quarta-feira, 13 de abril de 2016

COLONIZAÇÃO DA GUINÉ 1800-1819


1800
Manuel Carvalho Alvarenga foi designado comandante de Ziguinchor
MANUEL PINTO DE GOUVIEA é capitão-mor de Cacheu
JOSE CALAZANS PEREIRA DE SOUSA foi comandante de Bissau em 1800 e ate 1806.
ROSA DE CARVALHO ALVARENGA e HONÓRIO PEREIRA BARRETO
A história de outra parceria, desta vez entre mãe e filho, serve para analisar o empreendimento afro-atlântico numa perspectiva comparativa e cronológica. Claras distinções entre a condição e a iniciativa feminina e masculina podem ser feitas no seio dos gan mercantis de Cacheu e de Ziguinchor — ao norte, localizado na região de Casamansa, no rio do mesmo nome — do século XIX. Também neste caso, sabemos mais sobre o homem do que sobre a mulher aqui referidos, mas há pouca dúvida sobre a autoridade de um e de outra. Tal como ocorreu com sua ilustre antecessora, Ña Bibiana, os dados biográficos são poucos e esparsos: enquanto muito se sabe sobre seu marido e filho, nenhum dado concreto sobre seu nascimento e morte foi encontrado. Presumimos que ela tenha nascido em algum momento do último quartel do século XVIII, e falecido em meados dos anos 1850. Em termos de status social, Dona Rosa de Carvalho Alvarenga, também chamada de Dona Rosa de Cacheu ou, mais afectuosamente, de Ña Rosa, descende do mais preeminente gan do presídio de Ziguinchor. O uso do termo “dona”, nas fontes portuguesas, indica sua inclusão na classe dos “notáveis” locais, intimamente associados com a administração e o comércio. A povoação tinha sido erigida em meados do século XVII, por uma administração desejosa de estender o seu raio de acção para o lucrativo comércio do rio Casamansa, a norte de Cacheu. O clã Alvarenga, originário das ilhas de Cabo Verde pela linha masculina, controlava, praticamente, a administração da cidade militar desde meados do século XVIII. Seu pai, Manuel de Carvalho Alvarenga, era o comandante de Ziguinchor na virada para o século XVIII. Tal como todos os altos funcionários, ele também actuava no comércio de escravos, cera de abelha, arroz, sal e marfim, que eram trocados por ferro, armas, pólvora e aguardente. Na linha feminina, a autoridade do clã estava baseada em laços de parentesco e clientelismo com as comunidades Bañum/Kasanga e Felupe/Djola, que habitavam a região de Casamansa. Estes eram, respectivamente, os principais fornecedores de escravos, cera de abelha e arroz da região.
Junto com os escravos obtidos dos Soninké/Mandinga, no interior, e dos Bijagós, nas ilhas da costa, o gan Alvarenga tinha acumulado considerável experiência, influência e riqueza.
Nascida no final do século XVIII, Ña Rosa ficou viúva em 1829. Seu falecido marido, João Pereira Barreto, tinha sido um oficial militar cabo-verdiano. Filho de um padre cabo-verdiano e uma escrava guineense, possivelmente de origem Felupe, tinha comandado postos nas administrações de Ziguinchor e Cacheu, e estabeleceu uma rede de relações de patronagem com as comunidades africanas vizinhas, incluindo os Felupe/Djola e Pepel. Em 1814, ele liderou uma revolta contra o então comandante de Cacheu, que foi deposto em nome do povo deste lugar sob a acusação de insanidade.(51) O “golpe”, que colocou um triunvirato no controle da cidade, foi, ao contrário da intervenção de Bibiana, posteriormente justificado numa investigação oficial. Os relatórios oficiais reconhecem a sua autoridade, que era “bem merecida e [que tinha] hereditária influência com as nações gentias”.(52) Na época, ele era o rico proprietário da maior casa comercial de Cacheu. Quando viajou para as ilhas de Cabo Verde por razões de saúde, foi acompanhado por “sua mulher, a família constante de trezentos pessoas”, a maioria das quais eram escravos e serviçais domésticos.(53) Ao morrer, deixou terras na Guiné, Cabo Verde e Brasil, além de uma casa em Lisboa para sua esposa, que veio a se tornar a mais poderosa comerciante das regiões de Cacheu e Ziguinchor. Sua irmã, Josefina, nascida em Cabo Verde, casou-se duas vezes, em ambas com oficiais militares que detinham postos chaves na Fazenda Real.(54)
O filho de Ña Rosa, Honório Pereira Barreto, nasceu em Cacheu em 1813 e, quando da morte do pai, foi chamado de volta à Guiné, de Portugal onde estava estudando, a fim de tomar o lugar daquele nos negócios da família. Juntos, mãe e filho determinaram o destino da companhia comercial criada pelo marido e pai, e desempenharam um papel dominante nos assuntos administrativos da região. Tal como no século XVII, o controle do governador português estabelecido em Cabo Verde, cuja jurisdição incluía as cidades e guarnições guineenses, era fraco ou quase inexistente. Assim, a combinação entre a fama inquestionável de Ña Rosa, baseada numa sólida associação de parentesco e empreendimento, e o papel de seu filho na débil administração guineense, emergiu com força na primeira metade do século XIX. Elementos centrais para indicar o estado das relações de poder na época são o envolvimento de Ña Rosa na produção agrícola para exportação na Guiné e Cabo Verde; a sua influência sobre os governantes africanos e comunidades kriston; a sua ação como mediadora de conflitos; o seu pedido para obter a custódia legal de seus dois filhos; a meteórica carreira de seu filho na administração do entreposto e, finalmente, o envolvimento de seu filho, e dela própria, no tráfico de escravos. As fontes deixam claro que as operações comerciais de Ña Rosa incluíam uma plantação, então chamada ponta, a primeira deste tipo na região, onde escravos eram empregados no cultivo de arroz: “A fazenda de D. Rosa de Cacheu, no Poilão de Leão, é a única que existe no limite da Guiné Portuguesa”.(55)
A importância do arroz pode ser ilustrada pelo fato de que Cacheu,assim como Ziguinchor, dependiam inteiramente da importação deste produto da região circunvizinha, e que Gâmbia (isto é Bathurst), recém tornada um estabelecimento britânico, estava, entrementes, atraindo o grosso do comércio da região, criando, assim, novos mercados e incentivando o cultivo do arroz como cultura de renda. Embora sua localização seja conhecida, pouca informação é fornecida sobre a própria ponta.
Informações baseadas em rumores dão conta de que era uma “uma grande fazenda que diziam estar bem cultivada”. (56) A área era conhecida pela existência de “habitações e campos de arroz” de comerciantes de Cacheu. (57) Muitas fontes falam da localização e sobre a produtividade da plantação de Ña Rosa, embora ninguém, aparentemente, tenha-a visitado pessoalmente. Há, na verdade, boas pistas neste silêncio. O fato de que a dita ponta, que ela presumivelmente “comprara” dos Bañun, estava localizada num riacho (o Saral) que liga os rios Cacheu e Casamansa, numa área que escapava ao controle da administração portuguesa, e que era insistentemente rotulada como uma rota de contrabando, ilustra sua importância estratégica. A mesma área tinha, na verdade, sido o lugar de povoamentos comerciais como o de São Felipe e Buguendo, importantes centros do comércio afro-atlântico nos séculos XVI e XVII. Localizada em território Bañum, seus trilhados caminhos eram bem conhecidos de muitos comerciantes baseados em Cacheu, tais como Ña Bibiana. No século XIX, a reputação da área revela a importância das relações de parentesco com as comunidades locais, que controlavam o acesso à mesma.
Como pontuou um contemporâneo, “apesar de ser este caminho mais comum e cómodo, por ser mais perto, não se pode ir sem algum perigo das perseguições dos pretos, de modo que é preciso pagar-lhes para atravessar as suas terras, como também para carregarem as fazendas, fato e tudo o que qualquer quer levar”.(58)
Significativamente, o acordo era feito com os Bañun cujo poder e controle territorial estavam, na época, muito reduzidos, já que o seu auge tinha ocorrido em época anterior ao contacto afro-atlântico. José Joaquim Lopes de Lima, Ensaios sobre a Estatística das Ilhas de Cabo Verde no Mar Atlântico e suas Dependências na Guiné Portuguesa, Lisboa, Imprensa Nacional, 1844, p. 95.
Rosa mantivera excelentes relações com o “rei” Bañun de Jame (ou Jami), situado num riacho que vinha de Ziguinchor, e que era então, assim como no tempo de Ña Bibiana, uma importante fonte de escravos e cera de abelha na região, onde Bibiana chegou a morar. Os paralelos com os episódios do passado são, certamente, notáveis, também em relação aos frequentes casamentos mistos entre oficiais-comerciantes vindos de fora e mulheres de descendência Bañun. Tais laços ofereciam vantagens para ambos os lados, assegurando um fluxo contínuo de mercadorias baseado no acesso privilegiado às provisões, e reforçando a confiança e as obrigações mútuas que determinavam o sucesso comercial. Mobilidade social e espacial eram importantes na região, que era conhecida por sua duvidosa segurança, por causa dos ataques dos nativos, ou gentios, sobre as embarcações, raptando as tripulações. Devido aos avanços franceses sobre a região na tentativa de estabelecer uma posição segura e tomar parte no comércio, estas alianças eram, então, encaradas pelas autoridades portuguesas numa perspectiva nacional: “A conservação d’este ponto se deve realmente ao Sr. Honório e a sua mãe D. Rosa, senhora muito rica, natural d’aqui, que exerce grande influência sobre os pretos”.(59) Por “pretos”, esta fonte entendia não somente os governantes africanos, mas também as comunidades kriston vivendo no povoamento e ao seu redor, que formavam a espinha dorsal do comércio litorâneo e conduziam as transações com o interior. A comunidade de Cacheu era vista como sendo mais bem comportada do que sua contraparte mais rebelde, a cidade comercial de Bissau, e relações pacíficas eram mantidas com os Pepel, em cujos tchon Cacheu estava localizada, tudo isto graças à presença de Ña Rosa. Comoresultado disto, ela e seu filho, Honório Pereira Barreto, capturaram a imaginação dos cronistas e historiadores portugueses e cabo-verdianos, em busca de ícones dos centenários e míticos elos “luso-africanos” para reforçar as reivindicações territoriais portuguesas. Este aspecto foi, mais tarde, explorado durante a ditadura nacionalista do Estado Novo (1926-1974), quando alguns começaram a descrevê-la como a chefe do gan Alvarenga: “A preponderância dos Alvarenga transmitia-se de tal modo,que Rosa de Carvalho era conhecida pela designação de Rosa de Cacheu, e cegamente acatada a sua autoridade pelos indígenas”.(60)
Imbuído de fortes tons nacionalistas, seu grande prestígio entre os africanos, tanto “gentios” como “cristãos”, foi exaltado, sendo ela, ainda, descrita como uma “senhora de cor, de grandes virtudes” com “qualidades de honradês”. Suas ações e as de seu filho foram sistematicamente colocadas numa perspectiva “lusocêntrica”, a fim de contrastar com as investidas francesas e inglesas na região da Senegâmbia na época. Curiosamente, estes elogios emularam aqueles contidos no enciclopédico estudo publicado pelo historiador cabo-verdiano Senna Barcelos, escrito na virada para o século XX, quando se desenrolavam as campanhas militares portuguesas que levariam à criação do estado colonial na Guiné, conforme demonstra o trecho: “Esta senhora, de côr, dominava as tribus da Guiné, os régulos eram seus vassalos e por isso nos nossos domínios de Cacheu, Zeguinchor e Farim os gentios prestavam a mais cega obediência às autoridades”.(61)
Isto demonstra claramente a mudança de atitude em relação a género, parentesco e cor, impelida pela necessidade de aliados e pelo crescente sentido de nacionalidade. Suas operações comerciais iam além da Guiné e se estendiam para a ilha de Santiago, no arquipélago de Cabo Verde, que, afinal de contas, era a terra natal da linha masculina de sua ascendência, que lá possuía “morgadios”. Pedidos de passaporte para viajar às ilhas de Cabo Verde, feitos ao governador português baseado no arquipélago, eram imediatamente atendidos, sem hesitação. Suas afinidades com as ilhas assoladas pela fome são, também, evocadas quando subscreve, junto com outros membros do gan Barreto, um pedido de auxílio em meados dos anos 1850.(62) Ña Rosa negociava directamente com escravos, arroz e cera de abelha, mas também com importantes mercadorias de troca, tais como os panos de algodão, chamados “bandas”, produzidos nas ilhas, além de tabaco e pólvora, que circulavam como moeda de troca local. Sua influência estendia-se para o universo político em razão das posições administrativas ocupadas por seu marido e seu filho, mas também como decorrência dos laços que mantinha com as comunidades estrategicamente localizadas no litoral, tais como os Bañun/Kasanga, Felupe/Djola e Pepel. Ela foi chamada muitas vezes, tanto pelas autoridades portuguesas quanto guineenses, para mediar conflitos nas praças de Ziguinchor, Cacheu e Farim, e não hesitou, sempre que necessário, em usar o seu exército de escravos. Um dos exemplos desta acção de Ña Rosa foi a sua mediação entre as aldeias Pepel da área de Cacheu e as autoridades da cidade, a pedido destas, em 1825 .(63) Ao eliminar os impedimentos ao livre exercício do comércio na região ela, naturalmente, era uma das principais beneficiárias de tais apaziguamentos.
Que sua influência política era sentida através da região norte da Guiné-Bissau e Senegâmbia, incluindo Casamansa, é algo que também fica patente nas fontes francesas.(64) Mas, notavelmente, a prioridade é dada à carreira meteórica de seu filho, Honório Pereira Barreto, que Ña Rosa promoveu de forma determinada. Ele pôde gozar largamente da influência de sua linhagem paterna, mas sobretudo da materna; pois a própria posição proeminente de sua mãe como comerciante afro-atlântica foi decisiva para o sucesso de suas aventuras comerciais. Ao mesmo tempo, os serviços prestados por seu pai na administração local muito o ajudaram em sua carreira política
No que tange ao universo privado, os dados também indicam a ocorrência de mudanças nas percepções e práticas. Com a morte de seu marido, Ña Rosa submeteu um pedido formal a Lisboa para obter a guarda de seus dois filhos, Honório e Maria, que foi provisoriamente garantida. Os documentos incluem testemunhos de moradores de Cacheu, acerca da sua capacidade para educar os filhos. Aqueles que atestaram sua responsabilidade moral e civil declararam, inequivocamente, “pela a conhecer ha muitos anos, ser ela muito capaz e suficiente para a boa e fiel administração dos bens de seus filhos, porquanto é assas público e notório a actividade, zelo e intelligência com que tem portado negócios dos seu cazal e na boa educação dos seus filhos” .(65) Inquirida sobre o assunto, Ña Rosa declarou que ela não só renunciava a todos os direitos e privilégios que a viuvez podia assegurar pela lei portuguesa, mas “que obrigava todos os seus bens presentes e futuros pela boa e zelosa administração dos seus filhos, e para que hipotecava os seus mesmos bens” (ibidem). Este foi um dos primeiros casos nos quais tais direitos foram formalmente garantidos para um cidadão nascido na Guiné, e é particularmente significativo o recurso à lei portuguesa por uma viúva, como meio para assegurar direitos paternais, não só demonstrando o seu controle sobre os negócios da família como a extensão dos seus recursos materiais.
A parceria estratégica entre mãe e filho, no âmbito comercial e político, permitiu a Ña Rosa e aos seus sucessores obterem contratos-chave da administração. Um dos grandes prémios foi o contrato para “arrematação” das alfândegas de Cacheu, Bissau e Bolama em 1845. O citado contrato tinha sido, previamente, entregue a uma das principais casas comerciais guineenses, dirigida por uma sociedade rival, estabelecida em Bissau, formada por Aurélia Correia e Caetano José Nozolini. Todavia, este último tinha oferecido “condições inaceitáveis” a uma proposta alternativa. A doação que Honório Pereira Barreto tinha feito, no mês anterior, à coroa portuguesa, dos contratos para o direito de estabelecimento que ele tinha celebrado com vários chefes africanos no rio Casamansa, provavelmente também teve influência na decisão da coroa de outorgar-lhes a mencionada “arrematação”. No contrato, Ña Rosa e seu filho são designados como “moradores proprietários” de casa comercial baseada em Cacheu. Nas fontes contemporâneas, são elogiadas as habilidades de barganha que seu filho empregava nas negociações com vários chefes locais, de diversas comunidades nativas da região, bem como a sua capacidade para atrair investidores estrangeiros. É indicativo de seu status o fato de que comerciantes ingleses, belgas e franceses tenham-no escolhido “como o único árbitro em todas as questões que podiam surgir com o governador geral de Cabo Verde”, isto é, com Joaquim Pereira Marinho, com o qual ele mantinha relações cordiais.(66) Os tratados assinados com as tabankas (kriol: aldeia ou perímetro cercado) Bañun do rio Casamansa, perto de Ziguinchor, e com os régulos Pepel na vizinhança de Cacheu assim como os negociados com os Biafada e Bijagós, mostram o quanto a rede de parentesco e clientelismo que ele cultivou devia-se à sua ascendência materna e educação, como era então reconhecido: “Este senhor, um filho do país, exerce sobre os povos gentios uma extraordinária influência conhecendo os seus usos e costumes, e até a própria linguagem, acatando diplomaticamente os seus prejuízos. Distribuindo com largueza seus haveres, e estudando com extrema finura seus caprichos e interesses pode, ao seu bel prazer, entre aqueles povos atear a guerra, ou conseguir a paz”.(67)
Sua reputação de “patriota português”, que ele mesmo, “um escuro e obscuro Africano”, cultivou, era, todavia, acompanhada por uma dura atitude crítica acerca da estreiteza de visão da política portuguesa diante da expansão francesa na região.(68) Obviamente, a opinião franca de um comerciante guineense em relação aos seus superiores em Cabo Verde e Lisboa, que reclamavam a soberania sobre a região, provocou reacções díspares  Visto como “a pessoa mais instruída de toda a nossa Guiné”(69) , ele foi o primeiro governador a publicar suas opiniões e queixas num ensaio muito citado. É uma devastadora acusação, feita por um guineense que enxerga a lastimável condição das poucas “possessões portuguesas” em meados do século XIX: “Desgraçadamente, se pode dizer que nestas possessões há um governador, e comandante, mas que não há governo. O país está inteiramente desorganizado. Todos os empregados, desde o primeiro até o último, ignoram quais são seus deveres; só tratam de seus negócios, pois são negociantes”.(70) Embora ele, claramente, reconheça as relações desiguais de poder na região, mostra pouco respeito pelo modo de vida de seus moradores:
Os estabelecimentos são cercados por gentios mais ou menos insolentes, mas que geralmente dominam os Portugueses (..) Dos gentios vizinhos aos nossos estabelecimentos vem os sustentos (..) Os habitantes, à excepção dos poucos notáveis, seguem os costumes dos gentios, de que descendem (..) São preguiçosos, indolentes, inertes, e a nada se querem aplicar; podendo, se quisessem, levar a grande escala a agricultura, pois o terreno é fecundo (..) Não tem ideia alguma de moral, nem de virtude sociais; mamam o leite da devassidão, vivem brutalmente e morrem quase sempre cheios de moléstias venéreas.(71)
Quanto mais fala do papel de Lisboa, mais claro o documento se torna: “Nomeado um governador, não por suas virtudes e talentos, mas pelo partido que segue, é logo julgado infallível e santo (..) o governador é agraciado, antes de exercer seu cargo pelos serviços que há de fazer, e é agraciado depois pela participações que deu, sem o governo procurar saber se são ou não verídicas” e vai além, ao afirmar que a “má qualidade de gente que da Europa vem para estas Possessões, é uma das causas do atraso da civilisação delas. Degradados por crimes infames, e homens da mais baixa classe do povo, e que apenas aqui chegados passam a ser notáveis e até oficiais, não podem introduzir bons costumes; antes, pelo contrário, adoptam os de cá, porque favorecem a sua immoralidade.” (72) Apesar disto, as fontes portuguesas o elogiam por seu alegado patriotismo e filantropismo. Honório Pereira Barreto, segundo elas, era dono de “uma das casas comerciais desta província; a que possui talvez mais numerário e a que tem mais crédito nas suas transacções e que o mesmo coronel é o único cidadão desta província que faz sacrifícios pecuniários ao governo sem interesse algum próprio”.(73) Outros elogiavam sua “real inteligência e patriotismo”,(74) assim como seu “acrisolado patriotismo [ao qual] se deve a conservação de alguns dos nossos estabelecimentos da Guiné”.(75)
As razões para tais elogios são patentes: sem nenhum controle efectivo sobre a região, a coroa portuguesa tinha de confiar na iniciativa daqueles que estavam preparados para ocupar postos na administração local e podiam reivindicar certa autoridade diante das populações locais.
Honório Pereira Barreto atribui, enfaticamente, a um preconceito de cor o fato de que seus repetidos apelos não eram levados a sério em Lisboa. Amargamente, reclamava que “parece que a minha cor tem sido o único motivo de não serem atendidos minhas participações, com quanto eu julgue que a verdade e o patriotismo não tem cor”.(76) Negociando intensivamente com dignitários africanos acerca de direitos de terra e tratados de paz, ele criticava aqueles que condenavam essa sua política, pois “julgam que o negro é igual ao macaco”.(77) A despeito do fato de que os habitantes da região estavam sendo seduzidos por nações rivais, os portugueses só os viam como “pretos”.(78) Em seus prolíficos escritos como oficial militar ele fez algumas referências diretas à sua mãe, que respeitosamente chamava de “Dona Rosa Carvalho d’Alvarenga”.(79) Nestes escritos, mostrou grande admiração por ela e pelo gan Alvarenga: “Pela Guiné hei sacrificado minha fortuna, minha saúde, e o que mais é o bem estar da minha família, que idolatro”.(80)
Mas alguns dos aspectos menos palatáveis — por exemplo, aqueles associados ao tráfico de escravos, que era regulado nos tratados entre as nações europeias da época da Conferência de Viena — foram convenientemente omitidos pela historiografia oficial. Os acordos de mãe e filho como comerciantes (de escravos) privados foram completamente obscurecidos por sua carreira política. A evidência de que eram traficantes está contida nos relatórios da comissão anglo-portuguesa encarregada de supervisionar o cumprimento dos tratados que visavam abolir a exportação de escravos da África Ocidental. Eles demonstraram que, a despeito de Honório Pereira Barreto, no final de sua carreira, ter tomado medidas favorecendo a alforria e abolição do tráfico de escravos, ele e a sua mãe tinham traficado escravos em Cacheu nos anos 1830 e ainda na década seguinte.(81) Documentos mostram que a escuna capturada pelas autoridades inglesas, que transportava escravos para as Bahamas, era de propriedade de Ña Rosa, e que a maioria dos escravos estava registada em seu nome e em nome de seu filho.(82) Na verdade, ela tinha deixado instruções escritas para o comandante do navio sobre do que fazer com sua carga. Uma vez que os escravos foram embarcados na calada da noite, e consignados a um traficante privado (norte-americano) operando na costa, a tentativa de enganar os oficiais britânicos tornou-se clara. Por isso, a correspondência britânica sobre o assunto afirma que o estabelecimento-sede da empresa comercial da família em Cacheu “tem sido freqüentemente indicado (...) como um bem notório mercado de escravos”.(83) A despeito do declínio de Cacheu como entreposto de escravos durante a primeira metade do século XIX, a casa comercial Alvarenga-Barreto era, de longe, a maior proprietária de escravos da área na década de 1850. Na ocasião do primeiro censo de escravos, realizado em 1857, a casa comercial possuía 147 escravos, sendo 77 mulheres e 70 homens. O clã Alvarenga tinha 290 escravos em Cacheu e Ziguinchor, o que representava mais de um quarto de todos os escravos registados (1085) destas localidades.(84) Honório Pereira Barreto possuía 61 escravos (47 mulheres e 14 homens), enquanto seus parentes pela linha paterna (os Barreto) tinham 19 escravos. Assim, juntos, eles detinham catorze por cento da população cativa. Os dois clãs controlavam mais de um terço de todos os escravos de Ziguinchor e Cacheu.(85) Enquanto isto, a criação de um conselho municipal em Cacheu em 1850 tinha, finalmente, implementado um decreto real que datava de 1605, e que lhe conferia os direitos de “cidade” e, portanto, uma aura de “respeitabilidade” após ter servido por mais de três séculos como porto de escravos.
Em contraste com a sua mãe, não há evidências de que Honório Pereira Barreto tenha se casado,(86) uma circunstância interessante, convenientemente ignorada por seus biógrafos, que se abstêm de qualquer referência à sua vida privada.(87) Uma fonte chega a admitir que “ele morreu solteiro, mas deixou descendência”.(88) Após o seu desaparecimento de cena, a influência e autoridade que tinha acumulado junto às sociedades africanas, e que conduziam até a mater familias Ña Rosa, foram aparentemente ignoradas pelas autoridades de Lisboa e Cabo Verde, durante a “corrida para a África”, como reconhece um autor: “Por morte de Dona Rosa passou esse grande prestígio para o filho e depois para os descendentes. O que tem perdido, por culpa das autoridades locais, que decidiram resolver os conflitos à força de balas, de preferência à intervenção diplomática dessa família, o que seria muito mais útil à prosperidade da colónia para o aumento do comércio e desenvolvimento da agricultura”.(89)
Conclusões
Um das mais complexas tarefas com que se defronta o pesquisador que tenta reconstruir o impacto do comércio afro-atlântico sobre as sociedades pré-coloniais é, precisamente, a desconstrução de categorias, com base na diferença e desordem omnipresentes nas fontes disponíveis. O que se torna claro, após consultar pilhas de documentos tirados de prateleiras empoeiradas, é que tanto as práticas quanto as representações sofreram mudanças marcantes ao longo dos três séculos do contacto afro-atlântico. O fato de que a interacção social, num sentido intercultural, esteve sempre entranhada nas transacções comerciais, sublinha seu carácter negociado.
Na ausência de um controle externo, processos contínuos de negociação eram factores-chave na construção de redes de parentesco e clientelismo e no estabelecimento de direitos e obrigações recíprocas. Ao mesmo tempo, o comércio era uma fonte de profunda desordem e conflitos resultantes do tráfico atlântico de escravos. Ainda que a troca comercial, sempre em parceria com a conversão religiosa, tenha se tornado o padrão para julgar o “outro” no contexto afro-atlântico, aqueles a ele associados eram vistos diferentemente, em consonância com a cambiante configuração das relações afro-atlânticas. Os comerciantes tanto podiam ser vistos depreciativamente, como inferiores, pela camada aristocrática da Europa pré-industrial, quanto, dos fins do século XVIII em diante, como agentes civilizadores dos povos africanos.
Estas variadas visões estavam directamente relacionadas a mudanças nos padrões de comércio e interacção. Embora fossem a mercadoria mais importante da conexão afro-atlântica até o século XIX, os escravos e a escravidão já eram partes integrantes das sociedades ibéricas e do mundo mediterrânico mais amplo antes da “descoberta” do comércio transatlântico no século XV.(90) O contraponto entre diferentes culturas, tais como o Islã e a cristandade, que abraçaram a escravidão e o tráfico de escravos, foi o ponto de partida e serviu como justificativa para a expansão levada a cabo por Portugal e Castela. A presença de africanos na Europa era silenciada ou demonizada, por exemplo, em Portugal, especialmente após a contra-reforma.(91) Eles também eram os meios pelos quais as relações de poder eram estruturadas no mundo Atlântico, tanto na Europa quanto fora dela.(92) Conflitos engendrados no contexto afro-atlântico iriam estimular fortemente o comércio triangular, o que aumentaria a estratificação baseada no género, parentesco, cor, raça e religião, por meio dos laços constituídos em torno do casamento, concubinato, sujeição por dívida, adopção temporária, rapto e incursões para capturar escravos.(93)
