1687/04/02
CARTA do governador e capitão-general de Cabo Verde, VERÍSSIMO
CARVALHO DA COSTA, e do capitão-mor de Cacheu, ANTÓNIO DE BARROS BEZERRA,
ao rei [D. Pedro II] informando que concordavam na forma de conservar e
aumentar aquelas conquistas e atenuar a falta de moradores e as quebras no
comércio: construir as fortalezas de
Bissau e de Bolor para impedir o comércio francês e inglês,
respectivamente; fazer duas galeotas idênticas às da Índia, com duas peças na
proa, para controlar as actividades naqueles rios, recorrendo aos conhecimentos
do piloto da nau Milagres, JOÃO GOMES;
conquistar as terras circunvizinhas com o auxílio de 600 homens, mesmo que
fossem criminosos porque o clima era punição suficiente; informavam que o meio
de sustentar aquele lugar era permitir, mesmo que provisoriamente, o comércio
com os estrangeiros, porque até à conclusão das fortalezas receberiam os
direitos; declarava o governador que o rei de Bissau e os seus vassalos tinham
apreciado os presentes, bem como a presença do padre Francisco de Pinhel e mais missionários, e tinham enviado uma
comitiva com três escravos para enviar ao rei de Portugal, e indicado o melhor
local para a fortaleza de Bissau, para a qual fora nomeado Manuel Teles de
Avelar.
AHU-Guiné, cx. 3, doc.
34.
AHU_CU_049, Cx. 2, D.
177.
1753/02/09
«A segunda
fortaleza de Bissau
De facto, em Janeiro
de
1753, (D.José I) enviava para os rios da Guiné a nau de
guerra, N.a S.a da Estrela, acompanhada de um aviso e mais dois
navios com soldados, operários, boticário com medicamentos, material de guerra
e de construção. O comandante desta pequena esquadra levava
instruções para restabelecer o pôsto de Bissau, de acôrdo com o
capitão-mor de Cacheu.
Os navios
fundearam primeiro neste último pôrto, seguindo dali para
Bissau, em 9 de Fevereiro. Em terra, o govêrno português era representado
por um grumete nomeado cabo de esquadra que correspondeu com várias saudações às salvas
feitas de bordo.
A entrada dos barcos
portugueses provocou grande entusiasmo entre os habitantes
cristãos, que ó exteriorizaram em manifestações de regozijo durante 10 dias.
Tratou-se de nomear um capitão-tenente para a Praça de Bissau e do desembarque
do material e doentes que se encontravam a bordo.
O régulo
papel, Palanca, veio cumprimentar as autoridades e no dia 17 de
Fevereiro realizou-se a cerimónia de saudação à bandeira portuguesa,
lavrando-se nesta ocasião um auto de fidelidade dos chefes indígenas. No
entanto, esta cerimónia efectuou-se numa atmosfera de mútua desconfiança. O régulo
fez-se acompanhar de 200 guerreiros e, como havia razões para se
duvidar da sua lealdade, o comandante da esquadra desembarcou quási tôda a
tripulação e tomou as necessárias precauções.
Com
efeito, logo no dia seguinte ao da cerimónia, o gentio
papel começou a hostilizar a praça, procurando dificultar as
obras da fortaleza. Houve luta em que as nossas forças perderam 6 homens, mas o ataque dos papeis foi repelido.
Dois dias
depois, tendo o comandante da esquadra disposto as suas fôrças com intenção de atacar as
povoações indígenas, o régulo Palanca enviou seus emissários a pedir paz. Não se fez o
ataque projectado, mas o indígena não deixou de hostilizar a Praça.
A guerra
prolongava-se assim sob a forma de pequenas escaramuças e actos isolados, de
que o régulo procurava desculpar-se sob vários pretextos não deixando de
visitar as autoridades e fazer as suas transacções. Em
troca dos soldados feridos ofereceu o mesmo número de escravos e autorizou a sua
gente a trabalhar nas obras da fortaleza.
Os
operários eram pagos à razão de 400 réis por dia ou 80 fios de contas de vidro. As construções
mais indispensáveis terminaram em 22 de Março e nesse dia se deu posse
ao capitão-cabo de Bissau, na presença do régulo Palanca e mais 300 guerreiros
indígenas. Houve grande algazarra de tambores, clarins e salvas de morteiros.
No dia seguinte, celebrava-se missa a bordo da nau N. S. da Estrêla, comemorando
o acontecimento.
Nas lutas travadas durante êste período de
cêrca de 2 meses haviam perecido 9 soldados portugueses e perto de 500 papeis.
Registaram-se,
além disso, muitos óbitos devido· às febres e ao escorbuto
provocado por falta de alimentos frescos. Entre
as vítimas contava-se o capitão engenheiro que ia a bordo com
o encargo de dar o plano da fortaleza. A nau
de guerra deixou Bissau em 27 .de
Março de 1753, de regresso para Lisboa.
Foi desta
forma restabelecida a capitania de Bissau e para o seu comando foi nomeado, em 16 de Novembro, Nicolau de Pina
Araújo, com a indicação de prestar juramento nas mãos do capitão-mor
de Cacheu, isto é,
considerando-se
subordinado
a esta capitania. Pelo novo
comandante
de Bissau foram enviados 2 baús com fardas e presentes
para
o régulo papel.
Para
completar a guarnição da fortaleza foi determinado em Janeiro de 1754 que o governador
de
Cabo Verde destacasse para Bissau 50 soldados caboverdeanos,
tirados da guarnição de Santiago, que seriam substituídos por outras tantas praças
europeias.
Nesta ordem de ideas, foram enviados de Portugal para Santiago 50 homens
representados por criminosos e indesejáveis.
Por sua vez o governador de Cabo-Verde enviou para Bissau 50 soldados dos menos
recomendáveis. Em Outubro dêsse mesmo ano, o número destas
praças em Bissau estava reduzido a vinte por deserção da
sua maior parte.
Por seu
lado, também os oficiais não se demoravam muito tempo nos seus
postos, por não poderem resistir à malignidade do clima. Em certa altura por falta de um oficial capaz de tomar a direcção das obras do quartel, foi esta
entregue, em 1758, ao padre Manuel Vinhais Sarmento. Tôdas estas construções
eram, porém,
provisórias e imperfeitas. A
verdadeira Fortaleza
de S. José de Bissau, aquela que ainda hoje existe na cidade, só começou a ser construída
no ano de 1765.»
João Barreto, HISTÓRIA DA GUINÉ 1418-1918, edição do autor, Lisboa, 1938, pgs. 150-152
João Barreto, HISTÓRIA DA GUINÉ 1418-1918, edição do autor, Lisboa, 1938, pgs. 150-152
1754/10/25
O capitão-mor de Bissau
pede ao Governador Geral de Cabo Verde um engenheiro, gente para a respectiva
guarnição e trabalhadores para a
reconstrução da fortaleza pois que eram insuficientes os naturais de Cabo Verde
ali residentes. Só em 1766 foi atendido tal pedido, tendo a corveta «Nossa
Senhora da Esperança» levado 450, entre
eles haviam embarcado também 270 vadios
e criminosos.
1762/12/13
Contando um ano no
exercício das suas funções, JOÃO VIEIRA DE ANDRADE é assassinado na sua casa,
na vila da Praia.
Na noite de 13 de Dezembro de 1762, um bando de homens armados, após arrombarem
a porta à machadada, entraram na casa do ouvidor, mataram-no com zagaias e
machados. Os malfeitores resistiram ao corpo de tropa militar, dizendo que também
eram soldados e que estavam cumprindo ordens do governador das armas.
Não se tratava de episódio singular mas de mais um dos cerca de 20
oficiais régios superiores assassinados em um século entre governadores,
ouvidores ou sindicantes. Pombal
responde com o envio de duas fragatas de guerra, a que se juntaram duas
embarcações da companhia do Grão-Pará e Maranhão que sitiaram a ilha de
Santiago cerca de três meses até conseguirem prender os principais mandantes da
elite e seus operacionais vadios. Sentenciados em processos judiciais
sumários, os principais mandantes da
elite e seus operacionais forros foram presos e enviados para Lisboa. À
semelhança dos Távoras, as suas cabeças rolaram publicamente e foram depois
reenviadas para Santiago onde foram colocadas em paus junto do local do crime.
18 de Dezembro de 1764, A.H.U., Cabo Verde, Papéis Avulsos,
cx. 28, doc. 48 Collecção das Leys, Decretos e Alvarás..., vol. II (1760-1769),
p. 399: “Sentença proferida na Caza da Supplicação, contra os réos
comprehendidos na devaça, que Sua Magestade Fidelissima mandou tirar pela morte do Bacharel João Vieira de
Andrade, sendo Ouvidor nas Ilhas de Cabo Verde, Lisboa, MDCCLXIV”. Ver supra
184, 246, 260, 267, 269, 300, 333, 336, 339, 363.
Esta foi a advertência
trágica que o Marques de Pombal fez aos “Brancos da Terra” da ilha de Santiago
para que deixassem de ter desejos de autonomia e para que cessassem com os
actos de rebeldia e levantamentos contra os representantes do poder central
português
Quanto aos vadios criminosos, foram aliciados pelo novo
governador BARTOLOMEU TIGRE com uma falsa promessa de perdão régio a servir na
construção da fortaleza de Bissau construída a expensas da Companhia do
Grão-Pará e Maranhão. Apresentaram-se voluntariamente cerca de 1000 homens
indiciados em crimes de morte ou pequenos delinquentes ou ladrões formigueiros,
como eram localmente conhecidos. Era o
caminho para a morte certa provocada pelas febres palúdicas e pela malária na
Costa da Guiné.
O desembargador ouvidor, JOÃO VIEIRA DE
ANDRADE, foi assassinado no interior da ilha de Santiago, ao tentar fazer com
que os rendeiros cumprissem as suas determinações. Tais incidentes fizeram
com que nenhum oficial quisesse fazer deligências pelo interior da ilha de
Santiago, como também reduziu drasticamente o número de juizes nos concelhos.
Os juízes eram frequentemente acusados de "despotismo"
e''violências" pelos rendeiros, como também de favorecerem os interesses
dos morgados. Por isso, nenhum deles quiseram ocupar cargos na administração da
justiça, com medo de ser assassinados pelos rendeiros. Com efeito, as
autoridades administrativas davam pouca importância às reclamações feitas de
forma individualizada por parte dos rendeiros.
1765/01/24
CARTA do sargento-mor engenheiro MANUEL GERMANO
DA MATA ao rei D. José I informando que chegou a Bissau, após escala em
Cabo Verde, tendo convocado o padre do hospício de Bissau, frei FERNANDO VINHAIS, para que o informasse
do estado da terra; afirmando ter esperado a bordo da nau o consentimento do
rei de Bissau para construção da fortaleza, tendo-a recebido através do fidalgo
Taca, que viera na qualidade de emissário; sobre a saída das embarcações
daquele porto; acerca da chegada de marinhos e soldados para auxiliarem na
construção da fortaleza, juntamente com os homens vindos de Cabo Verde, a gente
preta e os degredados; referindo a chegada do capitão-mor de Cacheu, o capitão
cabo SEBASTIÃO DA CUNHA SOUTO MAIOR;
comunicando que recebendo uma quantia de degredados na corveta Nossa Senhora da
Esperança e iate São Joaquim enviados pelo Bispo de Cabo Verde, na companhia de
alguns homens; dando conta do levantamento
de alguns soldados de Cabo Verde contra o alferes TORREZÃO e de uma revolta dos
gentios da ilha de Bissau com a intenção de matarem os brancos, tendo
ordenado que JOÃO DA COSTA ATAÍDE
ficasse de sentinela numa casa do rei de Bissau; sobre a planta da fortaleza; solicitando
determinações acerca dos criminosos
enviados de Cabo Verde e se era de direito pagar e dar comedorias aos
trabalhadores na época das águas quando interrompiam o trabalho; acerca da
falta de dinheiro para fazer os pagamentos, em virtude da Companhia do Pará e
Maranhão ter mandado verbas insuficientes.
Anexo: relação.
AHU-Guiné, cx. 9, doc.
42; cx. 25, doc. 36.
AHU_CU_049, Cx. 9, D.
774.
1765/09/00
RELAÇÃO dos cabouqueiros que se achavam nas cadeias da Corte e os condenados à calceta que podiam ser enviados para servir na fortaleza de Bissau.
RELAÇÃO dos cabouqueiros que se achavam nas cadeias da Corte e os condenados à calceta que podiam ser enviados para servir na fortaleza de Bissau.
Anexo: escritos e relações.
AHU-Guiné, cx. 9, doc. 45.
AHU_CU_049, Cx. 9, D. 777.
1765/10/02
«A Terceira Fortaleza
de Bissau
O Govêrno
de
D. José I não tinha descurado da ocupação da ilha de
Bissau, e assim em Setembro de 1765 enviou a Santiago a corveta N. S. de Esperança com
instruções para o governador da província completar o seu
carregamento com mantimentos e pessoal das ilhas. Ordenava-se para êste efeito que o governador e o ouvidor prendessem os vadios
e os condenados por crimes comuns e os remetessem para Bissau, onde ficariam em regime de liberdade, trabalhando nas obras da fortaleza com o salário
diário de 180 réis, além da comida e uma ração de aguardente.
Em
cumprimento destas determinações, o ouvidor de Santiago fez uma
correição pelo interior da Ilha e prendeu 270 homens que se juntaram
a 450 soldados retirados das companhias do terço, na razão de 15 homens por
cada uma das 30 companhias.
Entretanto
saía de Lisboa, em 2 de Novembro, a fragata N
.ª S.ª da Penha de França, sob o comando de Luiz Catano de Castro, trazendo a bordo além de mais pessoal e material, o chefe da expedição João da
Costa Ataíde Teive, tendo por adjunto o tenente de granadeiros de Lisboa, Bernardino Alvares de Almada.
