«1456 --26 de Fevereiro, Bula Dum in nostre mentis 'flrchana de
Calisto III, revalidando em relação a D. Afonso V o privilégio que seu antecessor Eugénio IV concedera
a D. Duarte, pelo qual os Reis de Portugal, e as pessoas que por eles fossem designadas, ficavam autorizadas
a comerciar com os sarracenos e infiéis - sem que por esse facto
incorressem em qualquer pena espiritual ou temporal praticando todos os actos
necessários ao bom andamento desse comércio, o qual teria de se
traduzir na compra e venda de quaisquer objectos, bens e vitualhas,
desde
que não levassem para as terras dos infiéis, e lhas vendessem, ferragens, madeiras,
cordas, navios ou qualquer género de armaduras, os quais, pelo seu
carácter bélico poderiam prestar-se a fomentar guerras dos infiéis contra os Cristãos (15) .
(15) - Doc. orig. em Bulas, m.0 5, n.º l, Arq. Nac. da Torre
do Tombo; publ. Idem - ibidem, vl. I, doe. n.º 419, p.
533-535.»
Jorge Faro, Duas
expedições enviadas à Guiné anteriormente a 1474 e custeadas pela fazenda de D.
Afonso V, pp. 76-77, Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, Vol- XII, N.º
45, Janeiro 1957
1456/03/13
Na
terceira bula papal, Inter Caetera, de 13 de marco de 1456, o Papa
Calisto III confirmou mais uma vez o monopólio que a Coroa Portuguesa recebera
através da bula Romanus Pontifex. Além disso, esta nova bula atribuiu à
Ordem de Cristo, cujo chefe máximo era o Infante D. Henrique (o Navegador),
todos os direitos exclusivos do cuidar das almas e das transacções económicas
associadas à ”cura das almas” nas regiões conquistadas e outras que se viriam a
conquistar, ”do cabo do Bojador à Índia”. As bulas papais revestiam-se de grande
significado na Europa desse tempo. As bulas materializavam no texto escrito, a
grande autoridade moral do Papa, directamente vinda da vontade de Deus, o que
possuía um grande poder de influência na ética e moral das pessoas. Quanto à parte económica, deve-se admitir
que também esta vez o Papa apostou no cavalo certo. Durante os primeiros
cinquenta anos triplicou-se o comércio europeu de escravos de África.
«1456 - 13 de Março.
Bula
Inter cetera de Calisto III, pela qual, confirmando
a Bula Rornanus Pontifex de 1454 de Nicolau
V, é concedido perpetuamente à Ordem de
Cristo todo o poder, domínio e jurisdição espirituais sobre as
terras, portos, vilas, lugares e ilhas, descobertos ou a descobrir, conquistados ou a conquistar, desde os cabos Bojador e Não, e por toda a Guiné até aos confins meridionais (16).
(16) - Doc. em:
Gaveta 7, m.º 13, n .º 7, traslado autêntico; Livro dos Mestrados, fl. 165, l.ª col. Lívro das escrituras
da Ordem dle Cristo, cod. n.º 235
do cartório da Ordem de Cristo, fl. 13 e s.; Arq. Nac. da Torre do Tombo; publ. idem - ibidem, vl. I, doc. n.º 420, p.
535-537.
Jorge Faro, Duas
expedições enviadas à Guiné anteriormente a 1474 e custeadas pela fazenda de D.
Afonso V, pp. 76-77, Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, Vol- XII, N.º
45, Janeiro 1957
1857/12/26
«1457 - 26 de Dezembro, doação, feita pelo infante
D. Henrique à Ordem de Cristo, da vintena dos direitos de escravos,
ouro,
pescarias e quaisquer outras coisas resgatadas
na terra de Guiné, desde o cabo Não (17).
(17) - Doc. em: Livro dos Mestrados, fl. 151, 1.ª col.; Livro das escrituras
da Ordem de Cristo, cod . n.º 235
do cartório da Ordem de Cristo, fl. 17 e s.; publ. idem - ibidem, vl. I, doc. n.º 426, p. 544-545.
De 26 de Dezembro de 1457 a 13 de
Novembro de 1400 - D. Henrique
continua detendo o exclusivo da navegação ao Sul do Bojador, mas o
quinto ou dízima de todas as coisas resgatadas na Guiné era arrecadada
pelos oficiais da Fazenda da Ordem de Cristo - D. Afonso V mandava solicitar autorização
ao
Infante
e, no caso do objectivo
da viagem ser comercial, quando os navios regressassem, mandava pagar aos
oficiais da Fazenda da Ordem de Cristo o quinto do valor das mercadorias resgatadas; nestes 2
períodos não poderiam ser resgatados: gatos
almíscarados, malagueta e especiarias, e unicórnios, que exclusivamente
pertenciam
ao
infante D.
Henrique;»
Jorge Faro, Duas expedições
enviadas à Guiné anteriormente a 1474 e custeadas pela fazenda de D. Afonso V,
pp. 76-77, Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, Vol- XII, N.º 45, Janeiro 1957
1458
VIAGEM AO NIUMI
Informa DIOGO GOMES que em 1458 partiu para o
Niumi uma extpedição, onde embarcaram o abade Soto de Casa e o moço de câmara
João Delgado, a fim de satisfazer os pedidos do Niumimansa a Diogo Gomes na
viagem de 1456 deste.
Ignora-se se avançaram mais para o sul
1458-1460
ou1462 - Diogo Gomes
Em data dif!cil de precisar, mas que deve ter
sido 1458, 1460 ou1462, esteve de novo Diogo Gomes na Guiné, com o encargo de
fiscalizar o comércio ilícito. Nesta altura eram já numerosos os navios que se
dirigiam à Guiné para comerciar. Muitas viagens deve portanto ter havido de que não ficaram
vestígios, a não ser talvez os cartográficos.
Desta vez Diogo Gomes não passou do porto de
Zaia, na Terra dos Barbacins, região entre a Ilha da Palma e o Rio Jumbas. Os
barbacins eram os súbditos do Bor-ba-Sine, sereres e alguns jalofos.
1458, 1460 ou 1462- Gonçalo Ferreira e António
de Noli
No Porto de Zaia encontrou Diogo Gomes, segundo
relata, duas caravelas, de Gonçalo Ferreira e António de
Noli. Ignoramos se estas estiveram mais para sul.
1458, 1460 ou 1462 - Viagem ao Gâmbia
Refere ainda Diogo Gomes que ao Porto de Zaia
chegou uma caravela, vinda do Gâmbia, onde comerciara. Também não se sabe se
esteve mais a sul.
1458, 1460 ou 1462-Viagem de Prado
Segundo.Diogo Gomes,
esta última caravela, vinda do Gâmbia, informou
encontrar-se lá um outro navio, pertença de um tal Prado, comerciando
ilicitamente em armas. Gonçalo Ferreira capturou depois tal navio no Cabo
Verde.
Igualmente se ignora se o Prado esteve para sul
do Gãmbia.
«Depois
da chegada do senhor infante, na armada com o rei Affonso recordei ao senhor
infante o que me dissera o rei Nomimans, que lhe mandasse tudo o que elle
pedira. O infante tudo fez, e mandou para ali o sacerdote parente consanguíneo
do cardeal, abbade de Soto de Cassa, para que ficasse com aquelle rei, e o
industriasse na fé. E com elle foi um moço de camará chamado Johan Delgado, e
isto foi no anno 1458.»