Enquanto os homens atlânticos actuavam como fornecedores de mercadorias tais como ferro, pólvora e álcool, as mulheres africanas eram, sobretudo, vistas como mercadorias que foram integradas nos agregados dos comerciantes como escravas e concubinas. Por isto, não é coincidência que aquelas mulheres africanas que obtiveram notoriedade e fama fossem todas beneficiárias do status de livre, agissem como cabeça da família, possuíssem e dirigissem casas comerciais e não estivessem inibidas por obrigações conjugais. Consequentemente, elas não tinham de se encaixar nas vigentes noções patriarcais de empreendimento, nem precisavam se adequar aos padrões de relações hierárquicas baseadas na escravidão.
Ainda que inseridas num espaço africano amplo, elas, quando viúvas, por estarem no contexto específico das povoações afro-atlânticas, conseguiram escapar ao levirato e escolher os seus parceiros, ou constituir a sua própria linhagem, sem intervenção dos seus pares. Actuando como comerciantes e indivíduos por seu próprio direito, e extraindo grande autoridade de suas relações de parentesco com linhagens governantes, elas emergem das fontes como poderosas atrizes num mundo aparentemente dominado pelos homens. Tidas, primeiramente, como ameaça aos poderes instalados, as ñara, com o tempo, passaram a ser vistas como uma benção. No momento em que os produtos agrícolas apresentaram-se como uma alternativa viável aos escravos, a situação mudou: as mulheres africanas comerciantes tinham, agora, acesso à terra e ao seu usufruto, exercendo, então, elas próprias, o controle sobre a produção, e ganhando“legitimidade” no processo. O fato de que tenham se aliado a influentes homens atlânticos estrangeiros foi crucial para a sua recém adquirida “respeitabilidade” e a de seus filhos, então também em função das noções raciais. Claramente, os nacionalismos emergentes no contexto colonial — note-se a patente conotação feminina de nacionalidade, em contraste com a ideologia masculina construída em torno da noção de cidadania — ampliaram a importância da conexão “luso-africana”, a ponto de, nesta, serem aceites grupos sociais e indivíduos que, até então, tinham sido excluídos.
O pouco que tem sido escrito sobre as relações interculturais na região joga alguma luz sobre as diferentes valorações acerca das parcerias acima descritas e sobre o seu significado para a história social da interacção e troca afro-atlântica. As abordagens extrapoladas a partir das fontes escritas diferem, claramente, entre si, de acordo com o período considerado: enquanto Bibiana e seu irmão foram acusados de auxiliar a expansão de interesses não-portugueses na região, Ña Rosa e seu filho foram elogiados por fazerem exactamente o inverso. Enquanto a oposição à interacção entre governantes africanos e comerciantes atlânticos marca fortemente as fontes do século XVII, a cooperação entre as duas partes foi advogada no século XVIII. Enquanto as acções de Ña Bibiana e seus parentes foram vistas como fomentadoras da disrupção, a autuação de Ña Rosa e seu filho foi tida como preventiva e pacificadora de rebeliões, além de mediadora de conflitos. Enquanto o tráfico do gan Vaz foi condenado, o do Alvarenga foi tolerado, ou simplesmente ignorado. Enquanto as propriedades de Ña Bibiana, que ficavam fora do alcance das autoridades portuguesas, levaram estas a vê-las com grande suspeita, a fazenda pertencente a Ña Rosa, localizada numa rota de contrabando, foi tida como um empreendimento elogiável. Enquanto o papel de Ña Bibiana, considerada uma madrasta ruim, foi vituperado, a reputação maternal de Ña Rosa foi positivamente avaliada. Enquanto a longa carreira administrativa e comercial (bem sucedida desde os anos 1730) de Ambrósio, irmão de Ña Bibiana, recebeu escassas menções devido à sua atitude crítica às políticas portuguesa, a de Honório Pereira Barreto, filho de Ña Rosa, foi saudada como um grande exercício patriótico, a despeito de ele ter, publicamente, denunciado a séria falência de tais políticas.
Todavia, num outro nível da análise, certos denominadores comuns também aparecem. O perdão que as autoridades portuguesas estenderam a Ña Bibiana, seu irmão e seu primo evidencia um senso de “força maior” frente às relações de poder na região, da mesma forma que os seus esforços para reconhecer e valorizar os contactos de Ña Rosa e seu filho. O reconhecimento implícito do poder e da influência do gan Vaz, que estava bem entranhado nas comunidades africanas, tornou-se explícito no reconhecimento da autoridade derivada da descendência africana por parte do gan Alvarenga, e sobretudo a de Ña Rosa e seu filho.
Em ambos os casos, factores externos ditaram as atitudes. Ao mesmo tempo, as tradições orais da região sugerem que, entre as comunidades kriston, estas mulheres eram veneradas como “mindjeres garandis” (kriol: mulheres grandes) e matriarcas de um poder hegemónico no passado. A crescente influência de outras nações europeias na região, no século XVII, que pôs fim ao efectivo monopólio de Portugal sobre o comércio de mercadorias e escravos no âmbito regional e Atlântico, e a sua renovada penetração no século XIX, foram determinantes para a aquiescência mostrada diante dos clãs locais e de seus negócios. A confusão política e económica que afectou Portugal após o período da dominação de Castela (1580-1640), a independência do Brasil e a revolução liberal nas primeiras décadas do século XIX também desempenharam um papel importante na definição de atitudes e políticas.
As intervenções e visões contidas nas fontes localmente produzidas, tais como os relatórios de governadores e as petições das comunidades mercantis, ilustram claramente esta ambivalência, que caracterizou as representações no período pré-colonial. A despeito de lacunas na produção histórica sobre a região, as actividades do que tem sido chamada de camada “luso-africana” e as suas relações com as sociedades africanas têm produzido, nas últimas décadas, uma crescente literatura sobre as áreas de presença lusófona na África. Estes grupos, usualmente vistos como híbridos e intermediários, foram objecto de considerável confusão por parte dos observadores atlânticos, e mesmo os escritos históricos mostram dificuldades em lidar com eles. O fato de que viviam em casas rectangulares avarandadas, muitas vezes pintadas com cal (feito com conchas de ostras), construídas junto às margens dos rios, enquanto seus vizinhos moravam em cabanas circulares feitas de barro, tem sido tomado como um indicador de sua identidade enquanto grupo.(94) A categoria “luso-africano” foi, também, extrapolada das fontes dos viajantes a fim de dar-lhes uma aura de “etnicidade” que transcendia as categorias culturais existentes até então: português ou africano.(95) Outros, entretanto, deram grande ênfase à sua eficiente mobilidade espacial e social, movendo-se entre rios e riachos, e entre diferentes camadas sociais, assim como sua diversidade cultural e social.(96) Do mesmo modo que muitos outros agentes operando no solo africano, eles foram descritos como “hóspedes”, residindo em lugares indicados para este propósito pelos senhores da terra, isto é, pelas linhagens governantes, às quais eles deviam fidelidade em troca de protecção. A este respeito, a afirmação de sua condição liminar no contexto Atlântico foi a pré condição para o seu sucesso comercial em costas africanas.(97)
A necessidade de assentar sua presença e suas atividades nas comunidades africanas das quais estas mulheres emergiam, e em cujo tchon (chão, território) com elas coabitavam, é ainda mais importante. O fato de que eram comerciantes, e não agricultores, uma circunstância que,  muitas vezes, tem sido negligenciada, é fundamental. Tal como qualquer outro comerciante local, eles tinham de pagar um tributo, ou daxa, aos seus anfitriões e parentes por cada transacção e travessia em território indígena.
Eram obrigados a receber e a servir aos seus anfitriões e parentela, caso os primeiros assim o quisessem. Embora se beneficiassem da protecção, também ao nível espiritual, fornecida pelas linhagens dirigentes, estavam sujeitos às mesmas leis aplicadas a outros hóspedes e camadas profissionais.
Laços entre eles e seus vizinhos e clientes eram reforçados pela kriason, ou seja a adopção temporária para criar e educar filhos alheios, e a kuñadundadi ou relações entre parentes colaterais. Menos do que integrar uma categoria “luso-africana” abstracta, eles pertenciam às comunidades kriston, que constituíam o verdadeiro núcleo dos estabelecimentos afroatlânticos. Diferentemente do principal escol dos gan, que falava crioulo cabo-verdiano, a sua linguagem nativa era o kriol, ou crioulo guineense. Era usada como a “língua franca” das transacções comerciais, embora eles também tivessem controle sobre uma linguagem “étnica”, a qual evocava as suas raízes sociais e culturais externas aos povoamentos comerciais: um membro da comunidade kriston de Cacheu podia ter ancestrais Papel, e um seu equivalente de Ziguinchor podia, invariavelmente, reclamar seu parentesco com os Bañun. Dependendo de suas relações com as linhagens que detinham direitos ancestrais sobre a área do assentamento, eles podiam reivindicar propriedades e posições, obtendo influência em relação a seus pares e clientes. O fato de que os padrões de descendência das comunidades africanas com as quais estavam relacionados eram predominantemente matrilineares, e de que eles próprios aderiram a práticas bilaterais, implicou em contradições com as tradições patrilineares comuns no Atlântico norte.
Um dos principais obstáculos à interacção afro-atlântica foi, precisamente, a questão do controle sobre a exploração do comércio e, sobretudo, os privilégios concedidos ao parentesco colateral matrilinear, em detrimento da linhagem patrilinear. A duradoura ambivalência no tocante às relações de parentesco e género em um contexto intercultural assume um significado claramente definido, quando ancorado em relações de poder locais.
O fato de que a transferência e o controle dos recursos deu-se segundo o padrão matrilinear no caso de Ña Bibiana, embora aparentemente em conformidade com o costume patrilinear no caso de Ña Rosa, é fundamental para compreender o tratamento diferenciado dado a cada uma delas nos documentos escritos. No século XIX, os gan gradualmente evoluíram para unidades crescentemente autónomas, aparentemente auto-suficientes, embora fortemente entrelaçadas entre si.(98) Como consequência da imigração cabo-verdiana, os novos gan, que cresceram, sobretudo, em Bissau, privilegiaram os laços com o arquipélago à custa de suas raízes entre os povos do litoral.(99) As suas estratégias de acumulação, aceleradas pelo crescimento das pontas, também contribuíram para isso, devido ao grau de endividamento, ficando eles, deste modo, à mercê de capitais europeus, nomeadamente franceses.
As grandes mudanças ocorridas a partir dos anos trinta do século XIX provocaram fluxos migratórios entre as comunidades africanas, dentre as quais a Balanta, Fula, Manjaku e Mankañe, especializadas em culturas de exportação: mankara ou amendoim, coconote ou caroço de palmeira, algadon ou algodão, e buracha ou borracha, e também arus ou arroz. Porém, as comunidades que tinham estado profundamente envolvidas no tráfico de escravos, tais como a Bañun, Biafada e Mandinga, perderam terreno. Como consequência, os padrões de aliança e os arranjos de parentesco transformaram-se durante o século XIX, visto que os dois povos mais numerosos, isto é, os Balanta e os Fula, eram patrilineares.(100) A ocupação da região da África Ocidental pela ação militar européia reforçou ainda mais a redefinição das relações entre os gan, os kriston e os povos do litoral. Em vez de mediação, os poderes europeus confiaram na força armada para criar estados coloniais. Esta estratégia teve o efeito de quebrar a autonomia não só das sociedades africanas, mas também dos gan e dos kriston das praças. As medidas baseadas na segregação segundo linhas raciais e na nacionalização, ou “lusitanização”, do comércio, visavam reduzir ou excluir estes grupos das receitas geradas pela economia de extracção e plantação. A crise económica provocada pelos conflitos armados na região e pelo quase desaparecimento das pontas, nos anos oitenta do século XIX, que deixou o tecido empresarial muito enfraquecido, facilitou grandemente esta tarefa.
Os inúmeros impedimentos à mobilidade espacial e social — a “marca registada” das comunidades afro-atlânticas — que daí resultaram tiveram um forte impacto sobre as relações de género. A imposição de conceitos racistas e patriarcais na legislação marginalizou, efectivamente, as mulheres africanas, limitando as suas opções a estratégias de sobrevivência, e pondo fim às parcerias de acumulação como aquelas acima referidas. Mas estas mudanças vão além do escopo deste ensaio.
Hierarquias de poder e autoridade desempenharam um papelchave em termos de discurso. Além de género e parentesco, a questão da cor e da raça também é muito importante na formulação de representações. Enquanto os dignitários africanos aparecem como actores estratégicos nas representações, o mesmo não ocorre com os seus súbditos.
Enquanto os representantes do estado e da igreja, eles próprios autores da maioria das fontes, são destacados, a maioria dos habitantes dos povoamentos comerciais, ou seja, os escravos, é geralmente ignorada.
Como consequência, viúvas vivazes e aventureiros astutos parecem dominar a cena, quer como “bodes expiatórios”, quer como aliados, dependendo da época.(101) A população escrava e servil foi, geralmente, ignorada, pois era vista como mercadoria e não como pessoas. E, ao contrário, aqueles que possuíam escravos, ou seja, os comerciantes, funcionários e clérigos, garantiram o seu lugar na historiografia afro-atlântica.
Enquanto as fontes do século XVII identificam todos os atores, incluindo o marido de Ña Bibiana, como “pretos”, Ña Rosa, seu marido e seu filho são, todos, descritos como “de cor” ou “mestiços”.
Com o tempo, a “paleta de cores” usada para descrever o “outro” torna-se cada vez mais diversificada. O significado do padrão de miscigenação iria mudar nos séculos XVIII e XIX, como resultado da classificação biológica e dos conceitos eugénicos. Além disto, o “outro”, aqui formado pela camada de crioulos ou mulatos vindos de Cabo Verde, tinha passado a ocupar posições de poder político, capacitando-se, consequentemente, a produzir, também, fontes “oficiais”. O “outro”, do ponto de vista Atlântico, muda consoante os tempos. O constante vai-e-vem entre Cabo Verde e as terras continentais guineenses — e não o influxo, sempre mínimo, de europeus, nem mesmo o de africanos, em sua maioria cativos — é que foi tomado como referência fundamental para a historiografia dos povoamentos comerciais. Só assim pode se explicar a tese de que os impulsos de mudança vinham exclusivamente do exterior, sobretudo de Cabo Verde.(102)
Como vimos, questões de género, parentesco e classe estão intimamente relacionadas a isto: o fato de que os parceiros dessas mulheres se originavam ou localizavam sua ascendência em Cabo Verde, e de que eles detinham importantes postos administrativos no governo local reflectiu-se na força e fama atribuídas a estas mulheres. E se a própria mulher, como foi o caso de Ña Rosa, podia ligar sua estirpe ao arquipélago e, portanto, a distantes antepassados portugueses, sua “respeitabilidade” nunca seria posta em dúvida.
As parcerias discutidas acima ilustram as variadas configurações destas relações, que tinham implicações, tanto no âmbito do empreendimento mercantil, quanto pessoais. Elas abrangiam desde relações de parentesco com as linhagens matrilineares dirigentes até alianças bilaterais entre gan ou clãs mercantis. Esses laços interculturais incluíam extensas redes de clientelismo, que garantiam a acumulação de riqueza e influência política. Aqueles sem acesso a estes privilégios estavam, claramente, em desvantagem; na verdade, a maioria deles nunca chegou às fontes escritas. Aqui, então repousa, provavelmente, a mais importante distinção entre os membros dos gan Vaz e Alvarenga, de um lado, e a maioria dos habitantes dos povoamentos mercantis e aldeias africanas, de outro, ou seja, os primeiros controlavam uma parte significativa do comércio afro-atlântico e obtiveram uma mobilidade espacial e social que era inatingível para a maioria de seus compatriotas africanos. O fato de que os líderes dos clãs em questão tenham sido mulheres e viúvas foi outro elemento que demonstrou a directa correlação entre descendência matrilinear, famílias matrifocais e o comércio afro-atlântico. Ao desafiar as vigentes concepções androcêntricas acerca de relações sociais, tais mulheres contribuíram decisivamente para a existência de um “Atlântico no feminino” na historiografia sobre a região.(103) Finalmente, em termos demográficos, os povoamentos comerciais foram sempre caracterizados por ampla predominância feminina, mesmo que este fenómeno só se tenha comprovado no século XVIII, devido aos avanços da estatística.
Isto, não obstante ter sido somente após a morte de seus maridos que tais mulheres emergiram da sombra para obterem evidência na cena Atlântica, e assim assumir um papel autónomo nas fontes escritas.
A fim de entender as mudanças acima discutidas, é imperativo que a história social de tais encontros afro-atlânticos seja estudada com mais detalhes. Para suprimir lacunas nos escritos históricos, a documentação dos arquivos e os relatos de viagem têm de ser relidos e recuperados.
Além disso, tais fontes devem ser analisadas a partir de uma perspectiva interdisciplinar, que combine as tradições históricas e antropológicas.
Só então os vectores da expansão política e económica, que governaram as fontes, poderão ser contrabalançados por processos de socialização e aculturação. Os dois estudos de caso discutidos acima mostram que, com certos limites impostos pela natureza das fontes materiais, tal abordagem pode alterar de maneira significativa as configurações economicistas associadas à historiografia Atlântica e ir além dos localismos restritos da antropologia, ao esboçar uma dinâmica intercultural até então desconsiderada ou ignorada.
51 AHU, 1ª secção, Guiné, Cx. 21, 22-10-1814
52 AHU, Guiné, Cx. 22, 4-5-1819
53 AHN, CV, Secretaria Geral do Governo, A6/4, 24-1-1824
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54 AHU, 1ª secção, Guiné, Cx. 22, ant. a 31-10-1823.
55 José Conrad Carlos de Chelmicki & Francisco Adolfo de Varnhagen, Corografia Cabo Verdiana ou Descripção Geographica Histórica da Provincia das Ilhas de Cabo e Verde e Guiné, 2 vols, Lisboa e Cunha, 1841; op cit, vol I, p. 184.
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56 Bertrand Bocandé, “Sur La Guinée Portugaise ou Sénégambie Meridionale”, Bulletin de la Societé de Geographie de Paris, 3e serie, T.II (1849), p. 315.
57 Bertrand Bocandé, “Sur La Guinée Portugaise ou Sénégambie Meridionale”, Bulletin de la Societé de Geographie de Paris, 3e serie, T.II (1849), p. 315.
58 Chelmicki, Corografia, I, p. 109
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59 Chelmicki, Corografia, I, p.107
60 Jaime Walter, Honório Pereira Barreto, Bissau, Centro de Estudos da Guiné Portuguesa, 1947, p. 12.
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61 Cristiano José de Senna Barcellos, Subsídios para a História de Cabo Verde e Guiné, 5 vols., Lisboa, Typ. da Academia Real das Sciencias, 1899-1913, II, Parte 3, p. 159.
62 Boletim Oficial de Cabo Verde, no 2, 23-3-1855.
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63 Ibidem, p.348
64 Veja Christian Roche, “Ziguinchor et son passé (1645-1920)”, Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, XXVIII, 109 (1973), pp.35-59.
65 AHU, 1ª secção, Guiné, Cx. 23, 18-12-1828
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66 É interessante notar, nesse contexto, que o mesmo governador Marinho teve uma postura muito dura acerca do casamento misto e da miscigenação entre “pretos e mulatos”, sublinhando a necessidade de “branquear” a população de Cabo Verde, a fim de evitar que “as famílias desta Província retrogradem para a raça Africana”. AHU, CV, Pasta 3, 11-12-1838.
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67 Januário Correia de Almeida, Um Mez na Guiné, Lisboa, Typ. Universal, 1859, p. 23
68 As suas críticas faziam eco àquelas feitas pelo então deputado Alexandre Herculano nas Cortes poucos anos antes; vide Luciano Cordeiro, “A Questão da Guiné num discurso de Alexandre Herculano”, in Obras de Luciano Cordeiro, I, Questões Coloniais, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1934: pp. 633-662.
69 AHU, 2ª secção, Cabo Verde, Pasta 3, 5-4-1837
70 Barreto, Memória, p. 9
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71 A despeito de sua origem, ele sempre aconselhou Lisboa a nunca indicar um residente local, pois isto poderia facilitar abusos: “todos, sem excepcçao são negociantes; e de tal lugar só servirá para o exercerem em seu proveito”. Idem, Ibidem, pp. 47-8.
72 Ibidem, pp. 37-8 e 41-2
73 AHU, 2ª secção, Cabo Verde, Pasta 3, 11-3-1838
74 AHU, 2ª secção, CV, Pasta 21, 11-5-1856
75 Almeida, Um Mez na Guiné, p. 24
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76 AHU, 2ª secção, CV, Pasta 23, 27-2-1857
77 AHU, 2ª secção, CV, Pasta 23, 5-5-1857
78 AHU, 2ª secção, CV; Pasta 23, 27-2-1857
79 AHU, 2ª secção, CV, Pasta 22, 28-7-1856
80 AHU, 2ª secção, CV, Pasta 23, 29-5-1857. É possível que o tom amargo, que se torna habitual na segunda metade dos anos cinqüenta, esteja associado à morte da sua mãe.
81 ANTT, Fundo do Ministério de Negócios Estrangeiros , Cx. 224, Comissão Mista de Serra Leoa (1819-1857), Comissão de Cabo Verde, Of. 12, Boa Vista, 17-2-1844. .
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82 Public Records Office (PRO), London, PRO/FO, 84/117. Dados gentilmente fornecidos por João Pedro Marques. Para uma perspectiva histórica da abolição no contexto português, vide Marques, Os Sons do Silêncio, op. cit.
83 Ibidem.
84 AHU, Fundo do Governo da Guiné, Livro 35
85 Os Alvarengas baseados na ilha de Santiago, em Cabo Verde, também possuíam escravos, embora em número muito menor; vide os dados do censo de escravos de 1856 em António Carreira, Cabo Verde; formação e extinção de uma sociedade escravocrata (1460-1878), Bissau, Centro de Estudos da Guiné Portuguesa, pp. 512-20. Honório Pereira Barreto também possuía dois escravos na ilha de Santiago (Carreira “Cabo Verde”, p. 519), e parentes dos dois “gan” possuíam cerca de trinta escravos. Na época, o maior proprietário de escravos do arquipélago tinha pouco mais de 50 escravos, enquanto os ricos comerciantes da Guiné podiam possuir centenas de escravos. O número total de escravos registrados no arquipélago era de 5.182, três quartos dos quais em Santiago e Fogo.
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86 Sobre a origem dos gan guineenses, veja George E. Brooks, “Notas Genealógicas de
Proeminentes Familias Luso-Africanas no Século XIX na Guiné”, Soronda, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa (INEP), Bissau, 9 (1990), pp. 53-71.
87 O fato de que só os filhos de sua irmã, Maria Pereira Barreto, casada com o funcionário e comerciante guineense Cleto José da Costa, foram considerados como seus únicos sucessores legais poderia confirmar isto. Arquivo Histórico Nacional, Praia, Cabo Verde, Secretaria Geral do Governo, A6/9, Guiné: 21-8-1878.
88 Barreto, História da Guiné, p. 241. Seus descendentes directos, embora “ilegítimos”, (todos homens), foram Rufino António Barreto, Pedro Pereira Barreto, Ludgero Pereira Barreto, Ernesto Pereira Barreto e Heitor Pereira Barreto; eram caixeiros e “nenhum deles possuía qualquer meio de riqueza” AHU, Lisboa, Cabo Verde, Pasta 51, 30-9-1871.
89 Senna Barcellos, Subsídios para a História, II, 3ª parte, p. 159
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90 Isabel M.R. Mendes Drumond Braga, Mouriscos e Cristãos no Portugal Quinhentista: duas culturas, duas concepções religiosas em choque, Lisboa, Hugin, 1999; I.O. Hunwick, “Black Slaves in the Mediterrenean World: introduction to a neglected aspect of the African diaspora”, in: Elizabeth Savage The Human Commodity: perspectives on the Trans-Saharan Slave Trade, London, Frank Cass, 1992, pp. 5-38.
91 A.C. de C.M de Saunders, Escravos e Libertos Negros em Portugal (1441-1555), Lisboa, Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1994; e também José Ramos Tinhorão, Os Negros em Portugal: uma presença silenciosa, Porto, Ed. Caminho, 1997.
92 Boxer, Relações Raciais no Império Colonial Português; vide também John Thornton, Africa and Africans in the Making of the Atlantic World, 1400-1680, Cambridge, Cambridge University Press, 1992.
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93 White, Women in West and West-Central Africa, p. 70.
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94 Peter Mark, “Constructing Identity: sixteenth and seventeenth century architecture in the Gambia-Geba region and the articulation of Luso-African identity”, History in Africa, 22 (1995), pp. 307-27, e também do mesmo autor “The Evolution of Portuguese Identity: Luso-Africans on the Upper Guinea coast from the sixteenth to the nineteenth century”, Journal of African History, 40 (1999), pp. 173-91.
95 José da Silva Horta, “Evidence for a Luso-African Indentity in Portuguese Accounts on Guinea of Cape Verde (sixteenth to seventeenth centuries)”, History in Africa, 27 (2000), pp. 99-130.
96 George E. Brooks, Perspectives on Luso-African Trade and Settlement in the Gambia and the Guinea Bissau region, 16th to 19th centuries, Boston, African Studies Center Working Papers, 1980 e do mesmo autor “Historical Perspectives on the Guinea Bissau region, fifteenth to nineteenth centuries”, in: Avelino Teixeira da Mota: In Memoriam, Lisboa, Academia da Marinha (1987), pp. 277-304; vide também Jean Boulègue, “Les Luso-Africains de Sénégambie”, op. cit.
97 Carlos Alberto Zerón, “Pombeiros e Tangomãos: intermediários de escravos na África”, in: Rui Manuel Loureiro & Serge Gruzinski, Passar as Fronteiras, (Centro de Estudo Gil Eanes, Lagos, 1999), pp. 15-38.
98 Um autor, Wilson Trajano Filho, situa esta mudança nos anos sessenta do século XIX; vide Wilson Trajano Filho ‘Polymorphic Creoledom: the ‘creole society of Guinea Bissau’, tese de doutoramento, não publicada, University of Pennsylvania, 1998.
99 As subscrições para o auxílio aos habitantes de Cabo Verde, em que Trajano Filho se apoia como indicadores para o crescente entrelaçamento e homogeneidade dos gan, ilustram claramente esta kambansa (Kriol: viragem) e reorientação para o exterior. Só um século mais tarde, os gan se viram obrigados a reatar os laços com as sociedades guineenses no litoral durante a campanha de mobilização e a luta pela libertação, liderada pelo PAIGC (Partido de Independência de Guiné e Cabo Verde).
100 No caso dos Fulas, eram os Fula-Djiábe, cativos originários dos Soninké e Biafada, que, progressivamente islamizados pelos Futa-Fula ou Fula-Ríbe vindos do Futa Djallon, adotaram tradições partilineares; vide Joye Bowman, Ominous Transition: commerce and colonial expansion in the Senegambia and Guinea, 1857-1919, Alderhsot, Averbury, 1997.
101 Philip J. Havik, “Merry Widows and Wily Traders: negotiating gender and kinship in the Afro-Atlantic connection”, inédito apresentado na conferência “Negotiating Moralities: changing state, changing securities”, 15-17/06/1998, Centre of African., Asian and American Studies (CNWS), Leiden.
102 Fausto Duarte, “Os Cabo-verdianos na Colonização da Guiné”, Boletim Geral das Colónias, 295,1950, pp. 209-11; vide também António Carreira, “A Guiné e as Ilhas de Cabo Verde: a sua unidade histórica e populacional”, Ultramar, ano VIII, vol. XIII, 4, 1968, pp. 70-98.
103 Ver Selma Pantoja, “O Atlântico no Feminino”, Cultura de Sociedade, Ed Paralelo 15, Brasília.
Fonte: Philip J. Havik. A DINÂMICA DAS RELAÇÕES DE GÊNERO E PARENTESCO NUM CONTEXTO COMERCIAL: UM BALANÇO COMPARATIVO DA PRODUÇÃO HISTÓRICA SOBRE A REGIÃO DA GUINÉ-BISSAU SÉCULOS XVII E XIX. Afro-Ásia, número 027, Universidade Federal da Bahia, Bahía, Brasil  
1800/01/07
Dr. Roque Francisco Furtado Mendonça nomeado ouvidor em 7 de Janeiro de 1800.
1800/03/00