A fragata
e a corveta, acompanhadas de mais cinco navios da Companhia do Grão Pará, saíram da vila da Praia, transportando ao todo 750 homens, incluindo um cirurgião, 25 cabos,
10
carpinteiros
e 20 pedreiros. Levavam, além disso, 200 bois na sua maior
parte em carne salgada, 117 moios de milho, 73 moios de
farinha de milho, 15 moios de cuscus, 213 porcos (alguns salgados), 1.900 galinhas,
2
barris
de
mel e ferramentas ..
Esta
pequena esquadra chegou a Bissau em 1 de Janeiro de 1766, começando
imediatamente os trabalhos. A planta da
fortaleza, com 67 braças de cada lado, foi esboçada pelo
tenente-coronel Manuel Germano da Mata, capitão-mór
da Praia, e a fortaleza recebeu o nome
de S. José de Bissau, em homenagem ao rei
que a mandara construir. As despezas da construção eram feitas de acôrdo
com a Companhia do Grão Pará, que adiantava em Bissau as quantias necessárias, liquidando
em
Lisboa
as suas contas com o Tesouro Real.
As obras
deram a Bissau uma actividade desconhecida naquela
povoação. Chegaram a empregar-se diàriamente cêrca de 1.500 homens nos trabalhos,
não tendo havido nesta ocasião grande resistência da parte dos papeis, graças à melhor disposição em que viviam
com os moradores de Bissau e corn os religiosos Fr. Fernando e Manuel de
Vinhais Sarmento.
Pode dizer-se que o maior
inimigo das obras foram as moléstias que dizimavam
os
operários. Houve dias em que se registarão mais de 10 óbitos, sendo causados na sua maior parte por febres e escorbuto.
Os, cirurgiões da. época não
conheciam ainda a necessidade de alimentos frescos e o regime alimentar de todo o pessoal era constuído principalmente
por farinhas de milho e carnes salgadas remetidas de Cabo Verde.
Logo nos primeiros meses faleceram o cirurgião e o boticário, pelo que a direcção da enfermaria
foi entregue a um oficial de granadeiros.
Calcula-se
que as obras da fortaleza de S. José de Bissau custaram mais de mil vidas, vitimadas
por doenças locais. Além do escorbuto, lavrava entre
os operários e militares uma moléstia de carácter febril,
da qual não ficou uma descrição detalhada para se poder fazer um diagnóstico
retrospectivo. É possível que se tratasse do paludismo sob forma aguda,
mas também não repugna admitir que existisse ao mesmo tempo a febre
amarela.
Pelo
menos foi esta a doença que mais castigou
as colónias europeias que pouco depois os ingleses tentaram
estabelecer na Serra Leoa.
As noções que hoje
possuímos sôbre a epidemiologia da febre amarela permitem-nos aceitar a
hipótese de que esta doença, grassando sob forma endémica e latente entre os indígenas
mais
ou
menos
refractários, tornasse uma forma epidémica e aguda tôdas as vezes que um grupo de indivíduos estranhos à terra, em especial
europeus, tentava fixar-se em qualquer dos seus portos.
O vómito
negro, ao lado do paludismo, contrariava assim irremediavelmente tôdas as tentativas
de colonização, em pequena ou grande escala, feitas várias
vezes por portugueses, franceses e ingleses
em tôda a -côsta africana situa.da ao Sul do cabo Verde.
Hoje que temos uma tendência fácil para criticar e condenar o abandono a que os nossos governantes haviam votado a colónia de Guiné, não devemos esquecer que os
ingleses chamavam a esta zona o «cemitério dos brancos» (white man's grave) e aos
navios que cruzavam.aquelas águas, a «esquadra do
enterro» (coffin squadron).
Isto no século XlX, quando se achavam
consideravelmente melhoradas as condições da vida colonial,
a higiene e as relações com os indígenas.
No entanto
as estatísticas das tropas britânicas da Serra Leoa dizem-nos
que, durante 8
anos (1822 a 1830) dos 1.658 ingleses desembarcados faleceram
1421. Dos restantes 237, a maior parte foi julgada incapaz para o
serviço!
Com a
morte do engenheiro incumbido da direcção das obras da fortaleza de
Bissau, foi encarregado dêste serviço
Manuel Germano da Mata, antigo capitão-mór da vila da Praia. Vieram a Bissau, para, auxiliar
nos trabalhos, o capitão de Cacheu Sebastião da Cunha Soto Maior com 45
escravos e o capitão-cabo de Ziguichor, Carlos de Carvalho
Alvarenga, com 50.
Em
atenção aos serviços prestados, Soto Maior
foi nomeado capitão-mor de Bissau, mas tendo provocado desordens
devido ao seu vício de embriaguez foi sindicado pelo ouvidor
Gomes Ferreira e demitido do cargo.
Calcula-se
que as obras da Fortaleza de Bissau tenham custado
cêrca de 50 contos de réis.
O ritmo das obras foi decrescendo
sucessivamente, concorrendo para isso também a irregularidade no pagamento dos salários e doutras despesas que competia à Companhia do Grão Pará. A sua direcção preocupava-se mais
com os seus próprios interesses e passou a fazer os pagamentos em géneros e
artigos de vestuário fixando-lhes um preço superior ao do mercado e retirando assim
duplos benefícios.»
João Barreto, HISTÓRIA DA GUINÉ 1418-1918, edição do autor, Lisboa, 1938, pg. 152-155
Aprestou-se para largar
rumo a Bissau a corveta «N." S." da Penha de França», sob o comando
do capitão de mar e guerra LUÍS CAETANO DE CASTRO. A bordo seguiam soldados, operários, e
materiais para a construção da fortaleza de S. José de Bissau. Nunca a praça
vira tão grande número de trabalhadores (1.400) e tropa (2.500 soldados).
«No dia 1
de outubro de 1765 fundeou na villa da Praia a corveta Nossa Senhora da
Esperança, que levou ordens ao governador para a carregar de mantimentos e
soldados para irem fazer a fortaleza de Bissau.
Como já
vimos, foi em 1753 que se expediram as ordens para se construir essa fortaleza.
No dia 10 formaram as companhias do terço,
tirando-se de cada uma 15 homens, prefazendo 150, que deviam seguir, além dos
criminosos de todas as ilhas, conseguindo-se d' esta forma um total de 720
homens e mais 10 carpinteiros.
Como não houvesse prisões para receber 270
criminosos, mandou-os pôr em liberdade, comparecendo todos no dia aprazado,
incluindo o coronel Manoel Semedo de Andrade, accusado de varios crimes.
Em 2 de
novembro sahiu de Lisboa a fragata Nossa Senhora da Penha de França, sob
o commando do capitão de mar e guerra Luiz Caetano de Castro, e n'ella
embarcou João da Costa de Athayde Teive para construir essa fortaleza.
A fragata
recebeu muitos soldados e operarios, que se abarracaram em terra.
Para
tomar conta dos soldados e materiaes nomeou o commandante do campo, Teive,
o tenente da 1.ª companhia de granadeiros de Lisboa, Bernardino Antonio
Alvares de Andrade, que, tendo sido nomeado engenheiro das obras, foi lambem
encarregado da direcção do hospital, que logo se construiu para tratamento dos
enrermos, por não ser bastante a vigilancia dos enrermeiros. Como administrador
do hospital arbitrou-se-lhe 600 réis diarios.
A construcção da fortaleza começou em 6 de
dezembro de 1765, e desde essa data se passou a denominar S. José de Bissau, por ter sido
el-rei D. José quem a mandara construir.
Para
defender essa construcção havia alli 2:500 soldados de tropa regular, e um
corpo de 1:400 homens auxiliares, que serviam de trabalhadores.
A fragata Nossa Senhora da Penha de França largou de Bissau
em 9 de abril de 1766, achando-se jã as obras da fortaleza muito
adiantadas. A sua construcçlo durou quasi dez annos, trabalhando-se activamente n'ella
desde 1766 até julho de 1775, em que se concluiu.» –
Subsídios para a
História de Cabo Verde e Guiné, por Christiano José de
Senna Barcellos, parte III, pgs. 46-47, Lisboa, 1906
1766
O capitão-mór de Bissau pede ao Governador Geral de Cabo Verde um engenheiro, gente para a respectiva guarnição e trabalhadores para a reconstrução da fortaleza pois que eram insuficientes os naturais de Cabo Verde ali residentes. Só em 1766 foi atendido tal pedido, tendo a corveta «Nossa Senhora da Esperança» levado 450, entre eles haviam embarcado também 270 vadios e criminosos.
1766
O capitão-mór de Bissau pede ao Governador Geral de Cabo Verde um engenheiro, gente para a respectiva guarnição e trabalhadores para a reconstrução da fortaleza pois que eram insuficientes os naturais de Cabo Verde ali residentes. Só em 1766 foi atendido tal pedido, tendo a corveta «Nossa Senhora da Esperança» levado 450, entre eles haviam embarcado também 270 vadios e criminosos.
1766/01/01
Começaram os trabalhos da construção da terceira fortaleza
de Bissau
sendo o projecto do tenente-coronel MANUEL
GERMANO DA MATA. Os materiais e o pessoal desembarcaram da fragata «N.ª S.ª
da Penha de França» e da corveta «N.ª S.ª da
Esperança». Os operários eram constituídos
por 450 soldados retirados das companhias do terço da Ilha de S. Tiago de Cabo
Verde e por condenados e vadios naquela ilha com esse fim e que eram em número de 270.
1766/04/06
1766/04/06
OFÍCIO do sargento-mor engenheiro MANUEL GERMANO DA MATA ao secretário de estado da Marinha e Ultramar Francisco Xavier de Mendonça Furtado sobre os navios que chegariam em Bissau para integrar a expedição; dando conta que chegou naquela praça em Dezembro de 1765, e da agressão sofrida por alguns marinheiros da expedição após terem saído dos limites à procura de palha para as camas dos doentes, reiterando que averiguou a situação e castigou os negros agressores, parentes de três régulos, com a ajuda do capitão tenente JOÃO DA COSTA E ATAÍDE, o capitão cabo SEBASTIÃO DA CUNHA e do seu primo cabo CARLOS DE CARVALHO; informando que as muralhas estavam finalizadas, e do bom serviço do comandante da fragata de guerra LUÍS CAETANO DE CASTRO DE VASCONCELOS na obra da dita fortaleza, dos ferimentos sofridos pelo sargento-mor engenheiro, do elevado número de mortes, a falta de botica e mantimentos; dando conta que o padre presidente do hospício de Bissau e alguns oficiais estavam a trabalhar na reestruturação do edifício do hospício que estava em ruínas; expondo que para aquela expedição foram 12 oficiais de Cabo Verde que regiam as companhias, e muitos criminosos condenados; e sobre a despesa feita com o rei de Bissau e outro régulo seu valido.
AHU-Guiné, cx. 9, doc. 52.
AHU_CU_049, Cx. 9, D. 783.
1766/04/14
O sargento-mor foi obrigado a fazer algumas alterações à planta original que trouxe de Lisboa e comunicou o facto à Companhia em 14 de Abril de 1766.
Com o concurso da Companhia de Grão Pará e Maranhão, foi organizada uma frota que em Cabo Verde embarcou muita gente, compelida a ir trabalhar nas obras de fortificação que desta vez eram de maior vulto.
1766/05/11
OFÍCIO do sargento-mor engenheiro MANUEL GERMANO DA MATA ao provedor e deputados da Companhia de Grão-Pará e Maranhão sobre a execução de umas ordens de 29 de Março de 1766, mencionando o alívio que sentiu com a chegada dos mantimentos para a subsistência da gente da expedição e do dinheiro para os pagamentos pelo bergantim São Marçal; informando que mandou o iate São Joaquim e a corveta Nossa Senhora da Esperança para as ilhas de Cabo Verde buscar os mantimentos e dinheiro; acerca de ter sido informando pelo fiel da Companhia Feliciano António que a falta de mantimentos fez com que os homens da expedição ameaçaram fazer um levantamento para roubarem a casa da Companhia e unirem-se ao gentio, tendo participado o facto ao comandante da fragata Nossa Senhora da Penha de França frei LUÍS CAETANO DE CASTRO DE VASCONCELOS; acerca do andamento dos trabalhos em Bissau e sobre o pedido de descanso feito pelo soldado da companhia do capitão MANUEL DE BRITO que despontou numa série de acontecimentos que levou a uma pequena rebelião que terminou com a intervenção de frei MANUEL DE VINHAIS; acerca da compra de mantimentos pelos administradores da Companhia; dando conta que SEBASTIÃO DA CUNHA SOUTO MAIOR estava na posse do governo da fortaleza, referindo que o engenheiro ANTÓNIO CARLOS ANDREIS chegou naquela praça sem patente, sem soldo definido e encontrava-se doente; sobre se ter determinado quais os oficiais que deveriam ficar em Bissau para evitar gastos, tendo sido escolhido o capitão de infantaria LUÍS DA SILVA CARDOSO entre outros e uma companhia composta por alguns homens; pedindo reparos das peças de artilharia e informando que os pretos de Cabo Verde eram propensos ao trabalho; solicitando a ida de uma companhia de gente paga para concluir a obra da fortaleza; e ainda sobre a chegada naquela praça de seis moradores brancos da praça de Geba que estavam em fuga.
AHU-Guiné, cx. 9, doc. 54.
AHU_CU_049, Cx. 9, D. 785.
