36, p. 29-60, 2002. Editora UFPR PEREIRA, M. R. de M. Um jovem
naturalista num ninho de cobras...
(2) Este que foi o seu mais famoso estudo, apareceu nas Memórias Económicas da Academia Real das Ciências de Lisboa apenas em 1815. FEIJÓ, J. da S. Ensaio económico sobre as Ilhas de Cabo Verde. Memorias Económicas da Academia Real das Sciencias de Lisboa (MEARSL), v. 5, 1815. O mesmo volume das Memórias da Academia traz outro estudo de Feijó, intitulado “Memória sobre a urzela de Cabo Verde”.
1796/06/27
Ataque de uma esquadra
holandesa
à Vila da Praia, ilha de Santiago
1796/08/03
MARCELINO ANTÓNIO BASTO de capitão e
governador-geral de Cabo Verde.Governador de Cabo Verde e da Guiné, desde 3 de
Agosto de 1796 a 29 de Outubro de 1802, data em que faleceu. Durante o seu governo teve só 60 soldados
no arquipélago; quando morreu deixou em cofre mais de 20.000 cruzados.
OS GOVERNADORES DAS ILHAS DE CABO VERDE ENTRE 1767
E 1796
1797/03/23
Termo passado pelo escrivão do meirinho do Conselho Ultramarino,
José Teotónio Correia Ramos, da entrega de uma botica recebida pelo contra mestre da galera Leoniza, Manuel
João dos Santos, destinada ao provedor da Fazenda Real da praça de Cacheu. AHU_CU_035, Cx. 11, D. 860.
1797/12/00
ANTÓNIO PEREIRA foi nomeado capitão do
Baluarte de Farim em Dezembro de 1797.
1798
O estado da Geórgia (EUA) suspende o comércio de escravos.
LOPO DE ALMEIDA HENRIQUES
é
capitão-mor de Cacheu
1798/01/28
Ataque de piratas
franceses
à ilha Brava
1798/04/29
Falecimento
do bispo da diocese de Cabo Verde D. FREI CRISTÓVÃO DE SÃO BOAVENTURA.
Introdução da cultura do café em Santiago e em Santo Antão.
Introdução da cultura do café em Santiago e em Santo Antão.
1799
JOÃO DAS NEVES LEÃO é capitão-mor de
Bissau, até 1803
«Para a Praça de Bissau seguiu em 1799 o novo commandante José
das Neves Leão, que commonicou a sua chegada alli e não ter encontrado quem lhe
entregasse o commando, porque o seu
antecessor, José Antonio Pinto, já em Lisboa,
havia abandonado o logar, fugindo para o gentio de Fá por os soldados, na
Praça, se terem levantado contra elle pelas delápidações e opressões que
exercera em todo o tempo do seu commando.» -
Subsídios para a História de Cabo Verde e Guiné, por
Christiano José de Senna
Barcellos, parte III, pgs.
154-155, Lisboa, 1906
Entre 1799 e 1870 o
Fouta viveu um período estável, embora Estados animistas como Solima, Sankaran
e Tamba o tenham atacado regularmente e, sobretudo, apesar de algumas dificuldades internas
como a oposição dos muçulmanos ortodoxos da confraria Kadiryia (1) aos almany do Fouta e de Timbo. Este núcleo
de resistência (a sua capital, Boketo, só foi conquistada e destruída em 1884)
na estrada entre Timbo e a actual Freetown terá levado os almany a
intensificarem as suas campanhas a Norte, contra o Gabú que dominava o território entre a Gambia e o Rio Nunes.
O
Fouta Djalon desempenhava um papel relevante na vida económica da sub-região da
Guiné-Gâmbia, enquanto centro de comércio de gado, de cereais, de algodão e de
mel, e mercado de escravos. Os ingleses (em Freetown), os franceses (junto aos
rios Nunes e Pongo) e os portugueses (há muito estabelecidos nos estuários dos
rios Grande e Casamansa) competiam na atracção das caravanas que provinham do
Fouta.
(1) Confraria ainda hoje
presente na África Ocidental, fundada no Iraque por Abd al-Qadir al-Jilani, no
século XII, com vista a converter os povos ao verdadeiro islamismo. Vide
THORAVAL, Yves, L’ABCdaire de l’Islam, Ed. Flammarion, Paris, 2003, pp. 49, e
BARRY, Boubacar, La Sénégambie du XVe au XIXe Siècle, L’Harmattan, 1988
Erupção vulcânica na ilha do Fogo
1799/04/15
«Da numerosa familia Medina, da ilha da Madeira, que
habita em Cabo Verde, ha uma grande descendencia de Manuel Alexandre de Medina e
Vasconcellos e de seus irmãos Anastacio Florindo, Theodoro
Justiniano, Sabina, Maria, Emiliana, e de Francisco de Paula Medina e
Vasconcellos, illustre poeta.