JOSÉ JOAQUIM DE SOUSA TROVÃO nomeado comandante do Cacheu em Março 1800, manteve-se em Portugal , durante a Guerra das Laranjas (Fevereiro a Setembro 1801 ) e não assumiu o comando até Janeiro de 1802. Fazendo um balanço após sua chegada, Trovão informou que nenhuma oferta vasos tinha chegado por um ano e meio, os soldados não haviam sido pagos por um ano , e as fortificações e habitações estavam em estado ruinoso por falta de pedra e cal para fazer reparos . Ele reclamou que ele não tinha carpinteiros e a madeira necessária para substituir as carruagens arma para montar canhão. Estas alegações foram patentemente falsas: cal foi rotineiramente feitas pela queima de conchas de ostras coletadas de sambaquis, havia extensas florestas de madeira na Guiné , e os comerciantes residentes tiveram ferreiros experientes que trabalham em seus compostos. Em março de 1805, observações excludentes de Trovão foram repetidas por seu sucessor, José Antonio Pinto, que também reclamou da falta de ferreiros, carpinteiros e pedreiros, afirmando que degredados enviados para Guine não possuem essas habilidades (Cx. 16 , 17, 18 , AHU ).
1800/03/10
Alvará declarando e ampliando o de 19 de Setembro de 1761 para que os escravos que viessem ao porto de Lisboa, e aos mais deste reino em serviço de navios de comércio, ou o sejam dos donos dos naviàs, ou das pessoas que andam a bordo deles, ou residam no ultramar, e os queiram trazer a ganho, não possam gozar da faculdade que o dito alvará concede de ficarem livres, mas sim tenham de tornar a embarcar como escravos. Portugal, Torre do Tombo, Chancelaria régia,Núcleo Antigo 34, f. 125v.
1800/04/04
«Em 25 de abril participou o governador ter fundeado na Praia, em fins de março, uma frota ingleza composta das fragatas Melpomene e Magnanimo e da nau Bubg, sob o commando do commodoro Carlos Hamilgton, comboiando os navios mercantes Leandro, Gambia, Carlota, 7'Aame1, Anderason e Nancy. armados em guerra, destinando-se essa divisão naval â costa para castigar os francezes. Essa divisão íungleza na Praia ás onze horas da noile, e como em terra se julgasse ser franceza ordenou o governador que sobre ella se fizesse fogo. Como ella não respondesse ao primeiro tiro e se visse uma lancha com pharoes a caminhar para terra, correu gente 4 praia e reconheceu-se então a nacionalidade do navio. O governador desculpou-se com o commodoro; este solicitou-lhe um emprestimo de dinheiro para o sustento da sua gente, e como os corres da província estavam quasi limpos conseguiu-se o dinheiro dos particulares.
Em 19 de março seguiu essa divisão naval em direcção â costa, e em 4 de abril fundeara em frente da ilha de Goré, que estava fortiftcada pelos francezes.
O commodoro Ramilgton intimon logo o commandante d'essa Praça para a entregar; este, andando com evasivas, pedia um praso para se resolver.
O dia estava muito encoberto pelo d4'nso nevoeiro causado pelas areias do deserto, e de terra julgava-se a força ingleza muito maior do que era; os fraocezes abandonaram a Praça logo aos primeiros tiros da divisão naval, e is onze horas da noite desembarcava em Gorê uma força de USO homens, que arvorou a bandeira ingleza. Um onico tiro booTe da parte dos francezes ao desembarcarem os inglezes, tiro que feriu um segundo tenente, commandante da mesma, e que ficou sendo da Praça, com 90 homens de guarnição.
Os ranezes abandonaram na Praça 90 barris com polvora, 38 peças de calibres 19 , 18, 11, 9 e 6, e muitos petrechos de guerra; deixaram no porto tres pequenas embarcações mercantes, que os inglezes tomaram.
O commodoro mandou a nao Ruby para Santa Helena e as doas fragatas, comboiando os navios mercantes, para a costa do Ouro, depois de apprehenderem as fragatas francezas, que tinham saqueado à farta as ilhas de Cabo Verde e os estabelecimentos inglezes da Gambia.» -
Subsídios para a História de Cabo Verde e Guiné,  por Christiano José de Senna Barcellos,  parte III, pgs. 159-160, Lisboa, 1906
1801
João Barreto alude a Nozolini a páginas 205 e 206, em "História da Guiné" (1418-1918),(1) ao dizer:
·• ... Descendenre de uma família europeia, fixada em CaboVerde, Caetano Nozolini nasceu na ilha do Fogo em 1801.Começou a sua carreira na vida militar... mas dedicou-se sobretudo ao comércio, não obstante ser proibido por lei aos militares terem casas comerciais... ". E, adiante, reconhece que "não pode dizer-se que tivesse mantido (2) sempre uma linha de conduta irrepreensivel ... ". reconhecendo o autor que CAETANO JOSÉ NOSOLINI “... no entanto prestou alguns serviços à colónia, graças sobretudo às suas relações com a rainha dos Bijágós, chamada Aurélia, com a qual acabou por casar: A colónia (3) formada em Bolama era dirigida por Aurélia,que desta forma centralizava ali o comércio com os Bijagós. Ao mesmo tempo em Bissau vivia uma sua irmã de nome Júlia. (4)"…"Estas relações nào só contribuíram para a prosperidadeda casa Nozolini, mas também ajudaram a consenvar o sossêgo local, afastando as veleidades de revolta da parte dos Bijagós e ainda das outras tribus. ".
(1)  Editado em Lisboa em 1933.
(2)   De seu nome completo Caetano José Nozolini.
 (3) Sita na Ilha de Bolama, na zona da Ponta Oeste, foi fundada por Caetano Nozolini, com a ajuda de Aurélia Corrêa, a qual era, no dizer de João Barreto, chamada vulgarmente rainha de Orango. Viveu em Bolama na Ponta Oeste ou Bolama de Baixo e Bissau onde faleceu em 1882, como se comprova pelo anúncio publicdo no B. Oficial n.º 28 e 29 da Província da Guiné, respectivamente de 05 e 12 de  Agosto desse ano.
(4) Em "África Occidental, Notícias e Considerações”,.. editado em 1864. há uma planta topográfica de Bissau, desenhada por Francisco Travassos Valdez. a qual foi reproduzida por Sant' Anna Barreto na obra supra referida e onde se vê, no enfiamento da porta da fortaleza da Amura e virada ao rio, o Largo da “Mãe Júlia”.
MANOEL HENRIQUES DE CARVALHO era urn soldado da Baía, donde desertou. Foi enviado para Bissau, onde em Junho de 1801 foi promovido a tenente. Em Julho - Agosto de 1804 era capitão de artilharia, quando obteve um passaporte para fazer uma convalescença na Baía, levando com ele a mulher, uma filha e urn criado chamado Joaquim. A passagem por Lisboa, pediu insistentemente ao Conselho Ultramarino que o nomeassem comandante da Praça de Geba, aonde voltou em fins de Maio de 1805. Voltou ao seu comando de Geba em 10 de Fevereiro de 1806.
A actividade crescente de potugueses e luso- africanos que vivem em Ziguinchor aparentemente provocam conflitos esporádicos com os vizinhos Banhuns e Balantas, Em 1787 os habitantes de Ziguinchor lutam com as comunidades Banhuns próximas. Durante a última parte do século XVIII grupos Balanta avançam ao longo da margem sul do meio Casamança, conquistando território Banhun. Por um tempo, as relações luso-safricanas com Balanta vivendo rio acima foram pacíficas, permitindo o comércio ininterrupto com os mandingas do império Kaabu . Mas as circunstâncias mudaram por volta de 1800 , quando os Balantas de Sandegu (ou Conjudu ) começaram a saquear embarcações. Em 1801, em resposta a um apelo de MANUEL DE CARVALHO ALVARENGA, o comandante do Cacheu, MANUEL PINTO DE GOUVEA , enviou uma força de dezessete embarcações fluviais para combater os Balanras. Vale ressaltar que a expedição viajou por água em vez de terra, a uma distância de apenas 40 quilómetros. A expedição contra os Balantas não teve sucesso e foi o assunto de muita recriminação, especialmente em relação a JULIÃO MENDES, um alferes na guarnição Ziguinchor, que foi acusado de traição por ter avisado os Balantas do ataque e vender pólvora e balas. Mendes havia sido um escravo pertencente ao nhara MARIA JOSEFA. Este foi o último caso registado de assistência militar enviada do Cacheu ao Casamança ( CX. 15 , 16, 18 , 19, AHU ; Barcellos 1899-1913 : 3:162-165 ) .
«Em principios de 1801 , sendo commandante da Praça de Zeguichor Manuel de Carvalbo Alvarenga, a qual era dependente da Praça de Cacheu, que tinha por governador Manuel Pinto de Gouveia, atacaram repentinamente os gentios de Sandegú, proximo a Zeguichor, umas embarcações mercantes portoguezas que se achavam na costa a negociar.
O commandanle de Zeguichor deu conhecimento d'este racto ao governador de Cacheu, e este mandou logo um gentio, velho e prudente, amigo dos portuguezes, para ir a Sandegú saber o motivo das hostilidades, respondendo os gentios inimigos que não o attendiam.
Em vista da resposta ordenou o governador que se lhes désse um assalto, ficando elles derrotados e aprisionando-se alguma gente. Durante algum tempo ficaram mansos e subjugados, até qoe traiçoeiramente tornaram a ataear as embarcações, matando e aprisionando alguns marinheiros.
O governador de Cacheu mandou então preparar dezesete canôas, tripuladas por senhores e escravos, com munições de bocca e· de guerra, qne seguiram para Zeguichor, e alli com o au1ilio do gentio visioho, auxiliares, se organisou a expedição, que devia marchar sob o maior segredo.
Fõra encarregado de uma das canôas Julião Mendes, alferes da eompanhia do capitão Francisco Rabaça, do corpo de infantaria de Zeguichor, sem vencimento, o qual conseguira essa patente do ex-governador de Cacheu, Farim e Zeguicbor, Lopo Joaquim de Almeida Henriques.
Julião Mendes tinha sido escravo de Maria Josepha, e esta havia-lhe dado a carta de alforria em 20 de novembro de 1799.
Havia portanto pouco tempo que elle tinha deixado a condição servil para ter a patente de official e por isso não lhe causava repugnancia commetter o crime de traição. Mandara elle avisar ao gentio de Sandegú, por um seu escravo, do assalto que lhe estava preparado e forneceu-lhe polvora e bala.
Com o mesmo gentio tinha elle jâ combinado que no easo de sahirem bem da lucta lhe fossem vendidos todos os escravos que ficassem prisioneiros.
Indispoz. algumas tribos alliadas da Praça contra outros alliados que forneciam mantimentos, dando-lhes polvora e bala, pois seria insustentavel a Praça de Zeguichor raltando estes alliados, unicos qoe mantinham o commermercio de viveres com ena.
O velho gentio de Cacheo descobrira a traição estando jã as embarcações em viagem, e pelos gentios que Julião Mendes quizera revoltar soube a verdade de tudo.
Houve grande desanimo entre os expedicionarios, que duvidavam uns dos outros, e por isso pensou o velho gentio de Cacbeu de tornar alli mesmo publico o procedimento de Julião Mendes, pois que a maioria estava falada para nos atraiçoar.
Tornou-se publico, e n'aquelle momento gritaram todos morra o traidor, valendo-lhe o velho, que a todos accommodou, regressando as canôas a Zeguichor para novamente se prepararem.
Apenas chegaram fugiu o traidor para Sandegú, vindo dias depois ás mãos do velho, que o mandara agarrar.
O governador de Cacheu, sabendo d'este facto, veio a Zeguichor e entregandose-lhe o criminoso pediram-lhe que o castigasse como merecia, enterrando-o vivo.
O governador, que servia então de ouvidor, procedeu a um inquerito e sciente da verdade mandou-o degredado para o Pará por toda a vida, sequestrando-lhe os seus poucos bens, na importancia de li1988i5 réis, que foram entregues ao commandante de Zeguichor para os applicar no augmento das fortificações.
Chegando Julião Mendes ao Maranhão e conseguindo illudir a boa fé do governador d'aquelle Estado, mostrando-lhe a sua innocencia, mandou-o este soltar e conseoUu que elle fosse para Lisboa queixar-se; alli tratou da sua liberdade e para isso fez accusações ao commandante de Zeguichor e a um José Domingos, que para lhe tirarem os seus bens o haviam mandado degredado.
Pediram-se informações para Cacheu e Maranhão sobre Julião Mendes, e apenas ellas chegaram a Lisboa ordenou-se a sua prisão e que cumprisse a pena.
Todavia, pela provisão de 18 de novembro de 1802, mandou-se José Joaquim de Sonsa Torvão a Zeguichor para descobrir a verdade sobre a accosação feita pelo Julião Mendes.
O syndicante achou que dos seus bens havia faltas de seis escravos e três embarcações, mas que os accusados não eram responsaveis por ellas.
Que Julião Mendes nutria odios contra José Domingos por este ter requerido contra elle, ao commandante de Zeguichor, Alvarenga, em 1800, como traidor, pois que tendo José Domingos concordado com os grumetes forros de Zeguichor para fazer guerra aos balantas de Sandegú (ou Conjudú), que lhes aprisionaram tres canôas, as quaes foram vendidas em Cacbeu e Farim, e tendo elle vindo com os grumetes aos gentios circumvlzinbos de Jame, Guimongonje e ljibogue, conseguiu arranjar onze canôas bem equipadas para os ir atacar, tendo antes recebido do commandante de Zeguicbor auxilio de polvora
e bala, a bem da Praça, que lambem necessilava do commercio livre do Bije, de onde vinha o sustento para ella.
Estando assim tudo preparado entraram em casa de Julião uns gentios de Jame, que ficaram indispostos contra os mais gentios auxiliares, que iam para a guerra fazer escravos; que em 1800 o mesmo Julião conseguira indispôr o rei de S. Domingos contra Cacheu.
“Que o Alvarenga mandara em seo despacho que qualquer ofllcial superior  inferior ou soldado, e mesmo forros ou escravos, que encontrasse ou visse o dito Julião o prendesse e o mettesse logo a ferros.”» -
Subsídios para a História de Cabo Verde e Guiné,  por Christiano José de Senna Barcellos,  parte III, pgs. 162-164, Lisboa, 1906
1801/04/28
O sargento-mór comandante do Fogo, Manuel Alexandre de Medina Vasconcelos, solicitou do governo, em 28 de abril de 1801, o despacho do seu requerimeolo, no qual pedia o governo de Cabo Verde; foi simplesmente indeferido.
O capitão-mór do Fogo, Medina e Vasconcellos, fez tambem uma proposta para cultivar a Cova Figueira, mediante as condições de plantar ali vinhas, bem como em Afonso Gil e montados reais, aforando-se-lhe aqueles terrenos, tendo como prémio o soldo da patente de sargento-mor e a propriedade do ofício de reitor da real fazenda do Fogo.
O governo não concordou com o prémio, naturalmente por ser demasiado, nem com as recompensas que ele exigia.
1801/11/02
OFÍCIO do capitão de mar e guerra e comandante do Presídio da Trataria, António Paulo da Costa, ao secretário de estado da Marinha e Ultramar, visconde de Anadia, D. João Rodrigues de Sá e Melo, sobre os presos que vão para Cabo Verde e Cachéu e a dúvida quanto as ajudas de custo dos 16 presos que embarcarão nos correios marítimos.
Anexo: lembrete.
AHU_CU_035, Cx. 13, D. 1076.
1801/12/17
Nomeação de D. FREI SILVESTRE DE MARIA SANTÍSSIMA como bispo da diocese de Cabo Verde.
1802
Na Dinamarca entra em vigor a proibição do tráfico negreiro.
JOSÉ JOAQUIM DE SOUSA TROVÃO capitão-mor de Cacheu até 1803
TOMÁS ÁLVARES DA SILVA era capitão-mor comandante da povoação extramuros de Bissau em Maio de 1802.
JOSÉ JOAQUIM PEREIRA, sargento-mor de Bissau, falecido em 1802.
SUPRIÃO CORREIA tinha 44 anos de idade em Setembro de 1802; nascera em Cacheu.
ANTÓNIO TEIXEIRA BARRETO, filho do padre JOÃO PEREIRA BARRETO,  foi capitão de milícias no Cacheu em 1802-1803, sob o comando do capitão-mor JOSÉ JOAQUIM DE SOUSA TROVÃO, que foi deposto em Novembro de 1803. Deve ter ido também, pois não há mais notícias dele. Ha poucos pormenores a respeito de António Teixeira Barreto. Foi apontado como capitão de milícias de Cacheu pelo comandante José Joaquim de Sousa Trovão, mas não se encontram referências subsequentes. Não aparece a sua assinatura na petição contra Trovão de Março de 1803, nem figura na lista das famílias de Cacheu em Março e Abril de 1804. Pode ser que tenha perdido o lugar quando Trovão foi deposto de comandante em Novembro (?) de 1803.
1802/04/02
PAULO GOMES é nomeado capitão auxiliar em 2 de Abril de 1802.
ALEXANDRE CARVALHO ALVARENGA foi nomeado por Sousa Torvão comandante de Cacheu, capitão-mor do Baluarte de Nossa Senhora da Luz de Ziguinchor em 2 de Abril de 1802. Era filho de MANUEL CARVALHO DE ALVARENGA
1802/09/00
LUÍS ANTÓNIO DA SILVA, alferes, aparece como nascido em Portugal, casado, de 25 anos de idade, em Setembro de 1802. Em 1803 disse ter 24 anos e ser «casado nesta praça» (Cacheu). Em Março de 1804 aparece como proprietário duma casa em Cacheu.
DONA JERÓNIMA DA SILVA aparece numa lista como tendo 26 anos de idade, viúva, natural de Cacheu, em Setembro de 1802. Em Janeiro de 1803 aparece como viúva, de 35 anos de idade.
DONA MARIA DA SILVA aparece como natural de Cacheu, de 56 anos de idade, em Setembro de 1802. Em 1804 aparece como proprietária de uma casa em Cacheu arrendada a ANTÓNIO BARBOZA.
ANTÓNIO JOSÉ GOMES aparece numa Iista de Setembro de 1802 como nascido em Ziguinchor, casado, de 35 (?) anos de idade.
1802/09/27
THOMAS DA COSTA ALVARENGA foi o primeiro signatário dum documento datado de 27 de Setembro de 1802. Aparece como natural da praça e Cacheu, casado, de 36 anos de idade.
GASPAR DA COSTA aparece num documento datado de 27 de Setembro de 1802 como nascido em Cacheu, de 28 anos de idade e casado. O mesmo documento foi assinado por LIBERATA DA COSTA e recorda que nasceu em Bissau, de 25 anos e residente em Cacheu. Gaspar assinava a petição contra o comandante Trovão em Março de 1803, mas o nome de Liberata não aparece na lista.
1802/11/14
Dr. José Joaquim Botelho de Almeida provido ouvidor em 14 de Novembro de 1802, com ordem para ir a Cacheu inquirir sobre a fuga do capitão-mor Sousa Trovão. Durante a sua ausência foi substituído pelo coronel .de milícias Guilherme Faustino Cardoso.
1802/11/18
Por provisão desta data foi a Ziguinchor SOUSA TORRÃO para saber se era verdadeira a acusação feita ao antigo escravo JULIÃO MENDES, feito alfe­res da Companhia do Corpo de Infantaria de Ziguinchor, por ter avisado o gentio de Sandegu da expedição punitiva que se organizara em Cacheu. Foi degredado para o Pará, sendo-lhe sequestrados os bens.
1802/11/29
Falecimento do capitão e governador-geral de Cabo Verde, MARCELINO ANTÓNIO BASTO. Governo da Câmara, tomando seguidamente os poderes de governador interino Manuel Cruz Monteiro, José Coelho de Mendonça e Joaquim Nazário da Fonseca Borges.
1803
Para capitão-mor da ilha do Fogo nomeou-se José Lourenço da Silva em substituição de Manuel Alexandre Medina e Vasconcelos, que servira por três anos.