OFÍCIO do sargento-mor engenheiro MANUEL GERMANO DA MATA do Conselho Ultramarino ao rei D. José I sobre a falta de dinheiro e mantimentos na expedição de Bissau, dado que acabaram os mantimentos vindos da ilha de Santiago, informando que mandou o iate São Joaquim e a corveta Nossa Senhora da Esperança para a ilha de Santiago avisar ao governador e capitão-general de Cabo Verde e ao administrador da Companhia do Grão-Pará e Maranhão da situação de carência vivida em Bissau e solicitando mantimentos e dinheiro para pagar os pretos de Cabo Verde, que reivindicavam. pagamento em dinheiro tal como receberam os marinheiros e soldados da nau de guerra; expondo o incidente que tiveram com os pretos por estes não quererem trabalhar sem receber pagamento em dinheiro não obstando terem uma boa dieta alimentar, advertindo que o episódio foi amenizado pela presença do padre frei Pedro de Valongo e com a promessa de que seriam pagos; queixando-se dos maus procedimentos dos trabalhadores pretos oriundos de Cabo Verde, que só trabalharam bem enquanto estava frei Luís Caetano de Castro Vasconcelos em respeito a guarnição da sua nau, e mencionando que uma reivindicação de um soldado da Companhia de Manuel de Brito por mais tempo de descanso despontou numa série de acontecimentos que levou a uma pequena rebelião; acusando a recepção do pagamento e os mantimentos que constavam da relação inclusa; dando conta que remeteria na galera São Pedro uma quantidade de homens incapazes para trabalhar e alguns doentes na galera Nossa Senhora da Esperança, e que pediu ao administrador de Cacheu que convocasse os moradores para trabalharem em Bissau; informando da chegada em Bissau de seis moradores de Geba em fuga por terem sido ameaçados de mortes em Geba, povoação de onde era proveniente a maioria dos cativos, cera, marfim e algum ouro, referindo que o capitão cabo daquela praça recebia uma porção de todos os navios que para lá iam carregados de sal ou de carne de cavalo-marinho; informando que ouvidor das ilhas de Cabo Verde, JOÃO GOMES FERREIRA, desrespeitou uma lei do tempo de D. Pedro II proibindo que degredados sentenciados exercessem ofícios, ao colocar APOLINÁRIO JOSÉ, degredado na ilha do Fogo, para servir no ofício de escrivão da correição quando foi a dita ilha averiguar a queixa que o signatário fez contra o vigário Inácio Mendes Rosado e alguns dos seus aliados; e dando conta que pediria mais homens ao governador e capitão-general de Cabo Verde.
AHU-Guiné, cx. 9, doc. 55.
AHU_CU_049, Cx. 9, D. 786.
1766/05/12
OFÍCIO de frei MANUEL DE VINHAIS SARMENTO ao secretário de estado da Marinha e Ultramar, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, informando que frei LUÍS CAETANO DE CASTRO DE VASCONCELOS se ausentou de Bissau, mas continuaram erguendo os murros e a tabanca; informando o sargento-mor engenheiro responsável pela obra do hospício de Bissau encontrar-se prostrado numa cama por causa de uma pancada infligida por um marinheiro da fragata; relatando um episódio ocorrido com um soldado da Companhia de MANUEL DE BRITO, que se queixou do excesso de trabalho, e da tomada de posse de SEBASTIÃO DA CUNHA SOUTO MAIOR na praça de Cacheu; sobre os oficiais de Cabo Verde que integravam a expedição de Bissau terem pedido melhores condições de trabalho e soldo devido, bem como as honras que lhes eram devidas; dando conta dos homens doentes e incapazes que seguiriam para Cabo Verde; e solicitando amparo régio para construírem um novo hospício naquela praça.
AHU-Guiné, cx. 9, doc. 56.
AHU_CU_049, Cx. 9, D. 787.
É possível, mesmo muito provável, que este capitão-mor comungasse nos anseios de separações relativamente ao governo conjunto de Cabo Verde e Guiné, que animavam os demais, visto que e esse sentimento, dando-o como generalizado, se referia o Governador TEIXEIRA CARNEIRO num oficio dirigido ao governo a 13 de Junho de 1794, solicitando que o isentassem da autoridade que tinha sobre os capitães-mores da Guiné, visto eles não obedecerem a seus mandados, pedido que, todavia, não foi deferido. Essa aspiração, se realmente viveu no espírito de JOSÉ ANTÓNIO PINTO, foi nele parceira dum certo autoritarismo, traduzido nas violências de que se queixavam os soldados. Aquele foi o motivo apresentado ao insubordinarem-se os soldados e por forma tal que ele resolveu pôr-se a salvo e foi para Geba. Em Junho de 1803 obteve a nomeação de comandante de Cacheu, com o seu filho NARCIZO EDUARDO PINTO, que servia como tenente de artilharia.
1805/02/00
1766/05/13
OFÍCIO do capitão-mor da praça de Cacheu, SEBASTIÃO DA CUNHA SOUTO MAIOR, ao secretário de estado da Marinha e Ultramar, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, sobre uma ordem régia determinando que acertasse com o capitão-de-mar-e-guerra LUÍS CAETANO DE CASTRO DE VASCONCELOS e com o sargento-mor engenheiro MANUEL GERMANO DA MATA o que se devia praticar para a segurança da fortaleza, contudo informando que recebeu a dita ordem para o capitão-de-mar-e-guerra mas que este já se tinha retirado para a Corte, e o sargento-mor engenheiro encontrava-se muito doente; informando da delicada situação vivida em Bissau, em virtude dos soldados estarem desalojados desde Janeiro e de um princípio de levantamento protagonizado pelos pretos de Cabo Verde; dando conta da existência na ilha de Bissau de um preto capitão-mor por patente régia, que assistia perto daquela praça, e junto dele estavam alguns cristãos; expondo que para a segurança daquela praça iria escolher algumas pessoas de confiança e participaria na remuneração do seu trabalho, e opondo-se a nomeação de AUGUSTO DE SOUTO E MATOS para o posto de sargento-mor da praça de Bissau feita pelo governador das ilhas de Cabo Verde, BARTOLOMEU DE SOUSA E BRITO TRIGO, por ser de pouca idade e inexperiente, e propondo para o seu lugar BERNARDINO ANTÓNIO ÁLVARES DE ANDRADE, filho do ex-sargento-mor SEBASTIÃO ALVES DE ANDRADE; informando que o ajudante LUÍS DA SILVA CARDOSO foi para aquela praça nomeado capitão pelo mesmo governador e capitão-general de Cabo Verde, e que achava ANTÓNIO RODRIGUES MOCAMBO capaz de servir no posto de ajudante da praça; e expondo que a fortaleza de Bissau era um quadro de pequena fortificação, guarnecido pelo lado que faz frente ao mar com dois baluartes, e pelo lado da terra havia um único baluarte no meio da cortina, entre outros aspetos da fortaleza.
AHU-Guiné, cx. 9, doc. 57.
AHU_CU_049, Cx. 9, D. 789.
OFÍCIO de JOÃO DA COSTA E BONIFÁCIO JOSÉ LAMAS ao provedor e mais deputados da Companhia do Grão-Pará e Maranhão dando conta do cumprimento das ordens contidas na carta de 29 de Março de 1766 e de outras enviadas ao sargento-mor engenheiro MANUEL GERMANO DA MATA; dando conta que enviaria pela galera São Pedro, de que era capitão MANUEL JOSÉ DOS SANTOS, alguns homens incapazes e doentes para a ilha de Santiago; informando que recebeu pela corveta Nossa Senhora da Esperança e pelo iate São Joaquim um carregamento de mantimentos; sobre os desaforos cometidos pela gente de Cabo Verde; dando conta que o capitão ENGENHEIRO ANTÓNIO CARLOS ANDREIS PAIS estava a exercer por impedimento de sargento-mor engenheiro MANUEL GERMANO DA MATA e de um levantamento protagonizado por um preto chamado PEDRO VARELA; acerca da pretensão de se despachar o bergantim São Marçal com os escravos que havia naquela praça com destino a São Luís do Maranhão; pela escuna Nossa Senhora do Rosário se expediram ordens para um porto vizinho pedindo arroz, em virtude da falta de mantimentos em Bissau; solicitando mantimentos da Corte; acerca da construção de uns armazéns; sobre a conta dos gastos feitos pela fragata de guerra e pelo navio São Pedro; acerca de uma botica que ficou na fragata de Guerra e uns botins que serviriam de amostra; sobre um outro levantamento ocorrido em Geba envolvendo o capitão-mor ANTÓNIO FERNANDES LOPES GODINHO SANCHES e tendo tido a intervenção de um sargento-mor de Bissau nomeado pelo governador e capitão-general de Cabo Verde e sobrinho do capitão-mor de Cacheu, que prometeu retaliação aos gentios de Geba; e acerca da eleição de SEBASTIÃO DA CUNHA SOUTO MAIOR para capitão-mor de Cacheu.
AHU-Guiné, cx. 9, doc. 60.
AHU_CU_049, Cx. 9, D. 792.
1766/05/19
OFÍCIO do tenente BERNARDINO ANTÓNIO ÁLVARES DE
ANDRADE ao secretário de estado da Marinha e Ultramar, Francisco Xavier de
Mendonça Furtado queixando-se das atitudes do sargento-mor engenheiro MANUEL GERMANO DA MATA e da sua pretensão
em tornar-se rei de Bissau, reiterando que passou a pagar os soldos e ordenados com a pataca castelhana e se negando
a fornecer mantimentos ao hospital de Bissau, mencionando que JOÃO DA COSTA E ATAÍDE por diversas
vezes socorreu o hospital com galinhas e vacas para ajudar os doentes e enfatizando o mau tratamento que o dito sargento-mor dava aos soldados.
AHU-Guiné, cx. 11, doc.
10.
AHU_CU_049, Cx. 9, D.
793.
1766/08/05
OFÍCIO do capitão-mor da praça de Bissau, SEBASTIÃO DA CUNHA DE SOUTO MAIOR, ao secretário de estado da Marinha e Ultramar, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, sobre o estado da fortaleza, da necessitava de apetrechos de guerra, de guarnição, e de tudo mais que era conveniente para a sua conservação; informando que o seu estado estava agravando-se com a época das águas e estando em ruínas por não ter sido revestida com pedra e cal, contudo por várias vezes o sargento-mor engenheiro MANUEL GERMANO DA MATA afirmou ser desnecessário fazer tal revestimento; acerca da rebeldia dos soldados de Cabo Verde; sobre a renovação do projeto da fortaleza feita pelo capitão António Carlos Andreis, que se achava à frente da inspeção, direção e execução da obra; dando conta que ainda não havia um corpo de guarda principal, por isso a companhia de infantaria ia quase que diariamente guarnecer aquela fortaleza fazendo patrulhas, rondas e sentinelas; e comunicando o falecimento do rei de Bissau e a sucessão naquela sociedade por via matrilinear.
AHU-Guiné, cx. 9, doc. 64.
AHU_CU_049, Cx. 9, D. 797.
1766/09/26
OFÍCIO do sargento-mor engenheiro MANUEL GERMANO DA
MATA ao secretário de estado da Marinha e Ultramar, Francisco Xavier de
Mendonça Furtado, expondo o seu empenho na construção da fortaleza de Bissau; sobre a sua chegada na ilha de Santiago para
integrar a expedição que partiu para Bissau com o intuito de construir a
fortaleza, da qual dava conta do andamento da obra, dos problemas que vinham
experimentando, do pagamento dos homens e os avanços e recuos daquela
empreitada; informando da situação que
levou à prisão do tenente JOÃO DA COSTA DE ATAÍDE; referindo os primeiros
contactos que os membros da expedição tiveram com o rei de Bissau numa
tentativa do régulo permitir a construção da fortaleza e o estabelecimento de
Portugal naquela praça; remetendo cartas que recebeu dos administradores da
Companhia de Grão-Pará e Maranhão JOÃO
DA COSTA e BONIFÁCIO JOSÉ LAMAS, de
quem tinha queixas; comunicando que alguns marinheiros da expedição foram
agredidos mata a dentro, quando foram procurar palha para as camas dos doentes;
dando conta do levantamento dos pretos.
Anexo:
ofício, aviso e folha de pagamento.
AHU-Guiné,
cx. 9, doc. 67 e 62.
AHU_CU_049, Cx. 9, D. 800
1769/04/01
OFÍCIO
do sargento-mor engenheiro, MANUEL
GERMANO DA MATA, ao secretário de estado da Marinha e Ultramar, Francisco
Xavier de Mendonça Furtado, sobre os progressos da obra da fortaleza de Bissau; informando que o administrador da Companhia
do Grão-Pará e Maranhão não forneceu os mantimentos e pagamentos dos soldados e
dos problemas que teve com os administradores da Companhia JOÃO DA COSTA e BONIFÁCIO
JOSÉ LAMAS; comunicando a chegada de um novo administrador da Companhia
chamado ANTÓNIO FERNANDES SILVA;
acerca da controvérsia suscitada pela forma com que os administradores da
Companhia faziam o pagamento dos soldados e oficiais, pagando-os com fazendas
pelo preço praticado na ilha de Santiago; dando
conta que no decurso daquele ano daria por terminado a obra da fortaleza.
AHU-Guiné,
cx. 9, doc. 76.
AHU_CU_049, Cx. 9, D.
812.
1773/11/22
REQUERIMENTO do sargento-mor de infantaria com exercício de engenheiro ANTÓNIO FÉLIX RIBEIRO DO AMARAL ao rei D. José I solicitando que o ex-capitão-mor da praça de Cacheu, BERNARDO DE AZEVEDO COUTINHO, passasse certidão na qual constasse que MARIA DA GRAÇA, moradora na povoação de Ziguinchor, mandou de presente um escravo ao governador interino da fortaleza de Bissau, SEBASTIÃO DA CUNHA SOUTO MAIOR, para que este dispensasse da obra da dita fortaleza o seu sobrinho soldado GREGÓRIO CORREIA, natural de Cabo Verde.
AHU-Guiné, cx. 10, doc. 19.
AHU_CU_049, Cx. 9, D. 829.