67 D. G. SINTRA (1484-1496), Op. Cit., pp. 86.
Por outro lado, Diogo Gomes, em documento à
disposição para consulta na Biblioteca de Munich, narra suas duas viagens entre
os anos de 1458 e 1460:
«Dois
anos depois (de 1458) o rei Afonso equipou uma grande caravela, em que me
mandou de capitão, e tomei comigo dez cavalos, e fui á terra dos barbacins,
etc. etc., e com a ajuda de Deus em 12 dias cheguei a barbacim e ali achei duas
caravelas, uma em que estava Gonçalo Ferreira, da casa do príncipe Henrique,
natural do porto, que levava para ali cavalos, e na outra caravela estava o capitão
Antonio da Noli, genovês, que era também mercador que trazia cavalos, isto no
porto de Zaza, etc. etc. Eu e Antonio da Noli deixamos então aquele porto de
Zaza e navegamos dois dias e uma noite para Portugal e vimos ilhas no mar, e
como a minha caravela era mais veleira do que a outra, abordei eu primeiro a
uma daquelas ilhas, e vi areia branca e pareceu-me um bom porto, e ali fundeei
e o mesmo fez Antonio, disse-lhe eu que desejava ser o primeiro a desembarcar e
assim fiz, não vimos rastos de homem e chamamos a ilha de Santiago por ser
descoberta no dia do santo, aí pescamos grande abundancia de peixe, etc. etc.
depois vimos a ilha amaria que se chama Palma e depois fomos à ilha da Madeira
e querendo ir para Portugal por causa do vento contrario fui parar as ilhas
Açores, Antonio da Noli esperou na ilha da Madeira e com melhor tempo chegou
antes de mim a Portugal e pediu ao rei a capitania da ilha de Santiago que eu
tinha descoberto e o rei lh'a deu, e ele a conservou até a sua morte, eu com
grande trabalho cheguei a Lisboa.»
1460
«Anno
de 1460 ou 1461.
Depois da morte do Infante D. Henrique,
despachou el Rei D Afioqso V. a Pedro de Cintra dando-lhe por regimento correr a costa dos negros, e descobrir novas
terras.
O primeiro descobrimento deste navegador foi o Rio de Bessegue, a 40 milhas do Rio
Grande por costa.
D'ahi a mais140 milhas descobrio o Cabo que se
chamou da Verga.
D'ahi a 80 milhas descobrio outro cabo muito
alto, e coberto de arvores viçosas, a que deo o nome de Cabo Sagres de Guine'.
Defronte deste cabo ao mar descobriu duas ilhas, desabitadas e sem nome.
Do mesmo cabo a 40 milhas descobriu um rio, que
se chamou de S. Vicente: e mais
adiante 5 milhas o rio que se denominou
Rio-verde.
A 24 milhas do Rio-verde achou o cabo a que deo
o nome de Cabo-ledo por ser mui
viçoso.
Por esta costa se extende em longura de mais de
60 milhas huma altíssima montanha cheia de verde e copa do arvoredo, a que se
deo o nome de Serra-leoa, pelo grande
rugido , que continuamente fazem as trovoadas, de que está cercado o seu cume.
Defronte da extremidade meridional desta serra
estavão três ilhotas, que os navegantes denominarão Selvagens.
A 30 milhas adiante da ponta da montanha
descobrirão o Rio-vermelho (ou roxo),
a que derão este nome, porque a sua agoa, correndo por terreno avermelhado, mostrava a mesma cor.
Além deste rio está hum Cabo, que também denominarão vermelho;
e defronte delle ao mar huma ilhota deshabitada que igualmente ficou com o nome
de Ilha-vermelha.
Passado o Cabo-vermelho descobrirão hum rio grande,
que chamarão de Santa Maria das Neves,
pelo avistarem a 5 de Agosto.
Além deste rio está huma ponta, e defronte della
a ilha que chamarão dos Bancos, pelos
muitos que ali faz a arêa.
Além desla ilha descobrirão hum cabo grande que
chamarão Cabo de Santa Anna, pelo
avistarem a 30 de Julho.
Do Cabo de Santa Anna a 60 milhas, descobrirão
hum rio, a que derão o nome das Palmas, por haver ali muitas.
Navegando ainda outras 60 milhas, acharão o rio, a que pozérão o nome dos Fumos, por verem muitos na costa
quando ali passárão.
Mais adiante 24 milhas descobrirão o Cabo do Monte, assim denominado porque o
cabo entrando muito ao mar mostra hum elevado monte.
D'ahi a 60 milhas acharão outro cabo, e outro
monte mais pequeno, a que por isso chamarão Cabo
Mesurado.
Navegando ainda mais 16 milhas notarão hum
bosque grande com arvores mui verdes que vinhão até ao mar, e lhe chamarão o Bosque de Santa Maria.
D'aqui voltou Pedro de Cintra ao reino,
trazendo da ultima terra hum negro, conforme a ordem de elRei, que depois o
mandou restituir ao seu paiz.
A Relação desta viagem foi escripta por
Cadamosto, e della se vê:
1.° Que Pedro de Cintra, passando além dos
últimos descobrimentos, explorou mais de 629 milhas de costa para o sul.
2.° Que a sua viagem foi executada logo depois
da morte do Infante D. Henrique, e provavelmente no anno de 1461, ou quando
mais tarde em 1462, porque Cadamosto, concluindo a narração diz «E deste ultimo lugar (que era o Bosque, ou
Matta de Santa Maria) não tinha passado navio algum ate á minha partida de
Hespanha, que foi no primeiro dia do mez de Fevereiro de 1463.»
(Vej. Navegação do Capitão Pedro de Cintra
escripta por Cadamosto, impressa na collecção de noticias para a hist. e
geograf. das nações utramarinas da Academia R. das Scienc. de Lisboa . tom. 2.
n.° 1.)»
índice
chronologigo das navegações, viagens, descobrimentos e conquistas dos
portuguezes nos paizes ultramarinos desde o principio do século xv. francisco
de s. luiz, lisboa, na imprensa nacional, 1841. pg.50-53
1460 Antonio e Bartolomeo da Noli, navegadores
genoveses ao serviço de Portugal, reclamam as Ilhas de Cabo Verde. As Ilhas
foram oficialmente descritas como "desabitadas". No entanto,
considerando os ventos dominantes e as correntes oceânicas na região, as ilhas
podem ter sido visitadas por Mouros ou por pescadores Wolof, Serer ou talvez
Lebu, da Costa da Guiné. A tradição sugere que as ilhas podem ter sido
visitadas por Árabes ou Fenícios séculos antes da chegada dos Europeus.
O explorador português Jaime Cortesão conta a
história da visita de Árabes a uma ilha, chamada "Aulil" ou
"Ulil", donde tiraram sal de salinas naturais. Qualquer que tenha
sido o caso, não havia população suficientemente bem estabelecida para resistir
à tomada de posse total pelos Portugueses.
«António da Nola - genovês, também
conhecido por Antonietto Usodirnare, um dos capitãis que pela primeira vez
avistaram a ilha de Sant'Iago. Desconhece-se a carta da doação da
capitania, que teria sido feita por volta do ano 1460. Primeiro capitão donatário»
João Barreto
Com a chegada
de PEDRO DE SINTRA à Serra Leoa em 1460, ficou concluída a fase das
descobertas sob a orientação do Infante D. Henrique, por este ter falecido
precisamente naquele ano.
1460? - Viagem de Pedro de Cintra
No resumo das viagens de Pedro de Cintra vamos
seguir as conclusões de DAMIÃO PERES, em estudo recente (B 30).
Tanto o roteirista DUARTE PACHECO (B 29), oomo
os cronistas RUI de PINA e JOÃO DE BARROS afirmam ter sido a Serra Leoa o
términus das viagens do tempo do Infante D. Henrique.
Teria sido descobridor da referida serra o navegador Pedro de Cintra, como
DUARTE PACHECO afirma, baseado em informaçâo do próprio. Não se sabe ao certo a
data da viagem, mas simplesmente que foi anterior a 13 de Novembro de
1460, dia da morte do Infante.
1460/05/01
Descoberta
das ilhas orientais de Cabo Verde por ANTÓNIO
DE NOLI, com seu irmão, o advogado BARTOLOMEU
DE NOLI, e seu sobrinho RAFAEL DE
NOLI (os filhos deste foram povoadores das ilhas do Fogo e Brava). Foi
proprietário rural.