JERÓNIMO PEREIRA, homem pardo, de 23 anos de idade, foi condenado para Bissau em 1803 por três anos; não se diz se chegou a vir ou nao. (Os seus pais eram Joao Pereira e Mariana do Sacramento Nº 1 da Moeta, Cortos d'Alcobaça).
MANUEL CORREIA tinha 50 anos de idade, era casado e tinlha nascido no Arquipélago de Cabo Verde, quando apareceu numa lista de Cacheu em Janeiro de 1803.
MANUEL ANTÓNIO DE CARVALHO era tenente da Praça de Cacheu em Janeiro de 1803; tinha 40 anos e era solteiro. Numa !ista de Março de 1803 aparece como tenente e tesoureiro da Real Fazenda e homem branco. Em Março de 1804, um Manuel Carvalho, capitão-mor, aparece numa lista como proprietário de uma casa de Cacheu habitada «pellas suas famílias». Parece provável (?) que fosse o pai de:
ANTÓNIO MIRANDA DE CARVALHO, tenente de ordenanças. Foi um dos cabecilhas (juntamente com o sacerdote do forte, MANUEL GOMES DE OLIVEIRA, e JOÃO PEREIRA BARRETO, sargento-mor) da revolta bern sucedida contra o comandante de Cacheu, em Agosto de 1814. Era «filho dum homem de cor do Arquipélago de Cabo Verde e duma preta gentia». Era pai de PEDRO LOPES DE CARVALHO, primo de Honório Pereira Barreto. Foi morto durante um ataque a Farim em Novembro de 1846.
GONÇALO CARDOSO é considerado cunhado de JOSÉ DE ARAÚJO GOMES em 1803. Pode ser pai (?) de: MANUEL DA SILVA CARDOSO, acompanhou João de Araújo Gomes na sua viagem ao Pará e a Portugal em 1804. É descrito como «homem pardo», de 20 anos de idade, solteiro e nascido em Bissau.
MANUEL DE CARVALHO ALVARENGA, que foi capitão-mor de Ziguinchor, em 1803 chefiou os habitantes e a guarnição de Cacheu numa petição para o afastamento do capitão-mor Sousa Trovão, sendo depois sargento-mor de Cacheu em 1806 por indicação do, a seguir, capitão-mor JOSÉ ANTÓNIO PINTO.
J. J. DE SOUSA TROVÃO abandonou o lugar de capitão-mor de Cacheu em 1803.