1775/04/06
OFÍCIO do sargento-mor e comandante da praça de Bissau, INÁCIO XAVIER BAIÃO, ao secretário de estado da Marinha e Ultramar, Martinho de Melo e Castro, dando conta que chegou a Bissau, no dia 28 de Fevereiro, após 21 dias de viagem, tendo tomado posse do governo daquela praça, inteirando-se da quantidade de artilharia disponível e soltando alguns, e prendendo por ordem régia o ex-governador daquela praça, SEBASTIÃO DA CUNHA SOUTO MAIOR, tendo principiado o sequestro dos seus bens e passado uma carta precatória ao capitão-mor da praça de Cacheu para dar seguimento ao sequestro dos bens e escravos em Cacheu; comunicando que recebeu visitas do rei de Bissau; dando conta que completou as duas companhias de infantaria, formou com alguns soldados a terceira companhia de artilharia; remetendo mapa da artilharia, armamento e munições de guerra; informando que a tropa encontrava-se há muitos meses sem pagamento dos soldos, e solicitando que fosse declarado se o pagamento deveria ser feito em dinheiro ou em fazendas; remetendo uma carta que recebeu do governador e capitão-general de Cabo Verde, JOAQUIM SALEMA DE SALDANHA LOBO; informando que os padres do hospício de Bissau necessitavam de uma quantidade de cal de ostras e pedras para as obras do hospício, entre outros materiais que constavam de uma atestação; reiterando que a capela da praça tinha três imagens de Nossa Senhora, São Francisco e Santo António, e ornamentos dos padres missionários, mas era necessário imagens de São José e Nossa Senhora da Conceição, um cruxifixo, um cálice e mais ornamentos para rezar a missa; remetendo amostras de ouro e prata e um livro de contas do negócio de Geba.
Anexo: inventário (cópia), mapas, atestado e carta precatória.
AHU-Guiné, cx. 10, doc. 28 e 25.
AHU_CU_049, Cx. 9, D. 839.
1775/04/09
OFÍCIO do sargento-mor e comandante da praça de Bissau, INÁCIO XAVIER BAIÃO, ao secretário de estado da Marinha e Ultramar, Martinho de Melo e Castro, informando que os doentes do hospital de Bissau estavam sem assistência porque os soldados destacados para assistir no hospital faltavam com as suas obrigações, e desta forma tinha escolhido quatro soldados para se ocuparem do hospital, pagando-os meio soldo e alimentação.
AHU-Guiné, cx. 10, doc. 29.
AHU_CU_049, Cx. 9, D. 841.
1776/03/22
OFÍCIO do tenente Bernardino ANTÓNIO ÁLVARES DE ANDRADE ao secretário de estado da Marinha e Ultramar, Martinho de Melo e Castro, dando conta dos problemas existentes na praça de São José de Bissau, como era o caso dos pagamentos dos soldados, seu diminuto número e a falta de reparos para a artilharia, mas sugerindo que se cultivasse a terra em Bissau, de forma a torná-la produtiva e que para a praça fosse enviado um oficial engenheiro.
AHU-Guiné, cx. 11, doc. 10-A.
AHU_CU_049, Cx. 10, D. 882.
1776/07/05
OFÍCIO do sargento-mor e comandante da praça de Bissau, INÁCIO XAVIER BAIÃO, ao secretário de estado da Marinha e Ultramar, Martinho de Melo e Castro, informando que deu execução a uma ordem régia para em Bissau se formasse uma companhia com homens disciplinados e hábeis para servir em Cacheu; acerca de uma outra ordem régia sobre uma pedra que se achava em modo de cachoeira no rio Geba e que poderia ser demolida para dar passagem pelo rio acima; dando conta da ruína da igreja, do quartel e do calabouço, reiterando que já tinha feito reparos, com a excepção da igreja, por falta de madeira, telha, cal e tijolo; informando que se aproveitou de um chão do hospício dos franciscanos para levantar um novo hospital com os apetrechos necessários para os doentes e alguns quartéis para os oficiais; remetendo carta patente comprovando que a jurisdição da Serra Leoa pertencia ao comando daquela praça de Bissau, e desta forma pedindo intervenção para regular a situação, visto estar um homem preto mandado naquelas partes; sobre desordem vivida na povoação de Geba, e dos atritos que teve com o comandante e sargento-mor da praça de Cacheu, ANTÓNIO VAZ DE ARAÚJO, acerca da jurisdição daquela povoação; referindo as incursões dos ingleses e franceses na costa da Guiné; e sobre representação dos soldados e oficiais solicitando poderem receber os pagamentos em dinheiro.
Anexo: informação.
AHU-Guiné, cx. 11, doc. 16.
AHU_CU_049, Cx. 10, D. 895.
1776/12/02
ATESTADO passado pelo ajudante da guarnição da praça de Bissau, PEDRO ANTÓNIO BRAUM, atestando que os administradores da Companhia do Grão-Pará e Maranhão não queriam abonar os soldados, em virtude de não terem satisfeito dois bilhetes de abono ao sargento MANUEL JOAQUIM a mando do capitão da primeira companhia de infantaria.
Anexo: escrito.
AHU-Guiné, cx. 11, doc. 25.
AHU_CU_049, Cx. 10, D. 899.
1794/06/13
1799
«Para a Praça de Bissau seguiu em 1799 o novo commandante José das Neves Leão, que commonicou a sua chegada alli e não ter encontrado quem lhe entregasse o commando, porque o seu antecessor, José Antonio Pinto, já em Lisboa, havia abandonado o logar, fugindo para o gentio de Fá por os soldados, na Praça, se terem levantado contra elle pelas delápidações e opressões que exercera em todo o tempo do seu commando.» -
Subsídios para a História de Cabo Verde e Guiné, por Christiano José de Senna Barcellos, parte III, pgs. 154-155, Lisboa, 1906
1803
MANUEL PINTO DE GOUVEIA e capitão-mor de Bissau, até 1811
O governo da metrópole nomeou capitão-mor de Bissau um oficial que já servira na capitania de Cacheu, Manuel Pinto de Gouveia, e então se achava em Portugal.
O novo capitão-mor partiu de Lisboa em Fevereiro de 1805, e com a sua administração a vida económica de Bissau melhorou consideravelmente nos anos imediatamente subsequentes, crescendo também os rendimentos públicos; porém, já desde 1807, a subvenção que cabia às capitanias da Guiné para fazerem face ao deficit da administração, e era enviada de Cabo Verde, começou a ser constituída por panos de fabrico cabo-verdiano, e não por dinheiro, pegando-se então com eles, nas capitanias guineenses, prejudicando os interessados, os vencimentos de funcionários e também os soldos da tropa, facto este que gerou no seio dela uma atmosfera de exaltação, propícia a novas turbulências, tanto mais fáceis de eclodir, em Bissau, quanto grande parte da guarnição era ali constituída por presos tirados do Limoeiro, que o capitão-mor trouxera de Lisboa. Essas turbulências surgiram em Abril….
«Em Fevereiro de 1805 fôra chamado Manoel Pinto de Gouveia pelo conde de Anadia para ir governar a Praça de Bissau, que se achava abandonada por terem envenenado o governador d'ella, Antonio Cardoso de Faria.
A tropa que guarnecia Bissau era composta de pretos, naturaes do paiz, que conviviam com os gentios, que se negavam a fazer serviço.
O novo governador pediu o posto de brigadeiro, e tendo ido ao paço solicital-o ao principe regente este dissera-lhe: «Já estou bem informado do teu requerimento. O premio não se procura antes da commissão feita. Sabe desempenhar ao que vaes, e Jogo que as coisas estejam em paz pela secretaria te será remetido o que pretendes pois vejo que é de justiça.•
Seguiu Pinto de Gouveia para Bissau, com 150 degredados tirados do Limoeiro, facínoras e dos maiores crimes, tendo alguns d'estes a alva vestida, que lhes foi despida. Em Cabo Verde recebeu mais 80 homens de péssimos costumes, e com 230 soldados indisciplinados em Bissau formaria um batalhão de 460 desordeiros.
Com muito trabalho montou o serviço militar, que estava relaxado, e restabeleceo a paz com os gentios.
Não havia escripturação da fazenda e apenas encontrara nos cadernos de papel mal escripturados.» -
Subsídios para a História de Cabo Verde e Guiné, por Christiano José de Senna Barcellos, parte III, pg. 173, Lisboa, 1906.
1811/04/14
A guarnição de Bissau,
formada por criminosos retirados do Limoeiro e vadios embarcados em Cabo
Verde, amotinam-se por falta de pagamento.
Essas
turbulências surgiram em Abril de 1811, traduzidas numa insubordinação que o capitão-mor conseguiu todavia aplacar prometendo
imediatos pagamentos em dinheiro. Mas como, se o cofre da
capitania estava quase exausto e ele próprio nllo recebia vencimentos havia quatro anos? Contudo, preso à sua palavra, vendeu os escravos que tinha e cumpriu-a.
Não decerto tão completamente que evitasse nova insubordinaçllo em meados de Julho,
também desta vez aplacada pelo modo por que o tinha sido a
anterior.
A situação agrava-se, porém, pouoo a pouco, alimentada por intrigas; e assim, foram apresentadas queixas ao Governador
Geral, e este ordenou a prisão do
capitão-mor, tendo talvez ooncorrido para este acto de rigor ser conheoida
daquele a tentativa de emancipação empreendida por Pinto Gouveia, propondo à
Corte que se constituiesse, com as praças
da Guiné, um governo separado do de Cabo Verde, e apreeentando-se ele próprio como candidato ao cargo.
« Deu-se o
primeiro conficto no dia 14 de abril de 1811.
O capitão da Praça havia avisado o governador Gouveia do levantamento que
os soldados queriam fazer, e n'aquelle dia, depois da missa, formou a tropa e
aconselhou-a a que soffresse com resignação por ser bem precario o
estado do paiz. Conservou-se formada a tropa, e à resideocia do governador
dirigiram-se então os officiaes e os empregados da fazenda, que
assignaram um termo em como se resignariam.
O capitão Antonio Cardoso de Figueiredo,
commandante da tropa, mandou destroçar os soldados, mas a sua voz não foi
obedecida, antes envolvendo o capitão n'um circulo lhe disseram que intimasse o
governador para lhes fazer o pagamento, pois que estavam com fome, rotos e
descalços, e este estado não podia continuar.
O governador, inteirado d'este facto, mandou dizer que no dia seguinte
pagaria do seu bolso, visto o cofre estar vazio e haver ainda um saldo contra de 3:137$000 réis.
Não obstante essa resposta, foi este prevenido que os soldados queriam
n'aquella noite arrombar os armazens dos particulares para tirarem alimentos,
por isso que alguns soldados não comiam havia dois dias.
O governador viu-se obrigado a vender os escravos que tinha para
lhes fazer o pagamento e a pedir providencias ao de Cabo Verde,
respondendo-lhe este: que o povo estava atacado de uma epidemia e de tal fome que não podia acudir a
Bissau, pois que não havendo rendimento para o sustento dos habitantes lhe era
impossivel fazer o pagamento do segundo quartel do anno.
Havia quatro annos que o governador de Bissau não recebia os seus
vencimentos; porém como elle vivia
dil-o uma representação firmada pelos officiaes da tropa e
pelos negociantes Thomaz da Costa Ribeiro e Joaquim Antonio de Mattos, aceusando-o de intriguista e turbulento; que negociava, probibindo que os outros o fizessem; que vivia amancebado com uma Clara
Gomes. a qual sahia altas horas da noite da fortaleza,
acompanhada pelo sargento de ordens; que elle absorvia os rendimentos reaes,
roubando a polvora da fazenda para seo negocio e o dinheiro que lhe era
remettido de Cabo Verde para pagamento da tropa. e que falsificava os livros.
Em 6 de julho queixou-se o governador da Praça de que o capitlo-mór
de
Farim e o bacharel José Thomaz de Sá tomaram ao capitão do navio Expedição a sua
correspondencia official, na qual elle relatava as desordens da Praça de Bissau e
apontava os cabeças de motim, que eram
os acima referidos e mais o escrivão de fazenda, Justiniano Antonio
de Moraes, o capitão da 3.ª oompanhia. A. Cardoso Figueiredo, o alferes da
mesma, Antonio José Teixeira,
e Joaquim Antonio de Mattos.
Que se achava havia quatro annos sem receber soldo, vendo-se nas circumstancias de recorrer
ao governador da Goré a pedir-lhe socorros, mediante lettras sobre o
real erario, se não lhe facilitassem os saques.
Em 12 de julho deu-se nova Insubordinação dos
soldados. Ao toque da assembléa, às horas da parada da guarda, não
quizeram os soldados entrar na formatura, e
passando o governador ao quartel foi alli insultado, exigindo-lhe os soldados o
pagamento no meio de ameaças, e pegando em armas, que não quizeram entregar.
Retirou-se o governador e pela tarde d'aquelle dia foi avisado de que os
soldados tinham resolvido assassinal-o a golpes de baioneta, bem como à
familia, em vista do que o governador mandou logo dizer que no dia seguinte (13)
faria o pagamento com o seu dinheiro.
Os soldados resolveram então ir para as guardas, enquanto o
governador com o thesoureiro davam o balanço ao cofre, onde havia pouco mais de 700$000
réis,
faltando-lhe ainda 1:900$000 e tantos réis. O governador levou da sua
casa
essa importancia para o quartel, recebendo em fazendas do armazem
para fazer o pagamento. Os soldados, sabendo que iam ser pagos em fazenda, preveniram
o governador com novas ameaças de que não recebiam, vendo-se
este obrigado a pagar-lhes em dinheiro no dia immediato.
N'este dia chamou o bacharel Thomaz de Sá um soldado e
disse-lhe: Tesos com o governador, não
aceitem senão dinheiro de lei; tres ataques destes morre, leva-o o
diabo. Não ha de faltar quem vos governe, e que pague tudo e que não os
faça estar tão sujeitos.
Por outro lado no dia 10, achando-se o governador em frente dos soldados,
dirigiu-se-lhes o capitão Antonio Cardoso e disse-lhes: O senhor
governador disse que sou eu a causa desta desordem, quando eu estava doente; e metendo-se
no
meio dos soldados dizia-lhes em voz baixa: ele não quer dar soldo, não se
pode suportar.
O governador pediu então para Lisboa 100 homens de tropa para prender e
remeter os cabeças de motim, a fim de serem mortos no reino e mandadas as
suas cabeças para Bissau, como se fez em Cabo Verde, e que para alli
fosse enviada uma fragata de guerra para esse fim.