Este relatório por DIOGO GOMES indica que foi ele quem descobriu as ilhas em 1460,
provavelmente no dia primeiro de maio, a primeira das ilhas foi descoberta e,
juntamente com seus companheiros (A.de Noli), nomeou-a Santiago. Na opinião de
Fontoura da Costa, D. Gomes chegou a Portugal antes da morte de D. Henrique em
13 de novembro 1460, que é mais uma razão que é preciso ressaltar a Carta Régia
(Carta da Doação) de 03 de dezembro de 1460, o qual não se refere à descoberta
de D. Gomes. Com base em este facto, parece que nenhuma probabilidade de que
ele teria sido considerado a descobridor de verdade parece ser um point.41
41 Este é um comentário curioso por Gabriel
Pereira em relação à personalidade de Diogo Gomes: considerando que ele seja
muito arrogante sobre suas conquistas e sempre colocando se acima de todos os
outros, com uma forte tendência para desacreditar seus companheiros. Em:
PEREIRA, Gabriel, As Relações de Diogo Gomes p. 269.
A hipótese sobre a autoria de Diogo Gomes é
sustentada com o seu próprio relato. Com efeito, no seu relato, que transmitiu
oralmente ao alemão Martin Behaim, este de passagem por Portugal por volta de
1484, o navegador português sustenta que descobriu a ilha de Santiago, na
companhia de ANTÓNIO DE NOLI, em
1460.40 MARTIN BEHAIM começou a
escrever o relato de DIOGO GOMES em
1484,41 portanto, depois da morte de António de Noli, ocorrida provavelmente
entre 1496 e 1497.42 De acordo com o relato de Gomes, dois anos após a morte do
Infante D. Henrique, o rei D. Afonso V equipou uma caravela, deu-lha como
capitão e enviou-o ao país dos “Barbacins”, onde chegou 12 dias depois da
partida, provavelmente de Lisboa.43 Relata Gomes que no porto de Zaza encontrou
duas caravelas, uma capitaneada por GONZAL
FERREYRA e outra por Antonius de Noli, genovês; que enviou Gonzal Ferreyra
para Portugal, a fim de conduzir sob prisão um tal PRADO, mercador. Enquanto isso, partia de Zaza na companhia de
Antonius de Noli também com destino a Portugal e, dois dias e uma noite depois
avistavam ilhas no mar, tendo ele chegado primeiro a uma delas, onde fundeou a
sua caravela, ao que foi seguido por Antonius de Noli. Chamaram a dita ilha de
Santiago. Nela desembarcaram e não encontraram vestígios de homens. Em
contrapartida, encontraram numeras aves exóticas que se deixavam aproximar a
tal ponto que eles as matavam com paus. Da ilha de Santiago partiram para
Lisboa e, tendo Antonius de Noli chegado primeiro, pediu a D. Afonso V a
capitania da ilha de “Sanctus Jacobus”. Tendo o rei anuído o pedido de Noli,
ficou preterido Diogo Gomes. Chegado a Lisboa poucos dias depois, Diogo Gomes
não reivindicou os seus direitos.44
40 MONOD, Th.; MAUNY, R.; DUVAL, G.
(Organização e notas de) – “De la première découverte da la Guinée”. Bissau:
Centro de Estudos da Guiné Portuguesa, 1959, p. 50-54.
41 MONOD, Th.; MAUNY, R.; DUVAL, – “De la
première découverte da la Guinée”, p. 8.
42 COSTA, A. Fontoura da – “Cartas das ilhas de
Cabo Verde de Valentim Fernandes” (1506-1508)”. Lisboa: Agência Geral das Colónias,
1939, nota de roda-pé nº 29, p. 17.
43 O Infante D. Henrique faleceu a 13 de
Novembro de 1460, pelo que a viagem de Diogo Gomes terá sido realizada,
portanto, em 1462.
44 PERES, Damião (Notas históricas de) – “Viagens de Luís
de Cadamosto e de Pedro deSintra”. II Parte. Lisboa: Academia Portuguesa da
História, MCMLXXXVIII, PARTE III.
Por
testamento do Infante D. Henrique as
terras da Guiné ficaram para o seu sobrinho, o Infante D. Fernando. Neste
testamento estavam incluídas as cinco ilhas de Cabo Verde, até então conhecidas
dos navegadores e que faziam parte integrante da Guiné.
1460/09/18
Doação
a D. Afonso V das ilhas do
arquipélago de Cabo Verde.
«1460 -- 18 de Setembro, doação feita pelo infante D. Henrique à Ordem de Cristo,
de todo o direito que o doador tinha e poderia ter na espiritualidade da terra da Guiné, com a obrigação
da donatária mandar celebrar semanalmente uma missa por sua alma (18).
(18) - Doc. ~m: ms. n.0 516 da
livraria, p. 27 e s.; Livro das escrituras
dia Ordem de Cristo, cod. n.º 235 do cartório da
Ordem de Cristo, fl. 11 v.º; Arq. Nac. da Torre do Tombo; publ. idem - ibidem, doe. n.º 452, p . 576-577.»
Jorge Faro, Duas expedições
enviadas à Guiné anteriormente a 1474 e custeadas pela fazenda de D. Afonso V,
pp. 76-77, Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, Vol- XII, N.º 45, Janeiro 1957
1460/11/13
Morte do Infante D.
Henrique.
«1460 -13 de Novembro, morte do infante D.
Henrique, em cujo testamento, datado de 28 de Outubro de 1460, D.
Henrique especifica as rendas que lhe foram concedidas por seu irmão D.
Duarte e por seu sobrinho D. Afonso V: «Item a el Rei meu Senhor
prouve de me dar as rendas que delle tenho, dellas em merçee, e delas em minha
vida, por tres annos depois de minha morte pera descarreguamento de
minha conciençia; as quaaes rendas som as que se seguem a saber:
ho meu assentamento, e as saboarias, e as ilhas da Madeira e
Porto
Sancto e a Deserta, e Guinea com suas ilhas e toda sua renda e o quinto das enxaveguas e as curvinas, e Lagos e Alvor».
Referindo seguidamente «Item peço a el Rey meu Senhor por
merçee, que elle queira seer meu testamenteiro porque seu he todo ho de que eu faço este testamento, e o leixo por meu herdeiro
de todo o que a my perteençer aa ora de minha morte, assy de
raiz como de movell, resalvando o de que fiz
herdeiro ho senhor ifante Dom Fernando meu filho (adoptivo)
e do que lhe elle mais do que ficar de mym queser
dar» (19).
(19) - Doc. em: ms.
n.0 516 da livraria, p. 3 e s.; cartório Ordem de Cristo, cods.: n.º 235, fl. 24 e s.; n.0 233, fl.
De 13 de Novembro de 1460 a Novembro? de 1469, D. Afonso V detém o pleno
domínio e jurisdição nos mares e terras da Guiné, a ele pertencendo todos os seus tractos, em virtude
do que as armadas que aí enviasse podessem visar todos, alguns ou algum destes objectivos: continuação dos reconhecimentos
geográficos;
defesa
dos mares e terras da Guiné das arremetidas dos corsários, que aí
pretendessem realizar o tracto sem estarem devidamente autorizados pelo Rei, e
investissem contra os navios que autorizados aí andassem efectuando o
resgate; realizar o resgate de todas ou
qualquer mercadoria, em nome e no interesse do Rei; contudo, o rendimento obtido durante os 3 anos subsequentes à morte do
infante D. Henrique (13 de Novembro de 1460 a 13 de Novembro de 1463) deveria ser integralmente
aplicado à satisfação dos encargos pios, testamentariamente fixados por D.
Henrique.»
Jorge Faro, Duas expedições enviadas à Guiné anteriormente a
1474 e custeadas pela fazenda de D. Afonso V, pp. 76-77, Boletim Cultural da
Guiné Portuguesa, Vol- XII, N.º 45, Janeiro 1957
1460/12/03
D.
Afonso V confirma ao Infante D. Fernando a posse das terras doadas por D.
Henrique.