Manuel Alexandre teve nomeaçã de
ajudante da companhia do Terço auxiliar da villa de S. Vicente, distrito do
Funchal, em 16 de novembro de 1790; por
resolução régia de 24 de fevereiro de 1797 e por decreto de 14 de novembro de 1798 teve a mercê do cargo de
sargento-mór commandaote da
ilha do Fogo, por tres anos, tendo chegado á
Praia em 16 de março de 1799, prestado juramento nas wãos do governador
Marcellino Basto em 17 do mesmo
mez e tomado posse na villa de S. Filippe da ilha do Fogo em 15 de abril d'esse anno.
N'esla
ilha casou com D. Luzia Filippa de São Thiago e com ela teve quatro filhos: Joaquim Rufino, que morreu
pelos annos de 1835 a 1836 em alferes; Antonio, Ernygdio e Thereza deixaram filhos, que estabeleceram, de preferencia,
a sua resideocia na ilba de S.
Thiago.
Manuel Alexandre subiu os postos
até
coronel graduado addido ao estado maior do exercito, e tendo sido rerormado no posto de brigadeiro,
pelo decreto de 20 de julho de 1822,
n'elle morreu em 1826.
Exerceu os seguintes cargos de nomeação regia, além do acima
dito: de ajudante de ordens do governador, com a mesma patente de sargento-mor
(rnajor), por
decreto de 13 de maio de 1811; de commandante da villa da Praia, por
decreto de 17 de maio de 1813; por nomeação dos governadores exerceu
importantes commissões.
Fôra um militar digno e honrado e por isso morreu pobre.
A viuva, n'um requerimento que dirigiu a el-rei, mostrando as
precarias circumstancias em que tinha ficado, sem um monte-pio para
sustentar a filha e um filho menor, pois que dois já eram officiaes, impetrava-lhe
para conceder o fôro de fidalgo cavalleiro com o habito de Christo áquelle
que casasse com a sua filha Thereza, de 11 annos de edade, em attenção aos
serviços prestados pelo pae d'esta e como dotação decretada por el-rei em
beneficio da mesma orphã, porque vivia amargurada de tal indigencia e de
maiores perigos que poderiam dar-se fallecendo ella e deixando a filha na
miseria.
Não foi deferida a pretensão e a filha não foi muito feliz.
Dos irmãos de Manuel Alexandre já era capitão-commandante da
companhia de infanteria de Cabo Verde em 1826 Anastacio Florindo e feitor
da real fazenda, do Fogo, Tbeodoro Justiniano.
Francisco de Paula foi casado duas vezes· e teve os seguintes
filhos: Canclido, que em t8i6 era terceiro escripturario da Junta de fazenda, e
Maria; e de D. Margarida Cassanaia, natural da Madeira, segunda mulher, teve
Servulo, José, Constança, Camilla e Carolina, ignorando-se o nome de um
outro filbo que em Cabo Verde morreu ainda creança.» -
Subsídios para a
História de Cabo Verde e Guiné, por Christiano José de
Senna Barcellos, parte III, pgs. 334-335, Lisboa, 1906
1799/07/03
«O governador commonicou em 24 de agosto de 1800 a presença de uma
esquadra franceza no porto da Praia em 3 de julho de 1799, que alli fôra para
atacal-o, composta das fragatas Concordia e Franceza, com 44 peças de
calibre 18, cada uma com 500 homens, e a fragata Medea com 40 peças de
calibre 12 e com 500
homens e 1:000 soldados.
Sabendo os francezes que em terra estava tudo preparado para a lucta, e temendo
uma derrota, sahiram do porto sem dispararem um tiro.
Estes
navios fizeram muitas presas na costa da Guiné, armando em guerra algumas e outras eram queimadas; apresaram quatro navios
portuguezes, dois americanos e onze inglezes, e
armaram a Sartaro com 36 peças de 12, Peregrino com 16 de
12, Amphytrite com 14 de 12, Stag com 12 de 12 e Adrianna com 20 de
12.» -
Subsídios para a
História de Cabo Verde e Guiné, por Christiano José de
Senna Barcellos, parte III, pg. 159, Lisboa, 1906
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