Solicitou para que Bissau, com Cacheu e suas dependencias de Farim, Zeguichor,
Geba e outros pontos da Guiné, constituisse uma capitania geral, em attenção
ao estado da Europa e à distancia que estava de Cabo Verde; pedia para ser
promovido n'aquelle lugar com 1:000$000 réis, que já tinha, no caso que o
achassem digno, evitando-se assim contendas com o governador de cabo Verde,
sem proveito para os interesses reaes, e só o de fomentar a intriga e a
desordem.
Desconfiando os cabeças de motim que o governador ia pedir a prisão d'elles,
foi um soldado entregar-lhe um papel no qual se lia:
1.º Nunca jámais intimará ordem alguma a
Thomaz da Costa Ribeiro, e não se falará mais em
elle sahir d'aqui. (Este Costa Ribeiro era o capitão-mór de
Farim.)
2.º Não se dará
parte do que tem acontecido, e nem se falará mais Thomaz da Costa Ribeiro,
em o Dr. José Thomaz de Sá, em o Capitão Antonio Cardoso de
Figueiredo e do escrivão de fazenda Justiniano Antonio de Moraes; nem
se dará parte alguma do soldado que V.cê
desconftar ser cabeça do pagamento.
Estes capítulos deve V.cê lel-os e rasgar já; deve
n'elles guardar um segredo eterno, sob pena de morrer
ás nossas mãos e toda a sua familia. Quem nos dá este
conselho, queremos mais bem que a V.cê jámais poderá justificar isto, pois
todos juararemos ser mentira, e sempre ouvimos dizer que quem confessa pela
bocca morre pelo pescoço; tome para si o melhor partido.
O governador, em vista de tantas ameaças e sem navios para pedir providencias,
atravessou o sertão, indo á Goré pedir soccorro de gente e de dinheiro pois
a fazenda já lhe devia 5:000$000 réis.
Depois do governador expedir a sua correspondencia para Lisboa
regressou a Bissau, mas durante aquelle tempo os promotores das desordens
ftzeram-lhe as mais graves accusações ao de Cabo Verde; este mandou que o
capilão Cardoso e
o escrivão de fazenda se constituissem juizes d'aquelles factos, auctorisando-os a syndicarem e a prendel-o se o
julgassem culpado.
No dia 12 de setembro, sem ter precedido inquerito, foram a casa do
governador Gouveia e deram-lhe a voz de preso à ordem de Sua Alteza
Real; só depois d'isto é que formaram a tropa e lhe leram a ordem do governador
de Cabo Verde.
Foi o governador Gouveia encerrado n'um quarto
velho, com sua
mulher e filhos, ficando
incommunicaveis; ahi se mandou pôr uma grade de ferro, sem portas, e permitliu-se apenas que um preto lhe levasse o comer; o preto tambem era revistado por ser prohibido ao preso
escrever.
No calabouço injuriavam-no constantemente.
O secretario do governo, Luiz Antonio Esteves
Freire, receoso de
ser preso, fugiu e
embrenhou-se no sertão; depois de percorrer umas 60 leguas chegou a Cacheu e d'ahi passon ao reino; narrou
este caso e representou contra o despotismo do governador de Cabo
Verde e dos desordeiros de Bissau.
Emquanto do reino não davam providencias, conseguiu pedil-as da
prisão o governador Gouveia, enviando uma carta ao governador e capitão
general da Serra Leoa, Charles Maxwel, em data de 17 de outubro, para
solicital-as do governador de Cabo Verde:
“Il.mo e Ex.mo Sr. Governador e Capitão General da Serra Lioua. Senhor,
as circonstancias em q me vejo me fazem procurar a protecção não
só de·V.• Ex.• como da Grande e sempre Grande Nação Bretanica. Eu Senhor sou
o Governador de Bissau, Sargento Mor de lnfantaria, Cavalleiro profeço
na primeira ordem de Portugal que hé de Nosso Senhor Jesus Christo.
Contra todas as Ordens e Leis do Reino esteu metido em prizão de Ferro e até
agora não sei o pelo que. Coando vim para este governo truçe 150 Homens
Brancos tirados de todos os Carseres do Reino costumados a toda a casta de
crimes, querendo aqui f'azerem o mesmo foi-me de grande trabalho o podel-os
suster e a força de castigos os puz em Ordem as finanças q nem delas
havia endisios hoje se acha tudo aranjado e em fim Senhor 6 q aqui ha tem tido
abelidade de por tudo em huma grande dezordem, e flzerão com a Tropa com q
no dia 11 de Julho fizesem hum grande levante e depuserão·todas as Armas e
não quizerão fazer o Serviço Isto por lhe faltar o pagamento 11 dias, e pegarão
todos em Armas e não as quizerão entregar; no dia 10 a sahida da Miça
fui descomposto e repreendido aspramente pelo primeiro Cabeça deste
levante que hé o Capitão da 3.ª Companhia Antonio Cardozo de Figueiredo que hé o que hoje estâ Governando. Fizerom
os 4 Cabeças de mutim e da traição huma queixa ao meu EU ... Senhor General em
Cabo Verde que deu por ella sem atender aos meus Offiçios e as minhas
reprezentaçaois, e com efeito forão atendidos. Porem Senhor as suas Ordens são
muito retas dizendo ellas que se tiraçe huma Devaça oculta contra mim e se eu foçe
culpado que foçe prezo, e se fose o Escrivão da Fazenda Real qne então foçe
elle prezo o que não fizerão porque a Devaça tirouçe depois de eu estar preso e
Escrivão foi o mesmo da dita Fazenda Real logo como havia de sahir culpado, o
que está tudo nulo e sem ifeito algum de Justiça, e eu prezo El.mo Senhor
depois de se acabar de tirar a devaça juntarão algumas testemunhas e a maior
parte da Tropa e fizerão hum abaixo asignado que se reduz o seguinte: Nos
abaixo asignado atestamos e sendo necessário juramos aos S.tos Evangelhos em Juizo
e fora delle que a Devaça que se tirou contra o Snr. Governador, nenhuma
Testemunha soube o q jurou pois quando o Escrivão procurou as d.'° Vm ... sabe
alguma couza do Governador Manoel Pinto, que a Testemunha dezia não Snr .,
acodia o dito Escrivão sim Senhor bem sei asigne aqui e se obrigava
violentamente asignar a ser castigado e q no requerimento q toda a Tropa dizem
fizerão contra ao d ... Snr. G. or ninguem
a soube senão coando o Ajudante Antonio Joze o andou aslgnar pellos
Cuarteis com grandes amiaços a quem o não quizesse asignar.
“Fol este papel denonsiado ao d ... comandante Cardoso, tem dado
grandes rodas de pau nos asignantes, tem
2 Alferes prezos, Joze dos Santos Campelo com 3 pares de Ferro, Manoel Luiz
Monteiro sem elles, e tem a meu Filho Cappitão da 2. ª Companhia Confirmado por
Soa Alteza Real tambem prezo, este se chama Marçelino Pinto da Fonçeca.
Esta bê Senhor a sorte a que se ve reduzido hum Homem que acaba de governar
esta Praça. Suplico a V. EIIl.ª pela sua bonrra, pela bonrra da grande Nação da
Granbertanba, haja de mandar as Ilhas de Cabo Verde pedir ao meu General me
solte e me entregue esta Praça que eu Jurei nas Reais Mãos de S. A. R. Pleito e
o Menaje por ella.
“Pello Manual mandei tão bem buma Carta, peso a V. Elll.ª o
mande tambem entregar ao d.'° meu General, pois athé estou empedido de Escrever e tenho 3 Sentinelas a vista. Só V.
Exll.ª hé o que agora me pode valer, e eu espero tanto de V. Exll.ª como da Vossa
Nação.
“Se o meu General não quizer atender, o que não hé de esperar,
na vossa bonrra e nasimento eu tenho toda a esperança. Aseitai Sr. ·a m. ª
estima pois sou De V. Exll. Senhor. Com mais profundo Respeito Manuel Pinto de
G.ª Bissau de 17 de outubro de 1811. IlL- Exll. Senhor Charles Mxuel.”
Por aqui se vê quão graves foram as desordens em Bissau e citadu
por muitos, sendo o principal
auctor o capitão Cardoso de Figueiredo, que se arvorou em governador. Não pouco concorreu para esse
estado de coisas o governador de Cabo Verde, que mandara fazer uma syndicancia por aquelles
que eram os algozes do governador da Praça. Não era, verdade seja, muito
prospero o estado financeiro de Cabo Verde que lhe permittisse mandar pagar
aos soldados da Guiné em metal sonante os seus vencimentos, que eram pannos
tecidos nas ilhas, mas o que era intoleravel é que os pannos fossem para
os armazena da Guiné oom o augmento de mais 50º/o do seu valor.» -
Subsídios para a
História de Cabo Verde e Guiné, por Christiano José de
Senna Barcellos, parte III, pgs. 191-195, Lisboa, 1906
1811/09/12
O capitão-mor da Praça de Bissau, MANUEL PINTO GOUVEIA, foi preso com a sua família por ordem do capitão FIGUEIREDO CARDOSO, encarregado pelo Governador de Cabo Verde para fazer a sindicância aos seus actos a quando da insubordinação das praças de que se compunha a guarnição de Bissau.
1811/10/17
Achando-se preso pelos soldados da guarnição e criminosos retirados do cárcere do reino, o Governador de Bissau, sargento-mór GOUVEIA, conseguiu este enviar uma carta ao capitão geral da Serra Leoa, CHARLES MAXWELL, pedindo-lhe solicitasse ao Governador de Cabo Verde providências a fim de ser posto em liberdade e condenados os chefes da insubordinação.
1825/05/01
«Em 1 de maio de 1825 houve uma sublevação militar na Praça de Bissau, promovida por alguns officiaes e pelo capellão da tropa…
Governava a Praça o capitão Domingos Alves de Abreu Picaluga, que não empregou meios energicos para conter os soldados.» -
Subsídios para a História de Cabo Verde e Guiné, por Christiano José de Senna Barcellos, parte III, pgs. 349-350, Lisboa, 1906
«Quási na mesma época, dava-se uma nova revolta militar na Praça do Bissau, em que, além dos soldados, se envolveram também alguns oficiais e o capelão militar. A causa ou o pretexto da sublevação eram, como sempre, o atraso no pagamento dos soldos e a má qualidade do rancho.
No dia 2 de Maio os soldados revoltosos assaltaram os depósitos de géneros e armamento. Exigiram a chave da Praça ao capitão-mor, Domingos de Abreu Picaluga, que se apressou a entregá-la. Praticaram diversas tropelias durante os dias seguintes.
Em 7 de Maio o comandante da Praça assinou uma convenção com os seus próprios soldados, jurando todos esquecerem o passado, sendo êsse juramento recebido pelo capelão.
Entretanto o comandante de Geba enviou um destacamento de 50 soldados em socorro de Bissau. Ao mesmo tempo fundeou no pôrto uma fragata inglesa. À vista do navio britânico, os revoltosos debandaram-se, tendo-se procedido à prisão de 38 soldados e 5 oficiais, que foram enviados para Santiago.
Os acusados foram julgados em Conselho de Guerra, tendo-se demonstrado no processo que o capitão Picaluga era em parte responsável pela insubordinação por causa da má qualidade do rancho e do seu custo exagerado. Foi, por isso, suspenso e substituído temporàriamente por Joaquim António de Matos.»
João Barreto, HISTÓRIA DA GUINÉ 1418-1918, edição do autor, Lisboa, 1938, pg. 187
1826/05/00
«Também na Praça de Cacheu se registou em Maio de 1826 uma revolta militar contra o comandante Veiga Santos. Em consequência do inquérito a que se procedeu, foram presos 15 soldados.
Paulo Xavier do Crato, sargento-mor da Praça, acusado de instigador e conivente na insubordinação, faleceu antes de ser julgado.»
João Barreto, HISTÓRIA DA GUINÉ 1418-1918, edição do autor, Lisboa, 1938, pg. 187
1842
Revolta dos habitantes da Praça de Bissau (grumetes) contra os ocupantes portugueses (Novembro de 1842 a Janeiro de 1843).
1842/11/00
«O capitão-tenente António José Torres tomou posse do governo da Guiné em Novembro de 1842 e passados poucos dias teve um grave conflito com os grumetes da povoação.
Segundo o seu relatório, datado de Junho do ano seguinte, os factos teriam-se passado da seguinte forma: era costume em Bissau, terminado o período das chuvas, retirarem-se as coberturas de palha dos prédios situados nas proximidades da fortaleza, a-fim-de se evitar a propagação de incêndios.
O juiz do povo, encarregado de fazer cumprir esta determinação, mandou pedir, em 30 de Novembro, auxílio ao governador da Praça a fim de prender o grumete Paulo Alves, que se negava a descobrir a sua casa. O comandante enviou uma escolta, que teve de sustentar luta contra os grumetes armados e decididos a impedir a prisão do arguido. Apesar disso a escolta recolheu com o Paulo Alves e mais dois prisioneiros.
Nos dias subsequentes os grumetes, protegidos pelas casas, atacaram a fortaleza, que ripostou obrigando-os a fugir. No dia 4, o negociante João de Barros, entrou na Praça, pedindo que cessasse o fogo pois os revoltosos haviam prendido o seu caixeiro e ameaçado fuzilá-lo e roubar o seu estabelecimento. O governador Torres, convencido de que este comerciante era conivente com os grumetes, aos quais vendia pólvora e armas, encarregou-o de avisar os sediciosos de que castigaria severamente os 3 grumetes prisioneiros, caso eles incomodassem os habitantes de Bissau.
No dia seguinte os revoltosos enviaram dois homens grandes a pedir paz, que foi concertada com quatro condições principais:
a) obediência e respeito pela bandeira e autoridade portuguesa;
b) cumprimento de todas as ordens do governo da Praça;
e) nomeação do juiz de paz escolhido pelo governador;
d) entrega do chefe Paulo Alves, que se tinha evadido.