1461
Diogo Gomes e Antonio
da Noli
descobrem mais ilhas de Cabo Verde
☻
1461 – Mandou ElRei a Soeiro Mendes,
Fidalgo de sua Casa, á Ilha de Arguim, para construir um Castello (se não foi
para acabar o que se diz estar já começado), a fim de proteger o Commercio
do ouro, e dos escravos, que neste tempo concorria áquellas Ilhas, o qual era
mais vantajoso a Portugal, do que o systema até alli seguido (I).
(I) Barros, Decada I, Liv. 2, Cap. I – Galvão (pag. 25) põe
esta expedição em 1462 – Faria e Sousa a coloca em 1449.
Sendo um território facilmente defensável e dotado de um bom
porto, dada a vantagem que a sua situação insular oferecia face à previsível
hostilidade das populações autóctones, a
ilha de Arguim foi escolhida para ali centralizar o comércio da costa africana.
A importância que a ilha rapidamente ganhou é comprovada pelo facto do Infante D. Henrique ter ali mandado erigir um castelo, concluído em 1461, já no reinado de D. Afonso V.
CASTELO
DE ARGUIM
Quanto à ilha de Arguim, já vimos na primeira
parte do nosso trabalho, que ela foi um dos
pontos mais importantes para os antigos navegadores
e comerciantes portugueses. Informa-nos João de Barros que em 1461, «D. Afonso
V mandou construir o castelo de Arguim
por Soeiro
Mendes, fidalgo da sua casa, ao qual deu a
alcaidaria para si e para seus filhos». Mas já
antes disso estava ali estabelecida uma feitoria portuguesa,
dotada de alguns meios de defesa militar.
O comércio no pôrto de Arguim estava
sujeito a um regimento fixado pelo Infante D.
Henrique. Segundo informa Luíz Cadamosto, em 1455 êste
comércio estava arrendado por 10 anos a uma
companhia que tinha ali os seus feitores «que compram e vendem
àqueles árabes, dando-lhes diversas mercadorias, como são panos tecidos, prata, alguizeis,
tapetes
e sobretudo trigo, do qual estão sempre famintos, e recebem em troca
Negros, que os ditos alarves trazem da Negraria e ouro em palhetas».
Os árabes e os azenegues tinham sempre grande número de escravos pretos,
obtidos não por violência, mas por troca de mercadorias,
e em especial de cavalos recebendo doze a quinze
escravos por um solípede.
As obras do castelo começadas por Soeiro Mendes
prolongaram-se até ao ano de 1483, ficando incompletas.
Era
um quadrado com 25 toesas de lado (cêrca de 50 metros) com muralhas de 4 toesas
de altura e 12 pés de largura, sem fôsso nem grandes meios de
defesa, de que, ainda hoje, se encontram alguns vestígios.
Em volta dele formou-se uma pequena povoação de comerciantes europeus e habitantes
mouros,
que
se
conservou
em
poder
de Portugal até 1638. Uma
esquadra holandesa de três navios
que passava próximo, informa da pouca resistência que a praça poderia oferecer, resolveu atacá-la e tomou posse em 29 de Janeiro dêsse ano. Estava-se na época dos
Filipes.
Não obstante os holandeses terem reforçado a defesa, o castelo foi
tomado, em 25 de Junho de 1665, pelos ingleses, que por sua vez tiveram
de o ceder no ano seguinte novamente aos Países Baixos.
Como a presença dos holandeses em Arguim prejudicasse a actividade
dos franceses, que, por intermédio da Compagnie du Sénégal, pretendiam
dominar em tôda a costa ocidental, foi
enviada
de
França
uma
expedição que se apoderou da fortaleza em 29 de Agosto de 1678.
A Companhia do Senegal resolveu,
porém, arrazar o forte, por não dispôr de elementos bastantes para a sua conservação.
Achando a região abandonada os holandeses voltaram a instalar-se em
Arguim no ano de 1685, onde se conservaram até 1721.
Voltaram novamente os franceses, mas após uma série
de
desastres em luta com os mouros e holandeses, tiveram de ceder a ilha em favor dos seus rivais.
Só em Fevereiro de 1724 é que Mr.
Salvert, director da Companhia Real do Senegal, conseguiu retomá-la, ficando
depois dessa data na posse da França.
Foi, pois, durante o
infeliz interregno
dos Filipes que Portugal perdeu o Cabo Branco e a região adjacente, assim como o resto da costa guineense, com excepção de uma estreita faixa compreendida entre os rios de Casamansa e Cacine.»
João Barreto, HISTÓRIA
DA GUINÉ 1418-1918, edição do autor, Lisboa, 1938, pg.
122-124 ☻ 1461ou1462
VIAGEM
DE PEDRO DE CINTRA
Segundo
CADAMOSTO, Pedro de Cintra fez uma viagem após a morte do Infante e antes do
seu regresso à Itália (1 de Fevereiro de 1463).
Sucede
porém que o veneziano, descrevendo a viagem, considera que só então se
ultrapassou o Rio Grande. Pedro de Cintra descobriria,de uma só vez, a costa
entre o referido rio e o Bosque de Santo Maria (cerca de 20 quilómetros
ao sul do Cabo Mesurado, na actual República da Libéria).
Ora
isto está em contradição com os informes de DUARTE PACHECO, RUI DE PINA e JOÃO
DE BARROS. Quis-se conjugar as duas opiniões, aparentemente discordantes, com a
hipótese de ter Pedro de Cintra partido em 1460 para essa viagem, descobrindo a
costa até à Serra Leoa no prazo que medeou até à morte de D. Henrique, e a
restante após essa data, mas tudo sempre na mesma viagem (FONTOURA DA COSTA,
apud DAMIÃO PERES, B 36, págs. 109-110).
No
entanto DUARTE LEITE (B 22) entende que se trata de informação errada dada a
CADAMOSTO por um seu antigo companheiro, e que a Serra Leoa já fora antes
atingida.
DAMIÃO
PERES (B 30) entende porém que houve de facto duas viagens distintas de Pedro
de Cintra, uma anterior e a outra posterior à morte do Infante, e que CADAMOSTO
muito simplesmente as transformou numa só. Parece-nos perfeitamente aceitável
esta hipótese.
1461/07/11
1461 - II de
Julho, o Papa Pio II, pelas letras Repetentes animo, nomeou vitaliciamente o infante D. Fernando (irmão de D. Afonso V e filho adoptivo do infante D. Henrique) Administrador e Governador da Ordem Militar de Jesus Cristo, concedendo-lhe plena jurisdição sobre os freires e bens da Ordem, cujos rendimentos anuais foram avaliados em 8.000 florins de ouro da câmara, que deveriam ser utilizados na manutenção dos freires, por forma a que o seu número não
diminuísse, e na satisfação dos encargos habituais da Ordem, podendo o infante D. Fernando livremente dispor do remanescente, como fizeram os seus predecessores, não podendo no entanto alienar bens imóveis e bens móveis preciosos (20).
(20) - Doc. em Regestum do Papa
Pio II, ano III, tomo 47, p. 61 v.0 , Arquivo do Vat icano; copiado por M. Marini, fins século x1x, Bulas, maço 68, doc. n. 0 143, pela numeração antiga n.0 95, Arq. Nac. da Torre do Tombo; publ. Dias
Diniz - Reflexos políticos
do segundo testamento henriquino. p. 42-46.»
Jorge Faro, Duas expedições
enviadas à Guiné anteriormente a 1474 e custeadas pela fazenda de D. Afonso V,
pp. 76-77, Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, Vol- XII, N.º 45, Janeiro 1957
1462
1462 - Entre os privilégios
concedidos aos moradores da ilha de Santiago (Cabo Verde) contava-se o livre comércio com a
Costa da Guiné (com exceção
de Arguim).
1462
O Rei D. Afonso V de Portugal doa o arquipélago a seu irmão, o Príncipe D.
Fernando, o qual posteriormente viria a dividir a ilha de Santiago entre dois
donatários. A colonização europeia começou pela Ribeira Grande, no sotavento de
Santiago, que oferecia uma fonte segura de água fresca e um porto relativamente
abrigado. Um grupo, constituído por portugueses expulsos ou indultados, por
aventureiros genoveses e flamengos e por judeus sefárdicos, incluía-se entre os
primeiros colonos europeus.