JOÃO ANTÓNIO PINTO é capitão-mor de Cacheu. 
1803/01/00
JÚLIA DA SILVA em Janeiro de 1803 aparece como solteira, de 40 anos, natural deste continente (Cacheu)
IGNACIO DA SILVA em Janeiro de 1803 aparece como solteiro, de 25 anos de idade e natural desta praça (Cacheu).
ANTÓNIO DA SILVA tinha 20 anos de idade, nascido em Sao Nicolau, solteiro, em Janeiro de 1803. (Cacheu)
1803/01/12
Em 12 de Janeiro de 1803 foram reintegrados, por uma resolução régia, nos seus lugares, Eusébio José do Vale, capitão-mor da ilha Brava, e seu filho João José do Vale, por ter o governador informado que eram relevantes os serviços prestados por aquele na descoberta e limpeza do salitre.
1803/03/00
MATIAS DA COSTA ALVARENGA (Ver Matias da Costa) assinou uma petição contra o comandante de Cacheu, J. J. de Sousa Trovão, em Março de 1803. Em documentos assinados em Março/Abril e em Julho de 1804 aparece como ajudante da praça, solteiro, nascido em África, de 27 anos de idade. Era ainda ajudante em Dezembro de 1806 quando o Conselho Ultramarino o promoveu a capitão numa companhia regular de artilharia.
1803/03/03
Manuel Carvalho de Alvarenga é signatário de uma petição contra Trovão jutamente com os oficiais da guarnição e chefiava os habitantes de Cacheu. Assinou outro documento em Cacheu em Julho de 1804, onde se afirma ter 51 anos de idade, ser solteiro e nascido em África.
1803/05/13
«D. António de Coutinho Lencastre, moço-fidalgo da Casa Real, nomeado por carta de 13 .de Maio de 1803. A primeira parte do seu governo foi assinalada por uma revolta popular contra o pagamento de um imposto especial lançado pelo governador com o fim de cobrir as despesas extraordinárias motivadas pelo aumento das guarnições militares.
Os constantes ataques dos piratas aos portos e navios cabo-verdianos e a presença de esquadras estrangeiras naquelas águas durante as guerras napoleónicas levaram o governo a elevar o número de soldados permanentes em Cabo Verde para 400 unidades. Novas contribuições lançadas para cobrir as despesas e a maneira violenta por que se pretendeu cobrá-las motivaram uma revolta e em sua consequência a exoneração do governador, que foi substituído por Morais e Castro em 1812.
Mas pouco depois, Coutinho Lencastre foi reintegrado no seu cargo que ocupou durante 14 anos.» João Barreto
MANUEL ALEXANDRE DE MEDINA E VASCONCELOS, filho de Teodoro Félix de Medida e Vasconcelos, nasceu no séc. XVIII, natural da Ilha da Madeira, faleceu em 1826 em Cabo Verde. Era, em 16 de Novembro de 1790, Ajudante do Terço Auxiliar da Vila de S. Vicente, na ilha da Madeira. Foi nomeado Sargento-mor (equivalente hoje ao posto de major de exército) para a ilha do Fogo por um período de três anos por resolução Régia de 24 de Fevereiro de 1797 e por Decreto de 14 de Novembro de 1798. Por Decreto de 13 de Maio de 1811 foi nomeado Ajudante do Governador de Cabo Verde. Por Decreto de 17 de Maio de 1813 foi nomeado Comandante da Vila da Praia, Ilha de Santiago. Ainda em 1813 o governador MORAIS E CASTRO incumbiu-o, juntamente com ANICETO ANTÓNIO FERREIRA, para ir ao Rio de Janeiro, Brasil, entregar em mão própria a S. Alteza Real D. João VI uma exposição que o dito governador escrevera sobre o estado em que encontrara as ilhas e denunciando os desmandos do seu antecessor D. ANTÓNIO COUTINHO DE LENCASTRE, que, aliás, retomaria o seu lugar de governador. Na sequência desta missão "Sua alteza real contemplou ambos com o posto de tenente-coronel por honrosamente terem cumprido a sua missão" . Coronel graduado, adido ao Estado Maior do Exército. Aposentou-se em 20 de Julho de 1823 no posto de Brigadeiro. Foi "um militar digno e honrado e por isso morreu pobre". 
Casou na ilha do Fogo com LUZIA FILIPA HENRIQUES, filha de MARCELINO JOSÉ JORGE HENRIQUES e de MARIA DO MONTE FORTUNATA DA FONSECA MENDES ROSADO. Reunião de Documentos genealógicos demonstrativos da ascendência e nobreza de D. ANTÓNIO COUTINHO DE LENCASTRE, precedida por estudo genealógico sobre esta personalidade, a partir do antigo Nobiliário do Conde D. Pedro, com as notas de João Baptista Lavanha e da História Genealógica da Casa Real de autoria de D. António Caetano de Sousa. À qual se acrescenta Breve Notícia de Alguns Ascendentes de D. ANTÓNIO COUTINHO DE LENCASTRE, do apelido de Chaves, por cuja linha herdou a sua casa, o antigo Morgado da Cidade de Rodrigo, no Reino de Castela.
D. ANTÓNIO COUTINHO DE LENCASTRE foi tenente-coronel do regimento de milícias de Castelo Branco e comandou um regimento de granadeiros na guerra de 1801. Em 13 de Maio de 1803 foi nomeado Governador da Província das Ilhas de Cabo Verde, que governou durante 15 anos. Foi Comendador da Ordem de Cristo, do Conselho de D. João VI e faleceu a 18 de Agosto de 1823.
O estado da guerra geral que abrasava naquele tempo a Europa obrigou também a aumento de forças naquele porto, e-houve ali 400 baionetas . Não podendo os escassos rendilhamentos cobrir semelhante despesa , interpôs ele um tributo aos habitantes para o pagamento dos soldados, ficando por isso isentos do serviço das milícias. Exigindo o Ouvidor o pagamento daquela contribuição, com toda espécie de vexames, tirando-lhes até as panelas, levantou-se na Capital um sussurro, que das imprevistas providências passou a ser levantamento formal. Uma imensidade de habitantes da ilha de Santiago veio então sobre a Vila da Praia, donde, rechaçados com alguns tiros de peças que lhes mandou o Governador fazer do presídio, foram á Cidade da Ribeira Grande implorar a protecção dos Cónegos. O Governador enviou por mar o Patrão-mor com soldados para destroçar o ajuntamento; mas estes, à ordem de fazer fogo, vendo seus pais, irmãos e filhos, fizeram pontarias altas, com o que animados os revoltosos, não tendo armas, com pedradas meteram a tropa a bordo da lancha, ferindo o Patrão-mor. Marchou no dia seguinte mais tropa e tudo ficou acalmado. As três pessoas que vinham à testa da gente foram remetidas presas ao Rio de Janeiro como cabeças de motim.
D. António era muito amigo de festas e reuniões , considerando-as como óptimo meio para civilizar e animar aqueles povos; mas a par disso foi muitíssimo respeitado mesmo dos estrangeiros, que às vezes levava por mal, não querendo por bem ouvir a razão.
Foi também pronunciada naquela ocasião e condenada a deportação para a ilha Maio uma mulher de cor, natural de Santiago, chamada Maria José, e que nos parece que ainda vive. Valiosos eram os serviços que prestava aos navios estrangeiros que demandavam o porto da vila da Praia. Falando bem lnglês, Francês e Holandês, quase que lhes servia de Cônsul; teve a honra de ser transportada para ilha de Maio numa fragata de guerra inglesa.
No seu tempo os corsários saquearam as ilhas de Maio e Boavista.
Este [Governador-geral] era um tirano e cruel para o povo, sacrificando os inocentes (…), deixando em estado destroçado as ilhas, extorquindo o cabedal alheio em seu proveito, perseguindo, maltratando, desterrando e matando(…), lançando tributos a este miserável povo, sem excepção dos velhos, aleijados, cegos, viúvas, órfãos de tenra idade (…) . (Extracto do documento aprovado pela Câmara Municipal da Ribeira Grande, em Cabo Verde, sobre as arbitrariedades do Governador-Geral D. ANTÓNIO COUTINHO DE LENCASTRE, 24 de Março de 1813)
E muito piores do que eles são as hordas de desalmados, escória e podridão do género humano que de Lisboa não cessam de enviar para aqui. Entre os quais vêm monstros que à facada têm assassinado os próprios pais. E se isto é gente que se possa convencer de razão, e levar por meio de doçura e suavidade, as luzes e experiência de V.Exª o decidirão. Eu o que posso assegurar a V.Exª é que, a não serem contidos pelo medo, já aqui não existiria nem Governo nem Governador, nem governados. (carta do Governador de Cabo Verde, D. ANTÓNIO COUTINHO DE LENCASTRE, 1813)
1803/09/05
Foi nomeado em 7807 ouvidor geral de Cabo Verde o bacharel José Joaquim Botelho de Almeida, com ordem para ir em diligência a Cacheu proceder à sindicância sobre a fuga do comandante daquela Praça, Sousa Torvão, conforme se havia ordenado em 5 de Setembro de 1803.
1803/11/00
PAULO JOSÉ VIEIRA DA SILVA era um degredado enviado para Bissau em Novembro de 1803. Chegou (?).
1803/11/16
CONSULTA do Conselho Ultramarino ao príncipe regente D. João propondo outro ministro para a diligência de Cacheu tirar a devassa do comandante Joaquim de Sousa Trovão e informando que o ouvidor das Ilhas de São Tomé e Príncipe, Luís Mourão Cordeiro do Vale, é falecido, necessitando os dois casos de resolução.
Anexo: carta (cópia), escritos, lembretes.
AHU_CU_035, Cx. 14, D. 1140.
1803/11/17
Deferiu-se ao governador, em 17 de Novembro, o disposto na carta régia de 7 de março de 1795, declarando-se-lhe que a jurisdição do governo de Cabo Verde se estendia às Praças de Cacheu e Bissau, ficando os seus comandantes subordinados ao referido governo.
1804
MANOEL CARVALHO era o capitão de Ziguinchor em 1804 e urn proeminente comerciante.
D. HIERONIMA DA SILVA aparece como proprietária de uma casa de Cacheu em 1804.
1804/03/00
PASCOAL PEREIRA, sargento-mor de Cacheu em Março de 1804, era proprietário duma casa que arrendou ao cónego.
1804/07/00
MATHIAS DA COSTA ALVARENGA, ajudante da praça de Cacheu numa lista de famílias de Cacheu compilada em Março-Abril de 1804.
JOÃO PEREIRA BARRETO, filho do Padre JOÃO PEREIRA BARRETO, já era capitão-mor de Cacheu em 1804, provavelmente como interino depois do afastamento de Sousa Trovão até à nomeação do novo capitão-mor JOSÉ ANTÓNIO PINTO. Um documento de 14 de Julho deste ano traz a sua assinatura, João Pereira Barreto, e inclui a informação de que tinha 29 anos de idade, era casado e tinha nascido no Arquipélago de Cabo Verde. A data do seu casamento com ROSA DE CARVALHO DE ALVARENGA não é apontada, nem as datas de nascimento dos seus filhos são conhecidas: Maria Pereira Barreto (1808-18); Honório Pereira Barreto (1810-1859).
Início da construção da igreja de Nossa Senhora do Rosário na ilha de São Nicolau
1804/10/08
AVISO do secretário de estado da Marinha e Ultramar, visconde de Anadia, João Rodrigues de Sá e Melo Meneses, ao conselheiro do Conselho Ultramarino, barão de Moçâmedes, José de Almeida Vasconcelos Soveral de Albergaria, remetendo os papéis do comandante da praça de Cacheu, José Joaquim de Sousa Trovão, do sargento-mor de Infantaria da Ilha do Príncipe, Gil José Duarte Dias e do capitão de Ordenanças do Recife, José Alemão de Sisneiros, que solicita ser nomeado como capitão-mor, para serem consultados pelo Conselho Ultramarino.
Obs.: ver AHU_CU_ 015, Cx. 251, D. 16826.
1805
JOAQUIM SEVERO PEREIRA DE SOUSA PINTO era tenente em Bissau em 1805(?)//1807(?). Entrou na Armada em 1792.
ATJMA, Inventário de JOSÉ JOAQUIM DA SILVA ROSA:
Deu mais a inventário o escravo FRANCISCO, fula, de idade de vinte e oito anos, avaliado em duzentos mil réis, 200$000
Deu mais a escrava JULIANA, papel, sua mulher, de idade de trinta anos, doente de uma perna, que foi avaliada por cento e sessenta mil réis, 160$000
Deu mais o escravo JANUÁRIO, crioulo, filho dos ditos, de idade de nove anos, avaliado por cento e quarenta mil réis, 140$000.
 1805/02/00
MANUEL PINTO DE GOUVEIA e capitão-mor de Bissau, até 1811
O governo da metrópole nomeou capitão-mor de Bissau um oficial que já servira na capitania de Cacheu, Manuel Pinto de Gouveia, e então se achava em Portugal.
O novo capitão-mor partiu de Lisboa em Fevereiro de 1805, e com a sua administração a vida económica de Bissau melhorou consideravelmente nos anos imediatamente subsequentes, crescendo também os rendimentos públicos; porém, já desde 1807, a subvenção que cabia às capitanias da Guiné para fazerem face ao deficit da administração, e era enviada de Cabo Verde, começou a ser constituída por panos de fabrico cabo-verdiano, e não por dinheiro, pegando-se então com eles, nas capitanias guineenses, prejudicando os interessados, os vencimentos de funcionários e também os soldos da tropa, facto este que gerou no seio dela uma atmosfera de exaltação, propícia a novas turbulências, tanto mais fáceis de eclodir, em Bissau, quanto grande parte da guarnição era ali constituída por presos tirados do Limoeiro, que o capitão-mor trouxera de Lisboa. Essas turbulências surgiram em Abril….
«EFevereiro de 1805 fôra chamado Manoel Pinto de Gouveia pelo conde de Anadia para ir governar a Praça de Bissau, que se achava abandonada por terem envenenado o governador d'ella, Antonio Cardoso de Faria.
A tropa que guarnecia Bissau era composta de pretos, naturaes do paiz, que conviviam com os gentios, que se negavam a fazer serviço.
O novo governador pediu o posto de brigadeiro, e tendo ido ao paço solicital-o ao principe regente este dissera-lhe: «Já estou bem informado do teu requerimento. O premio não se procura antes da commissão feita. Sabe desempenhar ao que vaes, e Jogo que as coisas estejam em paz pela secretaria te será remetido o que pretendes pois vejo que é de justiça.•
Seguiu Pinto de Gouveia para Bissau, com 150 degredados tirados do Limoeiro, facínoras e dos maiores crimes, tendo alguns d'estes a alva vestida, que lhes foi despida. Em Cabo Verde recebeu mais 80 homens de péssimos costumes, e com 230 soldados indisciplinados em Bissau formaria um batalhão de 460 desordeiros.
Com muito trabalho montou o serviço militar, que estava relaxado, e restabeleceo a paz com os gentios.
o havia escripturação da fazenda e apenas encontrara nos cadernos de papel mal escripturados.» -
Subsídios para a História de Cabo Verde e Guiné,  por Christiano José de Senna Barcellos,  parte III, pg. 173, Lisboa, 1906.
1805/04/00
Em Abril teve ordem o governador para proceder contra os capitães-mores das ilbas da Boa Vista, Aniceto António Ferreira, e o da Brava, Eusébio José do Vale, pela ilegalidade como procediam na condenação dos navios.
Contra o da Brava por ter condenado um bergantim de que era mestre o seu filho João José do Vale.
1805/08/17

ANTÓNIO PEREIRA DA COSTA foi nomeado cirurgião-mor de Bissau em 17 de Agosto de 1805. Morreu em Bissau em 1808.
1806
ANTÓNIO JOSÉ CORREIA tinha 18 anos de idade, nascera em Lisboa e servia como capitão em Bissau em Abril de 1806.
MATEUS DE CARVALHO ALVARENGA, filho de MANUEL CARVALHO ALVARENGA, foi promovido a alferes em Maio de 1806 pelo comandante de Cacheu, JOSÉ ANTÓNIO PINTO, que afirmou ter servido 13 anos na praça de Ziguinchor como soldado e sargento e que era filho do capitão-mor de Ziguinchor, que serviu o rei mais de 30 anos. O Conselho Ultramarino promoveu-o a seguir a sargento de Cacheu em 17 de Dezembro do mesmo ano, de novo por recomendação de António Pinto. Pode (?) ser o pai de ROSA DE CARVALHO DE ALVARENGA (?). MANUEL CARVALHO DE ALVARENGA enviou uma mensagem de Ziguinchor em 27 de Outubro de 1808 ao comandante britânico em Goreia a solicitar o envio para Lisboa duma declaração de acusações contra o comandante de Cacheu, JOSE ANTÓNIO PINTO. Seis anos mais tarde, estava implicado na destituição do comandante de Cacheu, JOSÉ FIGUEIREDO DE GÓIS, em Agosto de 1814, ate se tornar genro de ANTÓNIO DE MIRANDA DE CARVALHO, urn dos tres cabecilhas. Apesar disso, reteve o comando de Ziguinchor e foi promovido a tenente-coronel de 2ª linha, como é atestado pela sua pedra tumular, que agora està à porta da Biblioteca Nacional de Bissau.
«Em Bissau instigava ama revolta nos soldados o capitão-mor de Farim e commissario volante da Praça de Bissau, Thomaz da Costa Ribeiro, aconselhando-os a que principiassem por negarem o pagamento, com a promessa de lhes offerecer moita aguardente, e que matassem o governador capitão-mór da Praça, o tbesoureiro José Valério e as demais auctoridades. Mas como os soldados não annuissem foi então tratar com os gentios, fazendo-lhes ver que o governador da Praça tinha ido para alli a fim de os agarrar e mandal-os para o Maranhão, e também queria tirar a desforra de um seu irmão que tinha sido victima do gentio.
Os moradores da Praça, que conheciam o carácter de Costa Ribeiro, que na Guiné commettera muitos vexames e roubos, dirigiram ao ministro visconde de Anadia ama queixa, expondo-lhe que logo á chegada ã Praça do governador Pinto de Gouveia quizera Costa Ribeiro corrompel-o, offerecendo-lhe uma porção de escravos, como praticara com os outros havia mais de dez annos, e como elle não quizesse acceitar e não consentisse que Costa Ribeiro commettesse mais abusos começou este a presentear os gentios e reunindo-os em sua casa a altas horas da noite aconselhou-os a matarem o governador, negociantes e auctoridades. Os gentios revelaram estes factos aos negociantes, dizendo-lhes que o rei de Bissau viria á Praça na noite de 1 de setembro contar o caso, como effectivamente veio ãs 10 horas, apparecendo com a sua côrte, pedindo para avisarem o innocente governador que Costa Ribeiro tinha com elle tratado para na manhã de 11 darem um assalto á Praça, para tomarem os quarteis, assassinal-o e o mesmo fazerem á familia e aos que resistíssem.
Pedia o rei que assassinassem Costa Ribeiro ou que o pozessem fóra da Praça porque era um traidor.
Costa Ribeiro, vendo-se descoberto, dirigiu-se aos ídolos (hiram), com grandes sommas, e fallando ao demónio offereceu-lhe a sua alma comtanto que o ajudasse a matar o governador. O hiram não lhe fez a vontade. O hiram e o diabo ás vezes procedem sensatamente!
O ministro ordenou que elle sahisse de Bissau para Farim; não quiz obedecer com o pretexto de que tinha licença para regressar a Lisboa.
Como hospede de Costa Ribeiro havia certo bacharel chamado José Thomaz de Sá, que armou toda a chicana, aconselhando o seu amigo a não aceitar a intimação, ameaçando ao mesmo tempo Pinto Gouveia de recorrer aos bons officios de seu primo, o governador de Cabo Verde, que também recebera favores de Costa Ribeiro e que o havia de livrar n'esta occasião.
A receita de Bissau em 1806 foi de 37.139$387 réis e a despesa de 25:802$704. Avolumava a receita os direitos sobre os escravos, que regulavam 2$400 réis por cada um - -
Subsídios para a História de Cabo Verde e Guiné,  por Christiano José de Senna Barcellos,  parte III, pgs. 177-178, Lisboa, 1906
1806/03/00
JOSE GOMES CARDOSO assinou o seu nome como capitao estacionado em Geba em Março de 1806, de 40 anos e nascido em Geba.
1806/04/00
AGOSTINHO DA SILVAtinha 42 anos de idade, «natural desta povoaçãoo», em Abril de 1806.
VICENTE MENDES GOMESaparece num documento em Bissau em Abril de 1806; nascido em Cabo Verde, de 30 anos de idade.
1806/05/00
ANTÓNIO DA SILVA, nascido em Lisboa, de 35 anos de idade, vivia em Bissau em Maio de 1806.
ANTÓNIO ÁLVARES DA SILVA, nascido em Geba, tinha 42 anos e vivia em Bissau em Maio de 1806.
FRANCISCO GOMES aparece num documento em Bissau em Maio de 1806, de 30 anos de idade, nascido em Pernambuco.