Poucos meses depois de resolvida a questão dos grumetes, o governador de Bissau teve de combater um movimento de protesto dos soldados contra o pagamento dos seus prés em fazendas e mercadorias pelo sistema que se tornara um mal crónico da colónia.
Era no período em que a cobrança das receitas estava entregue ao arrendatário Caetano Nozolini. Nos termos do contrato, o arrendatário tinha de entregar em Bissau e Cacheu doze contos de réis, ficando por contra-partida com as receitas de Guiné e mais o subsídio de oito contos, enviado pelo cofre de Cabo Verde. Não havia neste contrato grandes vantagens para o Estado, visto que as receitas públicas não eram inferiores a quatro contos. A intervenção de um particular só poderia ocasionar complicações inúteis, sendo natural que o arrendatário procurasse tirar o máximo lucro do negócio.
Com efeito, o contratador Nozolini continuava a pagar aos soldados com mercadorias das suas lojas, fixando-lhes preços elevados e retirando por êste processo lucros em duplicado. Utilizava-se também nos pagamentos de umas cédulas, que os governadores de Cabo Verde punham em circulação nos momentos de apuros financeiros. Caetano Nazolini adquiria êste papel fiduciário, já bastante depreciado, com grandes descontos e servia-se dele para satisfazer as suas prestações ao tesouro da Guiné.
Em 3 de Julho de 1843, as praças da guarnição de Bissau manifestaram-se subversivamente contra êste sistema e exigiram o pagamento dos soldos em moedas metálicas. O governador Torres viu-se na necessidade de adquirir dinheiro por empréstimo ao comerciante· Nicolau Monteiro Macedo, a-fim-de satisfazer os revoltosos.
Durante o govêrno de António J. Torres, o comandante do presídio de Geba, Manuel José Semedo, fez um acôrdo com o régulo de Badora, Marnadú Sanhá, pela qual foi cedido à coroa o território de Ganjarra, em 24 de Agosto de I843. Em troca estipulava-se que o presídio daria, querendo, alguma daxa em géneros e auxílio em munições no caso de o régulo ser atacado por algum dos seus inimigos.
O capitão-tenente Torres embarcou para a metrópole em 13 de Setembro, com 6 meses de licença e para o substituir foi enviado o tenente do exército metropolitano José Maria Coelho. Ia acompanhado do tenente Francisco Alberto de Azevedo e levava a missão de inquerir e providenciar sôbre a indisciplina da Praça de Bissau.
Em face do relatório apresentado pelo tenente Coelho, o governador de Cabo-Verde, ouvido o Conselho do Govêrno, resolveu mandar para Bissau 60 praças e oficiais necessários para render a guarnição; destacar para ali o brigue .de guerra Vouga; fazer o pagamento das praças em moedas metálicas e mandar substituir o director da Alfândega que também servia de escrivão na Comissão de Fazenda.
Como na mesma época tivessem vindo da metrópole ordens para proceder a um Conselho de Investigação, foi nomeada uma comissão composta de Francisco Assis da Silva, comandante do Vouga, do tenente Rosado de Faria, chefe do estado maior, e de Evaristo de Almeida, escrivão da Junta de Fazenda de Cabo-Verde. Esta comissão chegou a Bissau em 4 de Janeiro de 1844.
Desembarcou o novo contingente e passou para bordo do brigue a antiga guarnição. Provada a culpabilidade dos promotores da sublevação registada no mês de Julho, foram castigados os soldados Lázaro Vaz e Manuel das Neves com 400 varadas aplicadas na presença de tôda a guarnição.
Verificou a comissão que por estar em ruínas o quartel, os soldados haviam construído mais de 40 palhotas dentro da fortaleza, vivendo ali com as suas mulheres e até mesmo exercendo o comércio de aguardentes e doutros géneros. A comissão tomou providências para a reparação do quartel, mandou destruir as palhotas e expulsar as mulheres (a ).
Notou .também que a fortaleza de S. José tinha perdido o rebôco ·e que o fôsso estava quási entupido, tornando-se assim faceis o ataque e a entrada do inimigo dentro do forte. Não havia cirurgião nem assistência aos doentes. Fora da fortaleza as palhotas dos grumetes avançavam até a muralha, servindo de abrigo os revoltosos e impedindo o emprêgo· da artilharia. A comissão tentou deslocar estas palhotas para longe, mas teve de desistir dos seus intentos por encontrar resistência da parte dos grumetes.
Por seu lado o escrivão da Junta de Fazenda que fazia parte da comissão achou a escrituração dos livros em tal estado de confusão, que o único recurso foi trancar a escrita anterior e começar outra. Deixou ali ficar um regulamento da alfândega, tabelas dos direitos, custas e emolumentos.
(a )É de supor que estas determinações estivessem em vigor por muito pouco tempo. Ainda hoje, nos nossos dias, no recinto da fortaleza de Bissau continuam a viver os soldados com as suas famílias dentro de palhotas. Tal prática tem sido mantida atendendo aos hábitos e mentalidade dos indígenas, e a sua eliminação não se considera indispensável para a boa disciplina militar, desde que não faltem a devida fiscalização e vigilância contra os abusos.»
João Barreto, HISTÓRIA DA GUINÉ 1418-1918, edição do autor, Lisboa, 1938, pg 211-214
1843/07/03
«Havendo-se insubordinado a tropa em Bissau nos primeiros dias de julho, recusando-se a receber o pré segundo se achava determinado no contrato feito pela Junta da Fazenda publica desta Província e approvado pelo governo de Sua Majestade, e obrigando o governador de Bissau a que os pagamentos se fizessem em metal, e para que cessassem os protestos ou outras insubordinações que podiam dar azo a anarquia militar, determinou o governador geral, em Portaria de 2 de novembro de 1843, que os pagamentos dos empregados civis de todas as classes e denominações, como os soldos aos officiaes e prets á tropa seriam realisados em Bissau e Cacbeu, e dependências de ambos os governos, em dinheiro metal pelo valor que se acha determinado na Portaria em Conselho de 25 d'outubro de 1842.
Para se levar a effeito este artigo a Junta alterou o contracto com Caetano Nozolini, que acabamos de citar, celebrando-se definitivamente outro, nos seguintes termos:
1º O cidadão Caetano José Nozolini se obriga a fornecer á Commissão de Fazenda, em Guiné, todo o numeraria preciso para pagamento de tropas e empregados daquellas possessões. Este numeraria será o corrente no Archipelago e pelos mesmos valores, isto é, patacas hespanbolas, brasileiras e mexicanas a 960 réis e onças hespanbolas a 155$60 ou 16 patacas; as fracções deste dinheiro logo que tenham o peso legal terão os valores correspondentes aos marcados.
2.º Obriga-se a fornecer igualmente os generos precisos para pagamento das outras despesas que não sejam consideradas pret, soldos, ordenados ou congruas, pelos preços seguintes : polvora e tabaco a 200 réis o arratel; aguardente a 670 réis o gallão; machetes a 500 réis; zuartes e fazendas brancas de algodão a 250 réis a jarda; bandas a 500 réis; ferro em barra a 1.000 réis cada barra.
3.º Obriga-se a acreditar os rendimentos das alfandegas e mais impostos daquellas possessões na quantia de 4:000$000 réis em dinheiro metalico, obrigando-se alem d'isso a pagar as commissões devidas aos empregados das mesmas alfandegas.
4.º Elle contratador, ou pessoa por elle autorizada, receberá na Thesouraria Geral da Província, a prestação de 1:500$000 réis, no fim de cada trimestre, por corita da maior quantia que tiver fornecido. O pagamento da prestação relativa a qualquer trimestre terá lugar durante o prazo de 90 dias depois de findo o trimestre a que fór relativa a qualquer trimestre, podendo elle contratador desobrigar-se deste contrato quando em todo aquelle período se não levar a effeito o mencionado pagamento.
5.º No primeiro dia do mês de julho de cada anuo ajustar-se-hão, na Contadoria da Junta de Fazenda, as contas com elle contratador as quaes terão loga r. á vista dos documentos legaes a despesa: e depois de somadas as verbas que foram pagas em dinheiro, abater-se-lhe-hão 4:000$000 réis dos rendimentos das alfandegas e mais impostos, e da differença que houver reunida a importancia das fasendas fornecidas, as quaes neste acto terão um abatimento de 20% nos preços marcados no artigo 2. o, deduzir-se-ha a quantia de 6:000,$000 réis, total das prestações em cada anno, e a Fazenda pagará a · elle contratador o saldo que houver a seu favor, ou será ·encontrada nas prestações futuras o saldo se houver a favor da Fazenda.
6.º A marcha da escrituração d"Alfandega e fiscalização continuará sem interrupção da maneira que se obraria se os seus rendimentos não se achassem arrematados, devendo dar entrada nella todos os objectos que forem importados ou exportados naquellas possessões.
7.º Que este contrato será contado como tendo o seu começo no primeiro de julho do corrente anno de 1843 e findará em 30 de junho do anno de 1846, se antes d'isso Sua Majestade não mandar o contrario.
8.º Para o exacto cumprimento deste contrato elle contractador renuncia, ás obrigações que contrahira pelo contrato celebrado em i 2 de julho ultimo, e bem assim a todos os casos fortuitos, solitos o insolitos, cogitados e não cogitados, salvo os da invasão, para o que obriga a sua pessoa e bens havidos e por haver, e na falta destes deu por seu fiador a Joaquim Martins Franco. (a) Francisco de Paula Bastos, governador-geral; João José Antonio Frederico, juiz de direito substituto; José Gabriel Cordeiro, delegado interino d"o Procurador da. Corôa e Fasenda: Caetano José Nozolini, Joaquim .Martins Franco.…
Em Bissau houve uma rebellião de soldados de 3 a 5 de julho de 1843.
O governador d'esta Praça relatou-a em 6 d'aquele mez ao governador geral, dizendo-lhe que os soldados haviam pedido ao seu comandante para que o pagamento lhes fosse feito em generos e não em baralhos (cédulas) porque o fornecedor os explorava com o elevado preço das fazendas. Concordou n'isso o governador da Praça e na manhã do dia 3 nomeou o commandante da força uns soldados, para escolherem e conduzirem polvora e tabaco qué desejavam para pagamento. Regeitaram receber estes artigos e sollicitaram dinheiro em metal sonante e como no cofre não o houvesse e se mostrassem os soldados cada vez mais exaltados, com grandes difficuldades, conseguiu o governador que o negociante Nicolau Monteiro de Macedo abonasse a importancia precisa ; só no dia 5, depois de muito ameaçados os officiaes e governador da Praça, receberam os revoltosos o pagamento; seguiu-se, então a embriaguez dos mesmos transformando-se a casa da guarda n'uma adega.
A esta sublevação não foram inditferentes os grumetes da Praça que intimaram os negociantes para recolherem as cedulas e fizessem circular o metal.
Ao Governador da Praça, Torres, havia-lhe sido concedido seis meses de licença para o Reino pela Portaria de 26 de maio; em 13 de setembro embarcou para Lisboa, e como deixasse a Praça, sem ser substituido e em condições criticas, foi submeltido a um conselho de investigação.
Em Cabo Verde, porem, o Governador Geral tomava providencias, reunindo no dia i2 de setembro o Conselho do Governo, deliberou-se mandar um ofllcial de intelligencia a Bissau, e que fosse de inteira confiança, para syndicar dos motivos, reaes ou apparentes, que deram Jogar á insubordinação e para dar as providencias que julgasse necessarias,. e que com este official fosse outro, intelligente, para coadjuvar o Governador na maoutenção da disciplina e subordinação; resolveu-se tambem que o pagamento continuasse alli a ser feito em generos pelo preço do mercado.
Nomeou-se o tenente Coelho, que recebeu as seguintes instrucções, e acompanhou-o o tenente Francisco Alberto de Azevedo.
O tenente do exercito de Portugal, José Maria Coelho, é nomeado para ir a Bissau em commissão de serviço de Sua Majestade, para o que embarcará na escuna Thereza, ao serviço da Província, no dia que posteriormente lhe for designado; e no desempenho d' esta commissão observará o que abaixo se lhe prescreve:
· 1. 0 Deverá conferenciar com o governador da Praça de Bissau, de quem se infurmará convenientemente acêrca dos motivos, reaes ou apparentes, que deram origem aos acontecimentos dos dias 3 a 5 de julho, em que a guarnição tumultuariamente, e em formal insubordináção, rncusou receber o pret em generos, na conformidade do contracto celebrado por a Junta da Fazenda d'esta Província com Caetano José Nozolini.
2;º Pela mesma forma haverá todas as informações que puder sobre os meios que se empregaram, e por parte de quem, para que esta insubordinação apparecesse; quaes são as queixas que os soldados teem allegado contra a forma de pagamento em generos; bem como se soffrem com ella prejuizos; e quaes os· inconvenientes que resultam da dita forma de pagamento.
3.º De acordo com o mencionado governador procurará os meios mais efficazes para fazer embarcar a bordo da escuna Thereza todos os cabeças do motim dos referidos dias; e quando não seja possível todos, a parte d'elles que o for; havendo-se nisso com toda a prudencia e discrição, pois que não leva força que o possa auxiliar, e quando isto não seja absolutamente possível, com o mesmo governador combinará o que for mais a proposilo para se levar a effeito apenas ali chegar embarcação de guerra. O mesmo tenente é por esta Portaria autorizado a dar em meu nome as providencias interinas que a urgencia dos factos imperiosamente reclamar, contanto que não offendam as Leis do Reino, e Ordens de Sua Majestade: sendo-me por elle apresentadas, no seu regresso a esta Província, as providencias que tomou em virtude d'esta autorização para eu resolver definitivamente. Quartel General do Governo da Prorincia, na ilha da. Boa Vista, 13 de setembro de 1843 = Francisco de Paula Bastos, brigadeiro, Governador Geral.