☻
Diogo Gomes:
«Dois annos depois (de 1460, morte do
Infante) o senhor rei Affonso armou uma
grande caravella, onde me mandou por capitão; levei dez cavallos commigo e fui
á terra dos Barbacins, que está entre Serreos e o rei Nomimaus. E estes
Barbacins são dois reis, a saber: Barbacin dun e Barbacin negor. O rei deu -me
poder sobre as margens d'aquelle mar, para quaesquer caravellas que encontrasse
em terra de Guiné fossem sob minha auctoridade ou dominio, porque elle sabia
que ali estavam caravellas que levavam espadas e outras armas aos mouros,
ordenando-me que as tomasse e lh'as trouxesse a Portugal.
Com a ajuda de Deus, em
doze dias cheguei a Barbacins, e achei ali duas caravellas, a saber: uma, na qual ia GONÇALO FERREIRA, familiar
do senhor infante, vizinho da cidade do Porto, em Portugal, que levava
cavallos para ali. E na outra caravella
era capitão e mercador, levando também cavallos, ANTÓNIO DE NOLI, genovez.
E isto foi no porto de Zaya. Também ahi encontrei Borgebil, que foi rei de
Geloífa, que para ali fugira com medo do rei Burbuck que lhe tomara a terra.
Estes mercadores com as suas caravellas fizeram muito
dainno ao resgate d'ali; porque onde costumavam os mouros dar 7 negros por um
cavallo, a elles não davam mais de seis.
Então eu convoquei os
capitães, e da parte do rei lhes dei
sete negros por um cavallo, e dei depois um cavallo por quatorze e quinze
negros. E estando nós assim veiu uma caravella de Gambia com a nova de que
um fuão, chamado de Prado, vinha com uma caravella cheia de riqueza.»
«Eu e ANTÓNIO DE NOLI, do porto de Zaya,
fomos dois dias e uma noite caminho de Portugal, e vimos ilhas no mar. E porque a minha caravella era mais veleira
que a outra, cheguei eu primeiro a uma d'aquellas ilhas, onde vi areia branca,
e, parecendo-me bom o porto, lancei a ancora e o mesmo fez António. E
disse-lhes que queria ser o primeiro a pôr pé em terra, e assim fiz, e nenhum
indicio de homem vimos ahi. Chamámos
Santiago á ilha, e até agora assim se chama. Havia ali grande pescaria. Em
terra, porém, achámos muitas aves estranhas e rios de agua doce. As aves
esperavam-nos sem fugir, assim as matávamos com paus. Havia ahi muitos patos.
Também era grande a fartura de figos, mas não estão dispostos nas arvores do
mesmo modo que nas nossas figueiras; porque os nossos estão perto da folha e
estes por todo o tronco, desde o pé da arvore e d'ahi para cima por toda a
casca dos ramos. D'estas figueiras ha grande numero; e ali também vimos farta
pastagem.»
O
primeiro núcleo populacional ter-se-á instalado na ilha de Santiago por volta
de 1462, como se pode inferir da carta
régia de 12 de Junho de 1466, pela qual D. Afonso faz saber “(...) que o
infante D. Fernando meu mui prezado e amado irmão nos enviou dizer como haverá
quatro anos que ele começara povoar a sua ilha de Santiago que é através de
Cabo Verde e que por ser tão alongada de nossos reinos a gente não quer a ela
ir viver senão com mui grandes liberdades e franquezas".2
2 In: António Carreira, Cabo Verde: Formação e Extinção de uma Sociedade escravocrata (1460-1878),
2ª ed., Gráfica Europam, Ldª, 1983, p.29.
Essa
carta régia estabelecia privilégios aos futuros moradores, por forma a poderem
contornar as dificuldades iniciais de fixação, quais sejam a distância a que se
encontravam as ilhas do Reino e a inexistência de condições naturais de
habitabilidade ou de acumulação originária. Através dela, e perante tácito
reconhecimento dos “grandes proveitos” que adviriam da fixação do povoamento
das ilhas, a Coroa concede aos donatários de Santiago o monopólio comercial em
toda a costa africana, que vai do Senegal aos rios da Guiné, e outras
prerrogativas como a “alçada do cível e crime sobre todos os mouros, negros e
brancos, forros e cativos, e de toda a sua geração que em a dita ilha houver”.3
3 Carta régia, de 12 de junho de 1466. In: Antônio
Carreira, op. cit. p. 29.
1462
- VIAGEM AO BOSQUE DE SANTA MARIA
Afirma
CADAMOSTO (Navegação de Pedro de Cintra, Cap. v) que antes do seu
regresso à Itália (1 de Fevereiro de 1643) partiu nova expedição para a Guiné
com o encargo de reconduzir à sua terra um indígena aprisionado para estudo na
anterior viagem de Pedro de Cintra.
Nada
mais sabemos acerca desta expedição, pelo que se ignora o ponto mais a sul
atingido. É porém natural supor que tenha ultrapassado o Bosque de Santa Maria,
uma vez desembarcado o aborígene.
☻
1462 - Neste anno (ou talvez no antecedente) mandou ElReí duas Caravelas para continuarem
o descobrimento da Costa de África: era Comandante de huma Pedro de Cintra, seu
Escudeiro, e da outra Soeiro daCosta(1).
Chegados
ás duas Ilhas habitadas, que Cadamosto reconheceo na sua
segunda Viagem, defronte do Rio a que chamou Rio Grande, surgirão em huma
dellas, e tratárâo com os Negros por acenos, por não
entenderem a sua linguagem; observárão tambem, que habitavâo em cabanas
miseraveis, e tinháo ldolos de madeira, que adoravão.
Fazendo-se daqui á véla, e navegando cousa de quarenta milhas além do Rio
Grande, virão outro que teria tres ou quatro milhas de largo, esse chamava Rio
de Bessegue (2), nome de hum Régulo, que dominava na sua entrada. E prosseguindo
no reconhecimento da Costa, descobrírão hum Cabo, a que pozerão o
nome de Caho da Verga (3), que distaria do Rio de Bessegue cousa de cento e
quarenta milhas; e toda a Costa entre estes dous pontos era hum pouco montuosa,
e coberta de alto e verdejante arvoredo.
Perto
de oitenta milhas adiante do Cabo da Verga achárão outro mais alto que todos os
antecedentes, com hum pico no meio, e sombreado de grandíssimas arvores, a que
puzerão o nome de Cabo de Sagres de Guiné (4), em memoria do Cabo de Sagres,
que o Infante D. Henrigue construíra. Os habitantes daquele Rio tinhâo a côr menos preta, que os outros
Negros, e erão Idolatras; andavâo quasi nús, homens, e mulheres trazião furadas
as orelhas, e cartilagem do nariz, em que enfiavão alguns anneis de ouro; e os
rostos, e copos marcados com varias figuras: não possuião armas de ferro, e mantinhão-se
de arroz, milho, e legumes.Ao mar do Cabo estavão duas
Ilhas pequenas, huma em distancia de seis, e outra de oito milhas, ambas deshabitadas,
e bastecidas de arvoredo. As Almadias destes Negros erão grandes, e capazes de
conter de trinta a quarenta homens cada huma; não conhecião o uso dos
toletes, e por oonsequencia remavam em pé.
Quarenta
milhas além do Cabo de Sagres vírâo hum Rio a que chamárão de S. Vicente (5),
com perto de quatro milhas de largura na boca; e cinco milhas mais
adiante outro ainda mais largo,que appellídárão Rio Verde, por serem estes os
nomes das duas Caravelas.Toda esta Costa era montuosa, e com bons surgidouros,
e bom fundo. Correndo mais vinre e quatro milhas, descobrirão hum
Cabo, a que derão o nome d eCabo Ledo, por ser mui viçoso, e alegre (6).