FRANCISCO CORREIA GOMES era sargento-mor da povoação de Geba em Maio de 1806, de 64 anos de idade, quando assinou urn documento em Bissau.
1806/12/06
A provisão de 6 de Dezembro de 1806 do Conselho Ultramarino, resolvendo sobre o aforamento da Cova Figueira, na ilha do Fogo, a João Gomes de Araújo, mandou ao ouvidor geral que fizesse a divisão pelos moradores da nova povoação, o que só se executou em 27 de Junho de 1815.
A nova povoação contava já 132 fogos com a população de 703 almas, sendo 361 homens e 342 mulheres.
Aforaram-se 420.143 braças quadradas de terreno.
Os foros foram na totalidade de cinco moios, quatorze alqueires, três quartas e um selamin (o selamim era uma antiga unidade de medida de capacidade para secos, usada em Portugal e no Brasil, correspondendo à décima sexta parte de um alqueire (Silva, 1813, II:681).)
Existiam 1.066 cabeças de gado com os seguintes valores:

O ouvidor geral separou 57.000 braças quadradas de terreno para logradouro comum dos habitantes da nova povoação.
1807
O Parlamento inglês aprova o Slave Trade Act, que proibia, a partir de 1 de Janeiro de 1808, o tráfico negreiro no Império Britânico, mas não a escravatura.
Os Estados Unidos da América proíbem a importação de escravos (Slave Importation Prohibition Act) a partir de 1 de Janeiro de 1808.
Em 1807 a Inglaterra proibiu finalmente o comércio de escravos em navios britânicos. À armada britânica foram dadas ordens para abordar os navios dos negreiros britânicos, confiscar os barcos e libertar todos os escravos os quais na generalidade eram levados para Serra Leoa na costa ocidental de África. Pouco tempo depois, a armada britânica passou também a atacar os navios negreiros de todos os outros países. Como resultado, o comércio de escravos transoceânico diminuiu notavelmente durante o século de XIX, embora só viesse a acabar nas primeiras décadas de 1900.
A proibição da escravatura foi uma parte do desenvolvimento da sociedade humana. Por um lado foi muito importante a actividade desenvolvida pelas pessoas que se dedicaram a combater a escravatura e o comércio de escravos. Por outro lado a transformação dos processos de produção na maior parte dos países da Europa exigia um outro sistema social nos países produtores de matérias primas
Esta grande transformação foi feita em primeiro lugar na Inglaterra, um país agora industrializado com grande necessidade de matérias primas e grandes mercados para vender os seus produtos. O triângulo do comércio, com latifundiários e escravos, deixou de ter importância para as novas indústrias em Inglaterra. Raptar milhões de pessoas, transporta-las pelo Atlântico para depois as vender, já não era negócio interessante para banqueiros e capitalistas. O importante era obter matérias primas para as industrias fabricantes de produtos baratos para vender em todo o mundo. E de onde viriam as matérias primas?

1807/03/00
«Concedeu o príncipe por uma provisão de 29 de Março, a João de Araújo Gomes, o aforamento da Cova Figueira por espaço de três anos, pela quantia anual de 400$000 réis, que se prorrogaria por mais três se ele fundasse a povoação à sua custa e uma igreja.
Fizeram-se 272 autos de aforamento nos terrenos da Cova Figueira. João Gomes de Araújo requereu o lugar de comandante da ilha do Fogo, em substituição de José Lourenço da Silva, que acabava o tempoFora capitão de infantaria de um dos regimentos de guarnição da ilha de S. Tiago, sendo promovido a sargento-mor em atenção aos seus serviços, pelos quais não recebera soldo algum durante quase 17 anos.
Na ilha do Fogo servira por espaço de seis anos de feitor da real fazenda. Era natural de Lisboa.» -
Subsídios para a História de Cabo Verde e Guiné, por Christiano José de Senna Barcellos, parte III, pgs. 176-177, Lisboa, 1906
1807/08/18
Alvará confirmando certa concessão para o estabelecimento de uma feitoria em Cabo Negro para o comércio livre da escravatura.1807-08-18. Portugal.
TT, Chancelaria régia, Núcleo Antigo 35, f. 107v.
1808
A Serra Leoa torna-se colónia britânica e base para transferência dos escravos libertados.
Os Estados Unidos decretam a abolição oficial da importação de escravos. No entanto, a instituição da escravatura continuaria nos EUA até o Presidente Abraham Lincoln assinar a Proclamação da Emancipação em 1865.
ZIGUINCHOR:
Esquecida por Lisboa a feitoria é miserável. Em 1808, o seu comandante MANUEL CARVALHO não sabe quem é o seu superior e queixa-se às autoridades britânicas em Bathurst (Gâmbia) dos prejuízos causados pelos comerciantes de Cacheu.
Em 1808 começou a cobrança da contribuição predial em Bissau.

JOSÉ PINTO morreu em Bissau em 1808.
1808/10/27
O comandante da Praça de Ziguinchor, Manuel Carvalho de Alvarenga, em carta de 27 de Outubro de 1808, dirigida ao comandante da Praça de Goré, então em poder da Inglaterra, Charles Maiwell, formulava as maiores acusações ao governador da Praça de Cacheu, pedindo-lhe para transmitir a sua queixa a sua alteza o príncipe regente, no Rio de Janeiro, sob o maior sigilo, para que ele não fosse vítima do referido governador.
É o facto deste governador ter proibido o comércio naquela Praça com os estrangeiros que ali iam muito, não podendo os navios demorarem-se mais de 24 horas no porto, unicamente porque o mesmo governador não permitia concorrência com os seus géneros, que vendia por alto preço em Cacheu, tendo para isso uma galera encarreirada entre Lisboa, Cacheu e Maranhão.
O comandante da Praça de Goré enviou a carta ao governador de Cabo Verde para tomar providências.
1809
Más colheitas e situação de fome nas ilhas de Cabo Verde
Em 1809, o governador D. ANTÓNIO COUTINHO DE LENCASTRE aproveitou peças de artilharia da fragata portuguesa “Urania” que se dirigia para o Rio de Janeiro e encalhou  a sul do ilhéu, para guarnece-lo, tornando-o na quarta bateria utilizada para proteger a vila da  Praia dos corsários e piratas, seguindo assim indicações avançadas ainda em 1604 pelo padre da companhia de Jesus, PEDRO GUERREIRO, que referindo-se às excelentes condições da Vila da Praia aconselhava ao seu povoamento e que “se fortalecera ua só entrada que tem, & no ilheo que está na boca da Baya se fizera algum forte, que a deffendera dos imigos.” (1) A Fragata Urania, comandada pelo CAPITÃO FRANCISCO ANTÓNIO DA SILVA PACHECO, fundeara pelas 15 horas do dia 5 de Fevereiro de 1809, “… tinha ancorado em bom fundo e distante do ilhéu de Santa Maria, mas começando a garrar, depois de terminada a faina de fundear e quando o commandante se achava na câmara, foi encalhar na restinga sul do referido ilhéu, onde se perdeu….A tripulação do Urania salvou-se toda e com ella alguns objectos. Com auctorização do commandante recebeu o governador bastante material de bordo, sendo da Urania: dezassete peças de artilharia, quinze chapuzes, seis palmetas, duzentas e dezesete espoletas…” (1)
(1) Relação annual das cousas que fizeram os Padres da Companhia de Jesus etc., 1605, fl.130.
1810
O México manifesta a intenção de abolir a escravatura.
Tratado de Aliança e Amizade entre Portugal e Inglaterra estabelece a abolição gradual do tráfico negreiro português, que fica desde já limitado às suas possessões efetivas em África.
Em 1810, o Tratado de Aliança e Amizade entre D. João I e Jorge III, rei da Grã-Bretanha, previa nos Artigos Secretos que fosse abolido todo o comércio e tráfico de escravos nos estabelecimentos de Bissau e Cacheu. Previa também que através deste acordo, a Grã-Bretanha ficasse em posse destas duas cidades e em troca, Portugal beneficiaria da ajuda desse país para a reconquista dos territórios de Olivença e Jerumenha.
1811
Na Ilha da Boa Vista:
O que não tem dúvida é que em 1811, por ocasião da referida festa da Vera Cruz os escravos fizeram uma conspiração para se rebelarem e libertarem dos ferros da escravidão, assassinando os seus senhores. Mas felizmente foi descoberto o seu desígnio a tempo de se poderem precaver tão desastrosos resultados, e de se impedir que tomassem posse do armamento e munições da milícia, como era o seu propósito.
CLARA GOMES era amante do Governador Gouveia de Bissau em 1811, associada com ele no comércio ilegal.
ANTÓNIO CARDOSO FIGUEIREDO, Capitão-mor de Bissau interinamente, teve duas sublevações da tropa em 1811
JOAQUIM JOSÉ REBELO DE FIGUEIREDO E GÓIS é capitão-mor de Cacheu até 1814
Dois factos se deram e se torna necessário citar porque eles vêm em reforço do que temos em vista focar. Em 181 1, o capitão-mor de Bissau, PINTO DE GOUVEIA, sugeria que o «território da Guiné deveria ser convertido em uma capitania-general, independente da do governo de Cabo Verde, cuja intervenção só contribuía para a desorganização administrativa e financeira».