Um dos melhores serviços d'este goverrnador Torres em Bissau foi arranjar uma casa confortavel para servir de hospital, com camas, botica e um boticario. Abandonou o antigo hospital, que era uma casa humida, terrea e sem janellas; não tinba camas nem botica. Era dirigido por um condemnado a desterro para Angola, no tempo de D. Miguel. Nessa Província havia sido tambem condemnado, por um crime que commetteu, á grilheta para Guiné, onde se dedicou á profissão de curandeiro.»
Subsidios para a História de Cabo Verde e Guiné, por Christiano José de Senna Barcellos, parte V, pgs. 4-10, Lisboa, 1911
1843/09/14
«O
governador geral em 14 de setembro, tendo em consideração as informações do tenente Coelho, que havia
mandado a Bissau por causa da sublevação dos soldados em julho e
das que lhe forneceu o governador interino Antonio da Silva Cardoso em 6 de outubro, tomou as
seguintes providencias, depois de ouvir o Conselho do Governo :
1.ª
Mandar para Bissau 56 praças de pret e officiaes necessarios para render
a guarnição.
2.ª Mandar o brigue de guerra Vouga para ali.
3.ª Que
o pagamento nas Praças da Guiné fosse feito em metal sonante.
4.ª Que se nomeasse
um official intelligente para governador da Praça.
5.ª Nomear
um official de confiança para cuidar da disciplina.
6.ª Mandar substituir
o
director da alfandega que servia de escrivão da
Commissão de Fazenda.
Para governador interino
nomeou-se o capitão José Antonio Serrão, com a gratificação de 460$000 réis, e para director da alfandega
João Severiano Duarte Ferreira. Comtudo o governador,
em portaria de 2 de dezembro, tomou
providencias nomeando uma commissão de inquerito a Bissau, por assim
ter-lhe ordenado a portaria régia ·de 23 de outubro de 1843,
que mandou se procedesse a um conselho de investigação nessa Praça, verificando
aquelle conselho : «se tambem o governador Torres se portou, durante o seu governo, como era de conveniencia e se desenvolveu
a
necessaria
energia
para
rebater a insubordinação, ou se deixou, pelo contrario,
de haver-se como lhe cumpria e era do
seu dever, para · reprimir e
castigar os insubordinados»:
Attribuiu
o conselho essa insubordinação á impunidade havida com outras
identicas nessa Praça; e quanto ao governador Torres, informou: que mal poderia elle remediar males inveterados emquanto houvesse soldados desmoralizados na Praça.
O conselho não disse bem a
verdade. Os soldados morriam de fome e andavam nús, por ser o pagamento feito cm cedulas, que soffriam desconto, mais de 50 °lo nas
lojas, em tabaco e aguardente. Os rendimentos da
Guiné estavam arrendados a um contratador
(NOZOLINI?), que recebia sete contos de réis em metal, e pagava dezeseis em generos e cedulas á Fazenda. Evidentemente eram roubados os servidores do Estado.
O Governador Geral, por
portaria de 2 de dezembro de 1843, nomeou uma commissão composta do commandante do brigue de guerra Vouga
(Francisco de Assis e Silva), do seu ajudante de ordens e chefe do estado maior e do escrivão deputado da Junta da
Fazenda, afim de restabelecer em solidas bases. a tranquillidade n'aquella Praça, assegurar
a
disciplina da
guarnição da mesma e fiscalizar os actos
do empregado de Fazenda alli em comissão.
O quartel da guarnição estava inhabitavel e para que os soldados se não vissem obrigados a fazer barracas para suas
habitações,
ordenou-se o indispensável concerto
d'uma parte d'aquelle quartel, com uma tarimba e competentes cabides e armeiros, aproveitando-se
a
telha e madeira que ainda estivessem
em estado de servir, de maneira que a obra ficasse concluida antes da estação chuvosa.
As muralhas estavam com falta de cal e o fosso, completamente entulhado, permittia que os gentios, em
occasião de guerra, subissem as muralhas e entrassem de noite na Praça para matarem as sentinellas.
Propunha este chefe do estado maior que se mandasse demolir algumas das choupanas dos grumetes, que estavam juntas ao
fosso, a distancia de uma ou duas
braças, porque impediam a Praça de fazer fogo para o lado da terra e serviam de abrigo aos gentios, que d'alli matavam as sentinellas
e atiravam sobre os soldados que nas
baterias guarneciam a artilharia, o que alli era vulgar em
occasião de desordens.
Tentou o chefe de estado maior demolir essas casas (palhoças) fazendo
promessas aos grumetes de, com o producto de uma subscríção, que lhes construiria outras em pontos mais
afastados do fosso, sendo neste assunto consultado
o Juiz do Povo, que respondeu: só á força poderia conseguir-se semelhante cousa. Para isso seria preciso
aumentar-se a guarnição e permanecer alli um navio
de guerra por algum tempo.
Dos edificios publicos, á excepção da casa do governador, que fóra concertada,
estava tudo no maior estado de ruina. Não havia alli um cirurgião; morria-se
ao abandono.
Na ilha de Bolama, dependencia de Bissau, continuava a existir um
pequeno
destacamento, porem os navios de guerra inglezes não permittiam que se içasse a bandeira portugueza, achando-se alli dois
inglezes, que
arvoràram a bandeira d' esta nacionalidade; este negocio já se achava affecto
ao governo e por isso ordenou o chefe do estado maior ao governador interino de Bissau, Serrão, que sem ordem do Governador
Geral não retirasse a·que\le destacamento.
O commandante do brigue de guerra Vouga, Francisco de Assis e Silva, tambem recebeu instruccões sobre a conducção do
pessoal e praças para Bissau, que lambem embarcaram na escuna Tarrafal, e que de conserra seguiu com o referido brigue...» -
Subsidios para a História
de Cabo Verde e Guiné, por Christiano José de Senna
Barcellos, parte V, pgs. 16-18, Lisboa, 1911
1853
1853 - Insubordinação
do presídio de Geba. O Comandante de Bissau, Francisco de Azevedo não conseguiu
dominar a revolta e foi com a ajuda de Honório Barreto que se estabeleceu um
plano e paz.
- Esquadrilha inglesa
em Canhabaque (dezembro).
JOSÉ MARIA CORREIA DA SILVA é capitão-mor de
Bissau até 1854
DIOGO MARIA MORAIS, governador interino de Bissau
Escassez de colheitas, especialmente nas ilhas do Sal e Boa
Vista
1853/05/02
Em 2 de Maio de 1853 rebenta uma rebelião no presídio de Geba, tendo HONÓRIO PEREIRA BARRETO partido para lá no dia 10 para a dominar. Conseguiu-o dez dias depois. Após a pacificação de Geba foi solicitada a sua intervenção para obter uma paz com os papéis que parecia não mais se realizar. Tentou negociar mas os comandos não aceitaram as suas propostas. No final de 1853 assumiu o governo interino de Bissau, tendo-o entregue ao seu proprietário, capitão-tenente ROMÃO FERREIRA, em Fevereiro do ano seguinte.
«Em 13 de maio de 1853 relatou o governador interino da Guiné, Azevedo, que em 2 d'este mez teve noticia de uma rebellião em Geba promovida pelos indigenas, que o obrigou a ir a essa povoação para restabelecer a ordem, sem resultado algum, por se negarem a prestar obediencia., e por isso convidou o governador interino de Cacheu, Honorio Pereiro Barreto, para se dirigir áquelle ponto, onde, pela sua influencia que tinha para com estes povos, os poderia submetter.
Acceitou Honorio essa incumbencia e tendo sido acompanhado, por solicitações suas, pelo negociante João Marques de Barros, seguiu no dia 10 do referido mês de maio e conseguiu pacificar Geba.
Em 18 de maio apresentou Honorio Barreto o seu relatorio. Em 11 chegou a Geba e a 13 reuniu os moradores e os aconselhou a serem obedientes ao governo.
Responderam que haviam recebido de Nicolau Monteiro de Macedo algumas cartas prevenindo-os do exclusivo do sal, e que este exclusivo lhes era prejudicial, pois tinham de comprar por seis bandas a sangra do sal que até ali compravam por duas; que desesperados, por isto, tinham também impedido a saída das producções d'aquelle ponto.
Que emquanto aos direitos do sal, declararam que nenhuma protecção recebiam do governo, pois que a sua igreja estava a cair e não se dava dinheiro para a sua reconstrucção; que havia ali duas peças de artilharia montadas á sua custa e não do governo e que, finalmente, quando eram escravizados pelos gentios, a cujas terras eram obrigados a ir buscar o sustento, eram comprados pelos negociantes, ficando escravos, sem que o governo se intromettesse em tal.
Mais disseram que foram ameaçados por Nicolau Macedo que os havia de reduzir ao maior apuro, obrigando-os a serem mandingas e que estavam convencido.s que o imposto do sal fôra estabelecido só para satisfazer este negociante, o que explicavam mencionando o facto do gentio de Bericama ter tomado os hens pertencentes a Nicolau Macedo, os quaes se achavam naquelie territorio, por causa da questão José Valerio. Então Macedo pagou aos grumetes de Geba para atacarem Bericama; depois de pagos recusaram-se a combater; então jurou vingança a Geba e o imposto do sal proporcionou-lhe boa occasião para isso, vendendo ao gentio por 200 réis cada sangra que até ali era a 400 réis, prejudicando assim o commercio de Geba.
Garantiu-lhes Honorio que o Governador Geral não approvaria mais esse exclusivo e que só· pagariam o imposto como estava estabelecido; declararam então entrar na obediencia e não difficultariam aos negociantes de Bissau o commercio.
Todavia imploraram de Honorio para que conseguisse que a fiscalização do imposto fosse no forte de S. Belchior, porque eram obrigados a vir ao porto de Bissau despachar o sal antes de o comprar e assim despachavam muita vezes um certo numero de sangras que depois não compravam nos Balantas, perdendo taes direitos; estes direitos pagayam sobre os objectos que levavam para comprar sal; álem d'isto eram obrigados a desembarcar em S. Belchior para se verificar o despacho.
Finalmente solicitaram-lhe que os alliviasse de semelhante imposto, pois era com o sal que compravam generos alimentícios.
Honorio Barreto prometteu-lhes interceder junto do Governador Geral para que fossem attendidos nas suas justas aspirações, e muito concorreu João Marques de Barros para tão bom resultado, e tendo-se feito a despesa de 58$100 réis, com esta diligencia, não quis este negociante que a fazenda lhe pagasse.
No dia 20 apresentou-se em Bissau Honorio Barreto com dois homens de Geba que vinham em nome d'aquelle povo prestar obediencia e pedir que o sal se despachasse em S. Belchior pelos motivos allegados.
O governador de Bissau informon bem esta pretensão ao Governador Geral, bem como a da reconstrucção da igreja.
Effectuada a pacificação de Geba empenhou-se Honorio Barreto em conseguir a paz com os grumetes e rei de Bandim, em Bissau, sob a condição de entregarem os escravos e soldados que para ali tinham fugido, garantindo-lhes o governo que algumas questões procedentes de dividas que tinham na Praça se davam por de nenhum effeito.
Nem os grumetes e nem e rei de Bandim se sujeitaram ás condições impostas.
Em 5 de junho de 1853 houve uma revolta, puramente militar, na Praça de Bissau, devido ao pouco senso do commandante da bateria.
Governava a Praça, interinamente, o major Diogo Maria de Moraes, que pediu auxilio ao governo francês para a sutlocar e para Cabo Verde ao Governador Geral.
Os soldados saquearam a Praça e embora fossem más as nossas relações com os grumetes e gentios vizinhos, estes apenas se approximavam da Praça, sem nos hostilizar, só para receber alguns objectos roubados pelos soldados.
Em soccorro da Praça appareceu o brigue francês Palinure, sob o comando do capitão de mar e guerra Augusto Bosse, no dia 18 de junho, cuja guarnição logo occupou a Praça, depois de travar lucta com os insubordinados soldados.
O Governador Geral organizou uma expedição que partiu para Bissau no dia 15 de agosto, composta da escuna Cabo Verde e do patacho Eleonor; a bordo da escuna seguiu o major reformado Francisco Alberto de Azevedo, nomeado presidente do conselho de investigação a .que haviam de responder todas as praças do batalhão de linha, que se revoltaram, tendo sido também nomeado governador interino, durante o impedimento do effectivo., Correia da Silva.
No Eleonor seguiram um capitão, dois segundos tenentes e sessenta e nove praças.
Convencionou o Governador Geral, que tinha passado a Bissau, com o rei de Bandim e com o juiz dos grumetes para a entrega de escravos fugidos, concedendo-se liberdade aos gentios e grumetes de entrarem na Praça e aos moradores d'esta lívre passagem no terreno dos gentios.
Pcrmittiu mais que os grumetes tornassem a vir habitar junto á Praça, mas com sujeição ás autoridades portuguesas.
Deixou contratada a construcç.ão de um edificio para alfandega, que seria custeada pele rendimento dos armazens.
O governador, em data de 8 de outubro de 1853, fez uma longa exposição ou relatorio, d'este acontecimento que o obrigou a embarcar no vapor ilfindello, mandado de Lisboa a Cabo Verde para o receber e conduzi-lo a Bissau, o que fez no dia 19 de setembro, saindo de S. Vicente, para onde tinha passado da ilha Brava, no referido vapor que ali fôra receber carvão.
Chegou a Bissau a 24., encontrando já a Praça em socego, para o que contribuiu o navio de guerra francês, e á activa vigilancia do governador interino, dos ofliciaes de guarnição e negociantes que, com seus escravos armados, auxiliaram as autoridades efficazmente, guardando os cabeças de motim presos em um brigue fundeado no porto, fazendo-se rondas e patrulhas.