(1)Como não achei nos nossos Escritores as particularidades desta Viagem de Pedro de Cintra, sigo a
narraçáo de Cadamosto, que escreveo as noticias que lhe deo hum Portuguez seu amigo, que parece fazia parte da guarnição da
Caravela de Pedro de Cintra ; e assigno a esta Viagem o anno ele 1462, por me
parecer mais provável, attendendo a que este Descobridor estava de volta em Portugal no 1.º de Fevereiro de 1463, epoca da saída de Cadamosto.
Vejão-se as Memorias da Academia já
citadas, onde vem as Viagens deste Veneziano. Faria diz que foi em 1463.
(2)Este Rio parece ser o de Nuno Tristão ja descoberto
(3)Este Cabo está situado na latitude N, 10° 4’; e
longitude 4° 51 '.
(4 )Não he possivel saber-sehoje a que ponta de terra se
deo o nome de Cabo de Sagres.
(5)O Rio de S. Vicente, e o Rio Verde talvez que sejão os Rios das Pedras , e de
Capor.
(6)Cabo Ledo (chamado pelos lnglezes Cabo da Serra Leôa, e pelos Francezes Cabo Tagrim) he a ponta do Sul da
entrada do Rio Mitomba, ou de Serra Leôa , situada na latitudc N 8º 30', e
Iongitude 5º 6'. A ponta do Norte
da mesma entrada chama-se ponta de Pulame, ou Ilha dos Leopardos. Este Rio, hum
dos mais formosos da Africa Occidental, corre de Oeste para Leste, com huma foz
de cinco legoas de largo até à Cidade de Freetown, Capital dos estabelecimentos
lnglezes, construida na margem Austral, a duas legoas e meia da entrada. Neste
ponto diminue o Rio quasi metade da sua largura, e assim continúa sete legoas além da Cidade, onde se divide em dois braços. Ha neste Rio varias
Ilhas, e na entrada hum baixo de area, que toma dois terços da sua largura.
1462/01/29
Nomeação
de DIOGO AFONSO como CAPITÃO DONATÁRIO da parte norte da
ilha de Santiago. Foi-o até 1473.
As
ilhas eram propriedade da casa senhorial do Duque de Viseu (o Infante D.
Henrique foi o primeiro), – foram doadas a D. Fernando, a quem D. Manoel, seu
filho e futuro Rei de Portugal, sucedeu. Estes senhores promoveram a povoação
da ilha concedendo donatarias a pessoas da sua casa na forma de
capitanias-donatárias, a quem nomeavam procuradores de sua jurisdição sobre os
territórios doados. Competia aos ditos capitães distribuir as terras em
sesmarias, um recurso jurídico-institucional amplamente usado na expansão
portuguesa para fixar os vassalos ou colonos aos novos territórios. Porém, a
doação destas terras estava condicionada a uma contrapartida primordial exigida
dos sesmeiros: tornar a terra produtiva em até cinco anos, sendo, no máximo,
este prazo prorrogado por mais cinco anos. Se neste período o proprietário
tivesse sucesso, entraria na posse definitiva das mesmas. Caso contrário, as
terras seriam confiscadas e cedidas a outrem para que as explorassem. Ou seja,
o acesso à terra estava condicionado à capacidade do proprietário de produzir.
Isto implicava em dois aspectos divergentes da propriedade rural na colônia e
no reino. Na colônia, a posse da terra é assegurada pelo seu uso produtivo,
descartando assim modos de utilização da terra não produtivos, mas
nobilitantes, muito arraigados no reino.1
Os
capitães donatários recebiam fartos proventos e significativos privilégios,
além de se verem investidos, por delegação régia, em prerrogativas inerentes ao
exercício do poder público. Representava uma arquitectura jurídica que servia
um objectivo bifronte. Por um lado, exibia a faceta de constituir uma justa
recompensa para aquelas que delicadamente se envolveram na empresa mrítima. Por
outro lado, configurava um valioso expediente jurídico no sentido de garantir
de forma atractiva o povoamento e exploração das ilhas descobertas.
A solução tradicional
de colonização através de doações de capitanias não era senão uma hábil
adaptação do velho sistema das doações de bens da coroa que, no nosso país, se
divulgara com um cariz próximo das concessões feudais. Um facto que nada
tinha de estranho à luz da prática régia europeia de enfeudar bens, rendas e
direitos da coroa, a despeito das forças centralizadoras que se procuravam
impôr.
Por
via de regra, a capitania constituía uma doação subordinada aos princípios da inalienabilidade
e da indivisibilidade. O interesse público assim o justificava. Em caso de
morte do donatário, a capitania era transmissível, em primeiro lugar, aos
descendentes, prioritariamente ao filho mais velho. Aliás, o quadro normativo
sucessório apresentava-se muito minucioso. Por exemplo, os bastardos de coito
danado eram incapazes de suceder. A carta também previa sanções. Se o donatário
violasse os princípios da inalienabilidade ou da indivisibilidade, sofreria o
perdimento da governaça.
O mesmo que capitães de Donatário ou capitães-mores,
são um cargo administrativo, primeiro surgido nas ilhas atlânticas no período
tardo medieval português e depois estendido ao Brasil, até aos limites
definidos pelo Tratado de Tordesilhas. O cargo era em geral hereditário,
estando sujeito a regimento específico e à confirmação real. Na ausência de
filho varão, seguia-se, com algumas exceções, a lei sálica, como aconteceu na
sucessão de António da Noli (à morte deste) por sua filha, Branca de Aguiar.
Cabia aos capitães a representação dos interesses e
autoridade dos donatários na respetivas Capitanias, garantindo-lhes os
proventos e administrando-lhes os bens. Serviam ainda de interlocutor entre as
populações e os donatários.Os capitães gozavam de largos poderes
administrativos, judiciais e fiscais, sendo a autoridade máxima nas respetivas
Capitanias. Cabia aos capitães a representação dos interesses e autoridade dos
donatários na respetivas Capitanias, garantindo-lhes os proventos e
administrando-lhes os bens. Serviam ainda de interlocutor entre as populações e
os donatários.
Tinham o dever de povoar, repartir as terras,
entregar colonos, explorar economicamente, defender o seu território e manter
ordem, aplicando justiça, sendo-lhes vedadas apenas as penas de talhamento de membros
e de execução. Respondiam pelos seus actos diretamente perante o Donatário,
sendo remunerados com parte, geralmente 10% do dízimo, a chamada redízima, dos
rendimentos que, na Capitania, cabiam ao donatário. Tinham o monopólio dos
moinhos, do comércio do sal e dos fornos de cozedura de pão.
O capitão do donatário recebia poderes, tanto no
campo cível como no criminal, mas era obrigado a apresentar as partes
desavindas perante os juízes da terra que deveriam aplicar o direito geral
legislado, o direito consuetudinário, acrescido depois da legislação que foi
sendo produzida e que desaguará no regime autonómico do século XIX.
A figura do Capitão funcionava ainda como instância
de recurso para onde as partes podiam apelar (declarar que se quer recorrer) e
agravar das sentenças. Do capitão recorria-se de agravo ou de carta
testemunhável para o Infante D. Henrique e seus sucessores, sem efeito
suspensivo, com exclusão expressa de todas as outras Justiças, devendo então o
capitão sustentar a sua decisão.
Quanto aos feitos criminais, o próprio Capitão é que
os julgava, podendo aplicar aos culpados penas de prisão, degredo e açoutes,
sem que disso pudesse apelar-se.
Tratando-se, no entanto, de crime tão grave que
merecesse talhamento de membro (mão, pé ou língua) no pelourinho ou pena de
morte, os acusados deveriam ser julgados e, quando condenados, só podiam apelar
para o Infante que deveria enviar o processo para a Casa do Rei onde o recurso
seria julgado ao final.
O infante determinou ainda que quem violasse esta
regra e usurpasse os seus poderes, pagar-lhe-ia mil réis por cada vez, para
além das penas que a lei geral previa para o caso.
Quanto aos tabeliães, os que se enganassem por
falsidade, deveria o Capitão suspendê-los imediatamente do ofício, comunicando
o facto ao Infante para que este determinasse a pena a aplicar.