Passados oito anos, em 1819, o tesouro público de Cabo Verde estava exausto e ainda tinha a seu cargo a administração do território fronteiriço que pesava no orçamento cabo-verdiano. Para este ficar mais aliviado, o governador PUSICH propôs ao Poder Central que a administração financeira da Guiné fosse entregue a entidades particulares, a uma companhia privilegiada como já  se havia feito noutros tempos.
1811/02/26
Criação da Junta da Fazenda de Cabo Verde
1811/04/14
A guarnição de Bissau, formada por criminosos retirados do Limoeiro e vadios embar­cados em Cabo Verde, amotinam-se por falta de pagamento.
Essas turbulências surgiram em Abril de 1811, traduzidas numa insubordinação que o capitão-mor conseguiu todavia aplacar prometendo imediatos pagamentos em dinheiro. Mas como, se o cofre da capitania estava quase exausto e ele próprio nllo recebia vencimentos havia quatro anos? Contudo, preso à sua palavra, vendeu os escravos que tinha e cumpriu-a. Não decerto tão completamente que evitasse nova insubordinaçllo em meados de Julho, também desta vez aplacada pelo modo por que o tinha sido a anterior. A situação agrava-se, porém, pouoo a pouco, alimentada por intrigas; e assim, foram apresentadas queixas ao Governador Geral, e este ordenou a prisão do capitão-mor, tendo talvez ooncorrido para este acto de rigor ser conheoida daquele a tentativa de emancipação empreendida por Pinto Gouveia, propondo à Corte que se constituiesse, com as praças da Guiné, um governo separado do de Cabo Verde, e apreeentando-se ele próprio como candidato ao cargo.
« Deu-se o primeiro conficto no dia 14 de abril de 1811.
O capitão da Praça havia avisado o governador Gouveia do levantamento que os soldados queriam fazer, e n'aquelle dia, depois da missa, formou a tropa e aconselhou-a a que soffresse com resignação por ser bem precario o estado do paiz. Conservou-se formada a tropa, e à resideocia do governador dirigiram-se então os officiaes e os empregados da fazenda, que assignaram um termo em como se resignariam.
O capitão Antonio Cardoso de Figueiredo, commandante da tropa, mandou deslroçar os soldados, mas a soa voz não foi obedecida, antes envolvendo o capitão n'om circulo lhe disseram que intimasse o governador para lhes f azer o pagamento, pois que estavam com fome, rotos e descalços, e este estado não podia continuar.
O governador, inteirado d'este facto, mandou dizer que no dia seguinte pagaria do seu boleo, tiato o cofre estar nzio e hner ainda um saldo con&ra de 3:137$000 réis. Nlo obstante essa resposta, foi este prevenido que os soldados queriam n'aquella noite arrombar os armazeós dos particulares para tirarem alimentos, por isso que alguns soldados não comiam havia dois dias.
O governador Tio-se obrigado a vender os escravos que tinha para lhes fazer o pagamento e a pedir providencias ao de Cabo Verde, respondendo-lhe este: •que o povo estava atacado de uma epidemia e de tal fome que não podia acudir a Bissau, .Pois que não havendo rendimento para o sustento dos habitantes lhe era impossivel fazer o pagamento do segundo quartel do anno.
Havia quatro annos que o governador de Bissau não recebia os seus vencimentos; porém como elle vivia dil-o uma representação firmada pelos officiaes da tropa e pelos negociantes Thomaz da Costa Ribeiro e Joaquim Antonio de Mattos, aceusando-o de intriguista e turbulento; que negociava, probibindo que os outros o fizessem; que vivia amancebado com uma Clara Gomes. a qual sahia altas horas da noite da fortaleza, acompanhada pelo sargento de ordens; que elle absorvia os rendimentos reaes, roubando a polvora da fazenda para seo negocio e o dinheiro que lhe era remettido de Cabo Verde para pagamento da tropa. e qoe falsificava os livros.
Em 6 de julho queixou-se o governador da Praça de que o capitlo-mór de Farim e o bacharel José Thomaz de Sá tomaram ao capitão do navio Expedição a sua correspondencia official, na qual elle relatava as desordens da Praça de Bissau e apontava os cabeças de motim, que eram os acima referidos e mais o escrivão de fazenda, Justiniano Antonio de Moraes, o capitão da 3.ª oompanhia. A. Cardoso Figueiredo, o alferes da mesma, Antonio José Teixeira, e Joaquim Antonio de Mattos.
Que se achava havia quatro annos sem receber soldo, vendo-se nas circumstancias de recorrer ao governador da Goré a pedir-lhe socorros, mediante lettras sobre o real erario, se não lhe facilitassem os saques.
Em 12 de julho deu-se nova Insubordinação dos soldados. Ao toque da assembléa, às horas da parada da guarda, não quizeram os soldados entrar na formatura, e passando o governador ao quartel foi alli insultado, exigindo-lhe os soldados o pagamento no meio de ameaças, e pegando em armas, que não quizeram entregar. Retirou-se o governador e pela tarde d'aquelle dia foi avisado de que os soldados tinham resolvido assassinal-o a golpes de baioneta, bem como à familia, em vista do que o governador mandou logo dizer que no dia seguinte (13) faria o pagamento com o seu dinheiro.
Os soldados resolveram então ir para as guardas, enquanto o governador com o thesoureiro davam o balanço ao cofre, onde havia pouco mais de 700$000 réis, faltando-lhe ainda 1:900$000 e tantos réis. O governador levou da sua casa essa importancia para o quartel, recebendo em fazendas do armazem para fazer o pagamento. Os soldados, sabendo que iam ser pagos em fazenda, preveniram o governador com novas ameaças de que não recebiam, vendo-se este obrigado a pagar-lhes em dinheiro no dia immediato.
N'este dia chamou o bacharel Thomaz de Sá um soldado e disse-lhe: Tesos com o governador, não aceitem senão dinheiro de lei; tres ataques destes morre, leva-o o diabo. Não ha de faltar quem vos governe, e que pague tudo e que não os faça estar tão sujeitos.
Por outro lado no dia 10, achando-se o governador em frente dos soldados, dirigiu-se-lhes o capitão Antonio Cardoso e disse-lhes: O senhor governador disse que sou eu a causa desta desordem, quando eu estava doente; e metendo-se no meio dos soldados dizia-lhes em voz baixa: ele não quer dar soldo, não se pode suportar.
O governador pediu então para Lisboa 100 homens de tropa para prender e remeter os cabeças de motim, a fim de serem mortos no reino e mandadas as suas cabeças para Bissau, como se fez em Cabo Verde, e que para alli fosse enviada uma fragata de guerra para esse fim.
Solicitou para que Bissau, com Cacheu e suas dependencias de Farim, Zeguichor, Geba e outros pontos da Guiné, constituisse uma capitania geral, em attenção ao estado da Europa e à distancia que estava de Cabo Verde; pedia para ser promovido n'aquelle lugar com 1:000$000 réis, que já tinha, no caso que o achassem digno, evitando-se assim contendas com o governador de cabo Verde, sem proveito para os interesses reaes, e só o de fomentar a intriga e a desordem.
Desconfiando os cabeças de motim que o governador ia pedir a prisão d'elles, foi um soldado entregar-lhe um papel no qual se lia:
1.º Nunca jámais intimará ordem alguma a Thomaz da Costa Ribeiro, e não se falará mais em elle sahir d'aqui. (Este Costa Ribeiro era o capitão-mór de Farim.)
2.º Não se dará parte do que tem acontecido, e nem se falará mais Thomaz da Costa Ribeiro, em o Dr. José Thomaz de Sá, em o Capitão Antonio Cardoso de Figueiredo e do escrivão de fazenda Justiniano Antonio de Moraes; nem se dará parte alguma do soldado que V.cê desconftar ser cabeça do pagamento.
Estes capítulos deve V.cê lel-os e rasgar já; deve n'elles guardar um segredo eterno, sob pena de morrer ás nossas mãos e toda a sua familia. Quem nos dá este conselho, queremos mais bem que a V.cê jámais poderá justificar isto, pois todos juararemos ser mentira, e sempre ouvimos dizer que quem confessa pela bocca morre pelo pescoço; tome para si o melhor partido.
O governador, em vista de tantas ameaças e sem navios para pedir providencias, atravessou o sertão, indo á Goré pedir soccorro de gente e de dinheiro pois a fazenda já lhe devia 5:000$000 réis.
Depois do governador expedir a sua correspondencia para Lisboa regressou a Bissau, mas durante aquelle tempo os promotores das desordens ftzeram-lhe as mais graves accusações ao de Cabo Verde; este mandou que o capilão Cardoso e o escrivão de fazenda se constituissem juizes d'aquelles factos, auctorisando-os a syndicarem e a prendel-o se o julgassem culpado.
No dia 12 de setembro, sem ter precedido inquerito, foram a casa do governador Gouveia e deram-lhe a voz de preso à ordem de Sua Alteza Real; só depois d'isto é que formaram a tropa e lhe leram a ordem do governador de Cabo Verde.
Foi o governador Gouveia encerrado n'um quarto velho, com sua mulher e filhos, ficando incommunicaveis; ahi se mandou pôr uma grade de ferro, sem portas, e permitliu-se apenas que um preto lhe levasse o comer; o preto tambem era revistado por ser prohibido ao preso escrever.
No calabouço injuriavam-no constantemente.
O secretario do governo, Luiz Antonio Esteves Freire, receoso de ser preso, fugiu e embrenhou-se no sertão; depois de percorrer umas 60 leguas chegou a Cacheu e d'ahi passon ao reino; narrou este caso e representou contra o despotismo do governador de Cabo Verde e dos desordeiros de Bissau.
Emquanto do reino não davam providencias, conseguiu pedil-as da prisão o governador Gouveia, enviando uma carta ao governador e capitão general da Serra Leoa, Charles Maxwel, em data de 17 de outubro, para solicital-as do governador de Cabo Verde:
“Il.mo e Ex.mo Sr. Governador e Capitão General da Serra Lioua. Senhor, as circonstancias em q me vejo me fazem procurar a protecção não só de·V.• Ex.• como da Grande e sempre Grande Nação Bretanica. Eu Senhor sou o Governador de Bissau, Sargento Mor de lnfantaria, Cavalleiro profeço na primeira ordem de Portugal que hé de Nosso Senhor Jesus Christo. Contra todas as Ordens e Leis do Reino esteu metido em prizão de Ferro e até agora não sei o pelo que. Coando vim para este governo truçe 150 Homens Brancos tirados de todos os Carseres do Reino costumados a toda a casta de crimes, querendo aqui f'azerem o mesmo foi-me de grande trabalho o podel-os suster e a força de castigos os puz em Ordem as finanças q nem delas havia endisios hoje se acha tudo aranjado e em fim Senhor  6 q aqui ha tem tido abelidade de por tudo em huma grande dezordem, e flzerão com a Tropa com q no dia 11 de Julho fizesem hum grande levante e depuserão·todas as Armas e não quizerão fazer o Serviço Isto por lhe faltar o pagamento 11 dias, e pegarão todos em Armas e não as quizerão entregar; no dia 10 a sahida da Miça fui descomposto e repreendido aspramente pelo primeiro Cabeça deste levante que hé o Capitão da 3.ª Companhia Antonio Cardozo de Figueiredo que hé o que hoje estâ Governando. Fizerom os 4 Cabeças de mutim e da traição huma queixa ao meu EU ... Senhor General em Cabo Verde que deu por ella sem atender aos meus Offiçios e as minhas reprezentaçaois, e com efeito forão atendidos. Porem Senhor as suas Ordens são muito retas dizendo ellas que se tiraçe huma Devaça oculta contra mim e se eu foçe culpado que foçe prezo, e se fose o Escrivão da Fazenda Real qne então foçe elle prezo o que não fizerão porque a Devaça tirouçe depois de eu estar preso e Escrivão foi o mesmo da dita Fazenda Real logo como havia de sahir culpado, o que está tudo nulo e sem ifeito algum de Justiça, e eu prezo El.mo Senhor depois de se acabar de tirar a devaça juntarão algumas testemunhas e a maior parte da Tropa e fizerão hum abaixo asignado que se reduz o seguinte: Nos abaixo asignado atestamos e sendo necessário juramos aos S.tos Evangelhos em Juizo e fora delle que a Devaça que se tirou contra o Snr. Governador, nenhuma Testemunha soube o q jurou pois quando o Escrivão procurou as d.'° Vm ... sabe alguma couza do Governador Manoel Pinto, que a Testemunha dezia não Snr ., acodia o dito Escrivão sim Senhor bem sei asigne aqui e se obrigava violentamente asignar a ser castigado e q no requerimento q toda a Tropa dizem fizerão contra ao d ... Snr. G. or ninguem a soube senão coando o Ajudante Antonio Joze o andou aslgnar pellos Cuarteis com grandes amiaços a quem o não quizesse asignar.
“Fol este papel denonsiado ao d ... comandante Cardoso, tem dado grandes rodas de pau nos asignantes, tem 2 Alferes prezos, Joze dos Santos Campelo com 3 pares de Ferro, Manoel Luiz Monteiro sem elles, e tem a meu Filho Cappitão da 2. ª Companhia Confirmado por Soa Alteza Real tambem prezo, este se chama Marçelino Pinto da Fonçeca. Esta bê Senhor a sorte a que se ve reduzido hum Homem que acaba de governar esta Praça. Suplico a V. EIIl.ª pela sua bonrra, pela bonrra da grande Nação da Granbertanba, haja de mandar as Ilhas de Cabo Verde pedir ao meu General me solte e me entregue esta Praça que eu Jurei nas Reais Mãos de S. A. R. Pleito e o Menaje por ella.
“Pello Manual mandei tão bem buma Carta, peso a V. Elll.ª o mande tambem entregar ao d.'° meu General, pois athé estou empedido de Escrever e tenho 3 Sentinelas a vista. Só V. Exll.ª hé o que agora me pode valer, e eu espero tanto de V. Exll.ª como da Vossa Nação.
“Se o meu General não quizer atender, o que não hé de esperar, na vossa bonrra e nasimento eu tenho toda a esperança. Aseitai Sr. ·a m. ª estima pois sou De V. Exll. Senhor. Com mais profundo Respeito Manuel Pinto de G.ª Bissau de 17 de outubro de 1811. IlL- Exll. Senhor Charles Maxwel.”
Por aqui se vê quão graves foram as desordens em Bissau e citadu por muitos, sendo o principal auctor o capitão Cardoso de Figueiredo, que se arvorou em governador. Não pouco concorreu para esse estado de coisas o governador de Cabo Verde, que mandara fazer uma syndicancia por aquelles que eram os algozes do governador da Praça. Não era, verdade seja, muito prospero o estado financeiro de Cabo Verde que lhe permittisse mandar pagar aos soldados da Guiné em metal sonante os seus vencimentos, que eram pannos tecidos nas ilhas, mas o que era intoleravel é que os pannos fossem para os armazena da Guiné oom o augmento de mais 50º/o do seu valor.» -
Subsídios para a História de Cabo Verde e Guiné,  por Christiano José de Senna Barcellos,  parte III, pgs. 191-195, Lisboa, 1906
1811/09/10
A portaria de 10 de Setembro de 1811 criou, junto dos governadores e capitães generais juntas compostas por ele e pelo ouvidor e juiz de fora, que tinham atribuições administrativas e judiciais.
1811/09/12
O capitão-mor da Praça de Bissau, MANUEL PINTO GOUVEIA, foi preso com a sua família por ordem do capitão FIGUEIREDO CARDOSO, encarregado pelo Governador de Cabo Verde para fazer a sindicância aos seus actos a quando da insubordinação das praças de que se compunha a guarnição de Bissau.
1811/10/17
Achando-se preso pelos soldados da guarnição e criminosos retirados do cárcere do reino, Governador de Bissau, sargento-mór GOUVEIA, conseguiu este enviar uma carta ao capitão geral da Serra Leoa, CHARLES MAXWELL, pedindo-lhe solicitasse ao Governador de Cabo Verde providências a fim de ser posto em liberdade e condenados os chefes da insubordinação.
1811/11/14
José Leandro da Silva e Sousa  provido ouvidor em 14 de Novembro de 1811, esteve em Cacheu em Fevereiro de 1813 a fim de sindicar os actos do comandante José António Pinto.
1811/12/27
Muitas pessoas protestam contra os novos impostos criados para suportar a milícia em Santiago. Os cabecilhas do protesto foram deportados como prisioneiros para o Governador do Brasil. Barcelos conta que as autoridades "não confiaram nos soldados crioulos porque no dia da revolta eles declararam que não disparariam contra os revoltosos."
1811/12/28
Levantamento popular na cidade da Ribeira Grande, ilha de Santiago
Revolta de 28 de Dezembro de 1811. Os rendeiros preferencialmente protestavam contra as opressões que vinham sofrendo dos morgados, por meio de requerimentos dirigidos ora para o administrador do concelho, ora para o governador geral de Cabo Verde. Porém, surtiam pouco efeito, tendo em vista não só o poder de influência dos morgados sobre a justiça local, como também a impossibilidade de o Governo Geral interferir nos assuntos de justiça e na autonomia das câmaras municipais.
A primeira manifestação colectiva que se tem registo é a da revolta de rendeiros, de 1811. Correlacionada directamente com a alta taxa tributária, para o sustento da infantaria, aumentou os descontentamentos na ilha de Santiago. Pela primeira vez as autoridades locais mostraram-se incapazes e frágeis diante da ameaça eminente de um grupo de trabalhadores do interior marchar para a vila da Praia. O próprio governo de Cabo Verde mostrou-se apreensivo de que a infantaria usasse abusivamente a força para conter os trabalhadores. Do ponto de vista do governo geral das ilhas, a revolta devia-se à influência de algumas pessoas descontentes com a administração das ilhas, que em, segundo elas, momento algum abonava os "deveres" atribuídos aos rendeiros, acrescidos pela imposição de uma nova cobrança para o sustento da infantaria, agravando ainda mais estado de miserabilidade própria da maioria da população. A revolta dos rendeiros, parceiros e meeiros levou três mil pessoas à vila da Praia para protestar contra a decisão do governo geral de Cabo Verde de implantar esse novo imposto. Como resposta, as autoridades governamentais debelaram o movimento com exercício da violência física.
1813
Situação de fome nas ilhas de Santiago e Maio
1813/02/07
«Para o cargo de commandante de Cacheu havia sido nomeado Joaquim José Rebello de Figueiredo Goes em 1811, que em um dos seus ofícios para o conde das Galveias dizia em 1813: Que havia chegado a Cacheu no dia 7 de fevereiro o ouvidor geral de Cabo Verde a syndicar os actos de José Antonio Pinto; que o ouvidor andara com elle de má fé, sendo pouco attencioso, pois expedira ordens aos commandanles dos presidios. recebendo inventarios e papeis sem formalidade alguma de entrega, e sem conhecimento d'elle comandante de Cacheu, que estava revestido do caracler de provedor e de juiz; que o ouvidor dizia que podia abrir correição e julgal-o até.
O conde das Galveias, achando muito ridícula esta queixa, embora reconhecesse alguma razão ao commandanle, mandou archivar sem resposta o referido officio, com a seguinte nota: “entre os dois só se collige de ter havido concussões, ciumes e desejos de preferencia; desconfiança e má fé, que tanto caracterisam o procedimento de magistrados e militares noviciados nas respectivas carreiras.”
Este commandante pedia um regimento da alfandega para evitar dolo e descamiobos de direitos dos navios que os pagam em Cabo Verde e Bissau e não em Caebeu. Ordenou então provisoriamente que pagassem 5 º/o sobre todos os generos e razendas, facilitando aos negociantes esse pagamento em ferro.
Requereu um regimento judicial para os contadores, que abusavam contando irregularmente as castas nos lnventarios.
Expoz o irregular procedimento de dois frades, um dos quaes seguiu para o Maranhão; o outro leigo tinha já vendido o telhado do hospicio e negava-se a recolher ao seu convento de Cabo Verde.
A exigencia dos direitos e de um regimento judicial para se pôr termo aos abusos e a má informação contra um frade deram causa a que o commandate Figueiredo Goes fosse perseguido e maltratado pelos principaes moradores de Cacheu, que só queriam para commandantes da Praça quem com elles se associasse.» -

Subsídios para a História de Cabo Verde e Guiné,  por Christiano José de Senna Barcellos,  parte III, pg. 196, Lisboa, 1906
1813/03/24
JOÃO SOARES DA COSTA PINTO, bacharel, foi nomeado juiz de fora para Bissau e Cacheu em 1813 e chegou à Guine em 24 de Março.
1813/04/24
Jaime Walter refere que HONÓRIO PEREIRA BARRETO nasceu em Cacheu no dia 24 de Abril de 1813, «filho de JOÃO PEREIRA BARRETO, sargento-mor de Cacheu, e de ROSA DE CARVALHO ALVARENGA, havia muitos anos residente em Ziguinchor (…)».
1813/03/24
JOÃO SOARES DA COSTA PINTO, bacharel, foi nomeado juiz de fora para Bissau e Cacheu em 1813 e chegou à Guine em 24 de Março.
1813/04/24
Jaime Walter refere que HONÓRIO PEREIRA BARRETO nasceu em Cacheu no dia 24 de Abril de 1813, «filho de JOÃO PEREIRA BARRETO, sargento-mor de Cacheu, e de ROSA DE CARVALHO ALVARENGA, havia muitos anos residente em Ziguinchor (…)».
1813/11/22
Falecimento de D. FREI SILVESTRE DE MARIA SANTÍSSIMA
1814
O papa Pio VII condena o comércio de escravos.
Os Países Baixos proíbem o tráfico negreiro.
«O verdadeiro commercio, o commercio dos produtos naturaes da Guiné, estava todo entregue aos francezes, que, desde 1814, se achavam de posse da Gorea, e aos inglezes, que, em 1815, fundaram uma colónia na embocadura do rio de Gambia.
Em 1828 os francezes da Gorea apossaram-se da ilha de Ito, ou dos Mosquitos, na ponta norte da barra de Gasamansa, e alli fundaram — com lesão dos nossos direitos de que não soubemos aproveitar-nos — um estabelecimento que nos tirou, por assim dizer, a posse do rio. Só em 1830 nos lembrámos de mandar fortificar a ilha dos Mosquitos, mas então já alli tremulava a bandeira franceza.
Assim fomos perdendo o nosso dominio, e, ainda mais, o importante commercio d'aquella fértil região.
Segundo o relatório do governador da província de 1878, os limites da possessão portugueza estão mal definidos; e, mesmo dentro d'esses limites, ha os rios Casamansa e Nunes, onde existem estabelecimentos francezes. O nosso dominio, até hoje, pouco se alongava dos estreitos logares por nós occupados
Estudos Sobre as Províncias Ultramarinas, por JOÃO DE ANDRADE CORVO, Volume I, Lisboa, por ordem e na typographia da Academia Real das Sciencias, 1883, pgs.91-92
1814/01/22
Por carta régia de 22 de Janeiro de 1814 foi mandado retomar o seu governo D. Antonio Coutinho de Lencastre.
1814/08/22
Situação de fome na ilha da Boa Vista
«Dentro da praça de Cacheu lavrava também o mesmo espírito de indisciplina. Os seus moradores e funcionários, incluindo os de classe eclesiástica, habituados a certa relaxação revoltaram-se contra o capitão-mor Joaquim de Figueiredo Goes, por não lhes agradarem algumas providências tomadas em beneficio dos serviços públicos e em particular na cobrança rigorosa dos direitos aduaneiros.
Segundo o relato feito pelo capitão Goes, em 22 de Agosto de 1814, os revoltosos, aproveitando da circunstância de estar retido em casa por doença, assaltaram a sua residência. Pelas 7 horas da manhã foi prevenido por um seu escravo que o sargento-mor da Praça João Pereira Barreto o procurava. Logo a seguir viu entrar o mesmo Barreto, seguido de oficiais, do vigário e de um frade, que o cercaram declarando que estava preso à ordem de S. A. Real.
Como não lhe fôsse apresentada a ordem de prisão, procurou resistir, mas foi subjugado pelos escravos dos revoltosos. No entanto durante a luta feriu com duas cutiladas o sargento-mor Barreto, que fugiu acompanhado pelos padres.
Mantido incomunicável na prisão, ali se conservou até Janeiro do ano seguinte. Uma noite conseguiu fugir, mas sem forças para caminhar, foram encontrá-lo prostrado no caminho de Cacanda. Recapturado voltou à prisão, onde esteve até à chegada do novo capitão-mor, em Abril de 1815.
Entretanto os revoltosos constituiram um triunvirato composto do sargento-mor Pereira Barreto, do vigário Gomes de Oliveira e do tenente António Miranda de Carvalho. João Pereira Barreto era natural de Santiago, filho de um padre e de uma escrava.
O vigário Gomes de Oliveira era também mulato, nascido em S. Nicolau e o tenente Carvalho era natural de Cacheu, filho de um caboverdeano e de uma indígena gentia.
O facto foi participado ao governador de Cabo Verde que tratou de enviar para Cacheu o capitão João Cabriel Godolfim, nomeado capitão-mor interino com o encargo de restabelecer a ordem.»