Álem dos cabeças de motim tinha o major Moraes mandado para a Praia 24 praças de pret, 19 para Cacheu e algumas outras para o forte de S. Belchior, ficando só com recrutas ainda algum tempo depois da retirada do brigue francês. A guarnição d'este brigue occupou a Praça durante 21 dias, desde 18 de junho até 9 de julho, adoecendo-lhe muita gente, o que fez apressar a sua retirada. Recebeu este brigue algum mantimento por conta da fazenda e um pratico do canal, tudo ua imporlancia de uns 120$000 réis, que o commandante quis pagar. e no que não consentiu o governador Moraes.
Pretendeu o commandante da Palinure arvorar a bandeira francesa ao lado da portuguesa em Bissau, mas não conseguiu esse desejo por se oppôr a isso o governador.
A revolta, puramente militar, foi consequencia da pessima administração do commandante da bateria. Tanto este commandante como os cabeças de motim responderam, em Bissau, a um conselho de investigação e embarcaram, em 18 de setembro, no pataoho Eleonor para a villa da Praia, sendo o patacho comboiado pela escuna de guerra Cabo Verde.
Os gentios, munidos de cabazes e balaios, occupavam os arredores da Praça para auxiliarem os soldados no saque.
Por occasião d'essa revolta apresentou-se em Bissau o novo governador nomeado, o capitão de engenheiros José Maria Correia da Silva, que mostrou sempre grande hesitação nas medidas que lhe eram reclamadas, e adoecendo com febres ligeiras, succumbiu a tal ponto que entregou o governo ao capitão Gregorio Alexandre Medina, que procedeu com energia.
Existia, havia annos, uma causa de desconfiança e de permanente hostilidade, que convinha remover no primeiro ensejo favoravel.
A guerra, havida em 1844, entre a Praça e os gentios vizinhos, deu logar a que fossem expulsos os grumetes que habitavam nos arredores da Praça, por estes consentirem que, da sua povoação, os gentios fizessem fogo contra a fortaleza; foram queimadas e arrasadas essas casas, e nesse terreno, junto á praia, edificaram alguns negociantes casas regulares e o mesmo fizeram alguns grumetes que se conservavam fieis ao governo, as quaes ficaram protegidas por uma tabanca, que se construiu de pedra, e pelo forte do Pigiguiti. O lado opposto da Praça estava fechada por uma estacada que terminava n'o mar.
As terras circumvizinhas á Praça pertenciam aos grumetes e não obstante isso conservavam-se incultas desde 1845, tendo sido infructiferas todas as diligencias por elles empregadas para as virem cultivar e habitar.
Esta tenaz denegação da parte da Praça, junto ao signal permanente da desconfiança contra elles, caracterizados pela tabanca e palissada, e bem assim os maus tratos de que muitas vezes eram victimas, quando vinham a Bissau tratar de negocios, pela soldadesca desenfreada sem que ninguém attendesse as suas reclamações, foram as causas por que os referidos grumetes estiveram em hostilidade permanente contra a povoação e Praça; e d'ahi resultou terem dado descarado acolhimento aos desertores e aos escravos dos habitantes da povoação, influindo para que o rei de Bandim se recusasse a entregá-los, como d'antes fazia.
Em março, quando ali esteve o Governador Geral, pela primeira vez, em Bissau, tinha encarregado Honorio Barreto de tratar d'esta questão com o rei de Bandim, promovendo a entrega dos escravos; o resultado não correspondeu á espectativa do governador, por aquelle rei e o juiz dos grumetes se recusarem a entregá-los, allegando a má fé com que sempre se tinha tratado com elles e falta de promessas.
Já em Cabo Verde pensava o governador no modo de realizar o seu desejo, de chamar grumetes e gentios á obediencia, sem derramamento de sangue e para isso nomeou interinamente para governador o major Moraes, official valente, a quem recommendou: muita prudencia no trato com os povos circumvizinbos á Praça, e a mais severa manutenção da disciplina na tropa da guarnição; e, tambem, o acabamento das reparações na fortaleza e nos quarteis.
Mais animado ficou o governador com o apparecimento do vapor Mindello, mandado pelo governo para restituir a paz e ordem em Bissau e aproveitando esse ensejo para nova tentativa, passou a Bissau.
A presença ali do primeiro navio a vapor português causou terror aos gentios e não menos aos grumetes.
Estabeleceu o governador sua residencia a bordo e ali convocou uma conferencia ao chefe dos . grumetes, que veio com os seus grandes, na companhia do negociante Nicolau Monteiro de Macedo; foram recebidos na camara do navio e ali disse-lhe o governador que era seu firme proposito trata-los com amizade, por se terem recusado a acceitar o convite que lhes fôra feito pelos soldados revoltosos e só lhes exigia a entrega dos escravos, fugidos no chão dos gentios.
O juiz do povo desculpou-se com o rei de Bandim, que deu hospitalidade aos referidos escravos.
O governador, então, chamou não só esse rei a uma conferencia, ou palavra, mas os de Antim, amigos da Praça, e de Antulla, a qual se realizou, na Praça, no dia 30, com assistencia dos grandes d'estes regulos e negociantes, obrigando ·se o regulo de Bandim a entregar os escravos e a conservar boas relações com o governo.
O Governador Geral, ao sair da Guiné, entregou uma carta de prego ao governador de Bissau, José Maria Correia da Silva para, no caso de ter de abandonar o governo, o entregar a Honorio Barreto.
O conselho de investigação apurou como culpados 48 praças e um official, que responderam a conselho de guerra, sendo condemnadas a degredo perpetuo ; em ultima instancia responderam perante a Junta de Justiça, em 6 de junho de 1854, tendo sido condemnadas 41 praças e o official. Em 16 do mesmo mês, por terem sido condemnadas só 6 praças a degredo perpetuo para Angola, foram estas exautoradas na praça do Pelourinho da villa da Praia. assistindo a este acto o batalhão de artilharia e dois corpos de 2.ª linha.
A Junta condemnou: o official, capitão da 5.ª bateria, Frederico de Abreu Castello Branco, expiada a culpa com o tempo da prisão jâ sofrida e na mesma pena a 12 praças; a degredo por cinco annos 2 praças; a dois annos de trabalhos publicos com cadeia do pé á cintura e presos a outros companheiros, oito praças; a um anno de trabalhos publicos como os antecedentes, treze.
O governo, por Portaria régia de 26 de agosto de 1853, pediu ao Governador Geral uma relação de nomes dos officiaes e praças do brigue de guerra francês Palinure, afim de serem agraciados pelos valiosos serviços que prestaram á Praça de S. José de Bissau por occasião da revolta militar havida em 5 e 18 de junho de 1853.
O ministro dos Negocios Estrangeiros, visconde de Athouguia, mandou ao da marinha a cópia de um officio que o nosso ministro em Paris lhe enviara, no qual informava ácerca da pensão que o governo francês arbitrara â viuva do tenente da marinha francesa de la Gillardaie, morto em Bissau, e propoz o quantitativo d'aquella que, por parte de Pórtugal, houvesse de conceder-se â mesma viuva, indicando igualmente as condecorações que julgava se poderiam conferir a alguns officiaes e indivíduos da tripulação do mencionado brigue, que mais se distinguiram por occasião do conflicto.
Subsidios para a História de Cabo Verde e Guiné, por Christiano José de Senna Barcellos, parte V, pgs. 273-, Lisboa, 1911
1853/06/05
«Amotinação
e intervenção francesa em Bissau (5 de
Junho-8 de Julho de 1853)
Em
contrapartida, Barreto fracassa numa tentativa de mediação entre,
por um lado, as autoridades de Bissau e, por outro, os grumetes (expulsos da
praça em 1844) e o régulo de Bandim (39). Trata-se de saber se Bandim será uma terra de asilo para os escravos que
fogem de Bissau. Bandim mantém-se firme. Ao fim e ao cabo, este ano de 1853 não é mais que
uma sucessão de humilhações para a feitoria pois que, a 5 de
Junho, rebenta uma amotinação na fortaleza de Bissau, devido à incapacidade
do comandante da bateria. Os soldados põem a
vila a saque, mas nem os grumetes nem os Papéis
extra muros tiram partido disto para sitiar a praça, contentando-se em ficar com aquilo
que os amotinados lhes vendem ou que
com eles trocam. O
governador interino,
Diogo Maria de Moraes, apela instintivamente
para os franceses de Goreia e, mais utopicamente, para Cabo Verde. São, evidentemente,
os marinheiros do Senegal os primeiros a aparecer na pessoa do chefe do
estado-maior da expedição aos Bijagós, três meses antes, o
capitão-de-mar-e-guerra Auguste Bosse. Os Franceses chegam num
brigue da Armada, a 18 de Junho. O governador português sobe a bordo e obtém
que um destacamento, de cerca de 70 marinheiros franceses, desembarque para surpreender
os amotinados. Estes, em número superior (160), tentam opor-se a esta «invasão», que irá desalojá-los da sua fortaleza e, no fogo da acção, matam o oficial que comanda,
como imediato, o destacamento, o tenente de Marinha Jules Marie Jean de la Gillardaie (40).
Os Franceses
apoderam-se finalmente da fortaleza e uma centena de soldados
(cabo-verdianos, assim se julga), fogem para os Papéis (41). Bosse e os seus
marinheiros ocuparão a fortaleza de 18 de Junho a 9 de Julho
de 1853, segundo os Portugueses ou, mais provavelmente, de 18 de Junho a 4 de Julho, segundo Bosse (41). Esta ocupação parece ser, de
momento, uma prudente medida de salvaguarda mas, vista retrospectivamente,
lança uma luz das mais cruas sobre a inconsistência da presença portuguesa nesta «capital», privada de soldados seguros. O governador nem mesmo assim
aceitará que a bandeira francesa flutue sobre Bissau. Esta «ocupação de
precaução» exigirá uma extrema vigilância dos marinheiros em terra, mas Bosse organiza
os grumetes «mais sólidos», que vão apanhar a
maior parte dos
amotinados, tendo os Papéis decidido entregá-los. 45 dos cabecilhas serão enviados
para Cabo Verde e para Cacheu. Os Franceses tiveram perto de 80 doentes com febres. Decididamente,
como com os Americanos em 1844, Bissau devora os marinheiros estrangeiros.
Entre a partida dos Franceses (8 de Julho)
e
a chegada (pelo final de Agosto), de três oficiais e 69 soldados enviados
pelo governador-geral de Cabo Verde,
Bissau não parece ter sido inquietado pelos
Papéis nem pelos grumetes, nem pelos amotinados fora das muralhas.
Quando, um mês mais tarde, a 24 de Setembro, o governador-geral Fortunato José Barreiros volta, enfim, a Bissau, no vapor da Armada que Lisboa lhe enviou - o
primeiro navio a vapor português nesta costa -, o burgo está sossegado. Os insurrectos, regressados
da
sua escapada
entre os Papéis, foram dispersos ou repatriados e os seus chefes
foram enviados para Cabo Verde, aguardando Conselho de Guerra. O governador-geral
está, pois, contente com a situação (43).
O importante neste triste episódio de soldados sublevados, é que Fortunato
José Barreiros, vindo a Bissau para estabelecer a ordem nas tropas, acaba por concluir acordo
(30 de Setembro de 1853) com os diferentes régulos papéis (Bandim,
Intim, Antula), e com o Juiz dos grumetes de Bandim, para que entreguem os escravos fugitivos e concedam
livre passagem aos moradores fora da
feitoria, em troca do qual poderão entrar na vila e os grumetes do
exterior reinstalarem-se perto da fortaleza, sob a autoridade dos Portugueses. É portanto,
em
1853, o final provisório da guerra de 1844.
(39) Jaime Walter: op. cit., pp. 104-105. Mesma observação sobre o erro de Barcellos.
(40) A sua viúva receberá uma
pensão do governo português.
(41) F. de Novais: «Acontecimentos de Bissau», Revista Militar, 1853, pp.
373-374.
(42) A.N.S.O.M. Afrique IV. Dossier 25b. Cartas de A. Bosse de 20 de
Junho e de 18 de Julho de 1853. Os Franceses partem a 8 de Julho, com os agradecimentos da população.
Importante dossier sobre 1853.
(43) I. de Novais: «Cabo Verde». Revista Militar, 1853, pp. 464-465.»
René Pélissier, História da Guiné Portugueses e Africanos na Senegâmbia
1841-1936, Volume
I, EDITORIAL ESTAMPA, 1997,
p.p. 120-122
1853/07/09
Ao ter conhecimento da insubordinação de 48 praças,
ocorrida em 5 de Junho na Praça de Bissau, o Governador-geral de Cabo Verde, FORTUNATO
JOSÉ BARREIROS, nomeado em 1851, fez embarcar uma força da cidade da Praia
com o fim de dominar os amotinados e render
a guarnição respectiva. Bem necessárias eram providências de defesa na Guiné, bem
como as que se referem aos vencimentos militares; sendo para desejar que se
mantenha na guarnição, que deve ao menos ser suficiente, a mais severa
disciplina, para que senão repitam os factos que se deram em Julho de 1853, que
tornaram indispensável o auxílio do brigue de guerra francês Polinure;
havendo a lamentar a morte do primeiro tenente deste navio La Gillardaie, comandante do primeiro
pelotão da força francesa que atacou os sublevados. O governo português, depois
de haver mandado de Lisboa expressamente o vapor de guerra Mindelo com
a precisa força militar e as necessárias munições de boca e de
guerra, decretouuma pensão àviúvado mencionado valente e infeliz oficial francês,
declarando as cortes dignos da gratidão nacionalos serviços prestados a
Portugal na praça de Bissau pela guarnição do brigue de guerra francês já
mencionado.
1853/12/00
Pedro H. Romão Ferreira –
governador da Guiné por decreto de Dezembro de 1853.
1880/04/08
Foi condecorado com o
grau de comendador da Ordem da Torre c Espada o primeiro Governador
da Província da Guiné, tenente-coronel AGOSTINHO COELHO,
por ter conseguido de modo enérgico sufocar, em Bolama, a revolta do batalhão de caçadores n.º 1 da África Ocidental, que tinha
por fim constranger o mesmo Governador a mandar pôr em liberdade 2 oficiais
daquele corpo.
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