1462/09/19
ANTÓNIO DE NOLI é nomeado capitão
donatário da parte sul de Santiago, na vila da
Ribeira Grande (hoje a Cidade
Velha), que a compartilhou com DIOGO GOMES, capitania
de Alcatrazes.
Na Ribeira Grande, a sete milhas da cidade da Praia, se
estabeleceu Antonio da Noli, acompanhado do seu irmão Bartholomeu e um sobrinho
por nome Raphael. Foram estes os fundadores do primeiro povoado da ilha, que
mais tarde chegou a ser a capital da província.
Vulgarmente conhecida, hoje pela cidade Velha, ficava situada na
costa meridional, ã beira mar, e estendia-se pelas margens de uma fertilissima
ribeira. Erguia-se do centro de altos penhascos e enormes montanhas.
Para a escolha d'esse lugar visou Antonio da Noli, certamente à
abundancia extraordlnaria de agua, que innundava um solo uberrimo, de
preferência aos outros pontos do sul da ilha, que lhe pertencia, onde faltava
aquelle elemento tão necessario no começo de uma colonisação, embora o clima
fosse mão.
Foi por isso que, a cidade Velha teve uma vida de curta duração,
mas, n'essa breve existência não deixou de se tomar notavel, quer sob o ponto
de vista politico quer commercial.
Posteriormente á Ribeira Grande, séde da capitania do sul, se
estabeleceu o povoado dos Alcatrazes, na actual freguezia de Nossa Senhora da
Luz, proximo ao seu ponto principal da Praia Abaixo. Era a séde da capitania do
norte, de que foi donatario Diogo Afonso.
Ambas as capitanias eram conhecidas por villas, ignorando-se,
porém, se honve algum titulo dando-lhes essa cathegoria.
Da villa dos Alcatrazes, que foi muito menos importante, sob o
ponto de vista commercial e de opulência, do que a Ribeira Grande, foram
desaparecendo as suas melhores casas em 1516, até que em 1770, restando ainda
algumas cabanas, que se iam erguendo sobre as ruinas, foram abandonadas pelos
moradores devido á grande esterilidade d'esse anno. Teve um forte que a esse
tempo estava quasi demolido.
Como mais adiante veremos, foi nos Alcatrazes onde residiu a
familia de appelido Annes, e é de crer, que se realmente os creados do
infante D. Fernando estiveram na ilha, que preferissem esta capitania à do
Antonio da Noli, por ter sido Diogo Afonso escudeiro e contador da ilha da
Madeira. A sua qualidade de portuguez e a sua posição social deviam
attrahir-lhe para a capilania gente de melhor linhagem.
☻ Confirmação por D. Afonso V da doação das ilhas
conhecidas do arquipélago ao infante D. Fernando,que, aliás, possuía
também o senhorio das demais ilhas atlânticas, por ser herdeiro de seu tio, o
Infante D. Henriques.
Quanto
ao lado material, todo o resgate por particulares era feito com a sua prévia
licença, prerogativa esta que advinha desde a doação que lhe fizera seu irmão
D. Pedro quando ainda era regente. À data da sua morte, em 1460, as suas
caravelas tinham atingido a Serra Leoa e por testamento de 28 de Outubro
do mesmo ano, institui seu sobrinho D. Fernando herdeiro dos seus bens, honras,
terras, senhorios, direito e deveres inerentes aos cargos que exercia.
O
sucessor não foi homem de génio nem da envergadura do tio; a sua actividade
limitou-se a mandar colonizar as ilhas de Cabo Verde que lhe foram dadas por
seu irmão. As doações têm a data de 3 de Dezembro de 1460 para as ilhas dos Açores
e parte do arquipélago deCabo Verde, e a data de 19 de Setembro de 1462 para as
restantes ilhas do arquipélago caboverdeano.
1462/12/24
Um Carnaval
antecipado? Cristãos-novos em pleno desrespeito pela religião que tinham dito
abraçar? Apenas uns copos a mais? É quase certo que não viremos a saber com
rigor o que ia na cabeça dos homens que montaram uma farsa na véspera do Natal de 1562, em Bugendo, terra da Guiné da
qual não reza a história.
Tudo começou
uns dias antes, quando FRANCISCO JORGE,
feitor de S. Domingos, pediu a ANTÓNIO
LUÍS, o “Boca Fede” de alcunha, um texto para ser representado na noite de
Natal. Os versos foram feitos, mas a encenação ultrapassou em muito aquilo que
o autor poderia supor.
Os convivas
juntaram-se para uma consoada de carnes e frutos doces onde a bebida terá
corrido em abundância. Admitiria mais tarde um dos participantes que todos
“tinham comido e bebido a seu prazer e estavam muito quentes”. Talvez por isso,
e para desespero do “Boca Fede”, em vez dos inocentes versos que estavam
preparados desenrolou-se um espantoso e incontrolável happening. Primeiro,
entrou em cena um tal MESTRE DIOGO,
alentejano nascido no Torrão que, vestido de mulher, e rodeado por 10 ou 12
homens disfarçados de “bailarinas”, cantou músicas pouco condizentes com a
quadra natalícia.
Dois dos que
assistiam à função perguntavam, de máscaras de papel no rosto: “Já pariu
Maria?”. Alguns berravam: “Que pariu? Macho ou fêmea?”. Retorquiam outros
“macho”. E à pergunta “onde?”, uns diziam que em Belém, havendo quem afirmasse
que “tinha sido em Bugendo, terra da Guiné”. Quando alguém perguntou que se
haveria de oferecer ao Menino, um garantiu que lhe daria um gabão que tinha uma
racha, ao que outro acrescentou, também como prenda, um porco de fumeiro e uma réstea
de alhos. Para além de 20 ou 30 cristãos-novos estavam presentes outros homens
a quem os cantares e dichotes pareceram perfeitamente despropositados. A história chegou aos ouvidos da Inquisição.
Na devassa que se seguiu tudo foi esquadrinhado: quem esteve e o que disse; que
papel desempenharam na farsa fulano e beltrano. Acabaram por vir à baila
histórias que pouco tinham a ver com os acontecimentos de Bugendo e que
exemplificam bem o tipo de interrogatório que era então usual.
«A inquisição e os jesuítas entravam, quasi ao mesmo tempo, em Portugal: e, logo
depois, estendiam a sua acção sobre as conquistas. E a toda a parte onde
chegavam, uma e outros, promoviam a desordem e levantavam os ódios contra o
nosso domínio; já pela intolerância dos seus procedimentos, já pela sua ambição
e cubica, e já pelas intrigas que tramavam sem descanço entre portuguezes, e
entre indígenas e naturaes das terras conquistadas.»
ESTUDOS SOBRE AS
PROVÍNCIAS ULTRAMARINAS POR JOÃO DE ANDRADE CORVO Volume I LISBOA POR ORDEM E NA
TYPOGRAPHIA DA ACADEMIA REAL DAS SCIENCIAS 1883, pp. 8-9
O processo
de MESTRE DIOGO, de 34 anos,
“solorgião”, cristão-novo lançado na Guiné, desenrolou-se a partir de abril
de 1563. Nessa data, o bispo de Santiago,
em Cabo Verde, deu seguimento às denúncias segundo as quais em Bugendo, terra
da Guiné, cristãos-novos tinham representado um auto na véspera de Natal,
durante o qual um cristão-novo “muito feio”, Mestre Diogo, aparecia vestido de
mulher e outros intervenientes interrogavam-se sobre se a Virgem Maria teria
dado à luz em Belém ou em Bugendo.