João Barreto, HISTÓRIA DA GUINÉ 1418-1918, edição do autor, Lisboa, 1938, pgs. 178-179
MANUEL CARVALHO DE ALVARENGA esteve implicado na destituição do comandante de Cacheu, JOSÉ FIGUEIREDO DE GÓIS, em Agosto de 1814, até se tornar genro de ANTÓNIO DE MIRANDA DE CARVALHO, um dos três cabecilhas. Apesar disso, reteve o comando de Ziguinchor e foi promovido a tenente-coronel de 2ª linha, como é atestado pela sua pedra tumular, que agora está à porta da Biblioteca Nacional de Bissau.
JOÃO PEREIRA BARRETO, então sargento-mor, foi um dos cabecilhas juntamente com ANTÓNIO MIRANDA DE CARVALHO, tenente de ordenanças, e com o padre MANUEL GOMES DE OLIVEIRA da revolta contra o comandante de Cacheu, em Agosto de 1814
« O governador D. Antonio, retomando as redeas do seu governo, nomeou João Cabral da Cunha Goodolphim, capitão de infanteria, para governador interino de Cacheu e syndicar de factos acontecidos alli contra o governador d'aquella Praça, Joaquim José Rebello de Figueiredo e Goes, que havia sido deposto, formando-se um triaunvirato para a governar, composto do vigario Manuel Gomes de Oliveira, preto, natural da ilha de S. Nicolau; do sargento-mór João Pereira Barreto, natural de S. Tbiago, filho de um padre e de uma escrava, e do tenente de ordenanças e thesooreiro Antonio Miranda de Carvalho, natural de Cacheu, filho de um preto de S. Tbiago e de uma preta gentia, vizinha da Praça. Este governo provisorio havia participado ao de Cabo Verde que o referido governador de Cacheu estava doido e que o mandasse substituir.
O governador D. Antonio limitou-se apenas a mandal-o substituir, e com municou este facto para o Rio de Janeiro. O ministro mandou que seguisse para Cacbeu a corveta Aurora a buscar Figueiredo de Goes, o que não foi preciso por já estar na Praia. Seguiu no brigue Triumpho para o Rio de Janeiro, e alli foi promovido a sargento-mõr em attenção aos seus bons serviços.
O novo governador Cunha Goodolpbim não syndicou, embora o ministro tivesse dado ordem para isso e para prender os auctores e remettel-os para a côrte.
Em 6 de agosto de 1816 relatou, no Rio de Janeiro, ao ministro, o ex-governador Goes os insultos que sofreu em Gacheu.
Que desde 7 de julho de 1814 soffria de uma molestia grave e que por fafta de medico passara a ·Bissau para se tratar, melhorando alli muito; regressando a Cacheu tornara a adoecer. As febres faziam-no delirar.
Em 22 de agosto, pelas sete horas da manhã, fôra prevenido por um seu escravo que o sargento-mór, major da Praça, João Pereira Barreto, o procurava; este entrou immediatamenle, seguido de officiaes, do vigario e de um frade leigo, que o cercaram, dizendo-llle o Barreto que elle estava preso á ordem de sua .alteza real. Exigiu a apreseotação d'essa ordem, e como tal não existisse não se deu â prisão, chamando os soldados pera impedir qualquer offensa. Entraram então n'esse momeolo grande numero de escravos ás ordens do Barreto. Os soldados não compareceram. Houve lucta, .e como elle estivesse armado com um sabre deu duas cutiladas no Barreto, que fugiu ensanguentado, ficando elle tambem ferido. Os padres fugiram. 
Que, finalmente, foi subjugado pelos escravos e mettido na prisão, onde o martyrisaram, conservando-o incommunicavel.
Em 1 de janeiro de 1815 conseguiu evadir-se da prisão pelas onze boras da noite, e encaminhando-se para a fonte Callaca faltaram-lhe as forças, ficando estendido no chão até ao outro dia, onde foi encontrado por uma gentia de Cacanda, vindo gente depois para o soccorrer. A esse tempo chegava da Praça uma canôa, que o recebeu, estando elle já mettido na agua.
Foi encerrado na mesma prisão quasi nú e com grilhões aos pés. Para se alimentar davam-lhe um boccado de abobora crua, até 3 de janeiro, e depois carne de porco, peixe salgado e arroz.
Fõra-lhe probibido fallar com os mestres dos navios que chegavam de Cabo Verde.
Em abril chegara o governador nomeado, Cunha Goodolpbim, e em 4 de junho embarcou então no brigue hespanbol Welington, que seguia para Havana e d'alli para Cabo Verde, onde se apresentou a 15 de agosto. Em 20 de junho de 1816 seguiu para o Rio de Janeiro, no brigue Triumpho, onde chegou a 1 de agosto.
O ministro nomeou José Telles de Menezes Drumot governádor da Praça de Cacheu, que levou instrucções para tirar a devassa e para remelter os presos no caso que a devassa não estivesse jã feita.» -
Subsídios para a História de Cabo Verde e Guiné,  por Christiano José de Senna Barcellos,  parte III, pgs. 224-225, Lisboa, 1906
1814/08/22
Deu-se uma insubordinação na Praça de Cacheu, tendo sido preso o capitão-mor dela, apesar da resistência oposta aos sediciosos, todos naturais da Guiné.
António Miranda de Carvalho, tenente de ordenanças, foi um dos cabecilhas (juntamente com o sacerdote do forte, Manuel Gomes de Oliveira, e João Pereira Barreto, sargento-mor) da revolta bem sucedida contra o comandante de Cacheu, em Agosto de 1814. Era «filho dum homem de cor do Arquipélago de Cabo Verde e duma preta gentia». Era pai (?) de: Pedro Lopes de Carvalho, primo de Honório Barreto. Foi morto durante o ataque a Farim em Novembro de 1846.
O capitão-mor FIGUEIREDO GÓIS, ali abusivamente deposto por um grupo de conjurados constituído por oficiais e eclesiásticos, foi em 1814 mandado sindicar pelo governador de Cabo Verde, que encarregou disso um capitão-mor interino, CUNHA GOODOLFIM, que então para tanto expressamente nomeou; mas só após a chegada deste Figueiredo Góis foi libertado da prisão em que os conjurados o conservavam retido.
Internacionalmente, as tréguas de 1814 seguidas do tratado de paz, tinham trazido um momento de tranquilidade a Portugal. Porém a vida interna da Guiné, essa ia continuar perturbada
1814/11/23
Acusado de loucura foi injustamente preso pelo sargento-mor da praça de Bissau o governador da mesma, FIGUEIREDO DE GÓIS, que se recusava a permitir a escravatura e o contrabando de fazendas. Formou se um triunvirato para a governar composto pelo vigário, sargento-mor e pelo tenente de ordenanças. O Ministro nomeou MENEZES DRUMONT governador daquela Praça, lendo levado instruções para tirar a devassa.
1815
Congresso de Viena: as potências europeias (Áustria, Espanha, França, Grã-Bretanha, Noruega, Portugal, Prússia, Rússia e Suécia) comprometem-se a proibir o tráfico de escravos, embora sem fixação de datas.
«A partir de 1815 um novo factor começa a influir na administração política e financeira da Guiné. Referimo-nos às primeiras determinações para a abolição do tráfico de escravos.
Com efeito, em 19 de Fevereiro de 1810, assinava Portugal com a Grã-Bretanha um tratado em que se faziam as primeiras tentativas neste sentido. A seguir, no Congresso de Viena ficava estabelecido o princípio da abolição de escravatura, ficando ao cuidado de cada nação tomar as providências necessárias para 'a execução do acôrdo. Em vista disto, o Govêrno português proíbia em 1815 o comércio de escravos .em tôda a costa situada ao Norte do Equador.
Se bem que no nosso território o tráfico de escravos tivesse decrescido consideràvelmente, não podiam deixar de se fazer sentir os efeitos dessa determinação, provocando não somente diminuíção da actividade comercial e alfandegária, mas também uma certa reacção da parte dos indígenas, que habituados a ter na permuta de escravos um meio fácil de adquirir os artigos necessários para sua vida, viam-se de súbito privados dêste comércio e fonte de riqueza.
A reacção dos indígenas traduzia-se naturalmente no agravamento da hostilidade contra as autoridades portuguesas tornadas responsáveis por êsse contratempo. A abolição da escravatura provocou, como é sabido, uma longa crise na rudimentar economia dos povos africanos, que terminou com o desenvolvimento da agricultura tropical e progressos da colonização europeia.
Sôbre êste assunto o govêrno central expediu do Rio de Janeiro ao governador de Cabo Verde, um ofício datado de 5 de Outubro de 1818, pedindo informações acêrca das consequências «da cessação do tráfico da escravatura que os presídios de Guiné faziam até agora, com tão reconhecida vantagem, assim para as mesmas ilhas (Cabo Verde) como para alguns portos de Brasil; cessação esta que, mudando quasi completamente a face mercantil daqueles presídios, deixa bem prever qual é o pé a que aqueles estabelecimentos se deverão reduzir, e a conseqüente necessidade em que V . M . fica de vigiar dobradamente sôbre a conservação de tais presídios, posto que sumamente honerosa se possa ela considerar de hora em diante ... » (S. Barcelos)
João Barreto, HISTÓRIA DA GUINÉ 1418-1918, edição do autor, Lisboa, 1938, pg. 179-180
JOÃO CABRAL DA CUNHA GOODOLFIM é capitão-mor de Cacheu interinamente.
1816
Samuel Hodges, de Stoughton, Massachusetts, e Manuel António Martins, de Cabo Verde, estabelecem uma "parceria de negócio" que envolve o contrabando de mercadoria americana, a bordo de navios africanos, para portos ao longo da costa da África Ocidental. Em 1818, em resposta ao volume de trânsito de navios americanos em Cabo Verde, o Governo dos EUA estabelece o seu primeiro consulado e nomeia Hodges como Cônsul.

Erupção vulcânica na ilha do Fogo
1817
João Teles de Meneses Drumond capitão-mor de Cacheu
CARLOTA PEREIRA, de 22 anos, e CLAUDINA PEREIRA, de 28 anos, ambas pretas, acompanharam JOÃO PEREIRA BARRETO a Portugal em 1817/18; a ultima era uma criança de 6 meses quando viajou de Lisboa no fim de Fevereiro de 1818.
1817/01/00
ANTÓNIO GOMES conseguiu um passaporte em Lisboa para regressar a Cacheu em Janeiro de 1817; preto, forro, solteiro, nascido em Cacheu, de 24 anos de idade.
1817/01/18
Pelo decreto de 18 de Janeiro de 1817 (1827?) foi nomeado governador de Bissau o primeiro tenente de armada FRANCISCO JOSÉ MUACHO.
1817/02/14
«Logo que entreguei o Convento ao Padre Guardião Fr. José de Tentugal, que foi a 24 de Outubro de 1816, fui para Bissau na companhia do Comandante interino, ANTÓNIO JOÃO DE DEUS MIRANDA, tendo saido deste Porto de Vila da Praia em 3 de Fevereiro de 1817, e chegámos á Praça de S. José de Bissau aos 14 do mesmo mês: onde estive servindo de Capelão da tropa daquela guarnição nove rneses, por uma Portaria do Excelentíssimo Capitão General das llhas de Cabo Verde. Logo que se passaram dois meses e meio fui mandado á Província de Geba [ que dista daquela, dizem, 60 léguas pelo rio acima] pelo sobredito Comandante de Bissau, em consequencia de uma representação feita pelo Comandante de Geba e seus habitantes , em que pediam para eu lá ir confessar,e baptizar aquele povo, que havia seis anos , ou mais, que estava sem Pároco; com efeito foi, não obstante estar convalescendo de uma grande moléstía, da qual não me julgaram vida: deixando para dizer missas à tropa o Padre Vigário de Bissau em meu lugar. Saí de Bissau nos fins de Abril , e cheguei ao Fá, uma povoação de Mandigas Mouros, em três ou quatro dias, e depois de descansar alí uma hora, parti a pé até a Ganjarra, que será distante dali légua e meia para duas ; e como eu não quisesse ir por terra, por me achar fraco da moléstia, me afirmaram que era um passeio de meia légua, e convenceram-me com efeito a ir a pé. Parti por entre aqueles arvoredos, que erão encantadores, não só pela vista, mas até pelo agradável aroma que deles dimanava, único lenitivo da minha fadiga e cansaço: pois quando cheguei à povoação da Ganjarra jánão podia dar um só passo, por levar os pés muito feridos. Logo que o Comandante de Geba soube, que eu tinha chegado allí, mandou uma canoa para pasaar o rio à outra parte, aonde está a povoação de GebaQuando cheguei ao porto desta povoação, bastantemente lindo pelas muitas árvores de que está bordado, todo aquele Povo mostrou grande álegria e contentamento, dando muitos tiros de espingarda, repiques de sino, e todas as demonstrações de obséquios de que eu não era digno, e que só competiam a um Bispo, ou Visitador. Dalí me dirigi a casa do Comandante [e não fui à Igreja por ser já de noite]. No dia seguinte, que era 3 de Maio, Invenção da Santa Cruz, fui celebrar, a que assistiram o Mestre da Capela, e muitos meninos,que me ajudaram a cantar a Missa, e muito bem;melhor que se canta na Catedral desta ilha de Santiago de Cabo Verde: estava a Igreja cheia de gente, que não podia caber mais. Estive alí todo o mês de Maio, e só confessei  203 pessoas. No 2.º Oitava do Espirito Santo foram só sete pessoas à Missa, que também foi cantada, e isto não deixou de me espantar. Perguntei porque razão era tão pouca gente naquele dia: responderam-me que estava a maior parte no sertão a fazer cera. Baptizei entre meninos e adultos para cima de oitenta pessoas, a que não puz os Santos Óleos por não os haver lá, nem em Bissau. Geba julgo que terá para cima de duas mil almas; advirto que baptizei só os que disse; por ter lá estado havia pouco tempo, o meu companheiro Fr. Manuel de Cessões, que baptisou um grande número de pessoas. Esta povoação de Geba está também há seis ou mais anos sem Pároco. A Paroquia ou para melhor dizer , o seu Vigário, está sujeito ao de Bissau, como Vigário Foraneo, que é nomeado pelo  Ordinário; porém a Religião, tanto em Bissau como em Geba está bastante abandonada, acolá todavia mais do que aqui
Viagem à Guiné de FR. AGOSTINHO DE MACEDO, escrita por ele mesmo em 1817.
1818
Em finais da década de 1810 e inícios de 1820 a pessoa mais influente na área do Geba-Grande era JOAQUIM ANTÓNIO DE MATOS (1788]-1843), um português que subiu de funcionário das alfândegas em 1805 para comandante de Bissau em 1818. Aparentemente Matos ficou a dever muito do seu sucesso a uma mulher africana ou luso-africana que exercia considerável influência entre os Papeis locais.
O declínio da influência de Matos em Bissau parece datar do seu casamento em 1820 (?) com Maria do Carmo Pusich, filha do governador da Província de Cabo Verde e Guiné. 0 destino de Matos mudou adversamente quando, em Maio de 1821, o seu sogro foi deposto por uma «revolta popular» na Praia a favor da revolucionária Constituição de 1820 em Portugal, revolta orquestrada por MANUEL ANTÓNIO MARTINS, o agente do poder no arquipélago nas décadas de 1820 e 1830. Seguidamente Martins aliou-se com Matos contra Caetano Nozolini e Mãe Aurélia Correia, mas já era tarde para impedir a consolidação do seu poder em Bissau (Brooks 1983: 310-311).
1818/02/06
«António Pusich, capitão· de mar e guerra, nacionalizado português desde 1791, nomeado em 6 de Fevereiro de 1818. Estivera antes no arquipélago desde 1801, como Intendente da Marinha com largas atribuições independentes do governador da província. Daí resultou a designação de flor do intendente, dada em Cabo Verde a uma espécie de acácia introduzida por Pusich.
Em 1 de Maio de 1821, um movimento revolucionário liberalista obrigou-o a afastar-se do cargo e governo foi entregue a uma Junta Provisória. Por carta régia de 10 de Abril de 1821 havia sido nomeado para governador Luiz Xavier Palmeirim, mas não chegou a tomar posse.» João Barreto
Ao comando do brigue de guerra Dragão, ANTÓNIO PUSICH fez a sua primeira viagem às ilhas de Cabo Verde, em 1798, a mando da Coroa portuguesa para ir receber as “produções naturais” das ilhas. Ao regressar a Lisboa em 1801, foi promovido a capitão-de-fragata e simultaneamente nomeado Intendente da Marinha das ilhas de Cabo Verde, cargo esse criado propositadamente para ele e com total independência em relação ao governador de Cabo Verde, na altura MARCELINO ANTÓNIO BASTO. Desempenhou os dois cargos em simultâneo nas ilhas, com residência na ilha de São Nicolau, até 1811.
1818/10/05
No decorrer do ano de 1819 o governador tomou muitas providências a bem da administração do arquipélago: deu comprimento à carta régia de 5 de Outubro de 1818, que mandou desanexar os empregos de feitores dos de comandantes das ilhas, nomeando-se, por portarias da Junta da real fazenda, feitor para S. Nicolau, José António de Araújo, e para a Boa Vista Serafim de Brito Livramento, ficando assim desligados os respectivos comandantes; na Brava, por ter falecido o feitor Manuel Joaquim Pereira, nomeou-se Francisco José de Sena.
1818/10/15
O Governo refugiado no Rio de Janeiro pede informações sobre as consequências da cessação do tráfico da escravatura que os presídios da Guiné faziam até então, com tão reconhecida vantagem, assim para as Ilhas de Cabo Verde como para alguns portos do Brasil
1818/11/18
Por provisão desta data ordenou-se que se observasse a mais rigorosa economia nas despesas da Capitania e praça da Guiné, a fim de os rendimentos delas chegarem para cobrir as despesas sem se recorrer ao produto da urzela das ilhas de Cabo Verde, pois que havia cessado as que se faziam com o batalhão que saíra de Lisboa para ali estabelecer a paz.
1818/11/30
Assalto de piratas à ilha do Maio
1819
J. Teles de Meneses Drumont, capitão-mor de Cacheu, faleceu em Julho de 1819.
Situação de fome na ilha de São Nicolau
1819/02/12
«Na ilha do Fogo estava processado o capitão-mór d'ela, João de Araujo Gomes. pelo ouvidor geral José Leandro, o qual fôra accusado de vários crimes; o processo foi remettido ao governador D. Antonio, para o mandar julgar, pelo facto d'esse réo ser militar, em 27 de novembro de 1815, 28 de outubro e 20 de novembro de 1817; fóra processado em 1815 por querer apossar-se de umas terras que pertenciam a Fernando da Silva, usando da força que lhe dava a sua auotoridade na ilha; em 1817, pelo crime de contrabando de polvora estrangeira, o que se provou n'uma devassa, de sociedade com Manoel Dias da Cunha Ribeiro, dando depois a este fuga para o estrangeiro.
O governador D. Antonio deixou o processo archivado, e nem exonerou aquelle capitão·mór do cargo, e por isso o ouvidor geral pediu em 12 de fevereiro ao governador Pusich para o mandar julgar.
O ouvidor José Leandro estava nomeado, pelo decreto de 17 de dezembro de 1814, desembargador para a Relação da Bahia e para servir no Maranhão, e na mesma data havia sido nomeado para o substituir Joaquim Gaspar de Almeida. Aquelle, por uma ordem régia, ficaria ainda por mais dois annos em Cabo Verde, e para Sergipe d'El-rei passou a servir o ouvidor Gaspar de Almeida. Reclamou José Leandro, protestando contra a sua demora, que reputava de illegal e que o prejudicava para a contagem do tempo de serviço.
O governador, fundando-se n'uma disposição da carta régia de 21 de setembro de 1794, que diz “que não continue no logar o ministro nomeado para outro”, resolveu “que elle entregasse a audidoria interinamente a um juiz ordinário da cidade em 24 de maio de 1819 e seguisse para o Maranhão.» - 
Subsídios para a História de Cabo Verde e Guiné,  por Christiano José de Senna Barcellos,  parte III, pg. 244, Lisboa, 1906
1819/05/17
«Bem infeliz fôra o governador com a sua proposta de 17 de maio de 1819 para se entregar a Guiné a uma companhia privilegiada, para allivio da real fazenda, e que fossem nomeados commandantes, sem ordenado, João Pereira Barreto para Cacheu e Joaquim Antonio de Mattos, seu futuro genro, para Bissau.
Parece que este governador ignorava os detestaveis resultados obtidos das companhias privilegiadas do Grão-Pará e do commercio exclusivo de Cacheu, que só ellas lucraram, com manifesto prejuízo dos povos.
A nomeação de commandantes para as doas Praças mais importantes da Guiné, sem vencimentos, seria de certo para elles um grande sacrifteio se f ossem honestos. O funccionario que não é recompensado, ou que o é mal, fatalmente rouba o Estado para não morrer à fome e explora os que d'elle dependem.
E possivel que não abusassem dos cofres da fazenda, mas que abusassem da lei que prohibia a escravatura, e que na Guinê ainda se fazia em larga escala, em navios portuguezes e estrangeiros, para Havana, Ballimore e Nova Orleans, com conhecimento dos commandantes das Praças e Presídios, o que confessa o governador n'um dos seus ofticios para o governo, citando os nomes de D. Pedro e de D. Antonio Frias, negociantes em Havana, como os principaes carregadores.
O nome de João Pereira Barreto não nos é desconhecido. Era negociante em Cacbeu e fora o auctor do attentado em 1814 contra o commandante desta Praça, Figueiredo Goes, depondo-o do governo e prendendo-o, assumindo elle, com outros, as redeas da governação, porque Figueiredo Goes não consentia escravatura nem contrabando de fazendas. A proposta do governador Pusich, indigitando o nome de Pereira Barreto para um logar de tanta ponderação, deixa-nos perplexo, sem podermos fazer um juizo seguro sobre a sua seríedade.
No mesmo estado de duvida ficamos com relação a Joaquim Antonio de Mattos para Bissau; este conservava as melhores relações com os régulos, a ponto de conseguir mais tarde para si, do rei de Canbabaca, a ilha das Gallinhas, e os régulos não dispensavam amisades senão a quem comprasse ou facilitasse a venda de escravos. Não fazemos mau conceito d'este governador; apenas nos parece um ingenoo que se deixava facilmente illudir.» -
Subsídios para a História de Cabo Verde e Guiné,  por Christiano José de Senna Barcellos,  parte III, pgs. 239-240, Lisboa, 1906
1819/07/09
Em 9 de Julho de 1819 faleceu o sargento-morcomandante de Cacheu, José Teles de Menezes Drumont, ficando à testa do governo três oficias milicianos de maior patente, eleitos pelo povo. Tinha sido eleito João Pereira Barreto, que queria dominar os outros, e para se evitarem desordens concordou-se que só governasse António Justino de Pontes Ferreira, capitão de uma companhia paga.
O governador nomeou então para esse lugar o capitão da primeira companhia da linha de S. Tiago, José Correia de Barros, que foi com o seu soldo e com a gratificação de 240$000 réis anuais. Nomeou-o também sargento-mor.
O governador de Cacheu tinha o ordenado de 8008000 réis anuais.
Para a ilha do Fogo foi nomeado comandante o capitão-mor João de Freitas Machado Miranda.
1819/10/12
Início dos trabalhos de construção da fortaleza do Príncipe Real na ilha de São Nicolau
1819/12/00
AGOSTINHO JOSÉ CARVALHO foi comandante do navio Conceição Esperança, destinado a levar degredados de Lisboa para Cacheu em Dezembro de 1819.






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