D. FRANCISCO ordenou o levantamento de um auto
de averiguações e, até junho de 1563, foram ouvidas diversas testemunhas dos
acontecimentos pretensamente ocorridos na casa do feitor de São Domingos,
Francisco Jorge, na noite de 24 de dezembro de 1562, protagonizados pelos tais
20 ou 30 cristãos-novos, tratantes ou negreiros, entre os quais, para além de
Mestre Diogo e do “Boca Fede”, figuravam JORGE
FERNANDES (o do nariz furado), TEOTÓNIO FERNANDES (o “Paião”), um alfaiate
com uma venda no olho, de nome desconhecido, AIRES LOBO (o “Marquesota”), ANTÓNIO DUARTE, algarvio conhecido por
“Corcoz”, e os IRMÃOS POLDRINHOS. As diversas testemunhas, depondo na
Ribeira Grande perante o vigário geral e um escrivão, referiram-se também à
morte, à maneira judaica, de bodes e galos brancos, a trovas ditas sobre a
cabeça cozida de um porco, ao roubo de um retábulo pelos negros e ainda à
história do famigerado “Braço de Balança”, presumivelmente queimado pela
Inquisição em Lisboa, e do seu filho, cujo nome desconhecemos, e que costumava
perguntar “como quereis que não haja fomes no reino se em cada ano fazem quatro
vezes cadafalso?”.
Quase todos
os intervenientes no insólito se terão escapado sem qualquer punição. Embora a
Inquisição se esforçasse por prender “certos cristãos-novos que andam no sertão” Lisboa
ficava demasiado longe e os judeus da
Guiné gozavam do apoio do feitor, “tão judeu como eles”. De MESTRE DIOGO sabemos que foi preso em
novembro de 1563 e que em setembro de 1564 estava no cárcere do Santo Ofício,
em Lisboa. Foi interrogado quatro vezes, confessando que a brincadeira do auto
de Natal fora de mau gosto e acusando outros cristãos-novos de terem afirmado
que a Virgem dera à luz em Bugendo e não em Belém. Reconheceu ainda que não
comungou durante os seis anos em que esteve na Guiné, aceitando as culpas por
quanto disse e por tudo aquilo que se esqueceu…
O pai de
Mestre Diogo acabou por pagar uma fiança de 500 cruzados, o que possibilitou a
libertação do farsante. Dois anos depois dos acontecimentos de Bugendo, o seu principal
protagonista estava de novo em liberdade. Sobre o que aconteceu a seguir não
temos notícia. Parece-nos lícito pensar que a sua paixão pela arte de Talma
tenha esmorecido e que nos anos de vida que lhe restaram se tenha dedicado
apenas a tratar da sua fazenda.
1463
- -
RELAÇÃO DAS VIAGENS DE PEDRO DE SINTRA, de um
português anónimo e do italiano LUÍS DE CADAMOSTO (1463-1465?);
-
Viagens de Luís de Cadamosto
(1463-1465?).
A
origem familiar de Cadamosto é controversa. Segundo alguma bibliografia,
provinha de uma família nobre oriunda de Lodi que, desde a segunda metade do
século XII, residia em Veneza. Rinaldo Caddeo, porém, refere que os Cadamosto
eram originários de Oderza e que se encontravam na Sereníssima desde 925.
Filho
de Giovanni Da Mosto, que fora provedor da República de Verona em 1439, e de
Giovanna di Matteo Quarini, Luís era irmão de Pietro e Antonio Cadamosto.
A
data do seu nascimento também levanta algumas questões. A sua relação de viagem
conduz à data de 1432. Porém, Ugo Tucci considera essa data inviável, apontando
o nascimento de Cadamosto para alguns anos antes, provavelmente 1429. O autor
justifica essa inviabilidade com o facto de, em 1442, Cadamosto ser já agente
comercial de Andrea Barbarigo. Ora, caso tivesse nascido em 1432, isso
significava que ele teria iniciado a sua carreira mercantil aos dez anos, idade
exageradamente precoce.
Cadamosto
viu-se privado da sua herança familiar dada a condenação do pai ao exílio, na
sequência de actividades ilícitas. Tal facto levou-o a aventurar-se no comércio
internacional ainda muito jovem. Em 1445, teria feito a sua primeira viagem.
Foi à Barbaria, em ligação comercial com a empresa de Andrea Barbagio. No ano
seguinte, navegava até Creta. Em 1451, embarcou na esquadra comandada por
Andrea Contariro que se dirigia para Alexandria. No regresso, partiu para
Flandres, de onde voltou em 1453.
Em
Agosto de 1454, junto com o irmão Antonio, Luís voltou a embarcar rumo a
Flandres nas galés comandadas por Marco Zen, tendo deixado o irmão Pedro em
Veneza, a liderar os negócios da família. No decorrer da viagem, os ventos
conduziram-no ao Cabo de S. Vicente. O Infante D. Henrique aproveitou para
enviar a bordo Antão Gonçalves e Patrício de Conti, cônsul veneziano,
destinados a mostrar à tripulação alguns dos produtos que Portugal recebia dos
territórios recém-descobertos e a falar-lhes das riquezas que destes advinham.
Cadamosto mostrou o seu interesse nas potencialidades desse novo comércio e, numa
reunião com o infante, colocou-se ao seu serviço para futuras viagens. D.
Henrique, sabendo do seu conhecimento sobre o comércio de especiarias com o
Oriente, aceitou-o e deu-lhe a oportunidade de escolher entre duas propostas: Cadamosto
encarregar-se-ia da armação da caravela, entregando-lhe apenas um quarto das
mercadorias que trouxesse, ou remeter-lhe-ia tal encargo, dividindo em partes
iguais a carga com que regressasse. Dada a precaridade da sua situação
económica, Cadamosto optou por deixar a armação da caravela completamente a
cargo de D. Henrique.
1464/07/26
SOEIRO
MENDES DE ÉVORA, o primeiro alcaide-mor
do castelo de Arguim e seu provável
construtor, recebeu de D. Afonso V, a 26 de Julho de 1464, uma
carta que lhe conferia a capitania-mor da ilha de Arguim, para si e para os seus descendentes.
«1464 - 26 de Julho, carta de D. Afonso V concedendo novamente
a Soeiro Mendes a função de «alquayde-moor do
dito castello ( de Arguim), cassas e
villa da dita ylha e resgate d'Arguym, e isto em sua vida, e qua qual alquaydarya lhe loguo pohemos de tença, em cada húu ano,
doze escravos ou escravas, ou ouro que os valham;
os quaes escravos, ou escravas, ou ouro elle
avera
pollo resgate que fara ou mandara fazer a outrem en seu nome de tanta mercadorya sua, daquella
que por nos nom he defessa, por que se possa aver os ditos escravos, ou ouro que os assy
valha ao que os assy resgatarem e doutra guissa nom, os quaees
mouros ou ouro, que assy ouver, elle os possa
trager, ou mandar frager a quaesquer pessoas de nossos reinos, sem nos
pagando della nhúu direito, mas ante toda livremente leve» (22).
(22) - Doc. em Chancelaria de D. Afonso ,-, 1.0 8.º, fl. 88, Arq. Nac. da Torre do Tombo; publ. em Annaes Marítimos e
Coloniaes, parte não oficial, 5.ª série, p. 41-42.»
Apud Jorge Faro, Duas expedições
enviadas à Guiné anteriormente a 1474 e custeadas pela fazenda de D. Afonso V,
pp. 76-77, Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, Vol- XII, N.º 45, Janeiro 1957
1470
Neste
anno descobrio Soeiro da Costa o Rio, a que deo o seu nome (1), o qual se
conserva ainda 'em todas as Cartas.
(1)O mesmo Barros no lugar citado. Este Rio está situado na Costa
Ocidental da Africa, obra de trinta legoas áquem do Cabo de Três Pontas.
☻
Partirão de Lisboa por ordem de FERNÃO
GOMES, em duas Caravelas (2) JOÃO DE
SANTARÉM, e PEDRO ESCOVAR,
cavalleiros da Casa d’ElRei, e por seus pilotos MARTIM FERNANDES, e ALVARO
ESTEVES, reputado pelo mais habil no seu tempo; e correndo a Costa de
Africa além dos pontos já conhecidos, descobrirão em Janeiro do anno seguinte o
lugar, a que se deu o nome de Mina pelo muito ouro que alli concorria; e não
longe do qual mandou depois ElRei D. João II construir o Castello da Mina.
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